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quinta-feira, 9 de março de 2017

Pequena Ilha de coral - Christianne Vieira

Resultado de imagem para ilha submersa


Pequena Ilha de coral
Christianne Vieira


Nogueira se acomodou confortavelmente na cadeira. A sua frente, um monitor cheio de imagens. Estava mergulhado nessa pesquisa há vários meses e, quando parecia ter encontrado um caminho, percebia um erro e retornava ao início. Como era possível existir uma Ilha Fantasma?

Sendo um renomado Oceanógrafo, não podia admitir. Por meses  utilizara informações privilegiadas da Agência Espacial Internacional. Seu chefe o pressionava por respostas, já desperdiçara muito tempo, verba e longas noites de insônia.

Resolveu então checar as mensagens no correio eletrônico, o que seria uma boa forma de relaxar e, para a sua surpresa, havia um e-mail que logo lhe chamou a atenção: “Lenda da Ilha Fantasma”.

Mesmo pensando que estaria desperdiçando seu tempo, abriu a mensagem.  Logo na primeira parte, sua curiosidade foi se aguçando, e, intuitivamente, acreditava ter encontrado uma nova fonte de pesquisa.

Um morador de Vannuatu, chamado Branch, lhe contou que conhecia uma lenda   da ilha fantasma.

Um corsário muito cruel, de nome Creek, havia enterrado um baú cheio de Coroas de ouro, que ele havia saqueado de uma embarcação  holandesa, durante as expedições marítimas .Ele tivera ajuda de uma moradora local, conhecida como feiticeira, e após o enterrarem, lançara uma maldição sobre a ilha.

A ilha ficaria submersa em boa parte do tempo e, só os aborígenes que bem conheciam a região seriam capazes  de encontra-la. Um mapa em pergaminho, muito antigo, desaparecido há muitos anos, continha as as coordenadas de onde este baú teria sido enterrado.

Branch se colocava à disposição e esperava encontrá-lo em breve.

Ao acordar no dia seguinte, tratou logo de esquematizar um pedido de verba, mas sabia que correria o risco de ser negada. A agência estava enxugando os gastos, o ano estava com o orçamento comprometido.

Leu diversas vezes seu projeto e se encaminhou para a sala de seu chefe.
Ao término da leitura, fez  perguntas sobre o tempo que essa aventura poderia levar e, as razões para tantos investimentos.

Nogueira explicou tudo detalhadamente e ficou na torcida aguardando respostas. Pela sua experiência, sabia que demoraria até uma semana para ser analisada pelo comitê.

Enquanto aguardava, foi estabelecendo um contato mais estreito com Branch que lhe enviava mensagens com perguntas pesquisando todo e qualquer fato que se relacionasse a Grande Barreira de Corais.  Descobriu fatos interessantes sobre o Mar de Coral, e as batalhas travadas  durante a segunda guerra mundial. Sempre se interessou pelo assunto, pois lembrava de sua visita ao porta aviões Midway na baia de San Diego acompanhado de seu pai. Essa era uma das razões de ter escolhido  sua profissão: o fascínio que o mar lhe causava.

Branch, muito solícito, lhe enviara fotos e recortes de jornais locais para contribuir com a pesquisa.

Tinha interesse ainda  maior sobre a curandeira e a sua possível feitiçaria. Um pesquisador nunca poderia acreditar em tais sandices. Mas, para o povo local esse comportamento era muito normal.

Nessas ilhas tão isoladas do mundo globalizado, a  cultura e o folclore eram seguidos por gerações.

Após sete dias, de muita angústia, chegou a confirmação, e já poderia voar para a aventura.

Foram dois dias e muitas escalas até conseguir pousar em Brisbane na Austrália. Dalí partiria para Nova Caledônia.

Branch o aguardaria em Vannuatu. Ao chegar à ilha se dirigiu ao escritório, que tinha uma atmosfera rústica e acolhedora, bem típico dessa região. A porta em madeira de construção, envelhecida, nas paredes várias fotos de barcos de pesca e mergulho. O seu negócio era o mais importante da ilha.

Tudo estava claro,  Branch  também tinha interesses nessas lendas, o mistério o ajudaria a vender seus passeios.

Conversaram durante algumas horas sobre o tema, Nogueira levou uma pasta contendo informações sobre as ilhas.

Cansado da maratona da viagem, foi dormir cedo. Acordou revigorado e, como haviam combinado, foi ao escritório de Branch.

Partiram para as ilhas, todas de uma beleza inigualável, pediu que parassem na ilha mais próxima da considerada  fantasma.

Primeira parada: Willis Islets, em busca de pistas ou relatos sobre as lendas ou de informações à respeito.  Das ilhas do arquipélago, somente nesta havia uma base meteorológicas, as outras desabitadas. Ouviu tantas estórias diferentes, que sua mente embaralhava. Seguiram pelas outras pequenas ilhas próximas: Magdelaine Cays, Coringa Islets, Tregrosse Islets e nenhuma nova informação se acrescentou. 

Cansado, retornou a Vannuatu no dia seguinte, pois  voltariam a visitar a Grande Barreira de Corais. Os aborígenes residentes destas ilhas são muito envolvidos com suas crenças e a comunicação com eles é dificultada devido a tantos dialetos. Conheceu Venalu, um homem de aproximadamente 80 anos, quase todos dedicados à pesca.

Ele fazia parte de uma cooperativa e todos viviam no mar e de atividades ligadas a ele.

Era um líder local  e seus conhecimentos tinham muito valor. Para eles, aborígenes, não há diferença entre o mundo espiritual e físico.  Existem almas ou espíritos, não só em seres humanos, mas também em animais, plantas, rochas, características geográficas, entidades do meio natural, como o trovão, o vento ou as sombras.

Parecia que uma cortina se abria diante seus olhos, pois a partir disto poderia encontrar alguma resposta.

Esse povo indígena, cheio de superstições, carregava as crenças, durante toda a sua vida.

Nogueira perguntou a Branch como poderia se encontrar com esse pajé?
Os homens das aldeias caçavam animais e pescavam. A  arte era a forma  de comunicação, e seus instrumentos de trabalho, cheio de pinturas e inscrições, contavam as histórias do povo e a relação com as divindades.
A mãe serpente era representada pelo yidaki, um instrumento cujo som era puro encantamento.

Venalu recebeu Nogueira e não se surpreendeu com as perguntas feitas, todas pertinentes ao sumiço, ou da existência da Ilha Fantasma.

Ele disse que uma curandeira, de outro clã,  fora rendida por piratas e fizera um acordo, para ser  libertada, deveria ajudar Creek a esconder seu mapa com as indicações de um baú enterrado repleto de coroas de ouro.

Ela o fizera a contragosto e, se utilizara de um ritual muito poderoso dos seus antepassados. A ilha  ficaria submersa  nove luas e depois permaneceria com sua maré baixa durante uma semana. Ao entrar a décima segunda lua, voltaria a ficar submersa novamente. Esse ritual deveria ser cíclico, até  o dia que, um novo pajé, o quebrasse. Tinha que ser do mesmo clã, e possuir mesmos dons de vidência.

Desde esse fato, todos os seus descendentes nasceram mulheres e, não apresentavam  capacidades de vidência.

A ilha fora visualizada e catalogada na décima primeira lua, por uma foto de satélite e, essa seria a razão de ser catalogada, depois ter desaparecido.

Nogueira se sentia ao mesmo tempo confuso e decepcionado. O que faria a partir de então?!

Suas pesquisas e seu tempo foram desperdiçados. Um cientista não poderia crer em rituais ou bruxaria.  Iria esclarecer seus superiores, abandonar a pesquisa e enterrar de uma vez, todos os meses que buscara em vão pela Ilha. Branch se encontrava da mesma forma, antes via esse mistério como uma boa fonte de renda.

Enviou seu relatório, fez as malas, mas agora levava consigo um novo mundo, rico em cultura e crenças, o qual nunca imaginou acreditar.


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