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sexta-feira, 12 de maio de 2017

Marilda - Christianne Vieira


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Marilda
Christianne Vieira

O Sol  estava alto, Marilda vinha caminhando a passos largos pela calcada,  preocupações assolavam sua mente. Com certeza seria um dia complicado, teria que escolher sobre qual caminho deveria seguir dali para frente. Mudar de cidade, e trabalho era uma atitude bem radical e definitiva. Não se sentia confortável, seus instintos a alertavam que não seria feliz. Mas, se comprometera com Henrique, seu noivo, ele seria transferido.

Pensava enquanto caminhava. Como poderia dizer não a ele?! Eles namoravam há cinco anos, fizeram muitos planos. Num passe de mágica haviam desparecido. Perguntava-se se realmente o amava? Talvez estivesse acostumada, desde que esse assunto rondava seus dias, ela vivia tensa, e as noites mal dormidas, pioravam ainda mais seu humor.

Marilda se sentia desanimada, ainda mais por ter guardado um segredo sobre sua origem.  Sabia que não conseguiria enganá-los para sempre. Quanto mais se aproximava, seu possível casamento, inevitavelmente teria que contar a verdade.

Sabia que tinha sido fútil, e desonesta, ao esconder sua historia, mas depois de tantos anos, como poderia contar?

Sempre que falava de seus pais, dizia que estavam viajando para o exterior, montara um  álbum de fotos, de uma vida que não era a sua.

Ele acreditou nas mentiras dela, por terem amigos  parecidos, que mal tinham contato com seus  filhos. Naquele  mundo artificial, tudo era possível. As mentiras se avolumaram de uma forma, que não  tinha como voltar atrás.

No ultimo mês, conhecera Raul, seu colega de trabalho,  a amizade entre eles se estreitara devido ao projeto que comandavam juntos. Ela o achava envolvente, bonito, pensava que ao seu lado sua vida poderia ser mais dinâmica  e divertida. Há algum tempo estava entediada. Os dias sempre iguais e monótonos, Henrique sempre se dizia cansado, sem disposição, não saiam juntos, ou faziam algo interessante, como ir ao teatro ou assistir a um bom filme.

Durante os almoços  com o  Raul, seus olhos brilhavam ao escutar o que fizera no fim de semana, sua vida era muitos mais emocionante. Mas ela não, ela teria que se mudar para Rondônia, lhe parecia o fim do mundo, seria ainda mais infeliz.  A aproximação com o Raul lhe deixara com muitas duvidas sobre a sua vida.

Conhecer  Raul, parecia uma oportunidade de recomeçar uma nova vida longe de tudo isso, sem mentiras. Ele era uma pessoa simples, com uma vida parecida com a dela. Teria a chance de ser ela mesma.

Aproveitando da situação que se encontrava, deveria romper com Henrique, culpando a transferência de cidade, ou talvez, mesmo sendo cruel, dizer que havia conhecido outro homem. O que em parte era a verdade.

De qualquer forma, ela o magoaria, e tinha que se preparar para isso. Combinaram de se encontrar a tarde. Ele muito empolgado pela oportunidade no  trabalho, discorria seus planos, sobre a mudança , e o casamento, Marilda, estava atônita, não sabia o que responder. Tentava em vão mudar de assunto, Ela ao contrario, sentia dor no estomago, enxaqueca, um mal estar generalizado.

Disse que precisava descansar, Henrique estranhou os constantes desencontros, e sentia que alguma coisa ela devia estar escondendo. Perguntou se ela precisava de ajuda, e como ela disse que não, foi para casa aborrecido.

Durante mais uma noite de insônia, Marilda resolveu que logo pela manha, resolveria a situação.

Ligou logo cedo para Henrique e disse que gostaria de falar com ele na hora do almoço, pediu para ele ver a sua agenda e retornar assim que pudesse.

Ele foi buscá-la, e durante o trajeto até o restaurante, ela foi dizendo que não andava bem, e que estava pensando em adiar o casamento. Henrique parou o carro na primeira vaga que encontrou, estava indignado, de forma muito grosseira, perguntou se era brincadeira?

Marilda, encolhida atrás de sua vergonha, disse que não, não era uma brincadeira, havia tomado uma decisão, que há muito tempo deveria ter sido tomada.

Abriu a porta, energicamente, e  a bateu  com forca, saiu andando rapidamente pela calçada, sem olhar para trás. Nos dias seguintes, não atendeu as ligações dele, bloqueou seu contato.

Henrique, estranhando tais atitudes, foi esperá-la na saída do trabalho, quando então a viu conversando sorridente com Raul.

Sem que ela o visse, saiu apressado, entrou no  carro e partiu em disparada. Quando ao virar a rua deu com um caminhão carregado, e em instantes, seu mundo se apagou.

Foi  um grande acidente. Levado pelo pelos socorristas ao hospital mais próximo,  lá permaneceu inconsciente, na UTI. Sua família foi avisada. Abalados, permaneceram no saguão aguardando o boletim médico, ou informações a seu respeito.

Ao amanhecer ligaram para Marilda contando sobre o acidente, ela imediatamente se encaminhou para o hospital, tomada de culpa, não conseguia  dizer nada. Henrique continuou em estado, vegetativo durante muitos meses, os médicos não sabiam como, ou quando ele se recuperaria.


A partir deste dia, ela se apagara para o mundo, apenas cumpria suas atividades básicas, e rezava muito, para que nunca ninguém soubesse o que de fato ocorrera. Sentia-se uma pessoa péssima, em seu intimo, imaginava o que acontecera, pela proximidade de seu trabalho e o horário do acidente. Fora longe demais, suas mentiras, e sua ganancia  haviam acabado com a vida de seu noivo, que durante aqueles cinco anos, estivera ao seu lado.

Uma pessoa do mal - Henrique Schnaider


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Uma pessoa do mal
Henrique Schnaider

Hildebrando nasceu como algumas crianças nordestinas em uma família abastada, filho de um Coronel, destes que, mandar matar era quase como um habito diário. O menino cresceu observando todas as maldades que o pai cometia, inclusive a forma como tratava seus empregados, verdadeiros escravos.

Certo dia Brando estava cavalgando, e mesmo sentindo a respiração apressada do animal, não estava satisfeito, e já demonstrando o que aprendera com o velho Coronel,  rolava as esporas de sua bota na barriga da égua que toda ligeirinha relinchava e não gostava daquela situação desagradável.

De repente Brando ouve barulho na mata e gritos desesperados. Freou o cavalo e cheio de curiosidade aproximou-se vagarosamente, procurando não fazer barulho para não chamar atenção. Sentiu um frio na barriga, pressentindo o que iria presenciar. O suor escorria pelo seu rosto e costas, tal a ansiedade de decifrar os gritos horrorizados que ouvia. De repente deu de cara com o capataz Tibúrcio que usava um motosserra para esquartejar vivo Antônio de Jesus vizinho da fazenda, que teria se recusado a vender o pequeno sitio onde tinha uma plantação de mandioca, para seu pai que pretendia aumentar a propriedade.  

Estranhamente, o rapaz não sentiu pena do pobre Antônio que estrebuchava dando os últimos suspiros antes da morte, pelo contrario, sentiu certo prazer sádico ao presenciar aquela cena pavorosa. O sangue, os gritos, a morte com a motosserra, tudo lhe dava prazer. Uma indecifrável alegria o dominou. Teve uma vontade incontrolável de algum dia cometer essa mesma barbaridade com suas próprias mãos. Brando olhava para Tibúrcio que sorria não demonstrando o menor arrependimento da barbárie que acabara de cometer,  aliás, possuía o olhar frio de um assassino sanguinário.

Hildebrando Paschoal tornou-se um adulto inescrupuloso como era de esperar. E, por desejo de seu pai, entrou na politica e não demorou muito tempo para que realizasse seu desejo íntimo e há tanto tempo acalentado.

A política de Cabrobó dos Montes era dominada por duas famílias, Oliveira e os Paschoal sendo que ao longo de tantos anos os assassinatos ocorriam entre as duas famílias.

Brando candidatou-se a Prefeito nas eleições daquele ano,  tendo como concorrente João Oliveira, o que demonstrava que agora as duas famílias mais ricas do lugar não disputariam apenas propriedades e dinheiro, mas também poder político.  

A disputa estava extremante acirrada,  cada vez mais inimizando Paschoal e Oliveira. Na cabeça de Brando começou a se repetira ideia alimentada desde garoto, pois matar alguém com a motosserra era ainda seu maior desejo. Começou a traçar um plano que julgava infalível,  tratava-se de uma tocaia para esquartejar seu concorrente João Oliveira. Naquela semana nenhum outro assunto o tocava, nada lhe atraía mais que planejar sua realização. Até que chegou o dia em que tudo poderia dar certo. Pegou o velho motosserra.  de seu pai, lubrificou-a enquanto matutava e sorria. Depois seguiu para o ponto de encontro,  e pôs-se aguardando escondido na estrada vazia, onde sabia que seu inimigo passaria.



João surgiu na curva empoeirada, estava sozinho, como sempre fazia. Tinha na cabeça as eleições que estavam por alguns dias. Tinha como certa sua vitória, pensava enquanto abria um sorriso plano. Vinha montado num trote lento completamente distraído sem ver nada a sua volta. Nem percebeu o inimigo por perto. Brando  aproveitando-se da absorção de Oliveira, rendeu-o  obrigando-o a ir para a mata fechada, lugar que bem conhecia desde quando assistiu o serviço de Tibúrcio, e lá sob o silêncio das copas, praticou o bárbaro crime matando seu concorrente com a motosserra, tendo assim realizado o maléfico sonho de muitos anos.

Sem ninguém para opor a ele, Hildebrando Paschoal ganhou a eleição daquele ano,  e exerceu sua gestão a ferro e fogo eliminando todos os inimigos que se interpunham no caminho.

Sua carreira foi meteórica e logo foi eleito Deputado Federal, cargo em que se deu muito bem, já que o ambiente no Congresso Nacional é propício para todo tipo de politico.

Chegou facilmente a Presidência da Câmara e cometeu todos os tipos de barbaridades que se possa imaginar para chegar onde queria:  intimidou parlamentares e empresários, corrompeu, chantageou, e assassinou.

Mas Brando não contava com inimigos no Congresso, tão ou mais criminosos que ele. E, finalmente, fez-se a Justiça ainda que por vias tortas, Hildebrando Paschoal foi desmascarado, cassado, preso julgado e condenado.


Atualmente depois de longos quinze anos de prisão, conseguiu direito a prisão domiciliar e passa seus últimos dias de vida em casa sofrendo de um câncer incurável.       

Sonho não realizado - Henrique Schnaider


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Sonho não realizado
Henrique Schnaider



Sempre sonhei que algum dia na minha vida conseguiria ser um ator famoso, e para isto segui o caminho que todos sonhadores como eu  fazem, ou seja, matricular-se na Escola Estadual de Teatro.

No meu caso, porém, havia um problema que todos os jovens de família pobre passam, ou seja, nem eu nem meu pai, tínhamos dinheiro para bancar o curso de teatro.

Comecei a procurar um trabalho que me proporcionasse renda, com a qual pudesse seguir em frente com o meu sonho de ser ator.

Passei por vários empregos, mas não conseguia adquirir estabilidade devido a minha falta de experiência e dessa maneira o tempo passando e eu adiando o inicio dos meus estudos de dramatização.

Quando finalmente consegui um bom emprego, logo percebi que era muito eficiente naquilo que fazia. Vi aos poucos as tarefas sendo realizadas com certa facilidade e dinamismo, o que chamou atenção do gerente do departamento. Não demorou muito para que nova oportunidade batesse à minha porta. Chegou-me a proposta de que a empresa patrocinaria meus estudos desde que eu firmasse acordo de estabilidade, o que para mim seria muito bom.  Assim que aceitei a proposta, logo me veio uma promoção em que passava de simples funcionário a encarregado de departamento.

E iniciei meu tão sonhado curso de ator, que me levava a um mundo totalmente diferente do que eu vivia.

Durante três anos, batalhei duramente, não fraquejando em nenhum momento tanto no meu trabalho como na  Escola de teatro.

Aprendi muita coisa durante este período em que frequentei as aulas e muitos métodos de teatralização do famoso Stanislavski, sendo o mais utilizado e passando por Samuel Bekett, não deixando ver Grotovski e muita aula de psicodrama.

Com os personagens que aprendi a representar, me permiti um grande enriquecimento cultural. Conheci pessoas incríveis, todas com o mesmo objetivo de atingir a gloria.

Neste ínterim recebi mais uma promoção na Empresa me deixando num cargo de muita responsabilidade.

Findo o curso passei por várias experiências interessantes, apresentações em cidades do interior, teatros de circos mambembes.

Minha vida seguia certa rotina, até que um dia uma pessoa que assistia minha apresentação me convidou para um teste em um estúdio para participar de uma novela como personagem secundário, fato este que para mim já seria algo fantástico.

Finalmente começaram as gravações e fui tão bem e para minha enorme surpresa, o diretor da novela, gostou tanto de minha participação e acabou me convidando para ser o ator protagonista.

Foi grande o meu sucesso e tinha tudo para seguir uma carreira de glorias.

Até que um novo caminho me foi apresentado nesta fase da vida.

Há anos trabalhando na mesma empresa fui galgando cargos de confiança até atingir o nível de Diretor. E numa manhã o Presidente do Grupo Empresarial me chamou para uma conversa particular que marcou minha vida para sempre. Ele simplesmente propôs a Vice Presidência de um dos maiores Grupos Empresariais do Brasil.  E ainda completou dizendo que, como não possuía herdeiros, eu seria o próximo Presidente no momento em que se afastasse das atividades. Era realmente uma proposta para a qual não se diz não. E ainda mais, fiquei soberbamente orgulhoso em saber que era tido em boa conta pelo dono da empresa. Aceitei sem relutar.


Hoje posso dizer que continuo a ser um ator frustrado, mas o Presidente de um grupo gigante industrial e totalmente realizado na profissão,  e confesso que não me arrependi da decisão que tomei.   

Quem era ela? - Hirtis Lazarin

  Quem era ela? Hirtis Lazarin     A rua já estava quase deserta. Já se ouvia o cri-cri-lar dos grilos. A lua iluminava só um tantin...