A GRANDE JORNADA - CONTO COLETIVO 2023

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quarta-feira, 16 de março de 2022

Consequências - Hirtis Lazarin

 


Consequências

Hirtis Lazarin

 

Já é primavera.  Despontam os primeiros raios do amanhecer.  Chegam leves e brincalhões, esgueirando-se entre galhos e folhas das árvores mais altas.  Acordam pássaros ainda nos ninhos. Aos poucos se fortalecem e colorem a natureza.  Inspiração aos poetas e a “Monet”.

Essa felicidade bate à porta da família Rodrigues, mas não consegue entrar.

Na cozinha, o casal toma o café da manhã.  Cada um senta-se na ponta da mesa comprida.  Ela, abatida, olheiras profundas mostram que chorou muito e, provavelmente, passou a noite em claro.  Ele, vez ou outra, lança-lhe um olhar amargo e enfurecido. Irrequieto, derruba café na camisa branca. Raivoso, empurra a cadeira e sai esbravejando.

Cristina e Fernando estão casados há quase trinta anos.  Têm dois filhos: Rui, formado em medicina e Vitor, estudante de veterinária.

Um casal modelo e bem-sucedido.  Ele, diretor numa multinacional e ela psicóloga e orientadora vocacional, numa escola alemã.  Gente simples e hospitaleira que coleciona amigos.  Sempre há um motivo para reuni-los e festejar.

Fernando chegou do trabalho bem mais tarde, mesmo sabendo que a esposa prepara e espera-o para o jantar todos os dias.  Ele atravessa a cozinha.   A casa está silenciosa e muito escura.  Tateando as paredes, encontra o interruptor da sala.

Cristina está caída aos pés da escada de mármore que dá acesso ao piso superior.  Os cabelos loiros estão avermelhados e um fio grosso de sangue escorre da cabeça ao pescoço.

Em pânico, ele toma-lhe o pulso.  Não há sinal vital.  O corpo gélido.  Cristina está morta.  Fernando corre de um lado pro outro sem saber o que fazer.  O celular, procura e não acha.  Grita por socorro e os vizinhos, solidários, entram na casa.   A polícia chega rápido.

As hipóteses são muitas... Ela sofreu mal súbito e rolou escada abaixo ou desequilibrou-se no salto alto do sapato... À primeira vista, a casa está em ordem, as portas todas trancadas e nenhuma vidraça quebrada.

O corpo é encaminhado ao IML e a casa interditada para que a perícia fizesse as investigações, sem correr o risco de alteração da cena do crime.

Concluiu-se que Cristina foi morta na cozinha.  Sobre a mesa, havia um livro de receitas aberto às páginas 45 e 46, respingadas de sangue.  Ao lado, ingredientes para um bolo de chocolate, o preferido do esposo.

Provavelmente, um bastão grosso de madeira golpeou sua cabeça por trás.  Ela estava com o tronco inclinado pra frente, compenetrada na leitura da receita. Foi surpreendida e não teve tempo pra reagir.  O corpo foi arrastado e o “luminol” mostrou um rastro de sangue da cozinha até os pés da escada. Esse bastão ainda não foi encontrado.

O crime aconteceu justamente no dia em que os funcionários não estavam presentes.  Era hábito do casal conceder-lhes folga extra, uma vez por mês

O delegado convocou familiares, amigos, vizinhos e todos que frequentavam a casa.  O casal era um exemplo de família.  Nenhuma suspeita.  Quinze dias depois, quando tudo já havia sido virado e revirado, todos voltaram a nova rotina, se é que há rotina onde aconteceu um assassinato.

Fernando autorizou, logo nos primeiros dias, que a governanta Amélia encaixotasse os pertences da esposa.  Eram muitas roupas, sapatos, bolsas de grife e perfumes importados.  Faria um bazar e o dinheiro arrecadado seria distribuído às instituições.  Insuportável sentir o cheiro de Cristina.  O casamento perfeito de duas pessoas que driblam os problemas em busca da solução.

Trabalho difícil para Amélia.   As duas não tinham segredos.  Tantos anos trabalhando na mesma casa, convivendo com as crianças, participando dos bons e maus momentos... Tornaram-se grandes amigas e confidentes em todos os detalhes da vida.  Um mistério.  Não conhecia ninguém que tivesse qualquer rancor por Cristina. Ela contava-lhe tudo.

Numa bolsa pequena, a governanta encontrou a agenda da patroa. Folheando-a aleatoriamente, e sem interesse em ler as anotações, chegou à página onde estava registrado o dia anterior à morte de Cristina.   Chamou-lhe a atenção a letra grande, tremida e grafada com tinta vermelha.  E muitos coraçõezinhos desenhados... Sentiu arrepios e um pressentimento ruim causou-lhe náuseas.   Só se deu conta do tempo que tinha passado, quando Fernando chegou da rua e chamou-a lá do andar de baixo.   Já era noite.

Guardou a agenda e, no dia seguinte, entregou-a ao delegado.  Meses depois, dois homens foram novamente convocados e um deles, como suspeito, ficou preso preventivamente.

Na última página da agenda, Cistina escreveu:

“Uma hora da manhã.   Contei a Fernando o que me torturava há vinte anos. Contei que Vitor não era seu filho.  Era filho de um de nossos melhores amigos.  Aconteceu depois de muita bebida.  Estávamos a sós, num boteco.  De madrugada.  Nem me lembro direito como aconteceu.  Acordei nua no motel ao lado dele.

Fernando ouviu tudo sem dizer uma única palavra, sem pedir mais explicações. O silêncio dele me torturava. Eu queria que reagisse, que gritasse.  A formatura de Vitor é no mês que vem e eu precisava contar. Meu casamento tá destruído. A traição, foi uma única vez.  Eu jurei que foi uma única vez.  Pedi perdão mil vezes. Tentei não chorar.   Cai de joelhos.  Sempre fui fiel.

Fernando permaneceu mudo e os olhos vermelhos descarregaram-me todo ódio que existe no mundo.  Fechou os punhos para não me bater, e deu um soco no espelho da penteadeira.  Cacos voaram pelo quarto todo. E sua mão sangrou. Chutando o que encontrou à frente, trancou-se no quarto de visitas.  Eu ouvi urros, muitos urros.”

OBSERVAÇÃO:  “Passei a noite em claro e, como faço todas as manhãs, vou preparar o café pra nós dois.  Só me resta aguardar as consequências. ”

 

ZÉ DO PICADINHO - Henrique Schnaider

 


ZÉ DO PICADINHO

Henrique Schnaider

 

Vou contar uma história que vem da minha juventude que é mesmo de causar espanto. Ela é verdadeira e estes crimes tomaram conta dos jornais da época.

José Alves dos Santos nasceu num lar pobre no interior de São Paulo na cidade de Pirassununga. Ele foi o terceiro de quatro filhos do casal. Sua mãe se desdobrava ao ter que cuidar dos meninos, carinhosa, sempre dando atenção e fazendo o possível para que a vida deles fosse a melhor que ela podia oferecer.

O pai era um péssimo marido, vagabundo, alcoólatra e violento, fazia da vida da mãe e de José e seus irmãos, um verdadeiro inferno aqui na terra. Além de não trabalhar, surrava os meninos sem nenhuma razão. Enquanto a mãe saía para trabalhar fazendo faxina e ganhando os seus míseros trocados e outras doações de roupas e alimentos que as patroas lhe davam.

Quando chegava do serviço, era dolorido de se ver, com as crianças todas marcadas de vergões, pelas pancadas recebidas do pai. Arlindo completamente embriagado, recebia a esposa com pancadaria, exigindo que ela fosse para o fogão preparar a refeição para todos.

Dessa forma a vida triste foi passando e nenhuma esperança de melhoras. José e os irmãos transbordavam de tanta revolta. A desgraça rondava a casa onde José e os irmãos moravam.

Um dia a esposa chegou em casa e foi recebida a murros e pontapés e caiu desfalecida sem chances de sobreviver. Os filhos já adolescentes, não suportaram mais tamanha violência. Juntos foram para cima do pai agredindo-o com pedaços de pau, levando-o à morte.

Neste dia os rapazes se tornaram órfãos e resolveram cada um ir pro seu lado. José foi à estação e pegou um trem com os trocados que tinha e veio para a Capital São Paulo. Foi parar numa pensão na rua Aurora. Saiu a procura de emprego e acabou trabalhando como carregador no Mercado Central.

A vida seguiu seu rumo, já com Jose adulto, mas ele era de fazer pouca amizade e carregava com ele a dor de uma revolta imensa de ter presenciado e participado no fim das contas, de tanta violência ao se desfazer a sua família,

Jose que morava na zona de prostituição, começou a se relacionar com as prostitutas da região. No começo tudo seguia o curso normal de quem pagava para ter um carinho e uma relação sexual. Mas ele não ficou satisfeito e as coisas pareciam piorar. Até que um dia José depois de se deitar com uma prostituta, sentiu uma violência e um ímpeto muito grande e sem controle matou a indigitada.

Com aquele corpo estendido na cama, José pensou como se livrar do cadáver. Pegou uma faca bem afiada e destrinchou o corpo em vários pedaços e colocou numa mala. Saiu dali carregando aqueles pedaços de gente e foi de táxi até o rio Tietê e sem testemunhas jogou a mala no rio.

O instinto assassino de José não parou na primeira vítima. Continuou a matar, picar e jogar no rio.

A polícia investigando aqueles crimes sem solução e com os jornais da época explodindo em manchetes enormes. Falando do Zé do picadinho, apelido que deram sem saber a quem se referiam. A opinião pública exigindo e pressionando as autoridades para uma solução daqueles crimes bárbaros.

Um dia seguindo sua rotina de crimes. José foi carregando sua mala em direção ao rio e para sorte da polícia e das prostitutas, passava por ali um carro policial na rotina de ronda. Viram aquele suspeito com a mala e pararam a viatura e se aproximaram dele. Mandaram abrir para ver o que levava e, já desconfiados, encontraram o corpo de uma mulher, em pedaços.  

José foi preso e condenado a muitos anos de prisão. Passado algum tempo, ele foi solto por bom comportamento. Mas o seu instinto assassino estava apenas adormecido. Despertou novamente e as mortes voltaram a acontecer.

Para a polícia não foi difícil localizar Zé do Picadinho e ele voltou para a prisão, ali permanecendo até o final dos seus dias.

Contei esta história porque depois de alguns anos aconteceu de um dia eu estar na casa do meu amigo de infância Carlos Azolini que trabalhou como Perito Criminal em São Paulo. Inclusive trabalhou no caso do Zé do Picadinho. Ele buscou uma pasta, tirou e me mostrou fotos dos crimes praticados. Me deixando espantado com o que eu vi.

Na época que os crimes aconteceram. Era espantoso saber dos fatos acontecidos com os crimes e da forma como foram praticados. Mas depois de ter visto as fotos deles. A minha sensação foi de horror, pois eu não podia acreditar que o ser humano fosse capaz de tamanha violência.

Mas infelizmente este é o mundo em que vivemos e a cada dia nos surpreende de forma negativa.

 

INACEITÁVEL - Helio Fernando Salema

 



INACEITÁVEL

Helio Fernando Salema


Estava como carona num carro em uma das principais avenidas de uma grande cidade. Assim que o final fechou, percebi, que ao longe, vinha um menino colocando um saco plástico com algumas balas, no retrovisor de cada veículo.

Muito antes de chegar ao carro em que eu estava, voltou correndo. Consegui vê-lo pegando cada saco numa rapidez incrível.

O sinal abriu, andamos lentamente, até pararmos antes de atravessarmos. Lá estava ele na calçada aguardando o fechamento do sinal.

Ao ver que estava fechado no nosso sentido, veio correndo e novamente pôs sua mercadoria nos retrovisores. Pela altura calculei que deveria ter no máximo dez anos. Usava um tênis simples, bermuda e camiseta. Cabelos penteados e o rosto que parecia limpo.

Quando passou por mim, acompanhei seus passos pelo retrovisor. Durante todo o trajeto não logrou nenhuma venda.    

O trânsito evoluiu e poucos minutos depois estávamos em uma outra avenida.

Ao pararmos, inicialmente não vi ninguém que estivesse aproveitando o local para fazer qualquer tipo de comércio.

Logo depois aparece um outro menino, que aparentava ter pelo menos doze anos, com um pedaço de papelão, mostrando para os motoristas. Com roupas um pouco sujas e com semblante desanimador. Vi que ele não conseguiu coisa alguma.

Passando por outros cruzamentos, sem parar, vi que nas calçadas, perto dos sinais havia crianças.

Ao chegar em casa, satisfeito por ter concluído tudo o que havia planejado, comecei a pensar naquilo que em poucos minutos me causara indignação.

 

Há pelo menos duas décadas, quando eu residia numa pequena cidade, em outro estado. Fui a uma cidade próxima para reunir-me com amigos. Pela primeira vez eu participaria. A finalidade era arrecadar brinquedos ou recursos para o Natal de crianças pobres.

Ao me aproximar deles, uma criança bem pequena, chegou perto de mim, e estendendo a mão,  pediu-me um dinheiro para comprar leite. Instintivamente peguei uma nota, dei àquela menina, que agradeceu e saiu correndo, numa direção que não percebi.

Ao chegar junto aos meus amigos nós nos cumprimentamos. Logo ao término das cortesias, um deles chamou minha atenção:

— Você não deveria ter dado dinheiro para aquela menina.

Um pouco espantado:

— Ora…Por que não?

— A mãe dela é que manda ela ficar pedindo. Não é por necessidade. É para a mãe comprar bebidas.

Como eu não conhecia esse fato, nem pensei em debater. Um outro amigo logo comentou algo sobre a reunião e assim o assunto ficou no passado.

Em casa à noite, lembrei-me do ocorrido e durante horas fiquei a meditar, se eu estava errado…“sim”. Não é um procedimento correto dar dinheiro a uma criança sem ter certeza do que ela fará.

Mas como vou saber o que aquela menina faria?…Se necessitava ou não?

Qual a certeza de que ela estava acompanhada?

Geralmente nessas ocasiões há alguém, responsável ou irresponsável por trás?

Eu teria autoridade para punir aquele adulto?

O fato de ter um adulto apoiando ou mandando piora ainda mais a situação. Mas por quê a criança não estava na escola? Se foi em horário de aula e em dia de semana?  

Não a conheço. Não é minha parente.

Mas é um ser humano. E se ela estivesse realmente necessitando? Cabe a mim indagar ou cobrar explicações?

Em alguns momentos sinto que faço parte de uma sociedade incapaz de reagir, ou de saber exigir.

Completamente impotente diante de situações que envolvem crianças e o futuro do país que desejo para os meus filhos e netos.

Não é necessário tomar prédios para transformá-los em escola, pois temos espaços de sobra.

Recursos não são tão difíceis de se conseguir. Será que as crianças no trânsito conseguem recursos suficientes para se manter?

Quem tem autoridade para agir nesses casos? Há leis que protegem essas crianças ou punem quem as exploram?

Nesses casos pode um cidadão comum ocupar o lugar das autoridades?  As autoridades não sabem que isso ocorre? Ou sabem, mas se omitem?

Faltam recursos? Falta vontade? Falta tudo que pode contribuir na solução, e sobram argumentos para as desculpas?

Dormi muito tarde. Acordei cedo, com o corpo dolorido e mau humorado. Foi um dia muito doloroso.

 

Ainda hoje, depois muitos anos, ainda me incomoda bastante, essas lembranças.

Tomei uma decisão. Quando um politico me abordar, vou perguntar o que ele já fez ou está fazendo pela escola pública.

Não aceito promessas. No passado, as promessas nos deram crianças analfabetas, no presente, jovens sem perspectivas, e no futuro, certamente será um desastre.

Aconteceu num domingo - Ana Catarina S. Maués

 



Aconteceu num domingo  

Ana Catarina S. Maués


     E tudo começou a ficar muito iluminado, de uma claridade intensa, mais forte que o dia lá fora. E vultos tomaram conta de todo o lugar, que parecendo anjos, caminhavam ora por entre o povo reunido, ora subiam e desciam em rasantes por sobre a cabeça dos que ali estavam. Um espetáculo que deixava a todos em êxtase. A visão era como se estivessem diante de holograma, pois os seres não podiam ser tocados, a imagem em terceira dimensão, desfazia-se com a tentativa de segurá-la.

      Tarde ensolarada. A devota Mara Lúcia, em passos largos, caminhava rumo a capela, próxima de sua residência, para a oração do terço, mas o salto agulha a atrasava, pois fazia, vez por outra, ela torcer o pé tornando o percurso mais longo.

     Enfim chegou, ainda a tempo de fazer, junto com o sacerdote, o sinal da cruz de início do terço.

     A reza lenta e compassada somada ao calor, faziam-na dar cabeçadas em um cochilo nada apropriado. Sentia-se estranha, nunca havia feito aquela oração de modo tão displicente.

     Terminado o terço, hora da santa missa. O padre deu início à celebração e Mara Lúcia continuava bem zonza. Abria os olhos com dificuldade, mas eles não obedeciam, tinham vontade própria, eles zombavam de sua intenção. Quando parecia bem acordada ela entrava em discussão consigo mesmo, mas o que será isso eu dormi bem à noite, não acordei tão cedo, não estava com sono quando saí de casa muito pelo contrário estava bem esperta para não chegar atrasada ao terço uma hora boa para um café será que alguém notou minhas cabeçadas na capela tem bastante gente caramba que vergonha logo eu conhecida como a mais devota da comunidade. Ainda em pensamentos, mas percebeu o olhar atento da amiga Carol, deu um sorrisinho, um aceno e voltou-se para a santa missa, todavia mais um longo cochilo.

     — Vão em paz, e o Senhor vos abençoe.

     Mara Lúcia assustou-se! E com seus botões dizia, meu Deus terminou a missa e se acompanhei metade dela foi muito, mas agora vem a adoração do Santíssimo, não posso ficar desse jeito. Levantou-se arrumando a saia, e dirigiu-se ao sanitário na lateral do prédio.

     Lá chegando jogou água fria no rosto, esfregou bem os olhos, abriu a bolsa procurando um batom, e retornou certa de que o sono a deixara.

     O Santíssimo já estava exposto. Mara Lúcia ajoelhou-se no banco em frente a hóstia consagrada e foi nesta hora que ela viu um feixe de luz saindo do ostensório. A luz crescia e avançava vindo em direção a ela, tomando conta de todo o salão.  Abaixou a cabeça e arrepiada, só lembrava de pedir perdão pelos seus pecados. Ela não tinha coragem de abrir os olhos e quem sabe ver Jesus, pensava que se isso acontecesse iria morrer por ver o poder do Cristo. Passados alguns instantes de um frenético torpor, tomou coragem e nesse momento pode contemplar a cena mais inusitada de sua vida. Viu a glória de Deus. Eram homens com asas, vestidos de um branco alvo, como jamais vira, que não andavam, deslizavam por entre as pessoas, enquanto outros pairavam próximo a cabeça delas e outros deslocavam-se como que voando, mas sem bater as asas, tudo ocorrendo dentro de uma aura mais clara que o sol de meio dia, porém sem afetar a visão. Mara Lúcia podia ver tudo sem sentir seus olhos ofuscados.

     A visão demorou alguns segundos, o suficiente para deixá-la inebriada, sem saber se foi arrebatada ao céu ou se o céu veio visitar a capela. Olhou em volta e as pessoas pareciam estar em transe.

A Adoração ao Santíssimo acabou. Mara Lúcia saiu da capela e não falou com ninguém sobre a visão. Todos saíram mudos, sem se cumprimentarem como de costume.

     Amanheceu. O sol chegou pisando forte na grama do jardim. Mara Lúcia acordou trazendo bem nítida a visão do dia anterior. Somente agora tinha a intenção de tecer algum comentário com alguém que também esteve lá. Lembrou da amiga Carol, com a qual trocou aceno e resolveu telefonar.

 — Oi Carol, que bom que atendeu.

 

— Oi Mara, comigo tudo bem e com você?

— Amiga, o que foi aquilo ontem na hora da adoração em? Perguntou Mara Lúcia.

   — Pois é, você passou tão mal. O padre interrompeu a adoração, chamamos o SAMU, eu fui com você até o hospital de emergência, você estava muito alterada, não falava coisa com coisa, de início pensei ser uma insolação, pois o calor era demais, mas os médicos disseram que você teve um AVC. Graças a Deus você reagiu bem e voltou logo a si.

   —  Carol! Do que você está falando? Perguntou muito assustada Mara Lúcia.

  — Do piripaque que você teve na capela ontem. Você não lembra?

 Cruz credo! Eu não lembro de nada não. Meu Deus! Eu liguei pra te falar de uma coisa totalmente inusitada, e você me diz isso!

— Verdade amiga, foi um corre-corre danado. Você ficou muito doida.

   Mara Lúcia sem entender nada, teve que acreditar na colega e até hoje não sabe explicar se o que viu foi verdadeiro ou efeito do acidente vascular cerebral que sofreu.

A IMPORTÂNCIA DE ESCREVER - Henrique Schnaider

 


A IMPORTÂNCIA DE ESCREVER

Henrique Schnaider

 

Não fui um bom aluno nas aulas de Português desde o curso primário. Tive muitas dificuldades, minhas notas não eram boas.

Assino o Jornal O Estado de São Paulo desde os anos de 1970. Comecei a melhorar na escrita, quando resolvi enviar minhas opiniões sobre notícias e textos dos mais variados comentaristas que escreviam para o Jornal na sessão do Mural dos leitores.

Com o passar do tempo, meus comentários começaram a ser publicados no dia seguinte e dessa forma de duas a três vezes por semana. Me senti obrigado, é lógico de uma forma positiva, a melhorar o meu português, pois me sentia constrangido quando o Editor corrigia algo do meu texto original.

Então muitas vezes eu verificava que não havia nenhuma correção, o que me deixava muito satisfeito com a minha evolução. Assim foi por muitos anos, sendo publicado e conhecido pelo Editor e por outros assinantes do Jornal que me enviavam e-mails comentando o que eu escrevi.

Dessa forma senti que melhorei muito no Português na escrita, mas ainda falhando na pontuação. Sempre usei termos difíceis, mas que são do meu conhecimento. Cheguei a ser convidado para participar de um Fórum na sede do Jornal.

O palestrante seria o Ministro Gilmar Mendes e não me senti com vontade de comparecer, devido ao fato de não ter uma opinião muito favorável a este Ministro.

Até que chegou um dia, durante o Governo de Michel Temer, escrevi um texto contundente de crítica ao Jornal por se omitir sobre coisas erradas deste senhor ao qual me refiro como uma raposa felpuda.

Deste dia para frente o Jornal num claro rompimento, nunca mais publicou nenhum comentário meu.

Foi neste momento que comecei a frequentar o ICAL e receber as aulas da Professora Ana. A princípio senti muita dificuldade de me ambientar e escrever os contos. Resisti e me mantive firme e assim estou até hoje no nosso querido ICAL.

Já escrevi dezenas de histórias. Melhorei mais ainda meu português e participei de dois livros editados. Conheci a Hirtis Lazarin e a minha convivência com meus colegas tem sido excelente, fiz muitas amizades as eu prezo muito.

Estou até hoje no ICAL sempre aprendendo, cada dia uma coisa nova, e sobre figuras de linguagem. Espero continuar por muitos e muitos anos convivendo com meus colegas e com a Hirtis e que Deus nos dê saúde física e mental para continuarmos assistindo as aulas da professora Ana e aprendendo e mantendo nosso português em dia.

 

 

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