A GRANDE JORNADA - CONTO COLETIVO 2023

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quinta-feira, 27 de maio de 2021

Serei eu o herói da minha própria história ou qualquer outro tomará esse lugar - Adelaide Dittmers

 





Serei eu o herói da minha própria história ou qualquer outro tomará esse lugar

Adelaide Dittmers

 


Não me considero uma heroína ao voltar os olhos para minha história.

Vivi tristezas e alegrias. Perdi e venci batalhas, que a vida sempre oferece a todos nós.  Ao percorrer meu caminho passei por belas paisagens e por áridos desertos.  Aprendi com as adversidades e desfrutei de momentos de intensa felicidade.

Todos nós em algum momento temos que abrir mão de nossos sonhos, pelos outros, o que nos torna mais humanos.

Considero-me uma protagonista da minha história, não uma heroína, como qualquer outro é da sua.  Sinto-me responsável pelos meus atos, certos ou errados.

Ninguém vai tomar o meu lugar, nem eu vou tomar o lugar do outro.

Aquilo por que passei e ainda passarei dependeu e dependerá de minhas respostas às situações que enfrentei e enfrentarei no futuro, baseadas no meu modo de ver a vida, naquilo que vivi e aprendi ao longo do percurso.

Não acredito, portanto, que alguém possa ser o herói da minha história, a não ser eu mesma.

 

 

Serei eu o herói da minha própria história ou qualquer outro tomará esse lugar? - Helio Fernando Salema

 




Serei eu o herói da minha própria história ou qualquer outro tomará esse lugar?

Helio Fernando Salema

 

Fui entrando. Caminhando lentamente, talvez por cansaço ou o peso dos fracassos daquela noite. Ao ouvir o som da música, a cada passo, mais nítida aos meus ouvidos, acelerava meu coração e meus passos.

 

Ao aproximar da pista de dança, onde poucos casais usufruíam daquela maravilhosa melodia, meus olhos fitaram os de uma morena que ao perceber que nossos olhos se cruzaram, desviou o olhar para os casais que dançavam. Imediatamente comecei a observar cada detalhe. Tínhamos a mesma altura, cabelos longos cacheados e muito séria.

 

Quando um conhecido meu aproximou-se dela e a convidou para dançar, ela nem olhou pra ele, de braços cruzados, apenas balançou a cabeça. Por alguns minutos continuou de olhar fixo naqueles que dançavam. Um outro rapaz chegou  à frente dela, esticou o braço num gesto de cavalheiro solicitando a honra de uma dança, e novamente ela só balançou a cabeça.

 

Uma outra música começou a tocar e me vieram recordações. Mais difícil ficou para eu ousar dançar com aquela que tanto me impressionou. O medo do fracasso afastou a esperança de qualquer êxito. Noite perdida, pensei.

Rapidamente pela minha cabeça se passaram os transtornos vividos no dia.

Tudo, naquele momento, pesava na minha decisão, tentava ou não dançar com aquela morena. Parece que o conjunto quis me ajudar e começou a tocar uma música que sempre me trouxe boas recordações. Pensei, serei eu o herói ou qualquer outro será?

Fui caminhando lentamente na direção dela sem que ela percebesse. Parece que ela se assustou quando me viu à sua frente. Lembro que estiquei a mão e talvez eu tenha dito alguma coisa. Ela veio junto a mim e começamos a dançar.

Foi um momento mágico. Dançava maravilhosamente, flutuávamos pelo salão quase vazio.

Tudo era divino, suas mãos, seu perfume. Eu não sabia o que falar. Lembrei do que algumas amigas tinham dito. Que minha barba dava uma sensação agradável ao tocar o rosto delas.

Então arrisquei.

- Minha barba incomoda você?

Um não suave ouvi. Percebi que ela sorria.

 

 Ufa, que alívio. Em seguida o conjunto para de tocar.

Tive coragem de dizer:

Que pena. Vamos depois continuar?

- Sim. Agora bem nítido e me fitando e sorrindo.

Não sei como é nem porque, completei.

- Quando a música começar você me tira para dançar?

Olhou me muito espantada e sorrindo foi em direção as suas colegas.

Assim que chegou junto as amigas vi que todas começaram a rir.

Vi um casal de amigos sentados e fui juntar-me a eles. Conversamos até que o conjunto voltou a tocar e eles saíram para dançar.

Vi que ela estava com as amigas e fui até lá, agora sem nenhuma preocupação.

Dançamos até o final.

 

Nosso relacionamento durou alguns meses, nossa amizade até hoje.

Recentemente a encontrei na rua e ela veio toda sorridente e me disse que estava muito contente. Nasceu o seu segundo neto. Conversamos por um longo tempo sobre a vida.

Ao despedir ela rindo me disse que todas as vezes que me vê, lembra:

Quando a música começar você me tira para dançar?

UM CONTO POLICIAL - Alberto Landi

 




UM CONTO POLICIAL

Alberto Landi

 

Ao volante de seu Austin esportivo vermelho, ano 2019, a jovem mulher seguia pela Interestadual I5 que conecta os Estados de Oregon e Washington, no sentido Portland, quando próximo do condado de Salem, foi abalroada por um pneu de caminhão que se soltou e veio rodando da pista oposta e, em alta velocidade, espatifando-se contra o para-brisa do Austin.

A jovem Valerie perdeu o controle de seu veículo e capotou várias vezes. No acostamento o carro ficou com as rodas no ar. Quando os paramédicos chegaram, alguns minutos depois, encontraram-na sem vida entre as ferragens.

O carro foi atingido por um pneu que se soltou de um caminhão, informou uma testemunha, Michael, que vinha dirigindo bem atrás da vítima, que parou para socorrer e chamar a polícia.

Tem alguma informação sobre qual veículo provocou o acidente? Perguntou o patrulheiro Philip, o primeiro a chegar ao local.

Confesso que não estava atento naquele momento, admitiu Michael. Minha atenção ficou no Austin, que sofreu o acidente. Porém vi onde o pneu foi parar, batendo no Austin. Levou então o patrulheiro até o local onde estava o pneu arrebentado, a uma distância de uns 100 metros da estrada.

Provavelmente, se soltou do caminhão, avaliou inicialmente o patrulheiro. O caminhoneiro nem deve ter percebido. Somente vai dar conta quando parar para reabastecer. E emitiu um alerta para a polícia de Salem.

Richard, um caminhoneiro de 1,90 m de altura e aproximadamente 120 kg de peso, acordou na boleia do cavalo mecânico estacionado junto a um posto de gasolina, nas proximidades de Salem. Alguém bateu à porta do veículo:

Abra!  É a polícia!

Richard ergueu-se, na cama atrás do banco, e esticou-se até a janela, no lado do carona. Havia um carro de polícia de Salem parado no acostamento com dois patrulheiros.

Era o patrulheiro Philip:

Um momento! Deixe-me me vestir! Gritou o caminhoneiro.

Instantes depois estava com os dois patrulheiros conversando.

Você é proprietário do caminhão de 3 eixos que está na oficina do posto para troca de um pneu?  Perguntou o patrulheiro.

Sim, é meu, confirmou. Quando parei para abastecer ontem a noite percebi que um dos pneus havia se soltado e caído na interestadual. Essas manutenções são muito ruins.

O seu pneu atingiu um carro ontem, informou o patrulheiro. Uma jovem faleceu.

Richard ergueu os braços de uma maneira bem chocada.  Eu não fiz nada não! Se foi o meu pneu, foi um mero acidente.

Mesmo assim, você vai ter que vir conosco, até a delegacia, prestar depoimento.

Melhor fazer logo o teste do bafômetro, sugeriu o outro patrulheiro Marc.   

Em seguida todos se dirigiram à delegacia de polícia de Salem.

O sujeito está limpo; sem sinal de álcool, drogas ou infrações de trânsito, informou o detetive Franco, da polícia de Salem para o xerife Dillon. Mas não resta nenhuma dúvida, o pneu que matou a jovem saiu do caminhão dele.

Como é de outro estado o veículo, e só estava aqui de passagem, melhor pedir prisão preventiva e deixá-lo preso até julgamento, comentou Franco.

Eu vou conversar com a promotoria, assentiu o detetive. Todavia o juiz pode não concordar com uma fiança alta, já que o caso se parece mais com um acidente de trânsito.

A outra companheira de Franco, a detetive Jennifer informou ter recebido uma queixa sobre um tumulto

ocorrido no estacionamento onde Richard estava, na noite anterior à prisão, havendo uma vítima.

O caminhoneiro estaria envolvido? Questionou Franco.

Há uma testemunha, mas a vitima não foi localizada, resumiu o xerife

Jennifer, a outra detetive, estava tomando um cafezinho, quando o detetive Franco aproximou-se trazendo uma pasta nas mãos. Tratava-se do caso do caminhoneiro.

O xerife informou que talvez tivesse algo mais.

Não é exatamente um fato conclusivo, mas a gerente da lanchonete do posto de gasolina afirma ter visto um caminhoneiro espancar uma prostituta, ontem à noite, no estacionamento. Pela descrição é o Richard.

E a prostituta?

A detetive informou que desapareceu sem prestar queixa. Isso não é exatamente incomum.

Sim. Franco balançou a cabeça.

Podem ter se desentendido sobre o preço ou o serviço prestado, e procurar a polícia seria a última das opções destas garotas.

Por isso se tornaram vítimas perfeitas para esse tipo de abusador. Replicou Jennifer, sorvendo um gole de café. Vou pedir um teste de DNA desse sujeito, argumentou Franco.

Você está desconfiado de alguma outra coisa? Indagou a detetive.

Somente por precaução, replicou Franco.

 O juiz está propenso a pedir uma fiança baixa nesse caso, informou a promotora Sofia, quando Franco ligou para ela, 2 dias após. Ele entende que ele não oferece risco à sociedade, complementou a promotora.

Estou aguardando retorno de informações que solicitei ao FBI, explicou o detetive. Tente conseguir mais 24 horas de preventiva com o juiz.

Vou fazer o possível, mas sem uma justificativa sólida, penso que tenhamos de colocá-lo em liberdade, informou a promotora. Infelizmente a prostituta espancada não prestou queixa, lamentou o detetive.

Mais tarde, para seu alívio, antes do término do inquérito dado pela promotora, o FBI fez contato com ele, informando dados importantes sobre o caminhoneiro.

O DNA dele está relacionado com 2 casos em aberto, de prostitutas mortas no Texas e Arizona. Informou o agente do FBI que ligou para Franco. Bingo!  Parece que você pegou um serial killer, Franco.

Por puro acaso minimizou Franco.  Tudo por causa de um acidente de trânsito, do qual é provável que seria inocentado.

Pelo visto, mais uma mulher teve que morrer para que pudéssemos pôr as mãos nesse criminoso, sentenciou o agente do FBI.

  

Por você, faria isso mil vezes - Adelaide Dittmers

 




Por você, faria isso mil vezes

Adelaide Dittmers

 

— Olhe em que tarde linda o seu filho vai nascer! Disse o rapaz, empurrando a maca, que me levava ao centro cirúrgico. 

Desde o quarto vínhamos conversando.  Olhei pela grande janela, que descortinava o verde das árvores entre as grandes casas do lugar.  Realmente era uma bela tarde de sol e céu muito azul.  E as palavras daquele jovem, que, ao fazer seu trabalho, conseguia ser sensível ao ver uma mulher, que ia ter um filho, tocaram-me profundamente.

Chegamos à sala de cirurgia e despedi-me dele.

A cesariana correu normalmente até o bebê nascer. O médico pediu, então, ao meu marido, que estava ao meu lado, que já podia sair da sala. O anestesista disse-me que ia me sedar para eu descansar, enquanto terminavam a cirurgia.

Quando acordei na sala de recuperação, sentia-me muito mal. Depois de algum tempo, fui levada para o quarto.  Continuava me sentindo muito mal.  Passei a noite da mesma maneira. Olhava pela janela e via as luzes da cidade muito turvas.  Estava assustada e com medo.

No dia seguinte, já me sentindo um pouco melhor, o médico veio me visitar e contou o que tinha acontecido durante o parto.  Ao retirar a placenta, uma grande hemorragia ocorreu.  Ele quase teve que retirar o meu útero, mas conseguiu evitar isso, costurando os vários vasos, que sangravam.  Foram mais de quarenta pontos internos e me submeteram a uma transfusão de sangue.

A recuperação foi lenta, mas a felicidade de ter aquele menino lindo nos meus braços deu-me forças para enfrentar as dificuldades do meu restabelecimento.

Hoje, ao olhar para trás, sei que teria passado por tudo isso mil vezes, se fosse preciso, para ter o privilégio de ser mãe de um ser humano tão maravilhoso. Ele e minhas filhas são a grande dádiva da minha vida.

E agora vejo que, apesar daquela noite ter se apresentada com as luzes turvas no meu restabelecimento, os dias que se seguiram sempre foram claros e azuis na minha vida.

 

Serei eu o herói de minha própria história, ou qualquer outro tomará esse lugar - Do Carmo

 




Serei eu o herói de minha própria história, ou qualquer outro tomará esse lugar

Do Carmo

 

Fim de tarde de um gélido domingo, íamos eu, papai e minha irmã, à padaria Dengosa, que sobrevive até hoje, que fica bem próxima da minha casa, a duas quadras de distância apenas. Compras domingueiras e infalíveis.

Seus pães, doces e tortas, salgados ou doces, eram terrivelmente deliciosos, bolos e docinhos, tinham sabor de quero mais e o estonteante perfume delicado, que embriagava o ambiente, era uma declaração de amor.

Já éramos clientes antigos e conhecidos do proprietário, amava participar dessas compras, porque sempre era presenteada com várias guloseimas, as quais só podia comê-las em casa, depois de lavar as mãos. Era um ritual macabro para mim, eu achava muito demorado.

Ao nos despedirmos dos funcionários, nos deparamos com uma cena muito triste, uma menininha chorava e um menino, pouco mais velho que ela, soluçava baixinho, e o pai, com voz melancólica, dizia:

- Queridos, vocês sabem da nossa situação de vida. Somos pobres, eu e a mamãe trabalhamos muito, mas com nossos salários, mal conseguimos pagar os compromissos mensais, e com muita dor no meu coração, não poderei satisfazer esse desejo de vocês. Sei que estão com vontade de comer algum desses doces, mas filhos, o papai não tem dinheiro.

Meu pequeno coração, retorceu-se dentro de mim ao ouvir, entre lágrimas, a menininha ainda chorando, dizer:

- Está bom, papai, você guarda um pouquinho do seu dinheiro, todo dia e quando tiver bastante, você compra para nós, não é maninho?

- É isso mesmo. Sabe papai, eu até não tenho mais vontade. Já passou.

Não me contive, soltei a mão de meu pai, aproximei-me deles e com a minha sacolinha recheada das compras, disse:  

- Menina, esta sacolinha está com alguns doces e pãezinhos, nós já comemos lá dento, então você quer ficar com ela?

A menininha, passando as mãos no rosto molhado, olhou para o pai que olhava para o meu pai com olhos desesperados e estendendo a mão para meu pai, disse;

 - O senhor tem uma joia valiosa, que tem um coração maior do que o mundo, uma criança colocando-se no lugar de outra que é muito carente. Eu aceito e agradeço a generosidade.

Com a alegria que sempre foi um dom de meu pai, sorrindo apertou a mão estendida e convidou-o a tomar um café, enquanto as crianças tomassem um saboroso chocolate quente com os pãezinhos e bolo, que escolhessem. Diante de toda essa cena, o proprietário da casa, alegremente ao servir-nos disse:

- Hoje este lanche é por conta da casa, pois recebi uma lição imensa de amor, vinda de uma criança heroica, pois não titubeou em entregar seus doces à uma menininha, carente e desejosa, que não conhecia.     

Meu pai ficou muito agradecido com os comentários do proprietário e pediu que fizesse outra sacolinha, que ele fazia empenho em pagar, para sua filha. Nos despedimos e cada um seguiu seu caminho. Ao chegar em casa, abrindo a bandeja, admirada ao extremo, vi a quantidade de doces e salgados que ele havia acrescentado ao novo pedido de meu pai. Com sentimento de dever cumprido, lanchamos naquela noite de domingo especial, como se fosse a primeira de nossas vidas.  

 

Um amor impossível - Dinah Choichit

 




Um amor impossível

Dinah Choichit

 

Está percebendo que eu faria por você isso mil vezes e mais mil? Quero te ver sempre alegre, sorridente e feliz com a vida, pois, sei que isso só é possível quando estou perto de você.

Eu também fico muito feliz de poder participar dessa sua alegria sabendo que sou o motivo dela. 

Nunca me esquecerei de que desde o primeiro momento que eu te vi eu também comecei a ver o mundo de outra forma, espero que possamos ter um  futuro juntos e que possamos lutar pelo nosso  amor,  porque por você, eu faria isso mil vezes e o quanto for preciso.                                                             

POR VOCÊ, FARIA ISSO MIL VEZES. - Henrique Schnaider

 




POR VOCÊ, FARIA ISSO MIL VEZES.

Henrique Schnaider

 

Israel, país dos meus sonhos.

Quando você foi criado por uma decisão da ONU em 1948, eu era apenas um menininho. Até hoje tenho minha vida ligada a ti, tanto por laços de família que tenho em Israel, como por laços afetivos devido a minha descendência judaica.

Os Judeus sempre foram um povo perseguido e considerados párias desde tempos imemoriais. Desde Nabucodonosor, rei da Babilônia, que ordenou a dispersão dos Judeus, nosso povo foi, desprezado e perseguido.

Os Judeus se dispersaram por todos os países existentes naquela época. Tanto na Europa Ocidental, países como Inglaterra, França Espanha, Portugal e países de toda Escandinávia. Pela Ásia foram andando e se integrando por onde chegavam.

Influenciavam a vida e os costumes de onde viviam e assim como a transmissão de vastos conhecimentos. Mas, sempre a história se repetia, assim como eram admirados, também perseguidos, sofrendo massacres intermináveis.

A igreja católica através da Inquisição, promoveu barbaridades contra os Judeus e disseminou o antissemitismo por onde a fé cristã chegava, obrigando os Judeus a se converterem e acusando o povo semita de culpados pela morte de Jesus.

Essa perseguição prosseguiu séculos adentro, chegando finalmente ao regime nazifascista da Alemanha. Através de Hitler e seus seguidores que queriam resolver o problema judeu, através dos campos de concentração e das câmeras de gás. Veio daí a palavra Genocídio, devido ao Holocausto do povo judeu. 6 milhões de seres humanos foram exterminados.

Derrotado o nazismo, regime horrendo, mais cruel que a humanidade já conheceu, as tropas aliadas chegaram aos campos de extermínios e encontraram algo inominável. Aqueles que sobreviveram, tinham se transformados em farrapos humanos, esqueléticos cheios de doenças.

Finalmente a recém-criada ONU, através da Presidência do excelentíssimo brasileiro Osvaldo Aranha, que ficou para sempre gravado na memória dos Judeus. Foi criado o Estado de Israel.

Não foi fácil a vida dos primeiros israelenses, que logo entraram em guerra contra todos os Exércitos árabes. Os quais não aceitaram a decisão da ONU. Foram derrotados de maneira milagrosa e Israel seguiu sua vida para o futuro. Hoje o País é considerado uma das maiores potências do mundo.

Nestes anos de existência de Israel ele deu ao mundo, contribuições enormes, nas pesquisas científicas na tecnologia e na Medicina. As quais o mundo todo reconhece. Os conflitos continuam na Região, mas não perco a esperança de que um dia todos os povos que vivem lá, promovam a Paz.

Oh, Israel! Hoje sinto orgulho de ti e pelo fato de ser judeu, por você me sacrificaria, faria isso mil vezes.

Porém nasci no Brasil, amo o meu País e pretendo viver aqui até o fim dos meus dias. Mas, sempre tendo a ti, oh Israel dentro do meu coração.

 

O CORREDOR EXEMPLAR - Dinah Choichit

 




O CORREDOR EXEMPLAR

Dinah Choichit

 

Hoje será um dia importante para meu filho Jonas, vai marcar a sua carreira. Haverá uma corrida de kart onde estarão muitos competidores capacitados. Ele vem se preparando o ano todo, pois é o seu sonho desde menino. Quando pequeno gostava muito de ir ao Kartódromo junto com um primo, que já era um campeão.

Antes de sair de casa, logo cedo, veio pedir a benção, e avisou para não nos atrasarmos. Estava calmo e confiante, pois conhecia a pista. Assim que chegou foi verificar se o seu carro estava em ordem, e se todos os funcionários estavam presentes. Tinha prometido a eles que se ocorresse tudo como o planejado, iriam almoçar todas as famílias, e todos juntos. Todos os parentes, amigos e sua equipe estavam vibrando para sua vitória.

Assim que entrou no carro, pensou ”Serei eu o herói da minha história ou qualquer outro tomará esse lugar?”.

Deu umas três voltas e não conseguia passar os outros competidores. Já estava começando a ficar nervoso quando surgiu uma abertura em meio aos carros e essa oportunidade lhe deu chance de ir para o primeiro lugar, onde permaneceu até o final.

terça-feira, 25 de maio de 2021

O menino do semáforo - Adelaide Dittmers

 



O menino do semáforo

Adelaide Dittmers

 

Em um anoitecer frio, o menino perambulava pelas ruas fervilhantes de carros, depois de ter vendido pequenos pacotinhos de balas ao lado de um semáforo de uma grande avenida.

Conseguira apenas uns trocados, que iria entregar à mãe.  Estava com muita fome e o ar gelado entrava-lhe pelos poros do corpo franzino e desagasalhado.  Pensou em entrar em uma padaria para pelo menos comer um pão com manteiga, mas ficaria com menos dinheiro ainda para entregar em casa.

Morava longe, no extremo sul da cidade e a condução até lá era cara.  Seguiu, então, até o ponto de ônibus com o estômago vazio reclamando alto.

Ao chegar lá, estranhou que estivesse vazio àquela hora de intenso movimento.  O ônibus devia ter passado há pouco tempo e ele teria que esperar muito até o próximo vir.  Olhou para os carros, que passavam, velozmente, com pessoas abrigadas e aquecidas em seus interiores.  Como queria ser uma daquelas pessoas.

E seus pensamentos voaram para a realidade de sua vida pobre e cheia de dificuldades.  A mãe trabalhava como faxineira, mas perdeu o emprego por causa da grave pandemia.  O pai os abandonara.  Era um beberrão inveterado e nunca mais o vira. Seus dois irmãos dependiam do trabalho da mãe e dos centavos, que conseguia com a venda de balas. Ele tinha deixado a escola.

Na comunidade, em que viviam, muitas pessoas os estavam ajudando para não passarem fome.  Sempre havia essa solidariedade entre o povo da favela.  O que seria deles?

Nesse momento, levantou os olhos tristes e viu a torre de uma igreja, que se erguia imponente atrás do casario e com uma fé inesperada, rogou aos céus, que ajudasse a ele e a sua família.

Momentos depois, um carro parou à sua frente, uma senhora abriu a janela e gritou:

— Olá menino! Para onde você vai?

— Para minha casa!  Espantado, ele respondeu.

— Entre, eu levo você!

— Não obrigado! Minha casa é muito longe.  Respondeu surpreendido, chegando mais perto da janela.

— Você está morrendo de frio.  Entre! Não tenha medo! Também moro muito longe.

O temor e a surpresa lutavam com a vontade de entrar naquele carro quente e acolhedor.  E o desejo do aconchego e do conforto foi mais forte do que tudo.  Ele não tinha nada a perder e a mulher tinha um rosto bondoso e afável.

Abriu a porta e entrou, dizendo a ela onde morava. Não surpreendida com a distância e o bairro periférico, dirigiram-se para lá, serpenteando pelas ruas movimentadas da cidade.

Durante o longo percurso, a generosa senhora perguntou-lhe sobre a vida, e o menino despejou sobre ela seus infortúnios, incertezas e necessidades.  Com uma voz doce, ela acariciava a alma do pequeno passageiro com palavras de incentivo e compreensão.

Ao chegarem à comunidade, onde o pobre vendedor de balas morava, ele disse:

— Pode me deixar aqui.  Seu carro não vai conseguir passar por esses becos.

A mulher assentiu e abriu a bolsa, de onde tirou um enorme maço de notas de dinheiro e estendeu ao menino, dizendo:

— É para você!

 Com os olhos arregalados, o menino respondeu

— Não, não quero.  Vão pensar que roubei!

— Não vão. É um presente!  Aceite e coloque nos bolsos para você não ser roubado.

O garoto pegou o maço com as mãos trêmulas e o distribuiu pelos bolsos rotos da calça.  Num impulso, beijou o rosto de sua benfeitora com os olhos marejados de lágrimas e saiu do carro.

Ela acenou para ele e deu partida no carro.  Parando para ver o carro ir embora, qual não fo a sua surpresa ao ver o carro sumir na sua frente como uma bolha de sabão, que estoura no ar.

Assustado, apalpou os bolsos e percebeu as notas dentro deles.  Aquilo fora real e não um sonho.  Lembrou-se que rezara e pedira uma ajuda.  Com certeza era um milagre.  Lágrimas continuaram a rolar pelo seu rosto magro.  Quem seria aquela senhora?  Uma santa? Um anjo? Uma fada?

Com o coração cheio de gratidão foi para seu barraco e quando olhou para o céu escuro da noite nublada e sem estrelas, viu uma luz que subia em direção ao alto e por um segundo, tudo ficou iluminado.

Por você, faria isso mil vezes - Hélio Fernando Salema

 




Por você, faria isso mil vezes

Hélio Fernando Salema

 

Você, meu amigo, que foi embora, junto com muitos outros levados pela COVID-19. Você nos deixou um imenso vazio. Sempre esteve comigo, todas as vezes que precisei. Mesmo não lhe procurando, parecia que percebia o exato momento que eu necessitava de ajuda.


A sua percepção associada à vontade de ser útil, algumas vezes  chamou minha atenção, foi uma grande surpresa.
Você chegava com uma conversa  sem sentido. Falava de coisas banais, percebendo que eu não estava de bom humor logo perguntava se estava acontecendo alguma coisa. Às vezes, antes que eu me manifestasse você já se colocava à disposição. Era difícil recusar a sua ajuda. Ainda mais com o alívio que sentia.


Insistentemente, apontava o que fiz por você, como se fosse mais do que você já havia feito por mim. Por vezes, pensei que esquecia da sua parte e só lembrava do quanto lhe ajudei. Esta era uma das inúmeras divergências entre nós. Como isso rendeu nas nossas conversas.
Hoje tenho uma certeza, por você faria tudo que fiz mil vezes.

RECORDAR É VIVER - Do Carmo

 



RECORDAR É VIVER

Do Carmo

 

Hoje voltei ao passado e revivi um sentimento adormecido há cinquenta e dois anos.

Sou considerada aqui em casa como “Policarpo Quaresma”, personagem que guardava até parafuso usado. Esqueci o autor. Ah, Lima Barreto.

Tenho um baú grande e muito bonito, de madeira de jacarandá, forrado com veludo lilás, cor que muito me agrada, onde guardo minhas relíquias sentimentais.

Vez por outra, remexo minhas fagulhas ardentes e revivo acontecimentos, participo realmente dos sentimentos vividos na época da chegada de mais uma recordação física.

Ao abri-lo nesta semana, logo em primeiro lugar estava uma caixinha de cartolina rosa, feita pela Bequinha, na época com seis anos, minha querida filhota.

Tão logo retirei a tampa, senti o perfume dos bombons que ela havia me dado pelo dia das mães, com um cartãozinho escrito com letrinha trêmula e caprichada, notava-se o esforço para ser perfeita. Naturalmente os bombons não mais estavam lá, mas os quadradinhos de papel aluminizado brilhante e coloridos, repousavam aveludados como no dia em que recebi.

Ao reler mil vezes a dedicatória, com meu rosto banhado em lágrimas, ouvia nitidamente sua voz dizendo:

— Mamãe, eu amo você. Eu fiz a caixinha e embrulhei os bombons que a professora mandou fazer, e cada menina embrulhou para sua mamãe.

Não consegui continuar olhando as preciosidades que iria rever. Ainda com algumas lágrimas deslizando de meu coração, fechei o baú e respirei o ar puro da tarde de final de outono.

 

 

A transformação - Adelaide Dittmers

 


A transformação

Adelaide Dittmers


Em cima de uma pétala de rosa, a gotinha trêmula conversava com a flor.  Um forte calor deitava-se sobre o jardim, as casas e o asfalto das ruas. As flores e folhagens bebiam sôfregas a água, que o jardineiro tinha jogado sobre elas.

— Por que você está com tanto medo? Perguntou a rosa.

— Não quero me tornar vapor e sumir no ar. Gosto de rolar por aí, mesmo por dentro de canos escuros, de me derramar pelo jardim, de sentir que estou dando vida às flores e sentir o perfume, que vocês exalam.  Do cheiro, que damos à terra, quando a molhamos.

— Você não quer morrer?

— É isso! Como vou saber o que vai ser de mim se evaporar? Assentiu angustiada.

E tentava agarrar-se à rosa, porém, começou a sentir-se fraca, como fosse se desintegrar e aos poucos foi se desgarrando da rosa e subindo para o céu.  Fechou os olhos. Será que iria desaparecer? Abriu os olhos e percebeu-se dividida em várias gotículas, mas estava viva.

A subida demorou um bom tempo e subitamente ela sentiu que se incorporara a uma nuvem, que deslizava rapidamente, levada pelo vento.  Com muito receio, olhou para baixo, onde as casas pareciam de brinquedo.

Mais além, campos espraiavam-se na paisagem, em que diversos tons de verde misturavam-se ao amarelo de vastos trigais. Maravilhada, a pequena gota apreciava aquele mundo, que não conseguira imaginar enquanto percorria rios e canalizações da cidade.

Estava dividida em partículas, mas era parte de uma nuvem branca e macia.  Como pudera ter medo dessa magnífica transformação.  Encantada, deixava-se levar pelo sopro suave do vento

Uma imensa floresta, que subia por altas montanhas, surgiu e a nuvem que a transportava tocou nos seus picos.  A sensação de resvalar pelos altos galhos das frondosas árvores foi intensa e inesperada.  Conseguiu divisar no meio da folhagem, um ninho, em que a mãe alimentava seus filhotes.  Novas vidas desabrochavam ali.

Mal tinham passado pelas montanhas e uma faixa branca, debruada por árvores, arbustos e vegetação rasteira, beirava uma grande extensão de água de um verde azulado, que se perdia no horizonte e brilhava sob os raios dourados do sol.

Era o mar.  Ouvira falar muito da sua imensidão, mas nunca imaginara a sua grandeza.  A viagem tornou-se mais lenta e as nuvens foram parando sobre a grande massa de água, bordada por pequenas porções de terra.  Um cansaço modorrento invadiu a viajante, que adormeceu acomodada no seu leito de algodão.

Horas depois acordou empurrada por uma forte rajada de vento.  Sentiu-se pesada e viu-se cercada por companheiras escuras, que a comprimiam cada vez mais.  Aos poucos começou a sentir que suas minúsculas partículas se uniam e estava se tornando novamente uma gotinha, entre milhares de outras.  Não queria mais voltar a ser líquida e percorrer rios e canos escuros.  Tinha descoberto um mundo novo e maravilhoso.  De repente, no entanto, sentiu que despencava do céu com uma força avassaladora.  Para onde iria agora?

Caiu com grande impacto no cinza escuro, em que o mar se tornara.  Desfaleceu ao se sentir absorvida pela turbulência das ondas e percebeu que agora era parte desse intenso movimento.

Um sentimento forte a tomou por inteira.  Será que ali era seu lugar?  Será que voltara à sua origem?  Pensou, então, na rosa de quem se separara com tanto temor.  O lugar da rosa era o belo jardim. E o dela?   Seria o mar ou voltaria a ser nuvem para viver, novamente, aquela experiência incrível.  Naquele momento, a pequena gota entendeu que a vida é feita de mudanças, que muitas vezes nos surpreendem e nos transformam.

 

Premissa: A gota que não queria se tornar vapor.

Logline: A estória de uma pequena gota, que temia evaporar, mas que se tornando parte de uma nuvem, descobriu um mundo maravilhoso e que as mudanças são constantes e surpreendentes na vida.

O CAVALEIRO PEGASUS - Alberto Landi

 




O CAVALEIRO PEGASUS

Alberto Landi

 

A face de Helen estava diferente, assustada e visivelmente transtornada. A professora Liliane preveniu-a sobre histórias assustadoras de castelos e masmorras, a respeito do que falavam os antigos moradores da aldeia de Gerês. Situada próxima da cidade de Braga em Portugal.

Diziam os antigos, que esse castelo erguido sobre uma rocha, era a porta de entrada para o mundo extraterreno. Habitado por criaturas monstruosas.

Helen ignorou as advertências da professora. Mesmo sabendo os perigos que corria, entrou no castelo, curiosa por descobrir se aquelas histórias eram verdadeiras, ou se eram meras lendas populares.

Ali na sua frente estava aquela criatura alta, de nariz pontiagudo, orelhas pontudas e roupas cavaleiro da idade média. Segurando em uma das mãos um elmo e na outra uma espada. Parado diante de Helena, ele era a prova definitiva de que o castelo, e tudo que diziam, era real. Estava ali, diante de seus olhos assustados.

O estranho cavaleiro permaneceu imóvel por alguns segundos. Moveu a cabeça para a esquerda e depois para a direita, parecendo observar a reação de Helen, diante do inusitado encontro. Ela permaneceu petrificada. Silêncio total, o seu espanto era enorme.

O que pareceu ser um duende. Dessas histórias de contos de fadas, começou a acenar para ela. Dedos magros, unhas grandes, chamando-a para acompanhá-lo.

Helen pensou em sair correndo o quanto antes do castelo, porém sua curiosidade era grande. O duende acenava com as mãos. Era um convite muito estranho, era uma situação assustadora.

A criatura, vendo que a Helen permanecia estática, a chamou pelo nome, proferindo com uma voz rouca, que ecoou no interior do castelo.

— Não tenha medo, disse.  Venha comigo, minha menina, e repetiu, não tenha medo.

Eu sou Pegasus, fui um nobre guerreiro espanhol. Fui cavaleiro do rei. Mas com o tempo minhas divergências com ele tornaram-se muito tensas. Até que fui desterrado e encarcerado nesse castelo. Os outros cavaleiros que me acompanhavam, naquele tempo e eram fiéis a mim, foram também exilados para outras terras.

Nos refugiamos nas montanhas. Arregimentamos um pequeno exército e lutamos por quem nos pagasse mais. Numa dessas batalhas, fomos capturados pelas forças do rei, e assim vim para cá exilado.

Helen estava perplexa, ouvindo a história. Ficou admirada com aquela criatura estar falando com ela. Era tudo surreal. O espanto foi dando lugar para admiração e curiosidade.

— Venha conhecer um mundo cheio de seres fantásticos. Tudo tem magia, dizia Pegasus. Afinal creio que este é seu desejo. Ela encantada, disse:

— Puxa, você é mesmo real, hein! Como sabe o meu nome e meus desejos? Disse Helen.

— Não tenha medo, você será a primeira pessoa a conhecer nossos segredos. Helen deu um passo em direção ao duende. E seguiu–o, lentamente. A criatura ficou sempre na frente, e o caminho se tornando cada vez mais estreito e sombrio. Helen assustada, disse:

— Não vejo nada...acho que vou voltar.

No mesmo instante, em um estalo de dedos. Surgiu nas mãos de Pegasus uma tocha. A chama iluminou seu rosto, que estava com um sorriso sarcástico. Helen hipnotizada o seguia apavorada.

Isso aconteceu durante um outono, em um dia bem frio, quando ela sumiu da aldeia de Gerês. Por meses todos a procuraram. Em todos os locais e até mesmo, nesse castelo mal-assombrado, porém sem sucesso.

Passaram-se alguns anos desde que Helen encontrou-se com Pegasus. A história do desaparecimento dela, foi mais uma das histórias já contadas a respeito desse castelo e de seus fantasmas.

Durante algum tempo, moradores da aldeia relataram ter visto uma menina com as mesmas características de Helen. Diziam que ela estava no topo de um dos torreões do castelo. Havia acenado como se pedisse socorro e depois desapareceu rapidamente.

O SOLDADO QUE NÃO QUERIA MATAR - Claudionor Dias da Costa

 


O SOLDADO QUE NÃO QUERIA MATAR

Claudionor Dias da Costa

 

Quando criança gostava de escutar as histórias de meu avô.

Certa vez, na tranquila varanda de sua casa ele me contou o que passou na época da guerra.  Participou da primeira guerra mundial. Meu avô era um português alto e forte, tendo passado um período na França atuando na artilharia.

Fez amizade com Arlindo, tão jovem quanto ele, e passaram por treinamento juntos trocando confidências e emoções num período em suas vidas que poderiam estar aproveitando com mais tranquilidade, ao invés de enfrentar o inimigo, tendo que matar ou morrer.

Por várias vezes seu amigo reclamava da convocação para participar do conflito e com ar triste e perdido exclamava:

— Antônio, por que eu e você estamos nesta situação? Não concordo nada em ter que assumir este papel que vai contra a minha consciência. Não aceito me oferecer para morrer, quando sei que esta guerra foi provocada por ânsia de poder, dominar o inimigo e usufruir de sua derrota. E não me conformo que a alternativa que tenho para continuar vivo é matar outro soldado que tem as mesmas inquietações que eu. Só está do outro lado. Será que minha vida vale mais que a do meu “inimigo”. Todos os seres humanos são iguais.

Meu avô disse que não poderia contestar, porque ele tinha argumentos profundos e sua filosofia de vida era baseada na paz e concórdia.

— A nossa sobrevivência Arlindo... Não esqueça que existem pessoas te esperando depois e dependem de você.

Contudo, em seu descanso, ficava meditando acerca dessas colocações e se via intrigado com os absurdos e armadilhas que a vida provoca.

Porém, naquele conturbado mundo não sobrava tempo para muitos pensamentos. A batalha era diária e sempre muito perigosa.

O sargento da tropa incitava todos a serem corajosos e destemidos, e essa pressão atormentava mais ainda o Arlindo que não via sentido em tudo que estava vivendo.

No acampamento ele ficava balbuciando palavras soltas e várias vezes chorava escondido. Era muito angustiante.

E nesse drama meu avô tentava acalmá-lo, mostrava que tudo terminaria. Precisariam de paciência, resignação, fé pessoal e muita em Deus.

Arlindo procurava não participar e vivia se escondendo atrás das atividades dos outros, de forma que não fosse surpreendido pelo sargento, porque poderia ser punido. Os amigos até procuravam protegê-lo porque sabiam dos motivos daquelas atitudes.

A única coisa que amenizava um pouco era receber notícias dos parentes através das cartas que demoravam para chegar, mas, que eram um bálsamo de um outro mundo que parecia que nunca alcançariam outra vez.

Apesar de gostar de recebê-las, Arlindo parecia se preocupar mais e ficava taciturno mantendo um silêncio que incomodava até os companheiros.

Os dias se sucediam naquela rotina cruel, sangrenta e cansativa.

Num dia de confronto violento, ele não aguentou e saiu tresloucado da trincheira, partiu correndo para a frente. Chegou ao extremo de sua depressão e preferiu se entregar e sacrificar sua vida do que permanecer fazendo o que não permitia sua consciência.

Ouviu-se um tremor muito grande. Uma bomba havia explodido próximo à trincheira em que estavam.

Meu avô e mais dois companheiros correram e viram o Arlindo caído, muito ferido, ainda vivo. Puxaram-no imediatamente e pelo rádio, chamaram o socorro médico que ficava na retaguarda.

Foi levado às pressas para o hospital de campanha.

Nesse instante, meu avô olhava para mim que estava com os olhos esbugalhados e aflitos, e aumentava o suspense:

— Será que o Arlindo se salvou?

Continuava:

— Bem...ele foi operado porque tinha ferimentos. Eu quando podia acompanhava sua recuperação e após algum tempo já podíamos conversar um pouco.

O tempo passou e as tropas regressavam a Portugal. A guerra finalmente acabava.

Mas...vovô:

— Afinal, o que aconteceu com seu amigo Arlindo?

— Meu neto, ele se recuperou e como acompanhou o pessoal da saúde no dia a dia, assim que se sentiu melhor procurou o sargento, que foi aos superiores e conseguiu permitir que ele ficasse junto aos atendentes no hospital de campanha trabalhando.

Era tudo que o meu amigo queria. Não atuar matando inimigos, mas, ajudando a salvar vidas. Assim, preservaria seus conceitos, não sofrendo contra o que não concordava.

Sorrindo acrescentava que em seu regresso à pátria, começou a estudar medicina e se formou em cirurgia.

Nesse instante, vovô se levantou, foi até uma estante em sua sala, apanhou uns envelopes e um álbum de fotos, e voltou.

Mostrou as cartas que recebia de seu amigo depois que havia emigrado de Portugal para o Brasil. Amizade de mais de quarenta anos.

E no álbum com fotos daquela época, também apareciam algumas recentes que Arlindo enviava para ele. E numa delas, num recorte de notícia de jornal entre mais três pessoas destacava: Dr. Arlindo Pereira Sampaio, renomado cirurgião português recebe comenda da ONU por suas contribuições e estudos na área de cirurgia vascular.

Vovô para pensativo e dirigindo-se a mim como era seu costume quando queria me aconselhar:

— Ele foi um exemplo e serve para nos lembrar que o caráter, uma consciência limpa, bons princípios e persistência num ideal alcançam sucesso e realização.

Eu tinha treze anos e sempre lembro da história do soldado que não queria matar.

 

 

 

LOGLINE DESTA HISTÓRIA

 

Rapaz convocado para a guerra sofre angústia por não concordar em matar.

Após quase morrer, consegue outra atividade atendendo feridos e, no final do conflito se dedica e atinge o sucesso e realização pessoal numa profissão nobre.

O cãozinho aventureiro - Alberto Landi

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