A GRANDE JORNADA - CONTO COLETIVO 2023

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quarta-feira, 6 de abril de 2022

VIAGEM DE NAVIO - Alberto Landi

 



 VIAGEM DE NAVIO

Alberto Landi

 

Um dos meus sonhos era viajar de navio, num cruzeiro, atravessando mares!

O desconhecido para alguns representa o medo, para outros, a fascinação de novas descobertas com suas maravilhas. E quem se aventura a ir onde pessoas jamais estiveram, se torna um afortunado!

Mas aconteceu, e quando subi as escadas, não acreditei que era real.

Foi assim que resolvi embarcar num cruzeiro rumo ao Alasca, partindo do porto de Seattle.

A vantagem de se estar embarcado, é o conforto e a comodidade de ver paisagens lindas e inesquecíveis sem precisar se preocupar com locomoção e hospedagem. A cada parada é possível conhecer pequenos lugares que ainda mantêm estilo de vida pacato e quase isolado do mundo ou lugares movimentados, mas inesquecíveis.

Escolhi o Alasca, porque é terra de superlativos, é o maior estado americano, abriga o maior pico, o maior parque nacional e a maior floresta dos Estados Unidos. Há glaciares mais extensos que países inteiros, baleia Jubarte de até 15 metros e ursos polares de até 500 kilos.

A primeira parada seria em Anchorage, que é a maior cidade desse estado, situada entre a cordilheira do Alasca e as montanhas Chugach.

Ao adentrar, após as formalidades de praxe, me dirigi à cabine, sendo esta com varanda com vista para o mar, garantindo um visual deslumbrante.

A acomodação da cabine era como de um hotel de luxo, possuindo todas as amenities, uma cama com um edredom branco   e toalhas dobradas, imitando cisne!

A janela que ocupava toda a parede mostrava uma paisagem maravilhosa do mar de cor azul e bem lá no horizonte, o encontro com o céu azulado e o sol se escondendo atrás das nuvens, parecia mais um quadro pintado pelo mais poderoso Arquiteto da natureza. Tanto o quarto como a sala de estar da cabine exalavam um perfume de lavanda propiciando ao ambiente leveza e aconchego.

Espaçosa, confortável, com entrada de luz natural, a varanda privativa ideal para relaxar, ler um livro, tomar café da manhã, tinha um bom isolamento acústico, localização distante de espaços de movimentação noturna, como teatros, cassinos e boates, e dos elevadores.

No entanto, estava bem próxima da proa, de forma que se sentia mais intensa a movimentação da embarcação. A cabine não era obstruída por nenhum bote salva vidas ou outra estrutura, porém, é a mais afetada pelo movimento das ondas que à noite embalava o sono

Há a vantagem também de os percursos, entre um destino e outro, serem feitos à noite, enquanto se assiste a ótimas peças  de teatro ou cinema,  ou ainda outras atividades.

Sempre que se aproximava de um porto, havia bandos de aves sobrevoando toda a extensão do navio.

No terceiro dia de navegação, acordei cedo como habitualmente faço e nesse momento, vejo o horizonte e contemplo o seu esplendor com o céu límpido e ainda semiescuro que se estendia até os limites do horizonte, se erguendo ao céu com luzes alaranjadas que se espalharam em um leque vivo de cor intensa que se desvanecia à medida que o sol começava a apontar na vasta imensidão do oceano.

Esses mares do Alasca são frios e perigosos, muitos já se aventuraram em pequenas embarcações e poucos voltaram, não se pode contar apenas com a sorte.

Nesse dia o mar estava calmo e na varanda fui surpreendido com um grande número de peixes voadores, fiquei maravilhado, pois pareciam peixes de prata polida, e ao longe havia tubarões que com certeza seguiam aqueles cardumes.

O sol oscilava na vastidão do oceano e os meus olhos eram capazes de acompanhá-lo lentamente, subindo e descendo majestoso, formando uma ponte de ouro que brilhava na água, quase tocando a linha do horizonte.

De repente, um ciclone surgiu em nossa rota, tornando a navegação complicada, ondas gigantescas e ventos fortes apareceram, fazendo a embarcação inclinar para ambos os lados; isso continuou até o entardecer.

Um nevoeiro se fez e foi preciso fazer desvio de rota. Conforme o nevoeiro se dissipava, nos deparamos com uma enorme parede glacial que mais parecia um território desconhecido e inexplorado.

Nessa enorme parede glacial jamais foi encontrada uma abertura, quaisquer fissuras ou promontórios em sua face que permitisse adentrar.

Parecia que estávamos navegando em um círculo fechado, essa parede glacial se estendia muito mais além do alcance de nossas vistas, circundando e mantendo juntas as terras continentais para as quais tenham sido fixadas desde a criação.

Enfim, foi a mais espetacular viagem que fiz em toda minha vida!


É aqui que eu quero morrer - Hirtis Lazarin

 



É aqui que eu quero morrer

Hirtis Lazarin

 

Finalmente, eu e o taxista chegamos ao topo do penhasco, mil seiscentos e quarenta e cinco metros acima do mar.

O caminho irregular e cheio de curvas estreitas, uma serpente negra e lisa incrustrada no verde da natureza viva.

A chuva fraquinha se fora e a lua crescente, num sorriso quase cheio, apareceu entre nuvens velozes e iluminou-nos com uma luz incerta.  Um punhado de estrelas surgiu e o céu concluiu sua rotina de escurecer.  Noite suave e serena.  Apenas o cri-cri-cri dos grilos invisíveis e a cantoria de uma nota só das cigarras.

Era só o que eu queria quando deixei o trabalho, a cidade grande e mil problemas não resolvidos.

A pousada que escolhi era de madeira. Além do aconchego, a madeira proporciona conforto térmico, deixando o ambiente fresco no verão e aquecido no inverno. Rodeada de salgueiros e hortênsias mais parecia um ateliê de artista.

Adormeci com os pássaros e assim que o clarão da manhã primaveril entrou no quarto por vacilo das cortinas mal-ajeitadas, saltei disposto a desfrutar cada pedacinho daquele vilarejo medieval.

À primeira vista, “COLFOSCO” cabia num só olhar.  Mais parecia um quadro ou um cenário fotográfico.  Uma paisagem com charme pitoresco que guarda um patrimônio: a história, a arquitetura, as belas paisagens e a cultura do país, uma vez que nos remetem à Idade Média.

Passar por essas estradinhas é voltar séculos no tempo. São ruínas de pedras, o castelo construído no século XIII, o monastério dos monges beneditinos, fileira de casas de pedra com telhas vermelhas próximas umas das outras e ruas sinuosas de paralelepípedos. Elas sobem até o relógio da torre, no coração daquele paraíso.

Era domingo e a missa do padre Piero durou mais de uma hora. No lado leste da igrejinha, a sombra adocicada de uma castanheira em floração tolera crianças irrequietas de bochechas vermelhas que correm e gritam alto à revelia dos pais.

Do alto do penhasco, pode-se ver o mar preguiçoso em seu momento de calmaria. Não pretende espantar o bando de gaivotas famintas que caminha indiferente ciscando entre as pedras.

E, pra encerrar a noite, há uma festa gastronômica regada a vinho produzido no local.

Já se passou uma semana e eu não sinto vontade de voltar. Angustia-me esse pensamento.  Voltar ao mundo complicado do progresso que nos trouxe maravilhas, é verdade, mas engoliu a simplicidade, o equilíbrio e a capacidade de viver com menos coisas e mais tempo.

É impossível fugir dessa ciranda traiçoeira.



Imigrando - Henrique Schnaider

 


 Imigrando

Henrique Schnaider

 

Rodolfo Crespi conheceu Mirna durante a viagem do imponente Vapor Conte Grande ao Brasil, trazendo dezenas de imigrantes italianos. Durante esta viagem, o amor típico italiano, explodiu em duas pessoas, Rodolfo e Mirna. Nada os impedia de se unir em matrimônio. Como era costume da época, pediram ao Capitão do navio Senhor Giovanni que os casasse e sob intensa emoção e encantamento, a cerimônia foi realizada.

Chegaram da Itália no ano de 1920. O navio branco levado pelo rebocador, encostou no Porto de Santos, soltando suas grossas amarras para que, aqueles negros estivadores lustrosos, com os dorsos amostra, suados com o calor do sol do meio-dia, prenderem firme    aquele imenso Vapor.

Na chegada, a emoção tomou conta de todos os passageiros. Na sua maioria vindos da Itália. Cantavam muitas músicas da saudosa terra natal. América! América! Lágrimas rolaram nos rostos grosseiros de lavradores que trabalhavam a terra na região de Puglia.

Depois de todo trabalho para passar na Alfândega e na Imigração, pegaram um trem da Cia Paulista de Trens em direção a São Paulo. Viagem que pareceu uma eternidade, até chegarem na Estação da Luz. Rodolfo e Mirna foram de ônibus para o bairro da Mooca, veículos estes, que haviam recentemente substituído as carroças.

Foram morar no bairro da Mooca numa pensão barata que pertencia à italiana Bruna, fofoqueira de primeira, uma chiveta como diziam os italianos. Os primeiros meses foram muito difíceis para o casal de imigrantes. Tinham alguma reserva para viverem de forma bem simples.

Depois de um ano de muito sofrimento e uma vida dura, Mirna grávida do primeiro de seus 10 filhos, (O italiano era fogo na roupa). Assim, cada ano nascia um filho Maschio. Conseguiu comprar, com muito sacrifício, a barraca de frutas do seu conterrâneo Aristide, que queria se aposentar.

Rodolfo era muito alegre e comunicativo. Buscava frutas muito bem escolhidas no Mercado Central. Montava a barraca às seis horas da manhã. Logo nos primeiros raios de sol. Os primeiros clientes chegaram. Rodolfo cantava as músicas da velha Itália e, ajudado por Mirna com aquela barrigona, prestes a dar à luz ao primogênito Armando, vendiam as frutas. O burburinho já era grande de pessoas indo e vindo. A gritaria dos feirantes era enorme e cada um querendo vender o seu produto. Pega três e paga duas, leva uma dúzia paga só 6. O aroma era uma mistura enorme do cheiro de frutas da estação, verduras e legumes. Era uma alegria só, e a feira ia até as 13,30 horas. No final era a hora da xepa.  Hora de comprar barato, tudo liquidando.

O paisano conhecia este trabalho como poucos. Desde as plantações e colheitas de frutas lá da sua amada Puglia. Assim a vida foi melhorando e a barraca aumentando e o dinheiro entrando. Depois de dois anos de trabalho intenso, Rodolfo comprou sua casinha de pintura fresca cheirando a tudo novo. O casal não cabia em si de tanta felicidade.

Os anos foram passando, a família aumentando. Além da feira, Rodolfo começou a frequentar o Clube Atlético Juventus. Tempos depois, tornou-se o Presidente do Clube. Barraca de frutas indo cada vez melhor e a família tornou-se abastada.

Rodolfo e a esposa Mirna e os dez filhos presenciaram uma homenagem que o Clube Juventus fez. Condecorou Rodolfo com o título de Conde e o Estádio do Clube Atlético Juventus, passou a se chamar, Estádio Conde Rodolfo Crespi.

A idade foi chegando para o velho imigrante italiano. Assim finalmente com muita tristeza, depois de cinquenta anos de muito trabalho naquela feira. Onde todos os feirantes e os clientes, tornaram-se uma grande família de imigrantes italianos e após centenas de feiras realizadas.

O filho primogênito Armando, passou a tomar conta da barraca de frutas, estabelecida no querido bairro da Mooca. Quanto ao Conde Rodolfo e a esposa Mirna, depois de uma viagem nostálgica a querida Puglia, começaram a usufruir da merecida aposentadoria, ambos já próximos dos noventa anos.  


ÉVORAMONTE - Alberto Landi

 


ÉVORAMONTE

Alberto Landi

 

No Alentejo há vilarejos charmosos e muitas maravilhas naturais; cenários inesquecíveis que ficam ainda mais incríveis ao pôr do sol.

Évoramonte, situado nas planícies verdejantes, são imensas de perder de vista. Ela é salpicada por sobreiros e colinas, com casas caiadas de branco criando paisagens deslumbrantes.

 Alguns vestígios megalíticos são vistos também.

É possível vislumbrar no alto da colina, a vila protegida pelas muralhas, casarios caiados de branco a contrastar com a cor castanha da fortaleza e de onde se destaca a Torre de Menagem.

Ao subir a colina, o visual começa a mudar, sendo provável admirar do alto toda a beleza da planície alentejana e ate um lago com pequenas ilhotas.

É uma vila charmosa, que fica em posição perfeita para observar o por do sol. Em dias claros pode se visualizar a Espanha.

É protegida por muro alto, espesso e extenso para defesa da fortaleza, com ruazinhas de pedra e casinhas brancas, parece um conto de fadas!

Campos, vinícolas e muito verdes rodeiam o vilarejo, que está localizada próxima a Evora.

No seu ponto mais elevado fica o castelo. Dentro da muralha, metade da área é de gramado, vegetação e ruínas.

Sua construção é estimada por volta de 1160 após a reconquista cristã aos mouros. Seu estilo limpo e simples mistura elementos do gótico com o renascentista de inspiração italiana. Canhoneiras e frestas de tiro guardavam a vila.

Ao adentrar, é como se fizéssemos uma viagem ao passado, as ruas de xisto negro a contrastar com branco das paredes das casas e os apontamentos medievais bem conservados, é como se o tempo tivesse parado nesse lugar.

O castelo e a cidade murada, outrora, tiveram elevada importância geográfica e militar. O paredão de 5 lados, tem uma forma quase triangular.

Encerrar o dia, é realmente mágico, garante um por do sol, fascinante e perfeito, refletindo tons de amarelo, laranja e vermelho na planície.

Contemplar o poente nas planícies alentejanas, é um verdadeiro presente para os olhos!

 

 

Fontes: anotações pessoais e leitura de vários sites


A Praça - Adelaide Dittmers

 


A Praça

Adelaide Dittmers

 

A praça deitava-se languidamente sob um sol morno de primavera.  Flores de todas as cores salpicavam o extenso e macio gramado.  Árvores espalhavam-se pelo belo jardim, oferecendo as sombras generosas àqueles que as quisessem desfrutar.

Bancos distribuíam-se pelos os largos caminhos, que a cortavam, onde pessoas sentavam-se para admirar o lugar ou para ficar imersas em suas leituras. No centro do gramado, crianças corriam para lá e para cá, respirando liberdade e prazer, como só os pequenos sabem usufruir de maneira plena e sem freios.  Algumas delas desciam velozmente pelos escorregadores ou balançavam-se tão alto, como que almejando chegar ao céu.  Subiam e desciam no trepa-trepa e seus gritos de alegria ecoavam por todo o canto.

Sob uma frondosa árvore, uma família estendeu uma toalha, em que colocou várias iguarias e acomodou-se para apreciar a paisagem, gozando de um saboroso picnic.  Conversavam e riam animados, com certeza esquecendo os problemas do quotidiano.

Mais adiante, um homem de cabelos longos e desgrenhados, vestido com roupas rotas e sujas, dormia ao lado de uma garrafa vazia.   O que será que o levou àquele estado?

Cães passeavam com seus donos, felizes pelo passeio, rosnando e latindo para outros, que por eles passavam ou aproximando-se para cheirá-los, abanando o rabo numa tentativa de reconhecimento.

Bicicletas, patins e skates deslizavam, atravessando a praça de ponta a ponta;

Dois senhores de idade avançada andavam devagar, apoiados em suas bengalas, lançando olhares nostálgicos à vida que se derramava pelo jardim e que aos poucos lhes fugia.

Um casal de papagaios passou ruidosamente pelos ares, chamando a atenção dos frequentadores, que apontavam para eles, mostrando às crianças aquelas aves tão simpáticas e barulhentas.

No alto de uma árvore, um bem-te-vi entoou seu belo canto, enquanto bem abaixo, um beija-flor sugava o pólen de uma flor.

As horas foram passando e a tarde vestiu-se com os tons alaranjados, rosas e lilases do pôr-do-sol.  O deslumbramento pelo espetáculo, que anuncia o fim do dia, tomou conta do coração de todos, fazendo-os se sentir parte daquele momento mágico, que a natureza proporciona.

Aos poucos, o lugar foi ficando vazio e solitário e quando a noite chegou de mansinho com sua roupagem estrelada e prateada pelo luar, a praça adormeceu placidamente embalada pelo silêncio.


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