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domingo, 11 de fevereiro de 2024

O pulo do leão - Hirtis Lazarin

 



O pulo do leão

Hirtis Lazarin

O caminhão cambaleava na estradinha de terra escorregadia e esburacada por conta das chuvas que chegaram exageradas após metros e mais metros de orações.  Tião partiu de última hora e não teve tempo de escolher o melhor caminho. Abandonou o prato quase cheio na mesa do almoço, arrancou uma camiseta do varal e quase esmagou o gato que atrapalhou sua passagem. Só após estar dentro do caminhão, percebeu que faltava a chave. O atraso provocou-lhe meia dúzia de palavrões cheios de ódio.  

Arrancou o veículo da garagem descoberta, arrastou a bicicleta do sobrinho e derrubou um balde cheio de água ensaboada. O piso cobriu-se de espumas e ficou escorregadio. Em meia hora, estava longe da cidade.   

Até agora, eu não vi no caminho nenhuma placa de trânsito e, realmente, não sabia se o motorista sabia pra onde estava indo.

Parecia que confrontava a sorte e quem confronta a sorte é muito corajoso ou já desistiu da vida.

Os pneus carecas e a carroceria que já foi envernizada e polida estava carcomida. Das letras garrafais que compunham o nome da família, desenhadas na madeira, só sobravam o “S” e o “A”. O caminhão era tão idoso quanto o pai de Tião, a única herança que o velho lhe deixou.

À medida que anoitecia, a mata que acompanhava a estrada foi ficando cada vez mais densa e fechada. O ruído feliz dos pássaros e o andar cauteloso dos animais acomodaram-se. A natureza é pontual nos seus compromissos.

O motorista acendeu os faróis, mas não funcionou. Desligou o motor, abriu a porta, cautelosamente, e só desceu após conferir todos os lados. Mexeu daqui e dali, mas nada mudou. Fez o que pode intercalando o fazer e o xingar. “Afinal não sou eletricista”. Foi a explicação que confortou seu coração naquele momento.

Se a velocidade do carro já era bem reduzida por conta do mau estado de conservação do caminho, agora, sem farol, a complicação dobrou. Não seguiu em frente.

Tião sentiu sede e fome. Virou e revirou a cabine em busca de uma sobra de alimento esquecido no banco, no meio de peças de roupas e papéis misturados. Nada.

Escuridão, fome, solidão…

A sensação era de perigo e a coragem do homem, que não era uma coragem tão grande assim, ouviu um rugido cada vez mais próximo. A esperança de que o animal não sentisse o cheiro de homem- por- perto foi por água abaixo. Dois olhos brilhantes e uma boca faminta aproximaram-se silenciosamente. 

Tião só conseguiu enxergar quando a fera parou à frente do caminhão. Enorme e cheia de dentes. Ele conferiu a maçaneta das portas. Frouxas, há muito tempo. Amaldiçoou a falta de dinheiro e a falta de zelo, indispensáveis na manutenção de um veículo.

O leão sondou o ambiente, deu um salto espetacular e alcançou o capô. Cheirou demoradamente o para-brisa, grudou o focinho no vidro e prendeu os olhos nos olhos de Tião. Tião não sentiu medo quando ficou responsável por levar o dinheiro roubado num caminhão caindo aos pedaços. Diante da fera desmaiou.

O dia amanheceu e Tião acordou agitado, com as mãos algemadas e rodeado de policiais.

 

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