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domingo, 10 de dezembro de 2023

O PODER DA INVISIBILIDADE - Leon Alfonsin Vagliengo

 


O PODER DA INVISIBILIDADE

Indignidade ou Pragmatismo?

 

                                                                                                                               Leon Alfonsin Vagliengo

 

 

Introdução: O ANEL DE GIGES

 

Conta Platão, no capítulo II de seu livro “A República”, que em época remota, na Lídia, um pastor de nome Giges encontrou um anel de ouro no dedo de um esqueleto humano gigante, após um terremoto, em uma fenda que se abrira no solo, próximo ao local onde ele apascentava ovelhas.

O anel, ele logo descobriu, possuía o poder de tornar invisível quem o utilizasse e, conforme a fábula, Giges, que era um homem comum até então, começou a fazer mau uso de seu novo poder, e perpetrou atos infames, até mesmo o de assassinar o rei da Lídia e ocupar seu lugar no trono.

 

Considerações:


Vemos, com esse mito platônico, que é bem antiga a atração do ser humano pelo anonimato, por permitir fazer o que se quer sem que ninguém saiba.

E o que se busca com o anonimato?

Certamente, o anonimato garante a invisibilidade na realização de qualquer ato, considerando-se que invisível é “aquele que não é manifesto, que não se deixa conhecer”. Portanto, não se trata, necessariamente, de uma invisibilidade física.

Com esse entendimento, o que significa e o que se busca com a invisibilidade?

Mas antes, um parêntese: "O conceito de Invisibilidade Social tem sido aplicado para referência a seres socialmente invisíveis, seja pela indiferença, seja pelo preconceito dos demais, o que nos leva a compreender que tal fenômeno atinge tão somente àqueles que nunca são lembrados, por estarem à margem da sociedade!". Nesta concepção, é, portanto, tema para estudos e ações de Justiça Social.

No entanto, voltando a esta abordagem suscitada pelo Anel de Giges, vemos que tem foco no comportamento humano decorrente de conceitos como cultura, religião e moral, educação e aprendizado, ética e dignidade, medo de punição ou vergonha do erro, num conjunto complexo, todos esses itens interagindo e operando na formação da personalidade e do caráter do indivíduo.

É o conjunto de normas e regras formadas com base na cultura, religiosidade e nos costumes de determinado grupo social, que servem para definir a moral desse grupo e orientar a maneira de agir das pessoas dentro daquele contexto específico.

O tema da moral está, portanto, diretamente ligado aos aspectos culturais do grupo social que a forja, a pensa e a pratica.

Por conta disso, estamos falando de um conceito de caráter particular, que se baseia, sobretudo, em hábitos e costumes válidos para cada comunidade.

Os valores morais são importantes porque geram uma vida em sociedade mais harmoniosa e justa. Normalmente, começam a ser transmitidos para as pessoas desde seus primeiros anos de vida, através do convívio familiar ou até mesmo no ambiente escolar.

Desde tenra idade o indivíduo aprende conceitos de ética, ao ouvir na prática reflexões sobre a moral e sobre os princípios que sustentam e orientam as ações humanas.

Aprende, também, que há algum tipo de castigo pela infringência das regras, e com o tempo percebe que as regras impõem limites a suas ambições de poder ou de riquezas, a seus desejos mais íntimos ou vingativos, enfim, a qualquer de seus desejos de agir fora das regras impostas pela moral de sua comunidade.

A invisibilidade, então, pode ser a solução para propiciar a realização desses anseios que extrapolem as regras. Se ninguém souber, ou se ninguém souber que foi ele, apenas a sua consciência poderá censurá-lo ou até castigá-lo.

É sob a poderosa proteção da invisibilidade que surge o conflito interno, quando vencerá a força preponderante da formação de cada indivíduo, que sopesará a tentação que se apresenta contra a rigidez de sua formação ética, e esta revelará a própria qualidade e higidez da educação por ele recebida.

Este conceito nos permite entender a importância de regras morais boas e justas e da educação bem orientada na formação do caráter das pessoas.

Em conclusão:

Neste início do século XXI vivemos em um mundo cada vez mais globalizado, especialmente pela ação da internet que, pela disseminação e vulgarização das informações, contribui acentuadamente para a descrença de conceitos morais e religiosos, com isso provocando o desgaste da austeridade e do compromisso ético.

Por exemplo, no plano religioso: será que alguém ainda acredita na punição do inferno? Ou, então, quantos nem acreditam numa vida posterior, que poderá ser prejudicada por ações cometidas nesta?

Essa descrença se repete em outras áreas, especialmente alimentada pelas decepções na política e na justiça social.

Parece que o mundo atual é o império da mentira, nada é confiável.

Para muitos resta apenas o “aqui se faz, aqui se paga”, mas somente se alguém descobrir o que se fez.

Temos, assim, o cenário ideal para empoderar a invisibilidade.

Se a tentação for grande e a invisibilidade garantir a impunidade, cada vez menos haverá dilemas morais ou formação ética que impeça aos indivíduos o cometimento de ações incorretas ou vergonhosas de qualquer espécie.

De alguma forma, a humanidade precisa estribar o conceito de dignidade, como ensina este pensamento:

A moral, propriamente dita, não é a doutrina que nos ensina como sermos felizes, mas como devemos tornar-nos dignos da felicidade.
- Immanuel Kant

 

 

 

 

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