A GRANDE JORNADA - CONTO COLETIVO 2023

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quinta-feira, 25 de maio de 2017

Qual o bem maior? - Ana Catarina SantAnna Maues

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Qual o bem maior?
Ana Catarina SantAnna Maues

       Helena fazia mestrado em  Antropologia. Quando  debruçava-se nas pesquisas não  percebia as horas passarem.  Já muito havia lido sobre estranhas civilizações com hábitos curiosos, mas a leitura que agora fazia da comunidade  Kuruguá,  chamou-lhe  atenção,  devido eles considerarem a fertilidade como bem maior,  valorizando-a de forma  rígida. Antigos nômades que eram, caminhavam procurando  terras para coleta, caça, pesca,  e a proliferação dos membros da comunidade.  Quando encontravam uma bela planície fixavam-se, aspirando que fossem férteis. As mulheres tinham como única função a reprodução, e assim como a terra, caso  não produzissem, eram exterminadas. Elas necessariamente tinham que mostrar seu rebento dentro de um ano após o acasalamento com os machos reprodutores.  Mulheres e terra deveriam ser fartas. O ritual de aniquilamento,  era semelhante, realizado minutos antes da comunidade partir em busca de um novo lugar para fixarem-se.  Eles reuniam-se  e jogavam em toda aquela terra uma substância avermelhada, a mesma que as mulheres inférteis deveriam  beber, estando amarradas ao tronco de uma árvore sem fruto. Depois de alguns instantes, iniciava um calor abrasador por todo o local umedecido com o tal líquido, e tudo começava a queimar. Da terra incandescente apareciam labaredas. Os corpos das mulheres  iniciavam a queima  de dentro para fora, seus gritos podiam ser ouvidos a distancia.  Mulheres e terra ardiam e consumiam-se num fogo reparador, assim pensavam.


Homens, mulheres e as crianças, deixavam o local sem olhar para trás. Quando encontravam água banhavam-se, julgando estarem libertando-se de toda infertilidade do antigo lugar.  Bem longe dali iriam por certo encontrar outra planície para assentar.

O furação - Henrique Schnaider

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O furação
Henrique Schnaider

Era o final das férias de Ana, benefício pelo qual lutara tanto nos últimos anos, mas que pelo excesso de trabalho, tantas vezes fora adiado.

Ainda lhe restariam alguns dias diante daquela beleza natural. De um lado a mata virgem provendo o espaço de ar puro e muitos pássaros, de outro, o mar que lhe oferecia oportunidade de manter os pés na areia, e aquele horizonte sem fim onde se encontram céu e mar.

A antiga casa dos pais, nessa praia quase deserta com grande extensão de orla para caminhar pelas manhãs, tem sido seu refúgio sempre que consegue folga.

A jovem Ana estava sozinha na praia quando soube que se aproximava um furacão.

Ana sentiu certo pavor e por alguns momentos manteve-se estática, sem reação. Depois, os pensamentos já se embolavam na mente e a situação já era de verdadeiro desespero  e aflição...

Ana lembrava-se de quantas vezes, esteve naquela casa, junto com seus pais e irmãos, desde os seus cinco anos de idade, ela passava suas férias de verão e ainda tão jovem, conheceu Paulo, amigo de seu irmão e com o passar do tempo acabaram se apaixonando e namorando.

Como são todos os jovens, pouco precavidos, Ana acabou engravidando, mas ambas as famílias foram compreensivas e curtiram muito a gravidez e finalmente nasceu Aníbal, criança linda, que deu muita alegria a todos.

Os jovens Ana e Álvaro casaram-se e acabaram formando uma família linda.

Ela acabou se formando engenheira,  e Álvaro formou-se em Medicina. Ambos  alcançaram sucesso  nas profissões e conseguiram ficar bem financeiramente .

Na segunda gravidez foi uma felicidade geral e ela conseguiu uma licença maior, e foi curtir a sua maternidade na velha casa de pais na praia, o marido descia para encontra-la nos finais de semana.

Passados alguns dias o noticiário da televisão comunicou  que se aproximava um furacão naquela região. Subitamente, houve queda de energia e o sinal telefônico foi a zero, interrompendo todas as possibilidades de comunicação. A jovem engenheira passou rapidamente os olhos pelas colunas da velha construção,  tentava avaliar se a sua casa antiga resistiria à fúria dos elementos.

Lembrou-se do porão, lugar de esconderijo das crianças nas férias. Resolveu se esconder lá, pois lhe parecia mais seguro naquele momento E lá naquele subsolo escuro e abafado manteve-se trêmula aguardando a passagem da tempestade.

A hora não passava.  Tateava na escuridão a estrutura, e a casa muito bem construída, resistia bravamente.  Os pensamentos iam e vinham os dois filhos, o casamento tão bem afinado, a carreira de engenharia tão desafiadora, a infância que agora brotava no breu do porão com irmãos e primos se escondendo ou brincando com as ferramentas e redes do pai. Muitos planos ainda por realizar, e outros tantos que lhe brotavam.


Lá fora os ruídos iam aos poucos reduzindo. Sentiu que o tremor da construção estancou. Finalmente o furacão, transformou-se em apenas uma tempestade tropical. Ela subiu vagarosamente a pequena escada de madeira e viu-se no quintal arrasado  pela ventania. A pequena jaqueira resistiu firme guardando seus segredos de menina. Ela sorriu aliviada. Tratou de correr ao telefone e conseguiu comunicar-se com o marido. Naquele momento sentiu  que ainda teria um futuro brilhante pela frente.

Vida de Rei - Henrique Schnaider

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Vida de Rei
Henrique Schnaider

Desde filhotinho o leão Hercules aprendera que a vida era dura para ele, e através dos ensinamentos da  leoa Dinda, sua mãe aprendera a sobreviver juntamente com seus três irmãos .

Ele aprendeu a localizar, perseguir e finalmente abater  a presa. Mas, já na fase adulta ele teria que seguir seu caminho sozinho,  e exatamente foi o que fez, procurando uma fêmea para também formar um novo bando. Em sua procura persistente, finalmente encontrou uma bela leoa, Antígona e depois de muita insistência a leoa cedeu aos seus encantos e deu sequência à natureza e formando um novo bando com quatro filhotes do qual era o garboso chefe alfa.

Mas, esta posição na hierarquia  do seu grupo, exigia muitos esforços de sua parte, para defender seu território de possíveis rivais que constantemente o desafiavam, tentando tomar sua posição de chefe alfa.

Havia uma procura incessante por alimentos, obrigando-o a caçar de forma intensa. Hercules estava desesperado de fome e procurava algo para suprir seu bando. Andava no meio da selva africana quando finalmente abateu um gnu, só que o que ele mais temia aconteceu, e um bando enorme de hienas aproximou-se, famosas por sua ferocidade e apetite,  acabaram entrando numa luta feroz com o felino em uma disputa sobre a carcaça abatida do animal.

Finalmente Hercules, inferiorizado e levando nítida desvantagem, na luta quando já pressentia sua eminente derrota, resolve por instinto de sobrevivência, se afastar e bate em retirada, o garboso leão abandona o gnu abatido e resolve se embrenhar na mata para recomeçar a eterna procura de alimento para a sua família.


Conforme andava percebeu próximo, a sua fêmea e seus filhotes que o seguiam e neste momento sentiu sua responsabilidade, pois todas aquelas vidas dependiam da sua grande capacidade de conseguir alimento para que sobrevivessem.


O ego de rei da selva se elevou dentro dele, o peito inflou, e o instinto caçador se evidenciou em Hercules. Logo teriam com o que se alimentar.

A sogra - Ana Catarina SantAnna Maues


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A sogra
Ana Catarina SantAnna Maues

       Eles queriam casar, mas precisavam de uma ajudinha. A sogra de Laura dizia sempre que podiam contar com ela, mas a ajuda financeira não vinha nunca, e os preparativos não tinham início,  até que desistiram de esperar e com economia própria casaram.

      Na humilde casa alugada podia não ter nada, mas o clima de amor, companheirismo e união entre o casal era visível, o que despertava ódio mortal na mãe de Fábio, que arquitetou um plano para causar discórdia entre eles.  Passou a  ir todas as tardes, ter um dedinho de prosa com a nora. Nas visitas, as duas conversavam, tomavam chá, assistiam  tv, mas ela sempre  ia embora antes do filho chegar do trabalho.   Quando o marido chegava,  Laura dizia:

— Sua mãe esteve aqui!

E ele estranhava por não tê-lo esperado. Com o tempo, este  fato  o incomodou, e ele foi ter com a mãe, indagar sobre a conduta, que ela aproveitou e inventou diversas mentiras a respeito da nora,  dizendo que  visitava para demonstrar amizade, mas ela a deixava sozinha na sala; que as vezes chegava e  sabia que  estava em casa, mas não lhe abria a porta; noutras ela até entrava, mas a nora logo a enxotava dizendo estar ocupada. Ele acreditou na mãe e indignado, chegando em casa brigou com a esposa, que perplexa chorou muito, sofrendo sem entender porque que  havia inventado coisas tão terríveis. Laura foi criada em orfanato, por isto transferiu para a sogra o amor filial que guardava. Em profundo abatimento calou-se. Não abriu a boca em defesa própria. Em sua confusão mental  estaria agredindo a mãe biológica que não conheceu.

      No dia seguinte, a sogra foi à casa deles no horário de costume, e  mal a porta abriu, falou rispidamente:

— Você não vai roubar meu filho!

      Laura tímida, com autoimagem fragilizada, estava confusa diante daquela pessoa tão significativa, que de uma hora pra outra  mostrava-se  perversa, dissimulada,  e pior, com poder de fazê-la perder o único bem de toda sua vida, Fábio.

     — Se quer continuar casada, disse a sogra,  vai ter que fazer tudo o que eu mandar. Amanhã cedo você vai à minha casa, assim que meu filho sair pro trabalho,  limpa-la, depois cozinhar, lavar e passar minhas roupas, só depois vem cuidar da sua, se der tempo! E caiu na gargalhada.

          E assim passou a ser a rotina de Laura. À duras penas dava conta das duas casas, sem nada revelar ao marido. Essa situação a deixava exausta. Nos domingos não tinha  ânimo para nada, o marido reclamava de sua apatia, mas a amava tanto que logo arrependia-se de ter reclamado. Ela respondia com silêncio. E o domingo passava insípido e sem graça.


         Os dias  passavam e nada mudava. Laura cada vez mais fraca, muito pálida e abatida, começou a emagrecer e acabou doente. Até que um dia caiu na rua e foi hospitalizada. O  médico chamou os familiares e avisou  que ela estava no último estágio de leucemia. Fábio ficou louco com a notícia. Inconsolado abraçava a mãe no hospital e pedia que rezasse por Laura,  pois se morresse, ele também morreria. Infelizmente nada mais podia ser feito, Laura depois de alguns dias  morre e com a notícia, em ato desesperado, Fábio se suicida.

Quando o amor nos move - Henrique Schnaider


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Quando o amor nos move
Henrique Schnaider

John era um rapaz tranquilo que viveu a infância e adolescência nos subúrbios de Londres.

Tinha  todos os sonhos de um jovem de classe media londrino indo morar no centro da cidade.  Durante seus estudos,  como gostasse muito de jogar futebol, e por sinal jogasse muito bem, resolveu fazer uns testes no Clube mais famoso da cidade, o Manchester United.

O técnico viu naquele jovem brilhante, um futuro promissor e o convidou para fazer parte do time.

John teve uma carreira meteórica e em pouco tempo, era muito festejado pela torcida. Já era muito famoso quando conheceu Elaine. Tiveram um romance tórrido e decidiram morar juntos.

Tudo ia muito bem entre os dois, porém devido a sua fama, era muito assediado e acabou não resistindo aos encantos de Alice, mulher linda, dotada de um corpo escultural.

John levou por um tempo aquela situação dupla, até que um dia Elaine descobriu no celular a traição de John e terminou tudo com ele.

Ele a amava muito. E de repente lhe veio o sentimento de perda, e reconheceu que não foi inteligente de sua parte o envolvimento carnal com Alice. Estava arrependido,  doía-lhe a separação. Naquele dia saiu de casa sem rumo, sem nenhuma esperança de que Elaine reatasse com ele. Tudo agora parecia um nada, e John que tinha o corpo atlético e musculoso, agora parecia franzino e arqueado,  tinha a cabeça baixa e caminhava visivelmente perturbado.

O desespero levou-o ao Tâmisa, e depois à ponte. O fim daquela união parecia marcar também o seu próprio fim. E, parado ali na ponte, olhando para as águas que passavam afoitas, atirou-se na tentativa de morrer.

No momento em que tocou nas águas, para sua sorte, passava uma lancha no local, que o recolheu e o salvou.

O atleta famoso arrependeu-se do gesto tresloucado e voltou para a casa de Elaine dizendo-se arrependido e pedindo para voltar, implorando pelo seu perdão e ela muito emocionada, resolveu perdoa-lo e depois de um longo beijo, resolveram voltar a viver juntos.


Formaram uma família bonita, tiveram três filhos e John teve uma longa carreira. Hoje é técnico do time famoso,  onde dois de seus filhos já treinam nos times de base e têm tudo também para uma bela carreira no futebol.

Dupla personalidade - Henrique Schnaider


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Dupla personalidade
Henrique Schnaider

Antônio era um ator famoso de novelas e estudava seus personagens de forma profunda, assumindo-os de tal maneira, que isso começou a influenciar sua personalidade.

Ele era casado com Lilian e tinham cinco filhos lindos, mas vivia uma vida de sonhos.

Nesta ultima novela seu personagem Álvaro era um homem dominador, poderoso, que se apaixona por Bianca, representada pela atriz famosa Alice dos Santos, com muitos anos de carreira.

No enredo, Álvaro levou muito tempo para conquistar Bianca, filha de um rico fazendeiro, que fora criada como um bibelô por seus pais e acabou se tornando muito mimada e geniosa, e acaba não resistindo aos encantos de Álvaro que acabou por pedir a mão de Bianca em casamento, que aceitaram imediatamente. O namoro foi de vento em popa.

Fora do enredo, Antônio começou a sentir-se atraído por Alice, que por sua vez correspondeu ao interesse dele, e as cenas românticas da novela começaram a ficar quentes.

O caso começou a ficar sério, colocando em crise os respectivos casamentos. Com o correr dos dias, começaram os desentendimentos cada vez maiores entre Antônio e Alice.

Depois de muitas brigas o casal caiu na realidade e percebeu que na verdade quem estava apaixonado era Álvaro por Bianca e, respectivamente, ela por ele. Perceberam que  ambos os atores haviam assumido os personagens da novela em que eram os protagonistas trazendo-os para realidade, provocando toda aquela situação perigosa quase destruindo seus casamentos.

Voltaram às gravações, agora muito mais comedidos e levaram seus papeis numa boa, sem mais nenhuma confusão.

Finda a novela, ambos resolveram dar um tempo com as representações  e procuraram cada um o seu analista para ajudá-los com a confusão de sentimentos que as novelas provocavam neles.

Quanto aos seus casamentos, se solidificaram e melhoraram seus relacionamentos aparando as arestas, voltando a vida normal de felizes casais no melhor momento de suas vidas.


sexta-feira, 19 de maio de 2017

Deus demora, mas não falha. - Ana Catarina SantAnna Maués


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Deus demora, mas  não falha.
 Ana Catarina SantAnna Maués

             Yolanda, mais conhecida como dona Landinha, era uma moça velha muito alegre. Já beirava os sessenta. Sempre viveu na casa onde nasceu, por isso os vizinhos já sabiam como era o cotidiano dela. Todos os dias saia cedo de casa para participar da santa missa, não importando o tempo. Chovesse ou fizesse sol, a simpática moradora da casa de número oitocentos e noventa e seis, estava a caminho da igreja, que não era tão longe, mas também não era tão perto. Passava, dando um bom dia festivo, e as vizinhas linguarudas comentavam:
              Ela nunca casou?
             Que eu saiba não!
            — Eu a conheço desde menina. Ela era muito linda. Até hoje podemos notar.   Não sei bem a sua idade, deve ter a minha, pois em criança brincávamos juntas com a meninada.
               _ Ela nunca namorou? Perguntava mais uma vizinha curiosa.
               _ Claro que não! Ela gostou muito de um coleguinha nosso, mas nunca soubemos se foi correspondida.
                 Landinha sabia que era alvo de comentários deste tipo, porém não se importava. De coração puro, entregue às coisas de Deus, os cochichos que  as vezes vinha saber, não causavam-lhe surpresa,  sempre dizendo que era falta do que fazer.   Ela nem imaginava que ali bem próximo, existia um homem, mais ou menos da sua idade, que nutria por ela grande amor.  Chamava-se Diogo.
              Diogo era contador, recente aposentado da firma FSTransporte, que se acostumou à rotina de acordar cedo para o trabalho, e dizia quando lhe perguntavam, que adorava ver o sol nascer, mas na verdade o que ele queria mesmo, era ver Landinha passar em frente à sua casa, embora ela nem soubesse da sua existência.
             Acredito que o destino já tinha marcado, vai ser hoje.
             Diogo como de costume, esperava vê-la passar.  Lá vem ela, disse, e de repente debaixo da janela, ela caiu. Mais do que depressa ele correu para acudi-la. Aconteceu uma troca de olhares apaixonado. Ele ao levanta-la do chão e ela por se deixar carregar por um homem elegante e lindo.
         Não demorou meio ano para realizarem o que ambos já desejavam. Ele, casar depois de aposentado, e ela, como dizia para as amigas, pedia sempre na hora da comunhão, que Jesus lhe enviasse um bom homem para casar. Agora agradece o marido que Deus lhe deu dizendo:

         — Não precisava me jogar no chão meu Jesus!  

Consulta médica - Ana Catarina SantAnna Maues


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Consulta médica
Ana Catarina SantAnna Maues

Sr. Sebastião, um nortista, estava  recente na cidade  de São Paulo, hospedado na casa do filho, Cláudio,  para uma consulta médica.                                              
            Que cidade fria! Reclamava seu Sebastião desde que chegou no sudeste do Brasil, vindo do Pará.  Minha terra é que é gostosa, quente que só o quê, não vou ficar muito por aqui não, tô até com saudade das picadas do carapanã de lá.
            O filho escutava e não falava nada. Sebastião, experimentando uma sobremesa de açaí continuava:
             Esse açaí daqui não presta,  o bom mesmo é o de lá, tão grosso  que demora a escorrer pela vasilha. Lá se toma na cuia acompanhado de pirarucu.  Ah meu filho! Aqui não se vive bem não.
             Cláudio, filho de Sebastião, tem bastante paciência com o pai, pois reconhece sua pouca instrução, mas neste momento responde irritado:
              — Calma, você vai voltar pra sua terrinha meu pai, não se preocupe. Sua consulta no médico já foi marcada. Um pouco de ânimo seria bom, o senhor está me deixando louco, cada hora inventa algo e fala, fala, aff!!!  Não consigo me concentrar, o senhor sabe que trabalho com computadores, e isso requer muita atenção.
             Finalmente chegou o dia da consulta, e seu Sebastião, entrando no consultório vai logo falando:
            — Bom dia dotô.  Sou um homem direto ao assunto, não quero perder meu tempo e nem do sinhô. Meu filho acha que eu tô com a ispinhela caída, pois sinto muita dor nos quarto. Tudo começou quando vi uma pereba no pé, me abaixei, mas tinha comido muito no café, o sinhô sabe né, café no norte é bem farto, tem mingau, tapioca, macaxeira, e eu tava empachado, o zóio tava nuviado com remela, ai perdi o equilíbrio e caí. De lá pra cá é uma dor nas cadeira que não passa. Foi mal jeito no espinhaço não foi?
   Bem,  seu Sebastião. Vou pedir alguns exames radiológicos e depois vemos o que aconteceu. Ok?
               Feitos os exames, seu Sebastião, desta vez com o filho, retorna ao consultório.
            O médico verifica tudo e vê que não é nada de sério. Receita anti-inflamatório e conversa explicando tudo ao paciente.
             Dias depois, já no aeroporto, embarcando pra sua terra tão querida, despedindo-se do filho, fala:
         — Viajar nesse troço me dá gastura, não sou passarinho. Chego lá com o pé durmente.  Sabe o que acho que aconteceu meu filho, mau olhado do cumpadre Jacinto. Mas meu santo é forte e o quebranto não pegou. A primeira coisa que vou fazer quando chegar, é ir até o ver-o-peso e comer peixe fresquinho.

            Pai e filho se abraçam, em despedida comovente. 

O CIDADÃO ILUSTRE - CINEMA - RECOMENDAÇÃO DE FILME


O CIDADÃO ILUSTRE



Título original: El ciudadano ilustre
Direção: Mariano Cohn, Gastón Duprat
Elenco: Oscar Martinez, Dady Brieva, Andrea Frigerio, Nora Navas, Belén Chavanne, Julián Larquier Tellarini

Sinopse:
Daniel Mantovani, um escritor argentino e vencedor do Prêmio Nobel, radicado há 40 anos na Europa, volta à sua terra natal, ao povoado onde nasceu e que inspirou a maioria de seus livros, para receber o título de Cidadão Ilustre da cidade - um dos únicos prêmios que aceitou receber. No entanto, sua ilustre visita desencadeará uma série de situações complicadas entre ele e o povo local.
Comédia | 14 anos | 118 min | Argentina

ESPAÇO ITAÚ DE CINEMAS

Augusta
Sala 1   Descrição: Legendado   14:00 - 16:20 - 18:50 - 21:20   Dia 24/05 não haverá sessão às 16:20 - 18:50 - 21:20
Sala 1   Descrição: Legendado   Dia 20/05 às 23:59   Sessão Extra

Frei Caneca
Sala 6       14:00 - 19:10 - 21:30

Pompeia
Sala 10   Legendado   16:00   


Veja um trecho do filme:


O inferno - Ana Catarina SantAnna Maués


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O inferno
Ana Catarina SantAnna Maués

             No céu fogos de artifício marcavam a chegada de mais um ano. O espetáculo era apreciado da varanda da grande sala oval do Centro de Estudos em Teologia, que levava o nome do mestre Dr. Ulisses, já falecido.  Brindes eram erguidos com votos de felicidade aos presentes.  Ali estava a nata dos mais conceituados teólogos dedicados aos estudos a respeito de Deus, Religiões, Bem e Mal, e assuntos afins. Em ocasiões como estas, Dr. Ulisses era sempre lembrado com carinho, pois suas teorias a respeito dos mistérios do além, do pós-morte, eram consideradas por todos, como verdadeiras pérolas. Iniciaram então vários comentários sobre o Dr. Ulisses, elogios foram tecidos ao caráter da ilustre personalidade, principalmente do modo como defendia suas teses, com eloquência admirável, e sempre muito bem elaboradas. A noite foi mesmo só de lembranças sobre a grande contribuição que ele deixou para a teologia.        
          Na primeira reunião do grupo após a festa de réveillon, os ilustres professores foram chegando ao local, e como de costume cumprimentos calorosos e animadas conversas paralelas tomaram conta do ambiente. Até que um dos presentes citou o curioso sonho que teve justamente no primeiro dia do ano:
— Caros colegas, vou expor com fidelidade o que sonhei, mesmo porque as palavras que ouvi me foram reveladoras como teólogo, e ficaram gravadas na mente, como o ferro em brasa marca um gado, mas por certo não conseguirei transmitir a sensação que tomou conta de mim na hora em que estava sonhando. Confesso que acordei impressionado, foi muito real. Bem, vamos lá. Estava em minha cama quando de repente um vento frio arrepiou meu corpo, logo depois uma voz de homem, sussurrou próximo ao meu ouvido, dizendo que as aspirações do homem ficam acumuladas em sua alma imortal. Enquanto vive, parte destes desejos são realizados através de seu corpo físico. Ao morrer, perde-se o corpo, mas as aspirações seguem impregnadas na alma. Sem a consciência imediata de que morreu, o tempo passa e a alma começa a inquietar-se. Não sabe onde está, não enxerga nada nem ninguém, mas sente que tem gente ao redor. Mexe os membros, mas não vê que os mexeu, coloca a mão no peito, mas não sente nenhum peito, tudo é escuridão. Um desejo incontrolável de querer coisas e pessoas invade o ser, iniciando grande tormento.  Só trevas em volta e ausência de esperança, pois ela faz parte da vida e não da morte. Este estado permanente sem satisfação, vai transformando-se em ódio. Você entende que você acabou, mas permaneceu.  Não encontrando algo para direcionar tanto tormento, ele cresce e multiplica. As lembranças da vida que teve, irão acentua-lo, que é como fogo, que com o tempo eterno começará a iluminar o ambiente, e então perceberá que está no inferno.
                 Ao fim do relato, todos permaneceram estáticos, um silêncio perturbador, até que um deles gaguejando disse:
— Tive o mesmo sonho nesta data também.

                 Ao mesmo tempo outros dois professores assumiram que tiveram a mesma experiência. E assim foi indo e indo, cada vez era um que denunciava ao grupo que sonhara a mesma coisa, até que concluíram que ocorreu um evento sobrenatural com eles.  Nesta noite não houve reunião, estavam demasiadamente intrigados com o sucedido. Nenhum deles ousava declarar que a voz reveladora do sonho, era de alguém conhecido, o excelso Dr. Ulisses.

quinta-feira, 18 de maio de 2017

Perdão e Pesar - Ana Catarina SantAnna Maues

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Perdão e Pesar
Ana Catarina SantAnna Maues

                   Levando uma vida comum, assim estavam Nelson e Dalita. Ele era eletricista e ela ajudante de padeiro. Ambos com personalidade tranquila, eram bem discretos. A relação entre eles era marcada pelo respeito e afeto. Exibiam na mão direita o único bem valioso, a aliança em ouro adquirida com sacrifício. Sem ajuda dos parentes preparavam-se para casar. Tudo caminhava harmoniosamente entre eles até que a padaria foi vendida para um jovem bonito e solteiro. Esse fato mexeu bastante com o humor de Nelson, que passou a buscar Dalita no trabalho. Numa tarde ele ficou espreitando e viu quando o jovem proprietário acariciou o rosto dela. Mais do que depressa ele atravessou a avenida e entrou na padaria querendo confirmar o que vira. Indagando sobre o que ocorrera, Dalita explicou que havia machucado o dedo, e que o proprietário ao vê-la chorar ofereceu-lhe um lenço, mas sem tocar no seu rosto.  Isto não ficou bem esclarecido na cabeça de Nelson que passou a desconfiar da fidelidade da noiva. Quando indagava sobre seu dia no trabalho era com sarcasmo e  Dalita reagia indignada iniciando assim mais uma discussão.   As brigas passaram a ser frequentes pelos motivos mais fúteis, e cada vez mais violentas, com Nelson dando apertões, beliscões e vez por outra até tapas no rosto de Dalita. Ela vivia deprimida, amargurada, insegura com o temperamento oscilante do noivo, mas com muita esperança de que tudo passasse.  Lutava com a arma da paciência e do perdão, não queria desmanchar o compromisso, pois o amava de todo coração.  
                      No final de uma tarde, chovia bastante, e Dalita recebera o aviso de que Nelson não viria buscá-la. Ao sair, dirigiu-se ao ponto de ônibus, e lá estando viu chegar de carro novo, Cláudio, seu irmão mais velho. Ele a viu na parada e ofereceu carona, que ela aceitou muito feliz. Chegando em casa qual a surpresa, Nelson a estava esperando, e a viu sair do carro. Cego de ciúmes não reconheceu o futuro cunhado ao volante.  Imediatamente ali na rua mesmo, a briga começou. Ela já entrou chorando e gritava que queria acabar com o noivado. A discussão ficou maior e maior, caminhavam por o espaço da casa, até que chegaram na cozinha e Nelson enlouquecido lançou mão de uma faca sobre a mesa e transpassou o corpo dela que caiu imóvel.
                  Atônito, saiu dali, correndo e chorando sob a forte chuva. Foi em direção a única ponte da cidade, conhecido palco de suicídios. Dalita meu amor o que fiz meu Deus perdão éramos tão felizes como tudo chegou a ficar assim burro burro ciumento egoísta meu amor perdão a vida sem você não tem nenhum valor meu Deus por favor faz com que tudo isso seja um pesadelo que acordarei logo mereço o inferno matei o amor da minha vida Dalita te amo te amo nunca mais te verei meu amor pois você vai pro céu e eu para o inferno merecido
            Nelson chorava muito equilibrando-se na parte mais alta da ponte, pronto pra saltar a qualquer momento. Gritava o nome de Dalita forte e bem alto, estava fora de si. Já ia saltar quando escutou a voz da noiva chamar por ele. Olhou pro lado e a viu caminhando com dificuldade em sua direção toda ensanguentada. Pensou em milagre e desceu de onde estava, vindo encontrá-la. Entre beijos e caricias ambos choravam, ele ajoelhou-se e prometeu diante de muitos que acorreram ali, acompanhando toda aquela situação, e prometeu jamais repetir aquele ato, pedia perdão soluçando. 
             O tempo provou que o perdão de Dalita e o arrependimento de Nelson foram verdadeiros, e como num conto de fadas vivem felizes até hoje.   


ANIVERSÁRIO DO ICAL COM A REVISTA EIXO CULTURAL 2017





O ICAL faz 8 anos em junho, e para comemorar essa passagem será publicada a Revista Eixo Cultural 2017.

Esta edição estará recheada de contos, casos e causos. 

Em brave maiores detalhes.

Para quem não conhece nossa revista veja os links abaixo.



REVISTA EIXO CULTURAL NÚMERO 2 - ICAL


REVISTA EIXO CULTURAL NÚMERO 4 - ICAL


EM BREVE.

Balé fantástico - Ana Catarina SantAnna Maues


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Balé fantástico
Ana Catarina SantAnna Maues

     Tenho vários nomes, sou muito conhecido, quem me vê jamais esquece, tremendo só em lembrar. Aguardo ansioso o período em que sobe o calor do oceano e da água que evapora, acelerando-me. Como mágica surjo doido a girar e girar, encorpando a cada volta, com excepcional coreografia a meu bel-prazer.   Ano passado alcancei três pontos na escala, saí em noticiários, fui capa de revista, mas este ano será melhor, superarei em muito o rastro que deixei, já me sinto forte, imagina daqui uns dias.
        Passado algum tempo o calor aumenta e a evaporação cresce acentuadamente.

       Acordei bem-disposto, com sorrisinho no canto da boca, presságio de deleite.  Hoje bailarei por sobre o campo, arrancarei árvores, postes de luz, derrubarei casas, destelharei outras, erguerei pesados caminhões e tratores, e os lançarei longe só pra escutar a ferragem se quebrando ou o fogo da explosão quando tocarem o chão novamente. Folhas, galhos e muito pó irão fazer-me companhia num bailado inebriante. O furor me levara a extrema satisfação. Alcançarei o auge e inchado de prazer vou dissolver-me. Mas o melhor de tudo é ver o rosto pálido dos humanos diante da devastação total. Inertes ficam assim por dias. Suas vidas tão bem organizadas de uma hora para outra reviradas. Nivelo a todos, rico, pobre, velho, jovem, preto ou branco. Como um severo juiz, condeno-os à ajuda mútua por bem ou por mal. Levo-os a refletir conceitos e valores, forçosamente terão que meditar sobre o que realmente vale a pena. Dou-lhes a magnânima oportunidade de reiniciar.

Quem era ela? - Hirtis Lazarin

  Quem era ela? Hirtis Lazarin     A rua já estava quase deserta. Já se ouvia o cri-cri-lar dos grilos. A lua iluminava só um tantin...