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domingo, 26 de março de 2017

Uma Vida em um Quadro - Rejane Martins


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Uma Vida em um Quadro
Rejane Martins

Tornar-me a guardiã dos objetos guardados por tantos anos pela minha mãe foi um privilégio, apesar de que não haver disputa pela incumbência sinto um grande apreço pela designação.

Dentre todos os objetos há uma foto especial. No altar da Igreja Matriz Velha em São Caetano toda a família se reuniu para imortalizar as Bodas de Ouro de meus avós maternos. Imagino o trabalho hercúleo do fotógrafo para enquadrar os filhos, genros, noras, netos e bisnetos em torno daquele casal velhinho e orgulhoso.  

 Sempre que manuseava aquela foto, sentia o poder que ela tinha de congelar, somente em um clique, toda uma história. Ali está retratada uma vida de lutas, vitórias, decepções, angústias e recompensas.

 A aura da imagem é tão intensa que mesmo aqueles que já pertencem ao espaço saudades, continuam transmitindo uma energia vibrante não só daquele momento, mas do seu legado, e por um instante esquecemos o vazio imposto pela sua ausência e sentimos a alegria presente em cada rosto.

Há alguns anos presenteei minha mãe com uma ampliação desta fotografia que era tão cara para ela. O trabalho de ampliação revelou algo ainda mais surpreendente, cada coadjuvante retratado ali tornou-se um protagonista. Ficamos por um longo tempo relembrando de todos personagens e suas esquisitices, no final o saudosismo tomou conta de todos nós. Ainda me lembro das lágrimas que furtivamente teimavam em escorrer dos olhos dela.

Naquele momento percebi o tesouro que aquele objeto representava, não era apenas uma foto que marcava um evento, era toda uma história envolvendo muitas pessoas, e cada uma delas doou um quinhão de responsabilidade para que este objeto se tornasse tão precioso.


O original e a ampliação que revela a grandiosidade e o magnetismo sempre presente naquela grande família, são de tempos em tempos resgatados de seu esconderijo, pois não me permito esquecer a história nem as raízes estabelecidas por aqueles dois jovens anciãos, que se acabaram de se casar novamente.

Amor à Primeira Vista - Rejane Martins


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Amor à Primeira Vista
Rejane Martins

Era o primeiro carnaval de Otávio longe de sua terra natal. Aquele domingo estava mais pasmacento que o normal. O calor era insuportável e a ausência de transeuntes promovia ainda mais a morosidade daquele triste e enfadonho dia que insistentemente não terminava.

Otávio decidiu gastar algumas de suas horas ociosas no jardim de sua senhoria Dona Eulália, que cuidava com muito esmero de seu precioso tesouro vivo, como ela mesma o definia.

Recolheria as folhas caídas, libertaria cada flor de suas pétalas mortas, se ocuparia de qualquer serviço para não sentir aquele vazio na alma.

Estava tão absorto em seu trabalho de jardineiro que quase passou despercebido aquele rosto angelical emoldurado pelas viçosas rosas do jardim.
A visão dos cabelos negros depositados sobre os ombros desnudos era uma obra de arte que não devia nada aos grandes pintores renascentistas.

Se contrapondo ao dia sem cor e brilho de Otávio, aquela moça ostentava dois grandes olhos brilhantes e sagazes, que beirava ao desrespeito pela sua dor devido a solidão.

Pensou duas vezes antes de se aproximar e tentar conhecê-la. O medo foi mais forte e acovardou o interiorano, obrigando-o a recuar.

Agachou-se tentando se esconder e ao mesmo tempo espreitar aquela imagem que preencheu seus pensamentos. Percorreu o jardim, feriu-se várias vezes, até que se sentindo um tanto quanto boboca, decidiu se apresentar e iniciar uma conversa descompromissada.

Aprumou-se, retirou o espinho que alojara-se em seu braço, alinhou a roupa. E só quando em posição ereta olhou para frente, viu aquela deusa se afastar com seu colega de quarto Mateus. A cada passo dado, além de aumentar a distância, provoca um novo e mais forte aperto no coração.

Hoje após tantos anos passados, Otávio ainda não sabe nem o nome dela, não teve coragem de tocar no assunto com Mateus, temia que a realidade o decepcionasse, preferiu alimentar a doce ilusão que o acompanhou por toda a vida. Junto com os netos adolescentes, Otávio faz questão de frisar sempre que eles acreditem em amor à primeira vista, e que ele é testemunha viva desta teoria, afinal ele se apaixonou por uma mulher cuja a perfeição era o seu maior atributo.


Foi Traição? - Rejane Martins


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Foi Traição?
Rejane Martins

Conhecera Ricardo há um ano, durante a viagem para Lençóis Maranhenses. Os dois adquiriram o pacote turístico na mesma agência.

Já na sala de embarque do aeroporto de São Paulo, Rosana e Ricardo trocaram olhares insistentemente. Aquele elegante homem, alto com porte atlético, destacava-se na multidão alvoroçada com as férias.

Durante toda a viagem, o casal não se largava. Coitada da Aninha, sua amiga de viagem, precisou se integrar com outro grupo para não ficar sozinha. Para eles aquele lugar deslumbrante tornou-se mais paradisíaco que nunca. Tudo era magico e estonteante, foram dez dias pisando nas nuvens.

Rosana sentia-se outra pessoa quando regressou a São Paulo. Aninha tentava colocar seus pés no chão dizendo que ele não ligaria, que aquilo foi um amor de verão. Um homem daquele jamais estaria dando sopa nos dias de hoje. Era enfática ao aconselhar a esquecê-lo, esta era a única maneira de não sofrer. Pensar nele como uma boa companhia de uma viagem dos sonhos.

Contrariando todas as previsões Ricardo precisou de dois dias para colocar o sono em dia, assim que acordou ligou para marcar um encontro, já estava com saudades.

Casamento com data marcada, os preparativos exigiam da noiva toda sua atenção. Afinal ela queria que tudo estivesse perfeito naquele que seria o dia mais importante de sua vida.

Rosana e Aninha, aliás a principal madrinha, tiraram o dia para visitar a floricultura que ornamentará a igreja. De repente Aninha ficou nervosa e queria sair dali a qualquer custo, sem nenhuma explicação e sem ter visto ao menos uma planta. Não conseguia esconder seu desconforto.

Foi quando Rosana virou-se e seus olhos focaram Ricardo carregando uma linda menina colo, acompanhado de uma mulher elegante e atraente. Ele passava as costas de sua mão no rosto dela. Ela aceitava o carinho com um sorriso, e logo retribuía lhe com outro toque.

Sem conseguir pronunciar uma só palavra, com os olhos marejados Rosana aproximou-se da feliz família. Ricardo assustou-se e logo dirigiu o olhar para o chão, não tinha coragem para encará-la. Rosana saiu às pressas seguida pela preocupada Aninha, que recebeu a incumbência de cancelar todas as providências do enlace.


Rosana naquela noite, no escuro de seu quarto, decidiu realizar um antigo sonho, aprender inglês em Londres. Hoje ela tem consciência de que a decisão tomada foi fuga, mas o mais engraçado é que ela nunca saberá se aquilo foi traição mesmo.

Presentes Eternos - Rejane Martins

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Presentes Eternos
Rejane Martins

Durante anos fui presenteada com  objetos manufaturados por meu filho na escola.

Em cada evento que participava, precisava segurar as lágrimas ao abrir os pacotes. Eram sempre muito significativos para mim. Camisetas “sujas” com tintas coloridas que revelavam as impressões digitais das mãozinhas espalmadas por todo o tecido, ou ainda a inédita foto com um rosto sapeca tirada às escondidas. Na canga tingida no barbante, era inegável a exposição de sua identidade na escolha das cores.

Como usar esses objetos, são obras de arte confeccionadas especialmente para mim. Tudo ali foi pensado com a mente mais pura de uma criança, era declaração de amor mais verdadeira que alguém poderia fazer. Como ignorar toda aquela expressão de criatividade daquele pequeno ser. Mesmo sem dominar o idioma ou se utilizar de figuras de linguagem, criou um texto embasado no mais genuíno sentimento de amor em cada gesto, em cada cor, em cada expressão.

São objetos de valor inestimável, e representam toda a recompensa de um trabalho integral e desprendido. Sei que este legado no futuro não estimulará o interesse de ninguém, mas para mim é um tesouro precioso que merece toda minha reverencia.

Como não considerar cada um deles um artesanato exclusivo, apesar de cada mãe ter recebido uma obra de arte semelhante, acredito que todas avaliam o valor pessoal igual ao meu.

Nenhum presente que agrega valor monetário competirá com estes, por isso guardo-os com muito carinho, inclusive no coração para todo o meu sempre.


quinta-feira, 23 de março de 2017

Um bibelô de madeira - Jany Patricio

                
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Um bibelô de madeira
Jany Patricio

Tenho em minha estante um objeto de madeira, pintado com flores vermelhas e folhas e um verniz dando acabamento. Guardo este bibelô em homenagem a uma mulher à frente do seu tempo.

        É uma singela recordação da minha vó. Uma pessoa amorosa, como todas as avós. Brincalhona e sorridente.

        Em momentos da sua vida, ela precisou romper com tudo. Deixou os quatorze filhos crescidos e marido para ir para a Europa. Não um outro continente. O jardim Europa, na Vila Mariana  que na época  era formado por chácaras, onde havia muito verde. Diferente dos dias de hoje que tem estação de Metrô, prédios, lojas, residências e muito asfalto.

        Imagino que sua vida não foi fácil. Porém só me recordo dela com um sorriso no rosto, contando muitas histórias e amada por todos, apesar da sua rebeldia, para a época.

        Depois de viver alguns anos em São Paulo, ela voltou para Paulo Afonso. Sua casa, próxima a rua principal do centro, era aconchegante e aberta para os amigos, parentes,  filhos e netos,  que passavam por lá todos os dias para almoçar, tomar um café ou simplesmente para lhe dar um bom dia e um beijo.

        Lembro-me dela sentada em sua cadeira de balanço, cercada de gente, rindo muito com alguns dos filhos piadistas.


        Certa vez em que estive em Paulo Afonso, ela me deu uma xícara e pires de porcelana, que infelizmente quebraram e este bibelô que guardo com carinho. Quando olho para ele, me recordo dos momentos alegres que passei em companhia dela, da sua história, da sua leveza e da sua fibra.

ERA MUITO MAIS QUE AMOR - Hirtis Lazarin


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ERA MUITO MAIS QUE AMOR
Hirtis Lazarin

          Eu teria que criar um texto sobre um objeto que me recordasse alguém ou algum momento especial.

          Empreendi uma viagem pelo tempo que já se foi.  Encontrei vários objetos preciosos ao meu coração.  Um crucifixo de rubi que ganhei ao completar quinze anos, uma peça decorativa em Murano que foi de minha avó Virgínia, uma caixa de madeira que meu bisavô fez pra mamãe guardar trecos de costura.

          Nesse percurso de busca acabei chegando quase no início da história da minha vida.  Lembrei-me, então de uma caixinha de papelão envelhecida e bem amassada, tantos foram os acontecimentos que se sobrepuseram a ela.  Estava ali guardada a minha relíquia mais valiosa.   Não era um objeto palpável.  Era um  "SENTIMENTO" que brotou quando eu tinha apenas cinco anos e já frequentava o jardim de infância.  Um sentimento tão intenso que me amparou nos momentos mais difíceis e, podem crer, foram muitos.  Permanece vivo dentro de mim e, após tanto tempo intocável,   compartilho com vocês. 

          Nosso quintal era imenso.  Uma maravilha pra brincar.  Havia laranjeiras, um limoeiro do limão rosa, alguns pessegueiros cujos frutos eram ensacados ainda verdes pra que os passarinhos não os roubassem de nós.  Pra eles cresceram duas goiabeiras que frutificavam o ano inteiro.  Nunca consegui chegar antes deles e só comi goiaba cheia de furinhos.  Havia também um espaço bem grande de grama verdinha, cercado de arame e madeira.  Ali pastava o cavalo mais querido do mundo.  Mas não foi sempre assim.

          Papai era apaixonado por cavalos.  Lia tudo sobre eles.  Trouxe o Tufão de Minas Gerais.  Um cavalo selvagem.  Acostumado à liberdade, era rústico e agressivo.  Porte majestoso e olhar desafiador.  Não podíamos nos aproximar do cercado. Era prepotente, relinchava feito doido e sapateava até arrancar toda grama a sua volta.

          Desde a sua chegada, com papai foi um pouco diferente.  Ele entrou no espaço proibido falando manso, encarando-o nos olhos e sem demonstrar medo. Mas levou patadas e cabeçadas. Tombos e mais tombos.  Teve o joelho enfaixado por semanas.  Não desistiu até conquistar-lhe a confiança e Tufão passou a obedecer todos os seus comandos.   Tornaram-se grandes amigos. Bastava apenas um gesto de papai e ele obedecia. Pudemos, então, ser apresentados a ele.  

          Nascia ali o grande herói da minha vida: papai, um homem forte e corajoso, capaz até de dominar uma fera.

          E ao grande amor que eu já sentia por ele, juntaram-se confiança e admiração.  Sentimentos tão intensos que já nem cabiam mais dentro de mim.

          Papai foi meu porto seguro, a quem recorri sempre, enquanto esteve perto de mim.  Um exemplo que segui na sua ausência.

          O encantador de cavalos que me encantou.


          E foi pra sempre...

Que tarde! - Carmen Lucia Raso

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Que tarde!
Carmen Lucia Raso

De longe pude vê-lo abraçado à outra. Pareciam tão íntimos, tão antigos.

Respirei fundo, contei até cem em alguns segundos, sem sequência ou coerência.

Parada quase no meio fio,  sem que me notasse, fiquei escondida atrás de uma árvore de tronco largo e galhos fartos que me dava total cobertura e eu observava com olhos de lince e coração de presa amedrontada.

Não sabia bem o que fazer, se atacava como caçadora ou me mantinha estática para que não me encontrasse.

Os abraços entre eles me arrepiavam de raiva, eles riam muito, ele passava as mãos nos seus cabelos e seus olhos percorriam aquela moça de linda aparência, de cabelos longos, cacheados, se afastavam de mãos dadas e logo vinha mais um abraço.

Tinha a sensação de que o tempo não passava, alguns segundos, uma hora, uma eternidade? Não saberia dizer.

Fiquei triste, brava e ao mesmo tempo decepcionada pelo que via do outro lado da rua.

De repente um vento gelado me acordou daquele transe, daquele turbilhão de sentimentos em que me encontrava.

Que horror! - pensava.

Um homem que passava por ali quis saber sobre uma doceria numa rua que eu não conhecia e lá fui eu desviada da minha espreita.

Onde estão? Perdi os dois de vista! Não acredito que sumiram. Onde foram?

Atravessei a rua em busca do que me aguardava.

De repente bateram de leve em minhas costas e quando virei meus olhos encontraram os daquela moça que ha pouco se abraçava ao meu namorado e me dei conta de que ela se parecia muito com ele. Em seguida ele chega com flores estendidas para mim.

— Pra você, meu amor!

Não entendi mais nada.


   Dois presentes, as flores, e minha irmã gêmea que foi criada na Itália, por nossos avós e acaba de chegar. Como eu vinha me encontrar com você resolvi marcar nosso encontro aqui mesmo em frente a Livraria para tomarmos nosso café. Não foi aqui que marcamos?

quarta-feira, 15 de março de 2017

Crime sem solução - Dinah Ribeiro de Amorim

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Crime sem solução
Dinah Ribeiro de Amorim

O velho conde Howard, solteirão inveterado, envelhece sozinho em pleno casarão da família, na pequena cidade de Yorkshire.

Auxiliado pelo  fiel mordomo Joseph, recebe cuidados especiais desde que  virou cadeirante, após um terrível tombo nas escadas do jardim. Mesmo assim, não desiste! Todas as manhãs, é levado a passear pelas alamedas e trilhas, recebendo os primeiros raios de sol, nos dias quentes ou, a brisa leve do inverno, quando se anuncia.

Sua vida simples e reduzida de alegrias, transforma-se quando o médico da família lhe encaminha Dolly, boa fisioterapeuta, de gênio extrovertido, brincalhona e provocante.

Howard fora um rapaz bonito e atraente, dono de grande fortuna e excelente cultura, conhecedor de vários lugares, em longas viagens.

Dolly se encanta com seu novo paciente. Além das boas possibilidades de uma melhora, admira sua conversa, conhecedor de tantos assuntos.

Substitui logo as tarefas do mordomo, levando-o ela mesma a passear fora do jardim, causando em Joseph ligeiro ciúme do patrão. Servia a família há muito tempo, acostumado a tomar iniciativas e decisões importantes, não admitiria que uma moça estranha, embora trouxesse melhoras, assumisse  seu lugar.

Howard e Dolly se apaixonam e, apesar da deficiência, resolvem se casar. A vida simples e pobre da moça se transforma em dona de uma mansão e herdeira de grande fortuna, com a chegada de um tabelião para o registro, sendo testemunhas Joseph, o mordomo e Vivaldo, o jardineiro da casa.

Vivem felizes durante certo tempo, transformando-se Howard em nova pessoa. Mais alegre, comunicativo, abrindo a mansão para conhecidos da pequena cidade e realizando notáveis festas e bate-papos, incluindo também os amigos de sua mulher. O fato de ser cadeirante não o importa, aceita melhor sua situação, graças a Dolly.

Ela continua tratando-o com o mesmo amor e carinho do início, preocupada com sua saúde e situação.

E assim  levam a vida, felizes um com o outro, até que num domingo, após voltar da missa, Dolly encontra Howard caído no jardim, com a cadeira por cima. Dá um grito desesperado, atraindo Joseph e moradores da região.

Tenta socorrê-lo, mas percebe que já é tarde. O corpo gelado e marcas de sangue pelo chão. Que teria havido, perguntam todos. Não há indícios de roubo, queda por alguma pedra ou entrave que pudesse virar a cadeira e tombá-lo. Será que tivera algum mal súbito, caindo e batendo sua cabeça no chão. Perguntas e mais perguntas que não sabiam como responder.

Joseph, assustado, chama a ambulância e, consultando Dolly, chama também a polícia.

O corpo de Howard é levado ao hospital, sendo a causa da morte uma batida forte na cabeça, causada por queda ou algum objeto de raspão, fazendo-o tombar, perdendo o controle de sua cadeira.

A situação se torna estarrecedora, com Dolly chorando pelos cantos, Joseph, murcho, calado, sem ação após a morte de seu patrão, a quem servira por tantos anos, obedecendo mecanicamente ordens da patroa que quase não saia do quarto.

Por ordem do inspetor de polícia, John Vincent, ninguém deveria deixar a casa até a solução do caso. Dolly o amava e já era dona de tudo. Joseph não trairia seu patrão, única incumbência de sua vida. Vivaldo, o jardineiro, não ganharia nada com isso. Perderia somente o emprego e o sustento da família.

Alguns amigos são chamados, mas a maioria, num domingo de manhã, possuía álibi, provando estar em casa.

Passa o tempo, muitos aparecem dando condolências durante o funeral, desaparecendo aos poucos, retomando suas vidas.

Somente Dolly e Joseph permanecem na mansão, pouco vistos, fazendo exclusivamente tarefas necessárias. A aparência de Dolly  se transforma. Toda a sua exuberância festiva agora é de uma tristeza profunda e angústia infinita. Envelhece um pouco a cada dia.

O inspetor Vincent, não achando solução para o caso, resolve arquivar o processo como morte natural, libertando os prováveis causadores daquela privacidade. Nem era preciso, pois não se via nem ouvia mais nada naquela casa.

Só Vivaldo, o jardineiro, é chamado para limpar o lixo e aparar a grama do jardim, que há muito não era feito. Acabou-se a beleza dos passeios pelos bosques floridos e trilhas iluminadas de  raios solares.

Subitamente, abaixando-se para aparar um arbusto, Vivaldo percebe um objeto estranho, e se assusta. escondido num canto, havia um pequeno revólver, bem perto de onde o patrão morrera.

Chama depressa sua patroa que, branca como cera, que chama a polícia. Encontrada uma arma na casa. Bem no jardim que Howard tanto gostava.

Novamente o inspetor Vincent vai ao local da morte, aconselhando-os a não tocarem no objeto. Embrulha-o com cuidado para não apagar digitais. Quem sabe poderia desvendar o mistério!

Providências de praxe são tomadas e após muitos dias, descobrem-se na arma as digitais de Howard. Ele tentara se matar, num momento de depressão que ninguém percebera. O único que sabia de seu estado era o médico, que não comentara nada por sigilo profissional. Era essa a causa do raspão na cabeça, seguido de queda. O tiro não acertara o alvo e ele cai batendo a cabeça. A queda causara a morte, mas a causa fora suicídio.

Como não percebera seu estado, pergunta-se Dolly, agora sim, sentindo-se culpada. Afinal, seu marido, continuava sendo seu paciente.


Joseph, mordomo de tantos anos, resolve voltar para sua casa, rever parentes, abandonando a profissão que lhe trouxera alegrias iniciais e tanta tristeza no final.

À Regina, amiga fiel - Dinah Ribeiro de Amorim (Amora)

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À Regina, amiga fiel
Dinah Ribeiro de Amorim (Amora)

Fiquei muito emocionada com o nascimento de minha primeira filha, em 1969.

Ganhei do meu marido, na ocasião, um lindo valioso anel de ouro, enfeitado com pequenos brilhantes e um rubi no centro.

Nunca me liguei muito em joias, mas achei-o lindo.

Além da alegria de uma filha saudável, várias manifestações de amigos e um anel valioso de um marido feliz.

Usei-o várias vezes, combinando-o com um par de brincos.

Meu casamento não deu certo, por motivos que nem sei explicar direito, agora.

Separada, com dois filhos, necessitei de dinheiro e vendi o anel a uma grande amiga, solucionando uma dívida contraída na época.

O tempo passou, os problemas também e, qual não foi a minha surpresa quando, de repente, recebo o  anel de volta, da bondosa amiga que, com sinceridade, achou que teria que devolvê-lo. Objeto meu de grande estimação!

Quem gostou disso foi minha filha, a herdeira dele, num futuro próximo ou longínquo, quem sabe?

A compoteira que viu o Imperador. - Dinah Ribeiro de Amorim (Amora)


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A compoteira que viu o Imperador.
Dinah Ribeiro de Amorim (Amora)

Moro em apartamento pequeno, sobrecarregado de coisas. Móveis antigos, quadros de minha autoria, fotos antigas de festas, netos pequenos, filhos, viagens, enfim passagens de minha vida. Todos são valiosos e representam muito para mim, lembranças e saudade.

Olhando-os, começo a imaginar qual seria o mais valioso e importante, continuação na família.

Reparo, então, numa compoteira de cristal que foi de minha bisavó paterna, oriunda de Porto Feliz, estado de São Paulo. Descendente de bandeirantes, serviu um almoço para D.Pedro II, colocando um doce caseiro, nessa compoteira. Nosso imperador passava por lá. Lugar muito importante, na época, rota de comércio para  o interior.

Foi dedicada a mim, após sua morte, mas só chegou às minhas mãos, encaminhada por meu pai, muitos anos depois, com o falecimento de uma tia, que a teve em seu poder, durante vários anos. Coisas de família.

O importante é que está comigo, enfeitando uma estante antiga, junto a outros vasos e licoreiras, mas, pelo desenho, som do cristal emitido, percebe-se logo que seu valor é antigo, histórico e inestimável. Distingue-se dos outros.

Espero ainda contemplá-la por muito tempo, mas encaminharei para alguém, da família, que dê valor à nossa história. Minha filha ou neta, talvez!

quinta-feira, 9 de março de 2017

Pequena Ilha de coral - Christianne Vieira

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Pequena Ilha de coral
Christianne Vieira


Nogueira se acomodou confortavelmente na cadeira. A sua frente, um monitor cheio de imagens. Estava mergulhado nessa pesquisa há vários meses e, quando parecia ter encontrado um caminho, percebia um erro e retornava ao início. Como era possível existir uma Ilha Fantasma?

Sendo um renomado Oceanógrafo, não podia admitir. Por meses  utilizara informações privilegiadas da Agência Espacial Internacional. Seu chefe o pressionava por respostas, já desperdiçara muito tempo, verba e longas noites de insônia.

Resolveu então checar as mensagens no correio eletrônico, o que seria uma boa forma de relaxar e, para a sua surpresa, havia um e-mail que logo lhe chamou a atenção: “Lenda da Ilha Fantasma”.

Mesmo pensando que estaria desperdiçando seu tempo, abriu a mensagem.  Logo na primeira parte, sua curiosidade foi se aguçando, e, intuitivamente, acreditava ter encontrado uma nova fonte de pesquisa.

Um morador de Vannuatu, chamado Branch, lhe contou que conhecia uma lenda   da ilha fantasma.

Um corsário muito cruel, de nome Creek, havia enterrado um baú cheio de Coroas de ouro, que ele havia saqueado de uma embarcação  holandesa, durante as expedições marítimas .Ele tivera ajuda de uma moradora local, conhecida como feiticeira, e após o enterrarem, lançara uma maldição sobre a ilha.

A ilha ficaria submersa em boa parte do tempo e, só os aborígenes que bem conheciam a região seriam capazes  de encontra-la. Um mapa em pergaminho, muito antigo, desaparecido há muitos anos, continha as as coordenadas de onde este baú teria sido enterrado.

Branch se colocava à disposição e esperava encontrá-lo em breve.

Ao acordar no dia seguinte, tratou logo de esquematizar um pedido de verba, mas sabia que correria o risco de ser negada. A agência estava enxugando os gastos, o ano estava com o orçamento comprometido.

Leu diversas vezes seu projeto e se encaminhou para a sala de seu chefe.
Ao término da leitura, fez  perguntas sobre o tempo que essa aventura poderia levar e, as razões para tantos investimentos.

Nogueira explicou tudo detalhadamente e ficou na torcida aguardando respostas. Pela sua experiência, sabia que demoraria até uma semana para ser analisada pelo comitê.

Enquanto aguardava, foi estabelecendo um contato mais estreito com Branch que lhe enviava mensagens com perguntas pesquisando todo e qualquer fato que se relacionasse a Grande Barreira de Corais.  Descobriu fatos interessantes sobre o Mar de Coral, e as batalhas travadas  durante a segunda guerra mundial. Sempre se interessou pelo assunto, pois lembrava de sua visita ao porta aviões Midway na baia de San Diego acompanhado de seu pai. Essa era uma das razões de ter escolhido  sua profissão: o fascínio que o mar lhe causava.

Branch, muito solícito, lhe enviara fotos e recortes de jornais locais para contribuir com a pesquisa.

Tinha interesse ainda  maior sobre a curandeira e a sua possível feitiçaria. Um pesquisador nunca poderia acreditar em tais sandices. Mas, para o povo local esse comportamento era muito normal.

Nessas ilhas tão isoladas do mundo globalizado, a  cultura e o folclore eram seguidos por gerações.

Após sete dias, de muita angústia, chegou a confirmação, e já poderia voar para a aventura.

Foram dois dias e muitas escalas até conseguir pousar em Brisbane na Austrália. Dalí partiria para Nova Caledônia.

Branch o aguardaria em Vannuatu. Ao chegar à ilha se dirigiu ao escritório, que tinha uma atmosfera rústica e acolhedora, bem típico dessa região. A porta em madeira de construção, envelhecida, nas paredes várias fotos de barcos de pesca e mergulho. O seu negócio era o mais importante da ilha.

Tudo estava claro,  Branch  também tinha interesses nessas lendas, o mistério o ajudaria a vender seus passeios.

Conversaram durante algumas horas sobre o tema, Nogueira levou uma pasta contendo informações sobre as ilhas.

Cansado da maratona da viagem, foi dormir cedo. Acordou revigorado e, como haviam combinado, foi ao escritório de Branch.

Partiram para as ilhas, todas de uma beleza inigualável, pediu que parassem na ilha mais próxima da considerada  fantasma.

Primeira parada: Willis Islets, em busca de pistas ou relatos sobre as lendas ou de informações à respeito.  Das ilhas do arquipélago, somente nesta havia uma base meteorológicas, as outras desabitadas. Ouviu tantas estórias diferentes, que sua mente embaralhava. Seguiram pelas outras pequenas ilhas próximas: Magdelaine Cays, Coringa Islets, Tregrosse Islets e nenhuma nova informação se acrescentou. 

Cansado, retornou a Vannuatu no dia seguinte, pois  voltariam a visitar a Grande Barreira de Corais. Os aborígenes residentes destas ilhas são muito envolvidos com suas crenças e a comunicação com eles é dificultada devido a tantos dialetos. Conheceu Venalu, um homem de aproximadamente 80 anos, quase todos dedicados à pesca.

Ele fazia parte de uma cooperativa e todos viviam no mar e de atividades ligadas a ele.

Era um líder local  e seus conhecimentos tinham muito valor. Para eles, aborígenes, não há diferença entre o mundo espiritual e físico.  Existem almas ou espíritos, não só em seres humanos, mas também em animais, plantas, rochas, características geográficas, entidades do meio natural, como o trovão, o vento ou as sombras.

Parecia que uma cortina se abria diante seus olhos, pois a partir disto poderia encontrar alguma resposta.

Esse povo indígena, cheio de superstições, carregava as crenças, durante toda a sua vida.

Nogueira perguntou a Branch como poderia se encontrar com esse pajé?
Os homens das aldeias caçavam animais e pescavam. A  arte era a forma  de comunicação, e seus instrumentos de trabalho, cheio de pinturas e inscrições, contavam as histórias do povo e a relação com as divindades.
A mãe serpente era representada pelo yidaki, um instrumento cujo som era puro encantamento.

Venalu recebeu Nogueira e não se surpreendeu com as perguntas feitas, todas pertinentes ao sumiço, ou da existência da Ilha Fantasma.

Ele disse que uma curandeira, de outro clã,  fora rendida por piratas e fizera um acordo, para ser  libertada, deveria ajudar Creek a esconder seu mapa com as indicações de um baú enterrado repleto de coroas de ouro.

Ela o fizera a contragosto e, se utilizara de um ritual muito poderoso dos seus antepassados. A ilha  ficaria submersa  nove luas e depois permaneceria com sua maré baixa durante uma semana. Ao entrar a décima segunda lua, voltaria a ficar submersa novamente. Esse ritual deveria ser cíclico, até  o dia que, um novo pajé, o quebrasse. Tinha que ser do mesmo clã, e possuir mesmos dons de vidência.

Desde esse fato, todos os seus descendentes nasceram mulheres e, não apresentavam  capacidades de vidência.

A ilha fora visualizada e catalogada na décima primeira lua, por uma foto de satélite e, essa seria a razão de ser catalogada, depois ter desaparecido.

Nogueira se sentia ao mesmo tempo confuso e decepcionado. O que faria a partir de então?!

Suas pesquisas e seu tempo foram desperdiçados. Um cientista não poderia crer em rituais ou bruxaria.  Iria esclarecer seus superiores, abandonar a pesquisa e enterrar de uma vez, todos os meses que buscara em vão pela Ilha. Branch se encontrava da mesma forma, antes via esse mistério como uma boa fonte de renda.

Enviou seu relatório, fez as malas, mas agora levava consigo um novo mundo, rico em cultura e crenças, o qual nunca imaginou acreditar.


O SEGREDO DE UMA LÁGRIMA - Pedro Henrique

  O SEGREDO DE UMA LÁGRIMA Pedro Henrique        Curioso é pensar na vida e em toda sua construção e forma: medo, terror, desejo, afet...