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quarta-feira, 7 de julho de 2021

NONNO E SUA CIDADE CURON VENOSTA (*) - Claudionor Dias da Costa

 



NONNO E SUA CIDADE CURON VENOSTA (*) 

Claudionor Dias da Costa

 

 

Naqueles instantes que a gente não sabe por que e como, vem à mente lembranças de pessoas queridas que marcaram nossa vida.  

 

Enquanto eu caminhava para meu compromisso, cruzei na rua com aquele senhor que deveria ter por volta de quase oitenta anos,  que me olhou e com sorriso suave,  me deu bom dia. Imediatamente,  a imagem de meu avô, que nos deixou há uns dez anos, surgiu clara,  e provocou minha memória.  

 

Parece que o via acomodado em sua cadeira de balanço, eu com quase quinze anos escutando atento suas histórias de um tempo perdido que se desvanecia nas nuvens que ele observava enquanto falava. 

 

O doce ócio daqueles dias de inverno regados a chá quente e gostosos biscoitos caseiros preparados com carinho pela minha adorável avó, que delícia! 

 

− Querido neto, você não tem ideia como era bonita a nossa pequenina Curon Venosta. 

 

Pontuava cada frase e gesticulava como bom italiano. Estava situada ao norte da Itália, encostada na Suíça e Áustria, e tinha pouco mais de mil habitantes na época.  

 

Prosseguia detalhando os costumes daquele povoado.

 

− A vida era simples. Éramos agricultores, plantando maça e uva, e produzíamos um pouco de vinho. Meu pai ainda fazia alguns trabalhos de marcenaria. E, assim,  a família de seis pessoas se sustentava. 

 

− Minha infância foi alegre e descontraída, com travessuras com os amigos em que escolhemos,  o Sr. Pepino como vítima. Dono da mercearia confusa com produtos espalhados. Causávamos mais transtornos à ele espalhando mais ainda sem comprar nada. Quem diria que viria a ser tio da minha namorada. 

 

− O tempo passou... 

 

Nesse instante vovô silenciou, parou o olhar e continuou franzindo a testa, mas, empolgado contando como se iniciou a segunda grande guerra mundial e que a sua Itália ficou ao lado da Alemanha, e em Curon cresceu mais ainda a adesão à ideologia de seu ditador, que viria a ser sanguinária. Outra parte mais resignada e assustada com a onda que invadia o país preferia discrição e se amparava em suas atividades de trabalho não entrando nas quentes discussões políticas que ocorriam. Nossa família estava neste grupo por uma questão meramente de sobrevivência. 

 

Sendo muito jovem meu avô dizia que esta situação o deixava revoltado e se envolveu em algumas confusões por não se manter calado, mas, por sorte e pelas pessoas conhecerem sua família acabaram tolerando e não o denunciaram. Porém, não se conformava com essa resignação serviçal. 

 

Até se irritava quando alguns habitantes falavam em alemão, dada a proximidade da fronteira com a Áustria.  

 

E continuava dizendo que somente o alegrava quando comparecia às missas dominicais da igreja de Santa Catarina.  O motivo principal que não o permitia se concentrar nas orações era por conta da visão da menina com seus cabelos alourados que refletiam luz dourada, com instigantes olhos verdes. Ela provocava estranhas sensações no vovô que aceleravam os batimentos de seu coração jovem e cheio de sonhos. Quando falava nela seus olhos brilhavam e seu entusiasmo aumentava. Seu nome era Catarina em homenagem à padroeira da cidade. 

 

Ao terminar o culto, na saída as famílias ficavam conversando à   porta da igreja. Nesses momentos ele e Catarina trocavam olhares e ele começou a sentir que também despertava simpatia. Daí aos sorrisos e algumas poucas palavras, passou a esperá-la na saída da escola junto com os amigos e a acompanhá-la até sua casa. 

 

Começava ali um romance para o jovem casal. Ele tinha dezessete anos e ela dezesseis. 

 

Contudo, os pais dela perceberam e mostraram contrariedade com a situação porque sabiam que vovô não gostava da dominação da guerra que tiveram que suportar. Os pais dela defendiam Mussolini. 

 

Assim, estava criado um problema que ele não sabia como resolver. Seu amor por Catarina cresceu mais ainda. A menina não sabia o que fazer, e muito triste suportava a pressão da família. Com isto, só conseguiam se ver aos domingos, e ao longe, na igreja. 

 

Meu bisavô sentia pena de meu avô Antônio, mas, procurava aconselhá-lo para que não persistisse no interesse por ela, e se dedicasse mais ao trabalho e estudos. 

A tristeza e revolta o dominou porque sentia que naquele lugar, época de guerra e preocupado com o futuro,  a única coisa que o interessava na vida era sua bela Catarina. 

 

Os pais dela procuravam ao máximo evitar contato entre eles. Aumentavam o controle nesse sentido. A irmã mais nova todos os dias passou a acompanhá-la na saída da escola. Contudo, ela era simpática aos dois e passou a disfarçar que não percebia quando vovô passava bilhetinhos à Catarina. Eram declarações de amor eterno e frases românticas que a deixavam emotiva olhando meigamente para vovô. Ele descrevia para mim aqueles momentos como se os estivesse vivendo novamente. 

 

Até que vovô, em seu ímpeto juvenil, resolveu elaborar um plano: fugir com ela. 

 

Para isto, precisaria usar as economias que recebia do pai nos trabalhos no campo e muita coragem. Seria suficiente? Só o tempo dirá. 

 

Movido pelo seu grande amor, combinou com Catarina que fugiriam num domingo à noite, quando todos já estivessem esgotados pela semana. Separaram umas poucas roupas, se encontraram furtivamente na escuridão, e partiram. Caminharam por mais de três horas e cansados se abrigaram na cocheira abandonada de uma fazenda. Quando amanheceu procuraram sair rapidamente e tomar a estrada novamente. 

 

Com algumas mentiras onde Catarina se passou por minha irmã e pedindo carona pela estrada fomos parar em Bolzano. 

 

Acabei me aventurando trabalhando como auxiliar num armazém que vendia de tudo. Aprendi muito nesse comércio, desde venda de alimentos até o vinho e suas características. Aproveitei a tolerância do Sr. Pietro que queria mais que eu trabalhasse e não fazia muitas perguntas. Até permitiu que morássemos nos fundos de uma propriedade velha que ele estava sempre pensando em reformar. Catarina passou a trabalhar na sua casa como doméstica. Despertou simpatia em sua esposa pelas habilidades que tinha e até fazia bordados junto com ela. 

 

E assim foi ... 

 

Após quase um ano, eis que de repente fomos descobertos por meu pai que estava acompanhado do pai de Catarina. Ouvimos poucas e boas. Eu engolia em seco mudo e preocupado. Ela soluçava em lágrimas e mal olhava para o pai. Porém, passado aquele momento, começaram a nos perguntar como chegamos ali, o que fazíamos e como vivemos aqueles meses. Nos recuperamos e tivemos a ajuda do Sr. Pietro que nos elogiava. Aliás foi através dele que chegaram à nós, porque sensibilizado, meio a contragosto com a situação que nos envolveu, resolveu escrever para as autoridades em Curon. 

 

E vovô batendo forte uma mão na outra, rindo muito disse: 

 

− Nos levaram de volta para Curon. Ficamos até felizes, porque já estávamos com saudades de todos e de nossa “Piccola Città”. E a emoção daquela visão quando chegamos:  

 

− “Ma que bello o Lago di Resia”. 

Não demorou quinze dias e fizeram o nosso casamento onde “ il mio Amore” estava lindíssima. Parecia uma deusa de branco com aquela tiara de flores. 

 

E se aproximou de mim e cochichou sorrateiro com sorriso no canto da boca : 

 

− Você já é moço e vou te confidenciar. Seu pai, Marcello,  já estava a caminho  há uns três meses. Mas, depois do casamento esta notícia deixou todos felizes e   foi feita a reconciliação com a família da Catarina. Com a morte de Mussolini em 1945 depois com o término da guerra a política foi sendo esquecida por eles.  

 

A nossa Itália por ter passado por tudo isto, não estava nada bem. Precisava ser reconstruída. 

 

Com estas dificuldades e como queríamos progredir, resolvemos emigrar para o Brasil, porque chegavam notícias de que era uma terra promissora e a agricultura iria crescer muito. Foi o que fizemos. Viemos com seu pai e sua tia Bianca e fomos parar numa fazenda na cidade de Pedreira, interior de São Paulo no lugar que devido a colonização italiana era chamado de Tri monte. 

 

Ficamos tristes quando soubemos o que fizeram com nossa Curon em 1950.  Foi totalmente submersa pelas águas, porque precisavam fazer a usina hidroelétrica e nossas famílias foram removidas para mais distante. 

 

Mas, como o comércio estava no meu sangue, não demoramos em vir para a capital. E aí você sabe de toda a história. 

 

E mostrando ar saudoso exclamava: 

- Aquele badalar dos sinos da igreja de Santa Catarina, me lembro até hoje. 

 

E virando-se para mim:  

 

− Vamos entrar que a “nostra bella fiore” irá nos servir o “fusilli com bracciola”. 

 

E cantava alto canção italiana. 

 

Que saudades do vovô. Contava tão bem suas histórias que até eu me imagino em Curon. 

 

 

 

(*) CURON VENOSTA - Cidade ao norte da Itália (fronteira com Suíça e Áustria) que em 1950 foi submersa por conta da construção de usina hidroelétrica. Hoje aparece no Lago de Resia somente a torre da Igreja (Campanário). A Netflix fez uma série usando esta visão da cidade. Dizem que em noites frias ouve-se até os sinos. Contudo, é uma lenda porque foram retirados há alguns anos. 

O ROUBO DA ESTÁTUA DO IMPERADOR - Henrique Schnaider

 


O ROUBO DA ESTÁTUA DO IMPERADOR

Henrique Schnaider

 

Dr. Langdon era um estudioso de antiguidades. Chegou de Londres, naquela manhã, em Roma. Foi direto para o Hotel no centro da movimentada cidade italiana, com as pessoas falando alto e cheias de gestos, e o aroma delicioso das massas com o molho que só eles sabem fazer.

Langdon tinha um encontro marcado com a Diretora e curadora do Museu do Vaticano, Dra. Siena, que o convocou  para que viesse com a máxima urgência. Aconteceu um roubo misterioso de uma escultura do Imperador romano, Augusto, que reinou o Império Romano, na época de Jesus.

Assim que chegou, lá estava ela aguardando ansiosa. Siena chamava a atenção pela beleza, uma Vênus de Milo. O Dr. se perdeu em olhares admirados pela Diretora.

— Olá Dr. Langdon, estava lhe aguardando com grande expectativa. Vamos ao local do acontecido. Não consigo entender como conseguiram efetuar o roubo da estátua do Imperador, já que temos vigias 24 horas e o local possui raios laser. Devem ser especialistas. Não sei qual foi a intenção e para onde levaram a estátua.

Langdon estava entretido entre olhar a beleza de Siena e procurar detalhes, no local do roubo, que lhe dessem alguma pista na investigação.  Pensava ele. — “As pessoas são capazes de ir muito mais longe por causa daquilo que temem do que por causa daquilo que desejam. Esse era o caso de quem efetuou este roubo audacioso”.

Depois de observar cada detalhe do local onde estava a estátua do Imperador:

— Foi realmente um trabalho de profissionais, não deixaram qualquer pista,  ou que seja, nem um pequeno detalhe do trabalho que fizeram, mas continuarei, se você permitir, a examinar detalhadamente o local do roubo.

Langdo possuía consigo vários aparelhos para um exame que o levasse aos autores do roubo. Então, se acende uma luz vermelha no cérebro e, automaticamente, no instinto investigativo dele, havia um pequeno pedaço de tecido que ele deduziu ser de uma roupa feminina.

Para Langdon, sempre que iniciava uma investigação era como uma luta sem tréguas. Ele tinha como lema a seguinte frase. “Todos temos a guerra dentro de nós. Às vezes ela nos mantém vivos. Outras vezes ela ameaça nos destruir”. Ele não perderia esta batalha por nada, até solucionar o caso.

— Eu vou voltar para hotel e analisar o que consegui de pistas do roubo, Siena.

Ele já tinha alguma desconfiança, mas quis voltar ao hotel, e na tranquilidade de seu apto, analisar com mais calma a conclusão a que chegou. Depois de examinar com lupa o pedaço de tecido, chegou a uma conclusão.

Por incrível que pareça a pista se abriu, pois Langdon desconfiado de Siena ao abraçá-la, antes de voltar ao hotel, conseguiu sem ela perceber tirar com uma pequena lâmina afiada, um pedacinho do tecido do vestido de Siena.

Voltaram ele e Siena a se encontrar no dia seguinte, a pedido de Langdon.

— Siena, analisei o tecido que peguei no local do roubo e tirei um pedacinho do vestido que você vestia ontem e são iguais.

— Eu te pergunto? Por que você está envolvida neste roubo?

Siena lhe responde sem pensar:

— É verdade Langdon, eu contratei profissionais para efetuar este roubo, para me vingar do Diretor Geral que me persegue desde que assumi o cargo de Diretora do Museu. Eu vou devolver a estátua, se você me prometer que não me acusará.

Langdon achou que valia a pena perdoar Siena e lhe disse:

— Não vou lhe acusar, você tem minha palavra de honra.

— Langdon,  existe um ditado famoso ao qual não segui: “A maior vingança contra um inimigo é perdoá-lo”, porém eu não consegui perdoar o Diretor Geral e cheia de ódio me vinguei.

Langdon sorri:  

— Vamos tomar um café e providencie a devolução da estátua. Ambos trocaram um olhar cúmplice e sorriram.  Siena deu o braço a Langdon e saíram andando tranquilamente.

 

 

quinta-feira, 1 de julho de 2021

O VIZINHO FALANTE - Dinah Choichit

 


 O VIZINHO FALANTE

Dinah Choichit 

Eu moro num lugar  tranquilo ,não conheço todos de lá  mas minha vizinha tem um filho muito esperto que conversa muito comigo e me conta vários casos  interessantes. Outro dia ele falou que tinha um amigo que lhe deixava muito curioso com suas histórias sobre  o que lhe acontecia, como no dia que ele percebeu que seu chefe estava mau humor, gritando com todo mundo e quando questionado disse “as pessoas são capazes de ir muito mais longe por causa daquilo que temem do que por causa daquilo que desejam”.

Outro caso que ele contou foi que ele foi convidado para ir passear de barco porque estava um dia de mar tão tranquilo que valia a pena sair para passear, quando eles começaram a navegar o mar foi se agitando cada vez mais, foi quando ouviu o Capitão dizer “O fato do mar estar calmo na superfície não significa que seja calmo nas profundezas”.

Sempre nos encontrávamos para conversar e refletir sobre seus contos, até que um dia ele chegou triste e eu lhe consolei dizendo “Todos temos uma guerra dentro de nós. Às vezes ela nos mantem vivos. Outras vezes ela nos ameaça nos destruir”.

CURON - Alberto Landi

 




CURON

Alberto Landi


Eram muito emocionantes as histórias contadas pelos meus avós, sobre a terra natal Itália.

Histórias carregadas de muita emoção. Com detalhes curiosos, principalmente na pequena igreja, tida como símbolo do lugarejo, local onde se casaram.

A família costumava se reunir após o almoço de domingo. A casa era aconchegante, espaçosa, com terraço de tijolos batidos, cadeiras de vime, rede, quadros religiosos e muitos pássaros cantando, enchendo de sons o ambiente.

No quintal, muitas arvores frutíferas, criação de galinhas, cabras, ovelhas e, também uma horta com variação de legumes e hortaliças.

A vida ali era muito saudável, todo o alimento vinha das plantações e do leite das cabras. Minha avó costumava fazer muitos doces em calda e uns pães caseiros deliciosos.

A tranquilidade e a alegria dos moradores do local, parecia que jamais terminariam. Até que esse pequeno lugarejo circundado pela imponência dos Alpes. Fronteira com a Áustria, Suíça e as regiões italianas da Lombardia e Veneto. Um campanário submerso tornou-se protagonista de um lugar magico que parece ter saído das páginas de um conto de fadas.

Hoje, esse lago artificial evoca lembranças tristes. A água invadiu os terrenos, plantações, casas e uma igreja do século 14, a mesma da qual ainda é possível admirar o campanário no lago de Resia.

A História afirma que durante o inverno ainda é possível ouvir o badalar dos sinos do fundo do lago, mas o detalhe é que eles foram removidos do campanário antes da construção da represa.

A pequena igreja, a cargo do padre Michele, lotava aos domingos. Um dia, na saída da missa, meu avô conheceu Giovana, a minha avó. A cerimônia do casamento, foi realizada pelo padre Michele e a pequena comunidade compareceu em massa. Houve uma bela festança com comidas e música.

Meus avós formaram uma família, com 5 filhos, e depois do desaparecimento do vilarejo, mudaram-se para a região da Toscana.

Nesse novo lugar cuidavam das plantações e colheitas de uvas, as quais eram colhidas e vendidas para uma cooperativa local, para produção de vinho.

De vez em quando visitávamos Curon. Sentíamos muita tristeza, porém o lago continua lá no seu lugar. De vez em quando há a limpeza e a drenagem. E o que aparece sempre é o campanário. Lembranças emergiram das nossas mentes.

Essa é a doce recordação que tenho de meus avós e do vilarejo de Curon!   


O ANJO DO CÉU E A LIBERTAÇÃO DE MIGUEL - Leon Vagliengo

 

 


O ANJO DO CÉU E A LIBERTAÇÃO DE MIGUEL

Leon Vagliengo

 

Um conto baseado em recortes sobre o sofrimento e o resgate do viver.

 

Ser feliz é uma responsabilidade muito grande. Pouca gente tem coragem. As razões possíveis são muitas, uma delas aqui exemplificada na história de Miguel, que passo a lhes contar:

Nascido de família de classe média, Miguel carregava em sua personalidade os efeitos de uma educação familiar básica, mas correta, moldada ao longo de sua infância e adolescência para que se tornasse um bom cidadão, capaz de enfrentar as circunstâncias da vida adulta.

Nesse processo, porém, um fator havia prejudicado a formação de seu equilíbrio emocional: o seu pai era um homem bom, correto e trabalhador, mas alcoólatra; não conseguia evitar a bebida, embora ele mesmo tanto o desejasse. Costumava embriagar-se quando não estava no emprego e brigava muito com a sua mãe, submetendo o seu lar a frequentes conflitos.

Outras vezes, embalado pela bebida, causava situações vexatórias perante os conhecidos, em situações como festas de casamento ou aniversário, ou provocava grande tensão e risco ao guiar o seu carro levando a família, apesar de sua grande habilidade na direção.

Nesses momentos Miguel a tudo assistia, às vezes com medo, sempre com muita vergonha, pois o protagonista era o seu pai.

Sua pequena família, porém, mantinha-se estável graças à inabalável consciência que ambos, seu pai e sua mãe, mantinham de suas obrigações familiares, apesar de tão prejudicada pela abominável doença do alcoolismo.

Apesar do amor que tinha por seus pais, essas situações marcaram profundamente e de forma indelével a personalidade de Miguel, pois aconteciam repetidamente durante todo o período mais intenso e sensível da formação de sua personalidade, consolidando nele um sentimento de muita insegurança. Tinha medo de que os amigos percebessem a embriaguez de seu pai, e ficava muito tenso e envergonhado quando eles o viam naquelas condições.

Filho único, tornou-se um adulto muito tímido, e ainda jovem aos seus trinta e poucos anos, permanecia morando com os pais. Não tinha estímulos para realizar os seus sonhos e acreditar em si mesmo na tomada de atitudes, algumas até necessárias para o seu bem-estar.

Tinha consciência de sua inibição, e sofria muito por seus efeitos. Inseguro, era muito difícil para ele aproximar-se de alguma moça para tentar um relacionamento, pois sentia que não saberia como agir e, muito pior, apavorava-se ao imaginar que poderia passar por algum vexame quando em algum inevitável momento se encontrassem com o seu pai naquelas temidas condições.

Não obstante, Miguel era uma pessoa afável, sempre solícito e amigo, simpático a todos que o cercavam, que não percebiam o seu conflito interior.  Mas, como sabemos, o fato de o mar estar calmo na superfície não significa que algo não esteja acontecendo nas profundezas.

Assim, nessa insegurança, passara a sua infância e adolescência; e a sua vida seguia, solitária e sem brilho, voltada quase que tão somente para as atividades formais de estudo e trabalho, em que ele se dedicava com afinco por vê-las como a obrigação a ser cumprida e até como uma forma de descarregar as suas tensões.

Em verdade, todos temos a guerra dentro de nós. Às vezes ela nos mantém vivos. Outras vezes, ela ameaça nos destruir. Com empenho no estudo e no trabalho Miguel compensava as suas guerras internas e sobrevivia, evitando, assim, a sua própria destruição.

 

Apesar de tudo, graças a essa dedicação Miguel obteve bastante sucesso na vida profissional e conseguiu um emprego promissor e estável, onde, apesar de jovem, já era respeitado por sua competência e saber, conquistando um bom salário. Deduzia que, no fundo, esse sucesso era fruto de seus terríveis temores, e que as pessoas são capazes de ir muito mais longe por causa daquilo que temem do que por causa daquilo que desejam. E ele temia desejar alguma coisa que lhe exigisse atitudes.

A sua timidez era um terrível incômodo, sempre presente a atormentá-lo. Procurava ficar longe de festas e outras situações de relacionamento social, dificilmente tomava a palavra nas reuniões de trabalho, sofria muito só em pensar que poderia ser convidado para alguma apresentação em público, pois achava que iria gaguejar, dizer coisas tolas ou sem propósito, perder-se na argumentação, enfim, submeter-se a um imaginário e temido vexame.

A sua vida era por isso uma permanente tensão, sentia como se a qualquer momento tudo iria desabar. Miguel tinha a consciência de que todo aquele sentimento negativo era fruto de sua imaginação, mas estava profundamente arraigado em sua mente, bloqueando as suas ações. Sabia também que tinha tudo para ser feliz: era ainda jovem e já estava bem financeiramente, percebia a admiração que despertava em algumas moças, mas tinha medo de tomar atitudes, inclusive para aproximar-se delas.

Em verdade, achava que ele próprio era o seu maior inimigo, a impedir-se de ser feliz. Às vezes sentia raiva e uma estranha vontade de vingar-se de si mesmo. Em suma, Miguel não conseguia sentir-se feliz. Faltavam-lhe as atitudes.

Foi quando ela entrou em sua vida.

 

A nova secretária do diretor da empresa a quem Miguel estava subordinado, Maria do Céu, com esse nome diferente e doce logo chamou a sua atenção. Na apresentação, ela lhe pareceu muito educada e simpática; e o melhor: era uma morena muito bonita, mais ainda por efeito do belo sorriso, e pareceu interessar-se por ele. Evidentemente, Miguel logo reagiu a essa impressão, concluindo que ela estava apenas mostrando-se educada.

 

Os dias seguintes se encarregaram de mostrar a Miguel que ele estava enganado.

 

 A todo momento Maria do Céu aparecia com algum assunto de serviço, feliz em encontrar pretextos verdadeiros para vê-lo, e a amizade entre eles foi se firmando.  Ela não teve dificuldade para perceber a inibição de Miguel e, inteligentemente, passou a abordá-lo sempre com o devido cuidado para não despertar a sua insegurança.

 

A habitualidade desses momentos teve o mérito de dissolver a timidez de Miguel em relação a ela, e ele sentia-se confortável com a sua presença. Em pouco tempo passou a esperar com ansiedade por essas oportunidades, ainda achando que, da parte dela, fossem motivadas apenas pelo trabalho...ou será que não?

 

A resposta partiu dele mesmo, numa dessas ocasiões. Repentinamente, surpreendeu-se ao ouvir a própria voz romper corajosamente as suas barreiras imaginárias, convidando-a para jantar. Ela olhou para ele com ar de incredulidade, durante o que lhe pareceu, aproximadamente, um século. Então, abriu o seu belo sorriso e aceitou, deixando claro o seu contentamento.

 

Depois daquele jantar muitos outros se sucederam e o relacionamento entre eles se estreitou. Maria do Céu teve o cuidado de respeitar o protocolo romântico e esperou que ele, não ela, revelasse as suas intenções, embora fossem as mesmas. Assim, por causa da timidez de Miguel, demorou um pouco para que se confirmasse o compromisso; mas, em verdade, muito antes da confirmação ele já era sabidamente irreversível.

 

Miguel continuava tímido, mas agora tinha um amparo, não se sentia mais sozinho para enfrentar as suas angústias. Maria do Céu procurava incentivá-lo, sempre cuidadosamente para não ferir o seu amor-próprio.

 

Com o passar do tempo Maria do Céu foi conquistando a confiança de Miguel, até que um dia ele criou coragem para abrir-se com ela sobre os seus temores e a culpa que sentia por ser uma pessoa tão inibida e sem atitudes importantes. E concluiu dizendo que, por isso, considerava a si mesmo o seu maior inimigo.

 

Pacientemente, Maria do Céu o ouviu e ao final, sabiamente, sugeriu que ele se perdoasse, pois, como ela aprendera com a sua mãe, a maior vingança contra um inimigo, é perdoá-lo. No caso não seria exatamente uma vingança, como no dito popular, mas este perdão seria o reconhecimento de que ele não tinha a culpa que imaginava, não era o seu próprio inimigo. Tinha que perdoar-se, não mais martirizar-se, e ela o ajudaria a tomar as atitudes que lhes trariam alguma felicidade.

 

E assim tudo aconteceu.

 

Com a ajuda de Maria do Céu, Miguel assumiu o comando de sua vida, deixando a casa dos pais e formando com ela o seu próprio lar.

 

Sentia que nunca superaria completamente a timidez e a inibição geradas pelas circunstâncias que as implantaram em sua mente durante a infância e adolescência, pois as raízes eram muito antigas e profundas. Isso seria muito difícil, se não impossível.

 

Porém, Miguel conseguiu finalmente compreender-se e conviver melhor consigo mesmo, graças ao apoio do Anjo que um dia desceu do Céu para protegê-lo e ficou para viver ao seu lado.

COELHO ESPERTO - Dinah Choichit

 


COELHO ESPERTO

Dinah Choichit

 

Estávamos em um casebre perto de uma trilha estreita com ruídos de animais, alguns eram encantadores e outros me assombravam. De trás do casebre surgiu um coelho assustado pois um animal maior o perseguia, um lobo. De repente foi ouvido um apito, era do guarda florestal. Assim que o coelho ouviu, se assustou e se escondeu dentro de um buraco. O lobo tentou ir atrás, mas o guarda florestal conseguiu espantá-lo.

Ao amanhecer uma águia pousou no telhado do casebre ao ver o coelho se mexer, porém ele não saiu de lá, e após uma tarde de espera ela decidiu ir embora.

Viagem ao passado - Helio Salema

 



Viagem ao passado

Helio Salema

 

Recebi pelo celular a notícia de que a cidade dos meus avós, e de meus pais,  iria ressurgir com o esvaziamento da lagoa. Era minha prima me convidando para irmos assistir.

Embora eu não tenha vivido naquela cidade, me emocionei ao lembrar das histórias contadas pelos meus pais e alguns tios, todos já falecidos. Não imaginava ver a casa, a loja nem o colégio. Mesmo assim fiquei empolgado.

Fiz uma lista do que precisava levar. Liguei para um amigo que gostava de fotografar para lhe pedir sugestões. Expus com detalhes o motivo, ele prontamente me ofereceu uma câmera muito boa que não usava há muito tempo. Separei roupas, dinheiro para as despesas pois minha prima já havia reservado hotel numa cidade próxima. Meu irmão disse que até gostaria, mas estava ocupadíssimo na empresa e não poderia se ausentar. Pediu para tirar muitas fotos e enviar para ele.

 

Viajamos no carro da prima Laura. Ela explicou que sua mãe, tia Clara, devido à idade bastante avançada e muito doente, não foi informada. Duas irmãs de Laura tomariam conta da mãe, enquanto estivesse ausente. Durante a viagem conversamos muito. Como não tínhamos contatos frequentes, foi muito bom ouvir os planos dela para depois de formada em arquitetura. Fiquei sabendo que já trabalhava com arquitetos amigos. Falei do meu trabalho no escritório de contabilidade. Também de minha intenção de fazer Direito, depois de concluir o de Ciências Contábeis.

No hotel fomos muito bem recebidos, era administrado por uma família, que nos receberam como se fôssemos parentes. Depois de descansar, desci para o jantar. Uma comida simples mas muito boa. Ficamos por um bom tempo conversando. Laura disse estar ansiosa, pois nunca tinha visto de perto as ruínas de uma cidade inteira. Eu também estava ansioso pela oportunidade de uma experiência nova. Já com a hora avançada fomos dormir.

No dia seguinte acordei cedo, como de costume. Desci,  fiquei conversando com outros hóspedes aguardando Laura. Assim que desceu, juntou-se ao grupo. Tomamos café todos juntos. Pessoas agradáveis e divertidas. Foi uma boa conversa.

Saímos logo após o café, em poucos minutos chegamos ao local. A lagoa já estava vazia. Caminhamos juntos em silêncio naquilo que parecia ter sido uma rua.

Por todo lado o que se via eram pedras espalhadas pelo chão, eu não percebi o menor sinal de que algum dia ali existiu uma cidade.

Eu não reconhecia nada daquilo que descreveram nas histórias,  mas senti uma tristeza enorme por lembrar que ali nasceram e viveram pessoas  importantes na minha vida. Tiveram que abandonar tudo sabendo que nunca mais poderiam rever,  mesmo  estando vivas.

Minha prima Laura examinava longamente os vestígios de possíveis prédios. Como eu não havia usado a câmera ainda,  ela perguntou se eu não iria tirar fotos. Respondi que não sentia vontade. Entreguei a ela que imediatamente começou a fotografar tudo que via.

Eu continuava a pensar nas pessoas. Por mais interessante que fosse a paisagem nos morros ao redor, nada me alegrava. Por que destruir uma cidade, tirar o povo dali contra vontade?

Será que realmente não havia outra alternativa?

Fiz esta pergunta à prima.

 - Provavelmente sim, sempre há várias opções, mas não sabemos o real motivo da escolha.

Sentamos em um bloco de pedras e ficamos por muito tempo em silêncio olhando algumas  poucas pessoas que caminhavam  pelos escombros.

Falei que estava com fome,  ela disse que estava quase na hora do almoço. Caminhamos em silêncio até o carro.

O restaurante do hotel estava vazio. Almoçamos em silêncio.

Fui para o quarto descansar. Dormi o suficiente para recuperar as energias. Acordei com Laura me chamando para irmos embora e chegarmos em casa antes de anoitecer.

Na volta para casa conversamos sobre a oportunidade que tivemos de uma nova experiência. Tudo muito diferente e estranho. Certamente, vamos levar muito tempo meditando sobre tudo que vimos e sentimos. Ela prometeu imprimir as fotos, encaminhá-las para o seu tio.

Ao chegar em casa senti como se estivesse, nas últimas horas, vivido em dois mundos.

LIVRO ANTIGO - Dinah Choichit

 




LIVRO ANTIGO

Dinah Choichit

 

Achei na minha biblioteca aquele livro antigo, esse livro conta a história de um ônibus   em uma cidade. Essa cidade fica o interior de São Paulo, onde tem um parque para crianças e várias outras atrações para adultos. A cidade é turística e possui vários ônibus lotados e cheios de crianças com a intensão de se divertir no parque.

Numa tarde ouvimos um estrondo e percebemos que era um tiroteio vindo de dentro de um dos ônibus, que quase não tinha passageiros. A porta abriu e de lá saíram  dois homens fugindo, entramos e vimos um policial amigo sem sapatos, estava morto. Ele carregava em uma das mãos um pacote de pedras e na outra segurava o bolso.

Essa e a história que lembrei quando li meu livro de papel áspero e grosso. Quando terminei meu livro percebi que já estava anoitecendo, levantei para fechar a janela e foi quando ouvi um grito de horror e vi o carteiro correndo com sua bicicleta. Fiquei preocupada, mas resolvi ir dormir, pois imaginei que o grito poderia ser de uma coruja.

 

 

Livro Antigo - Helio Salema

 


Livro Antigo

Helio Salema

 

Ao procurar um livro antigo para emprestar a um amigo, lembrei de como nos conhecemos.

Eu estava no ônibus para casa quando uma pessoa bem mais jovem sentou-se ao meu lado.  Notei que tinha nas mãos um pequeno caderno e lápis. Olhava para uma pessoa, atentamente, logo em seguida abria o caderno e anotava algumas coisas. Depois parece que escolhia outra pessoa, novamente, abria o caderno e mais anotações.

Guardou o caderno na mochila. Olhou para mim e perguntou se eu usava este ônibus sempre neste horário. Respondi que raramente. Ficou em silêncio, como se minha resposta não fosse a que ele esperava. O silêncio continuou e me incomodou. Então resolvi saber o porquê da pergunta.

Prontamente me explicou que neste horário, nesta mesma linha tinha ocorrido um assalto e um policial amigo dele tentou prender o ladrão quando foi baleado e veio a falecer.

Naquela época ele estava de férias na cidade dos seus pais e só ficou sabendo quando retornou.

Ele disse que era carteiro,  sempre fazia este trajeto de bicicleta. Como hoje completava dois anos do ocorrido e seu dia de folga,  resolveu fazer o trajeto de ônibus. Observar os passageiros para implementar o livro. Dados oficiais, ele já os possuía.

Iria descer logo em seguida, onde aconteceu o fato , para anotar mais alguns detalhes.

Eu lhe disse que infelizmente, não morava naquele bairro na época, mas gostaria de ler o livro dele. Respondeu que seria um prazer e acrescentou que me mostraria anotações que ele tinha sobre outros contos, que sempre escrevia.

Anotou meu endereço e disse que qualquer dia levaria seus cadernos para eu ler. Fiquei surpreso em conhecer alguém que se interessava tanto em escrever sobre a morte de um amigo. Pensei… o que é uma amizade? Será que algum amigo meu faria isso?

Certamente, não.

Depois de transcorrido uma semana ele apareceu, no meu portão, com dois cadernos. Assim que me entregou disse que estava com pressa. Pedi que aguardasse só um instante. Rapidamente peguei o livro e o levei até o portão. Ao pegar, leu o título, sorriu, agradeceu e saiu muito contente.

Era um livro que comprei há muito tempo, mas não tive oportunidade de usar. Técnicas de Redação.

 

EM TEMPOS DE PANDEMIA - Alberto Landi

 

EM TEMPOS DE PANDEMIA

Alberto Landi

 

Era um pequeno vilarejo ao pé da Serra da Estrela, em Portugal. Rodeado por grandiosas paisagens, fica junto a uma cadeia montanhosa da Serra da Estrela, a mais elevada em Portugal Continental.

No inverno fica coberta de neve e eventualmente no inicio da primavera. As casas, todas encantadoras, confortáveis e funcionais. A  localização do vilarejo é muito tranquila, e de fácil acesso às principais vias. As casas, na maior parte, em tons claros alaranjados, alinhavam-se no vale como se respeitassem o monte que lhes fornecia sombra.

Como na grande parte dos vilarejos de Portugal, havia uma integração entre os moradores, eram amigos entre si, e de alguma maneira até certo parentesco. Alguns diziam que eram descendentes do rei D. Diniz.

Isa vivia nesse tranquilo vilarejo. Sua casa era conhecida por casa das rosas, não pela pintura, mas sim pelo jardim florido com vários tipos de rosas. Era um sombrio casarão de paredes um tanto severas. Tinha um aspecto triste, parecia mais uma residência eclesiástica. Havia um revestimento quadrado de azulejo fazendo um painel no lugar heráldico do escudo de armas da família, que nunca chegara a ser colocado, e representando um grande ramo de rosas e girassóis. Ao fundo um terraço de tijolo, um pobre quintal, abandonado às ervas bravas, com um cipreste e um cedro envelhecendo juntos como dois amigos tristes. Um tanque entulhado e uma estatua de mármore ainda conservada de Vênus.

Isa compartilhava com os moradores um clima de união e bem-estar.  A vida ali era muito saudável.  Tudo que comiam vinham das plantações e criações de animais, como ovelhas, cabras, vacas. A tranquilidade e alegria dos moradores, parecia que jamais terminariam.

A primavera alí era muito abundante. Sobre as florestas da Serra da Estrela navegavam nuvens baixas de algodão com pontas dependuradas, através das quais em saltos, precipitavam-se as chuvas cálidas com cheiro de terra. Era a época em que a terra surge debaixo da neve  quase da mesma forma em que foi coberta , há meio ano. As florestas emanavam umidade e estava toda coberta de folhagem do ano anterior, parecia um quarto desarrumado. Em algum lugar longínquo o primeiro rouxinol testava as suas forças, com intervalos mais longos ainda um melro assobiava como se estivesse soprando em uma flauta entupida.

Isa, nos seus 23 anos, jovem, solteira, olhos verdes claros e pele morena. Tinha feições meigas e semblante calmo. Todos a admiravam pela sua simplicidade e beleza.

Ela não queria mais amar ninguém, pois seu coração foi ferido varias vezes. Mas tudo mudou! O mundo entrou na pandemia.

Milhares de pessoas não se viram mais, isolamento quase total das famílias. Isa tinha casa, mas não tinha a família junto de si.

Os dias iam passando e ela reencontrou um amigo de infância. Tudo estava bem entre eles, mas, um dia ele se declarou. Confessando o quanto a admirava e o quanto gostaria de estar com ela.

Isa se emocionou diante da confissão e pensou que sempre em algum lugar existe alguém que ama em segredo. Ela acreditou que seu amigo estava sendo sincero, e talvez estava. Mas os dois eram como água e óleo, estavam na mesma fase da vida, mas não se misturavam. O coração até queria, mas a razão prevaleceu, não daria certo a mistura.

Uma amiga de Isa, a convidou para participar de um grupo nas redes sociais, para conhecer novas pessoas e assim afastar sua tristeza. Prontamente aceitou, afinal o que fazer em uma quarentena sem a família junto de si, sem trabalho e sem um amor para gostar.

Começou a se interessar pela informática, para afastar uma possível depressão por estar só. A quarentena foi péssima para alguns, mas para ela foi o melhor que podia acontecer.

Num dos grupos que participava havia pessoas que se tornaram interessantes. Havia um rapaz que chamou sua atenção, por terem muitas coisas em comum, era o Marcos, formado em Ciências econômicas.

Com as trocas de mensagens escritas e às vezes por áudio, Marcos confessou a ela que tinha uma voz sensual. Isso fez com que ela se sentisse lisonjeada.

Os dias se passaram, as conversas aumentaram. Após um período ela resolveu se afastar, as trocas de mensagens cessaram, e o medo tomou conta dela.

Meses se passaram e a quarentena continuava. Isa resolveu se reaproximar de Marcos. Aprendeu que a coragem não é a falta de medo, mas o triunfo sobre ele. A pessoa corajosa não é aquela que não sente medo, mas a que conquista esse medo. Não importa quantas vezes você caia, mas o mais importante é levantar-se.

Pensou: hoje estou renascendo.

Nessa pandemia estava se reencontrando, percebendo suas fraquezas, mas também seu lado positivo. As nossas vidas são como um ímã, que atraem ao seu lado, pessoas certas, no momento certo, e você precisa estar consciente disso e reconhecer.

Uma coisa ela percebeu. A pandemia estava lhe favorecendo.

Na semana que antecede o dia dos namorados, Isa resolveu fazer uma surpresa a Marcos. Para isso consultou o site de compras no seu computador.

Começaram a descobrir algo muito além de uma amizade. Mostrando mesmo que em tempos de pandemia, a felicidade pode ser encontrada.....

E assim Isa, sentiu-se novamente com vontade de viver de forma intensa, ela e Marcos...... 

 

O SEGREDO DE UMA LÁGRIMA - Pedro Henrique

  O SEGREDO DE UMA LÁGRIMA Pedro Henrique        Curioso é pensar na vida e em toda sua construção e forma: medo, terror, desejo, afet...