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segunda-feira, 13 de outubro de 2014

DESPEDIDA - HIRTIS LAZARIN


DESPEDIDA
HIRTIS LAZARIN

          Eram apenas nove horas da noite e Marcos já dormia um sono profundo.  Cobri seu corpo nu, afaguei seus cabelos negros e  fartos que cobriam-lhe os olhos.
          Quando o conheci, eu tinha concluído meu curso de jornalismo.  Pretendia viajar o mundo, mochila nas costas, queria chegar até os monges tibetanos, antes de entrar no mercado de trabalho.

          Ele já tinha 32 anos e eu apenas 22.  Era forte, másculo, experiente e seguro.  Sabia muito bem o que queria.  Carregava-me no colo e eu me sentia a criança mais protegida do universo.

          Foi uma paixão alucinante, invadiu-me através de todos os meus poros, entrou-me na corrente sanguínea e fixou morada no meu coração.  Contrariava todos os meus planos.

          Hoje, dois anos após nosso casamento, um vazio começou a me incomodar.  Não se preenchia com o amor de Marcos, com a casa dos meus sonhos, nem com a segurança financeira que ele me proporcionava.

          A minha razão vinha brigando com meu coração.  Uma luta que começou desigual, teve reviravolta.  O coração se rendeu, jogou a toalha no ringue.  Nossos objetivos de vida tomavam rumos diferentes.  Ele sonhando com filhos e eu sonhando em viver livre como o vento, dançar, saborear a vida, banho de sol e de lua, conhecer o certo e o errado, juntos e misturados.  Carregar o meu violão, rimar meus versos, cantar com emoção.  Sair sem ter hora pra voltar, dormir no chão, pisar na grama sem reclamar.

          Beijei-o com delicadeza e muito carinho.  Guardei todos os porta-retratos espalhados pela casa.  Acariciei nosso vira-lata que me olhava com tristeza.  Sem bater a porta, saí.  A ponta da minha blusa serviu- me de lenço.

          Entrei no carro e parti, levando apenas uma mochila de roupas.

          Despedida assim evita o choro e as lágrimas, lágrimas trazem lamento, lamento traz dor da perda e perda traz sofrimento.

          É triste?  Eu sei. 

Dá vontade de chorar?  Eu sei. 


Mas, toda despedida exige um recomeçar.  Dentro de cada recomeçar mora um encanto.

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