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quinta-feira, 8 de março de 2018

Só podia ser olho gordo - Hirtis Lazarin


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Só podia ser olho gordo
Hirtis Lazarin

Itaoca, uma cidadezinha do sertão maranhense, estava pra sumir do mapa.  Os moradores mudavam-se aos poucos, em busca de estudo e trabalho nos centros mais prósperos.

Depois de conversas e desconversas, João Teodoro aceitou o cargo de delegado.

Não havia homem melhor que ele pra ocupar esse cargo.  Nasceu em Itaoca e sempre se orgulhou de ser honesto, trabalhador e cheio de prosa.

Pensou ele: "Não vou ter tanto pra fazer aqui.  Nossa cidade é pacata, todos se conhecem e há mais de quinze anos não acontece um roubo de doce de padaria".

Os dias foram passando tranquilos.  A única preocupação de João Teodoro era abrir a delegacia bem cedinho e fechá-la às dezoito horas.

Até que, numa segunda-feira como outra qualquer, altas horas da noite quando a cidade dormia, ouviram-se explosões e mais explosões de bombas.

As janelas todas abriram-se simultaneamente.  Os curiosos queriam saber quem eram os autores dessa brincadeira.

Esse seria, até agora, o trabalho mais sério que apareceu pra João Teodoro resolver.

Ele não perdeu tempo, pulou da cama, vestiu a farda, municiou o trinta e oito herdado do pai, fabricado na década de vinte.

Todo imponente apareceu na rua principal de Itaoca.

Foi recebido por rajadas de metralhadora, que só silenciaram, assim que o delegado caiu esparramado no chão.

Sangue escorreu em quantidade suficiente pra colorir o asfalto.

A quadrilha acabara de explodir o único caixa eletrônico da cidade.  Deixaram a cidade acenando para o povo assustado que espiava por trás das janelas entreabertas. 

Hoje João Teodoro ocupa o mausoléu mais" chic" do cemitério.  Um presente dos itaoquenses.  Ninguém se conformava com a morte violenta do ilustre cidadão.

Flores silvestres nasceram ao redor do túmulo, de livre e espontânea vontade.
E Itaoca, finalmente, desapareceu do mapa.  

O delegado - Henrique Schnaider



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O delegado
Henrique Schnaider


João Teodoro aceitou emocionado o cargo de Delegado da pequena Itaoca.

Foi programada a solenidade de posse, com a presença de todas pessoas ilustres da cidade, inclusive o Prefeito.

No dia, pediram ao pobre coitado que fizesse um discurso, deixando o infeliz engasgado, já que era analfabeto e com muitas dificuldades de oralidade, mal conseguiu balbuciar algumas palavras.

O público levado pelo entusiasmo com a nova autoridade da cidade, aplaudiu delirantemente, como se tivessem, acabado de ouvir uma peça oratória de Rui Barbosa.

Assim, prosseguiu a festa da posse daquele João ninguém que se desmanchava em mesuras a todas as pessoas presentes.

No dia seguinte assim que acordou, João Teodoro partiu a procura da Professora Antônia, única mestra de Itaoca.

O recém-nomeado Delegado, muito tímido, queria que a mestra lhe ensinasse o b a bá , mas queria que ela mantivesse sigilo, pois não seria interessante, que Itaoca, soubesse que o novo Delegado da cidade era completamente analfabeto.

Com o correr dos dias, ele foi dominando as letras e ficava cada vez mais sabido, aprendendo tudo sobre a língua e finalmente, acabou alfabetizado.

Nova festa na cidade e chamam João Teodoro para fazer um discurso para a Santa Padroeira, e para assombro de todos cidadãos de Itaoca, ouviram um discurso de um grande orador, com muitas qualidades, a ponto de falar por mais de uma hora.

Assim João Teodoro, se tornou, um respeitado Delegado e uma das pessoas mais ilustres da cidade, a ponto de ter sido convidado, para ser o paraninfo da formatura dos alunos da Professora Antônia, que feliz da vida, sabia que havia mudado a vida daquele homem.


A voz do mar é sedutora e nunca cessa. - Ilka Andrade


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A voz do mar é sedutora e nunca cessa.
Ilka Andrade

Ele é monitorado pela gravidade da lua e do sol

Observando um Mar litorâneo as ondas formadas pelo vento avançam na areia e ao retornar deixam a areia limpa e úmida. Com os pês no chão sentimos a areia macia ou áspera, quente ou fria úmida ou seca, neste contato absorvemos a textura da água do mar a qual nos dá um ar de liberdade! A maré é inconstante muda nas 24 horas. Mesmo sendo de água salgada há momentos em que ela nos transmite calma e doçura! No descer do dia ela se manifesta, ondas volumosas, audaciosas que ao recuar formam buracos com rodomoinhos capazes de engolir um ser humano. Baixando a maré, volta a calmaria.

O volume e a beleza da água transparente nos dão um bem-estar.  A voz do mar fala com a alma e tem um toque sensual que envolve o corpo.

Vamos agradecer a Deus. Somos abençoados por que temos o sol, o céu, e o mar.

JOÃO VALENTÃO - Henrique Schnaider



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JOÃO VALENTÃO
Henrique Schnaider


Os anos se passaram e João Teodoro, casou-se com uma das mais belas moças de Itaoca, Jussara. Formou uma bela família de três filhos, dois homens e uma linda garota. Tinha como sogro, o prefeito da Ernestinho Veiga, político corrupto, venal e perigoso, pois mandava seus capangas matarem os adversários, não só políticos como, qualquer um que tivesse coragem de se indispor contra ele.

A autoridade de João sobre a cidade era indiscutível, a ponto de os cidadãos de Itaoca passarem a temer a figura do Delegado, e já havia um burburinho, entre as pessoas tramando a demissão da autoridade máxima do Município.

João e Ernestinho se entendiam, cada vez melhor. O Delegado, começou a dar cobertura a todas atividades ilícitas do sogro, desovando cadáveres em valas sem nome, daqueles que eram assassinados pelos capangas do Prefeito.

Certa noite, destas que as pessoas têm medo de sair de casa, escura como breu, com raios cruzando os céus durante a chuva, na calada da noite percebiam-se vários homens de aparência sinistra, caminhando em direção a ponte que cruza o Município de Itaoca, carregando o que parecia ser, vários corpos inertes, possivelmente assassinados pelos capangas de Ernestinho.

Os suspeitos atiraram os corpos de cima da ponte no rio. No dia seguinte, cinco corpos de pessoas barbaramente assassinadas, são encontrados, boiando no rio.
A cidade toda, ficou em polvorosa, o assunto era só esse, todo mundo revoltado com as coisas horríveis que aconteciam, transformando, Itaoca, em lugar sem lei.

Os cidadãos, se uniram em grande número, dirigindo-se a delegacia, estavam furiosos, exigiam que a Justiça fosse feita com a prisão daqueles jagunços, os quais, faziam o que bem entendiam na cidade, como se fossem donos da mesma.

João Teodoro recebeu a multidão enfurecida, na porta da Delegacia, encarou a todos, sem demonstrar nenhum receio, enfrentando-os de peito aberto e de armas nas mãos, acompanhado dos jagunços de seu sogro, que também estava ali, desafiando as pessoas, querendo impor ambos, a lei do silêncio.

A turba enfurecida, também não se intimidou e avançaram sobre João, Ernestinho e os capangas, a confusão foi geral, transformando-se numa tremenda carnificina.

João, furioso atirava para todos os lados. A esta altura, dezenas de pessoas já mortas e outras gravemente feridas.

O Delegado que sempre se mostrou, uma pessoa extremamente decente, agora não passava de um facínora sanguinário, um valentão que a tudo enfrentava, cruel, sem o menor sentimento de culpa com a tragédia acontecida.

João e seu sogro estabeleceram a lei do silencio, de recolher aos habitantes de Itaoca, ninguém podia pcolocar os pés para fora de casa. O horror, o medo tomaram conta da cidade.

As pessoas procuravam conversar, achar alguma solução para aquela situação, já que nem sequer era permitida a entrada ou saída de quem quer que fosse, até as ligações foram cortadas. Assim começaram a faltar os gêneros de primeira necessidade.

João Teodoro parecia possuído, com tamanha crueldade de ser indigno, em que se transformara.

Os dias de horror prosseguiam, até que finalmente, depois de um mês nesta situação de pavor, João Vintém como era conhecido um moleque que vivia abandonado nas praças da cidade, conseguiu furar o cerco sem chamar atenção, se dirigiu até a cidade mais próxima bem maior que Itaoca, foi até a Delegacia de polícia de Inhaúmas, denunciou ao Delegado Gentil, tudo o que estava acontecendo.

O Delegado comunicou os fatos relatados, ao comando da Policia Militar da capital, e ao Governador do Estado.

Tropas chegaram a Itaoca, invadiram o quartel general de João Teodoro e Ernestinho Veiga, ambos, foram presos depois de uma certa resistência, juntamente com seus jagunços. Foram removidos para capital onde pagariam na cadeia por muitos anos por todos os crimes cometidos contra a população.

Todos os cidadãos se reuniram na maior praça da cidade, fizeram um acordo para que o novo Delegado fosse uma pessoa digna e alguém da confiança de todos.

João Vintém se transformou no herói da cidade, foi adotado pela Prefeitura que iria dali para frente, dar moradia, custear seus estudos e educação.

Assim, a paz voltou a reinar naquele fim do mundo, onde Itaoca existia. Logo João Teodoro, bandido e traidor, facínora, foi esquecido por todos.

JOÃO TEODORO – O HERÓI - Isabel Conde



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JOÃO TEODORO – O HERÓI
Isabel Conde

João Teodoro, que nunca quis ser nada, começou a pensar sobre aquela inesperada nomeação para delegado da pacata e decadente Itaoca, a cidade se seu coração. Itaoca, onde nada havia para ser feito, especialmente como delegado.

Tinha nascido e crescido lá, viu a cidade definhar a cada dia, mas mesmo assim ele amava tanto o lugar que acabou passando a vida apenas a observá-la e, na verdade, a ruir junto com ela.

Pensou que talvez tivesse sido porque faltou algo de muita importância para a cidade e para ele próprio, só não sabia o que!

Resolveu sair para caminhar pelas ruas de Itaoca, a fim de arejar um pouco a mente e tentar pensar em como a vida da cidade e a de seus moradores tinha ficado tão difícil ali, a ponto de não se manter.

 Viu   as ruas e as casas, quase tudo   desabitado. Um sol forte que tornava o ambiente árido fazendo tudo ficar como que amarelado.

Viu a pequena, mas linda igreja que permanecia em frente ao que tinha sido um dia, a praça da cidade. Hoje mais parecida uma obra de arte coberto por um pó uniforme... Desde os bancos espalhados por ela fazendo um corredor que levava à igreja, até o coreto, já destelhado, bem no centro do largo.

Passou pelo Fórum   que tinha sido muito importante em idos anos. O jardim que o rodeava, agora   com o capim alto e ressecado. Tudo fechado e cheio do mesmo pó que cobria todo o resto.

Em outra rua próxima, fechados, estava o que tinha sido o comércio de itaoca: um armazém, duas quitandas, uma farmácia, que chamavam de botica em sua infância. Tudo coberto daquele por aquele fino pó. Tudo muito só!

 As   casas por onde passou o fizeram lembrar a alegria, da qual tinham sido testemunhas, pois sua infância, junto com todos os que ali moraram, haviam sito muito felizes. Entre pega-pega, pique - esconde e outras brincadeiras, lembrou com saudade das vezes que se sentou nos degraus das casas de seus amigos para brincar as cinco pedrinhas, já à noitinha! Quando as mães chamavam, era hora de dormir. No dia seguinte, tudo começaria muito bem novamente! Todos se reencontrariam logo na primeira hora!

Sim, se encontrariam na Escola, que era um lugar mágico, único! Pensou que ali tinha começado a descobrir a vida... sua vida e a vida de tudo e de todos que estavam à sua volta! As descobertas eram diárias! Aprendeu a ler e a escrever! Podia observar que cada amigo tinha habilidades diferente, que a escola ajudava a aprimorar.

João Teodoro parou alí, em frente à Escola! Ficou alguns minutos olhando-a e ali mesmo resolveu mudar seu destino para sempre, como o de sua querida cidade, mas principalmente o de muitos que ali viveram e que gostariam de ter continuado vivendo.

Teve a certeza de que a coisa mais importante para uma cidade são as pessoas que moram nela. Só as pessoas podem construir um lugar. Mas a questão mais importante que ele descobriu foi que era preciso empoderar as pessoas, e isso não tinha se dado desde muito tempo.

Então, já sabia o que fazer!

Voltou para casa apressado e começou a entrar em contato com os amigos da Escola. Falou com Matilde, Trajano, Carlos, Carmem e Aparecido e como delegado, que agora era, e fazendo uso de todos os benefícios que o cargo lhe concedia, fez propostas de voltarem para Itaoca a fim de reconstruí-la.

Hoje, passados muitos anos, João Teodoro é reconhecido como herói. Ele fez a cidade voltar a se desenvolver por sua atitude de ter conseguido o retorno daqueles antigos amigos, que agora eram profissionais e pessoas de bem, cada qual em áreas diferentes. Muitas outras famílias, ao verem o desenvolvimento de Itaoca ir de vento em polpa, também voltaram a morar e investir na velha Itaoca.

Atualmente a cidade é próspera e as pessoas que lá vivem, muito felizes.
Anos atrás, em frente àquela imagem do o que tinha sido sua escola, ele teve um insight e começou a construção de escolas. Essa foi a decisão que mudou sua vida e a de todos.





quarta-feira, 7 de março de 2018

Numa excursão turística - Dinah Choichit



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Numa excursão turística
Dinah Choichit

Numa dessas excursões turísticas ao Museu na antiga Grécia, aconteceu um episódio alucinante que até hoje me dá calafrios.

Estávamos vendo esculturas da mitologia quando de repente, achei estranho, uma escultura enorme no fundo da sala, meio abandonada e numa escuridão total.

Me aproximei e foi me dando um arrepio, a figura era quase um ser humano, com 2 pernas, braços, uma cabeça de animal e muito peludo.

Olhando atentamente parecia que se mexia, fiquei estático, ele foi se tornando maior, maior e veio andando na minha direção. Quis fugir, mais estava paralisado. Ele foi chegando, chegando, olhou bem nos meus olhos e expeliu um sopro. Fiquei meio tonto. Em seguida mais um sopro. Tentei me segurar, mas senti a pancada do meu corpo no chão. Não vi mais nada.

Isso aconteceu por volta das 3 da tarde.

Me lembro bem que figuras iguais a dele e outros bem horripilantes, da cor do inferno, foram aparecendo, mexiam comigo, meus braços, me pondo em pé, me rodopiando, falavam cantando e soprando na minha cara. Tiraram minha camisa, rasparam minha cabeça e me puseram sentado numa poltrona que mais parecia um trono. Me fizeram beber um vinho doce e quente. Num minuto me senti forte feito um leão. Levantei e fiquei dançando com eles e belas mulheres mascaradas. Me senti o rei da festa. De repente uma pancada na cabeça e tudo voltou. Não senti mais nada, estava em pé na frente a escultura, com o relógio na mão, marcando 3 da tarde.

Realidade ou Imaginação?

ACREDITE SE QUISER - Hirtis Lazarin



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ACREDITE SE QUISER
Hirtis Lazarin

A pequena Itaoca, plantada no sertão maranhense, sofreu demasiadamente com a morte do delegado João Teodoro.

Ele não merecia ser  cravejado de balas.  Homem bom e prestativo, sempre disponível a ajudar os conterrâneos.   Amava-os  Pela simplicidade e pela sinceridade que mora no peito do itacaonse.

A rotina diária e o correr do tempo fizeram a vida voltar ao normal.  E melhor ainda ficou, com a chegada do novo delegado indicado por autoridades da capital.  Tinha a aparência de "leão de chácara".  Não perdeu tempo e já começou a mostrar trabalho.  Em poucos dias, tinha pronto levantamento dos moradores de Itaoca.

E, vamos adiante, que atrás vem gente.

O quintal de Seu Toninho era enorme.  Tinha horta, galinhas e galo, um cavalo de raça, 0 Ventania, e uma vaca leiteira.  O produto de tudo lhe rendia bons trocados.

Às cinco da manhã já estava ele ordenhando a Mimosa.  O latão de leite estava quase cheio, quando ouviu uma voz vigorosa chamando-lhe pelo nome.

Achou a voz conhecida, mas quando se virou, deparou-se com um homem alto, corpulento, rosto coberto por touca ninja e empunhando armas.

Exigiu-lhe a entrega do leite e evaporou-se montado  o Ventania.

Coitado!  Seu Toninho chorou muito diante de tamanha impotência à frente de um homem armado.  E ainda perdeu o cavalo de estimação (e ponha estimação aí).  Outro igual nunca encontraria.  Ventania foi criado desde pequenino.  Era o seu terceiro filho.

O delegado passava horas debruçado sobre a mesa tentando bolar um plano de ataque e defesa contra o ousado assaltante.  Não seria nada fácil. Sua equipe contava com três soldados apenas e faltavam armas pra todos.

Não demorou muito, o ladrão entrou em ação pela segunda vez.

Chegou montado no cavalo roubado.  Invadiu a lojinha de Seu Quinzinho.  Ele consertava relógios e vendia outros, novos e usados.

O ladrão rendeu o comerciante, escolheu três peças, as mais bonitas e caras, e voou galopando.

E o delegado continuava estudando...

A senhora do prefeito atravessava a praça central, como sempre, toda "emperiquitada" de joias caríssimas.   O cavaleiro misterioso aproximou-se e depenou a "árvore de natal".

A mulher pirou literalmente. Uma "judieira".    

A população evitava agora, até sair às ruas e, quando saía, saía armada.  As crianças só brincavam no quintal.  A cidade parou.
E o delegado continuava estudando...

 Dona Cidinha passava dos oitenta anos.  Já caducava e falava sozinha.  Morava com Luíza, sua filha, e o único divertimento dela era cuidar do jardim.  Mãos de fada.  Onde as colocava, brotavam flores viçosas.

já era tardinha, quando o sol  se acalmou, e lá estava ela a regar as plantas do jardim.  E, como sempre, conversando com elas. 

Luíza, na janela, olhava pra mãe com o maior carinho do mundo.  Sabia que lhe restava pouco tempo pra desfrutar desse convívio. 

Sem mais nem menos, Dona Cidinha empacou e os olhos arregalados fixaram em alguém.  Alguém conhecido.

Balbuciou  algumas palavras, fez gesto de cumprimento e de abraço apertado.
A filha ouviu perfeitamente quando ela disse:  "Vá com Deus", João Teodoro.

Fez-lhe dúzias de perguntas, tentou extrair-lhe o que havia acontecido, mas a mãe não se recordava de nada.

Ficou por isso mesmo... Como mais uma da velhinha caduca.

E o delegado continuava estudando...

O padre, então, convocou os fiéis para um louvor ao Santo Expedito, aquele que não deixa pra amanhã causas impossíveis.

Terminada a missa, todos juntos, com muita fé e devoção, repetiam:  "Santo Expedito, intercedei por nós junto ao Nosso Jesus Cristo.  Vós que sois o santo dos desesperados, Vós que sois o Santo das causas urgentes, protegei-nos, ajudai-nos.  Dai-nos forças coragem e serenidade.

Ao final da reza, enquanto todos ainda estavam ajoelhados, ouviu-se um grito misturado de dor e sofrimento.

Todos viram um nevoeiro levantar-se por trás da imagem de Santo Expedito.  Anjos surgiram trazendo alguém ao colo.

Inacreditável... Se eu não estivesse presente, jamais acreditaria no que vou contar agora.

Os anjos carregavam João Teodoro de farda, montado no Ventania, armado com a 38 herdada do pai, da década de 20.

Enlaçaram-no e voaram em direção ao céu, atravessando o teto de concreto da igreja.

João Teodoro entendeu, por bem ou por mal, que já não pertencia ao mundo dos vivos e que sua morada era na casa do Pai Eterno.

Tudo que fez após a morte, era sem maldade.  Queria avisar ao seu povo que não tinha morrido.   Que não queria morrer.  Que ainda era o delegado da cidade. E que devolveria tudinho que roubou em perfeita ordem.  Foi ele quem visitou Dona Cidinha.  Foi ele que visitou-a no jardim. 

E, os moradores de Itaoca, em poucos dias, desapareceram da cidade mal-assombrada.

Hoje são apenas ruínas de uma cidadezinha cuja história nem mais aparece entre os registros das cidades do Brasil.  E aquele pontinho, mais que pequeninho do mapa, apagou-se pra sempre.

As vizinhas - Dinah Choichit



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As vizinhas
Dinah Choichit


Estava abrindo a porta do apartamento para pegar o elevador e, por casualidade minha vizinha também.
Eu chamei o elevador, e a partir daí começou a conversa.
Perguntei se havia   viajado nesses feriados do carnaval.
Disse que não. Não tinha paciência para ficar de duas a três horas para percorrer uns 100 kms, quando normalmente levava somente uma hora. Tivera também a oportunidade de oferecer o sitio, que era perto, em São Roque, para a sua irmã que tinha seis netos e iam se reunir.
Uma das filhas vinha do exterior para visita-las. Essa tinha um casal de filhos, Paulo de oito anos e Ana Tereza de 10. Já fazia muito tempo que não via os netos.
O filho morava em São Paulo, tinha quatro filhos sendo duas meninas gêmeas, Lucia e Helena, de nove anos, um menino de sete, Eduardo e uma menina de cinco Gabriela.
Pensei, puxa não para de falar. Será que vai contar também o que se passou no sitio. E continuou.
Que eles passariam o carnaval juntos, no sitio, e que depois iriam visitar os parentes. Já tinham sido convidados para almoços, jantares, churrascos, a agenda já estava cheia.
Eu falei: que maravilha. E ela continuou: Aproveitei para colocar a casa em ordem. Como você sabe trabalho a semana inteira, depois academia, cuidar do marido e filhos leva tempo. Convidei também para virem jantar aqui na quinta-feira.
E por falar nisso gostaria que você me passasse a receita daquele maravilhoso pavê de nozes. Vai ser um sucesso o meu jantar.
Só eu falei. E você?
Venha amanhã a tarde tomar um café comigo.
Chegamos na garagem, e ela continuou, eu estou atrasada para o cabeleireiro, pois tenho um jantar chiquérrimo e preciso estar à altura vou pintar o cabelo, unha, depilação e uma bela massagem para me acalmar. Foi um prazer conversar com você. Não falte amanhã.
E eu só consegui respirar fundo: UFA!


quinta-feira, 1 de março de 2018

Evidências - Hirtis Lazarin



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Evidências
Hirtis Lazarin


           Ouvi sussurros a minha volta.  Não identifiquei quem os emitia. 

          Tentei abrir os olhos.  Pesados demais.

          Tentei gritar.  Não consegui.

          Eu sabia que estava vivo.  Sentia o pulsar descompassado do meu coração.

          Eu estava em estado letárgico.... Eis que meus pensamentos começaram a fluir como filme em câmera lenta.

          Eu e meus amigos, mais dois monitores, fazíamos trilha na Mata Atlântica, Serra do Mar.  Era um sábado abundante de sol.  Passaríamos a noite acampados e a volta seria no dia seguinte.

          As tralhas pesavam às costas, mas nada  como o vigor físico que a juventude nos garante.

          Ao entardecer já estávamos armando nossas barracas.  Fui rápido.  Afastei-me do pessoal.  Queria curtir, lá do alto, o dia que já ia embora.  O sol escondeu-se deixando um rastro alaranjado.

          Lembrei-me de alguns versos:  "Quando a noite esconde a luz, Deus acende as estrelas".  E o céu pipocou mesmo de estrelas miúdas pra que a lua cheia imperasse majestosa.

          Perdi-me na paz do silêncio.  Apenas o cricrilar dos grilos em busca de suas fêmeas, cigarras alegres e um bando de vaga-lumes ziguezagueando.

          E assim, perdido no encanto, vi um feixe de luzes coloridas vindo lá de baixo em meio às arvores gigantescas.

          Os raios entrelaçados alcançaram-me rapidinho.  E, ligeiros, enlaçaram-me num laço perfeito.  

          Totalmente imobilizado, levaram-me ao interior de uma cratera incrustada na mata fechada.

          Senti o calafrio da morte.  Vi mamãe perdida em lágrimas, meu irmãozinho procurando-me pela casa toda, papai fingindo tranquilidade. 

          Vi até a galinha que eu crio, amuada no poleiro.

          Vi meu mundo desmoronar.  Fim de linha.

          Só abri os olhos quando senti o chão aos meus pés.

          Inacreditável o que vi...Criaturas estranhíssimas que viviam debaixo da terra.

Eram tantas que pareciam brotar do chão.  Ignoravam-me.

          De baixa estatura, quase anões, eram carecas, cor acinzentada, olhos imensos num rosto pequeno.  De tão leves até flutuavam.  Conversavam muito, mas não entendi uma palavra sequer.

          Estava perdido.  Tremia feito liquidificador em velocidade máxima.

          O que queriam de mim? Um garoto tolo que não gostava de estudar nem de ler e viciado em vídeo game.

          Tentei correr.  Um deles me impediu.  Não foi grosseiro.  Foi firme.  E num português arrastado acalmou-me.

          Eram seres intraterrestres do bem.  Milhões e milhões.  Viviam em cidades subterrâneas preparando-se pra salvar o planeta Terra.

          As guerras, o embate entre os poderosos, a corrupção, os descasos com a natureza cresciam de tal ordem que pouco tempo restava aos seres humanos.
          A humanidade estava prestes a ser aniquilada.  Eles, então, se apossariam do nosso planeta e uma nova Era viria.

          A última coisa de que me lembro foi quando dois deles me seguraram e um chip foi introduzido atrás da minha orelha esquerda. 

          "Por que isso?"  Ninguém me respondeu.

          Naquela hora apaguei.

          Só sei que agora estou aqui deitado.  A cabeça não dói mais.  Posso movimentar braços e pernas.  Reconheço as vozes que me cercam.  Senti até um beliscão que o Juninho gosta de me dar. 

           Abri os olhos e todos estavam ali.  Era espanto, incredulidade, alegria.  Tudo misturado.

          Recebi alta.  No caminho de casa, nada de perguntas.  Só festa.

          Lembrei-me do chip.  Arrepiei-me todo.  Existia ou não?  A esperança era que não.

          Cautelosamente passei o dedo atrás da orelha.

          E... E...   O chip estava lá. 

O SEGREDO DE UMA LÁGRIMA - Pedro Henrique

  O SEGREDO DE UMA LÁGRIMA Pedro Henrique        Curioso é pensar na vida e em toda sua construção e forma: medo, terror, desejo, afet...