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quinta-feira, 19 de setembro de 2024

PROJETO MEU ROMANCE INVESTIGATIVO - O DETETIVE MORAIS - HENRIQUE SCHNAIDER

 




PROJETO MEU ROMANCE INVESTIGATIVO 2024


 

O DETETIVE MORAIS

HENRIQUE SCHNAIDER

 

João Morais era um nordestino Sertão da Paraíba. Era década de 90, quando o jovem João chegou a São Paulo, com muita fibra, a mesma que todo nordestino tem. Logo procurou se manter ocupado, fez de tudo para não ficar parado, trabalhou como servente pedreiro em algumas obras, dando duro danado em outras diversas atividades, agarrava todo bico que aparecia.

E com isso, conseguiu se estabilizar financeiramente, não passou por apuros. Conseguiu até juntar um dinheirinho e começou a fazer planos. Matriculou-se no curso intensivo, precisava aprender a ler e escrever corretamente, pois tinha pressa, já que ousaria o concurso público, queria seguir a carreira policial. Um antigo sonho de família.

Dedicado como era, intenso nos estudos, curioso para a profissão, foi aprovado na sua primeira tentativa para o cargo de escrivão de polícia.

Não cabia em si de tanta felicidade. Mandou logo carta à família contando a novidade.

Meses depois tomou posse com muito orgulho. Agora que ocupava a mesa do escrivão, e apesar de ser um cargo burocrático, João dedicava-se mais e mais às suas funções, às minúcias, aos detalhes. Não faltava jamais ao trabalho, não se atrasava, e cumpria rigorosamente todas as medidas da lei.

Três anos mais tarde, João Morais recebia uma boa promoção. Haveria melhoria financeira, além de que passaria a ocupar o cargo de investigador de polícia, função que sempre almejou.

O mais impressionante de tudo era que o Morais nasceu para aquilo. Era cuidadoso nos exames, infalível nas conclusões, meticuloso nos detalhes.

Morais foi ganhando fama de melhor investigador daquelas bandas. Todos os casos que caiam em suas mãos, ele conseguia resolver com sucesso. E assim ele foi empilhando uma dezena de casos difíceis que pareciam fáceis de resolver.

Até que um dia caiu em suas mãos o assassinato de uma socialite. Examinou o boletim de ocorrência, o relatório do caso, e seguiu para exame da cena do crime.

Quando o detetive Morais entrou naquela casa luxuosa, os policiais já estavam por lá. A vítima estendida no chão do living sobre o tapete persa.  Os olhos corriam por todos os cantos, a mobília limpa, os quadros no lugar, a vidraça da janela fechada por dentro. Os funcionários espantados alinharam-se à porta do ambiente.

De repente não sabe porque, veio à sua memória, lembrou de fatos ocorridos quando de sua chegada a cidade grande, praticamente sem recursos, conseguiu alugar um quartinho numa pensão da periferia.

A dona da pensão era uma senhora muito bondosa, muito solícita. Assim, o Morais começou a trabalhar de servente de pedreiro para poder se sustentar. Os pensamentos iam e vinham, borbulhavam, ao mesmo tempo, em que se atentava ao corpo estendido no chão. A polícia técnica ainda se movimentava por ali.

Voltam novamente os pensamentos do passado, e lembrou com saudade daquele dia em que foi trabalhar de servente de pedreiro na restauração de uma suntuosa residência onde morava Joana, uma mulher insinuante que o olhava de forma diferente.

Logo ela puxou conversa, quantas doces lembranças. Com o passar dos dias acabou acontecendo o envolvimento dos dois que se transformou numa forte paixão. Tudo isso foi muito rápido. A família da moça, quando notou aquela relação entre os dois entrou em polvorosa.

Até que um dia ele e Joana resolveram fugir e acabaram se casando. Mas ali era a cena de um crime bárbaro, e o Morais, lembrando daqueles dias maravilhosos. Agradeceu ao destino que os uniu até hoje.

Morais desperta daquele sonho. Tem um caso para solucionar.  Enquanto o detetive observava os detalhes da cena, entrou uma mulher muito estranha na sala, era Estela, irmã da vítima.

Os policiais o advertiram que Estela era completamente louca e inclusive esteve internada muitas vezes em casas de tratamento de pessoas com problemas mentais. Estela começou a gritar e chorar ao ponto que Morais, já perdendo a paciência, bradou: “Tirem esta mulher da sala, pois está perturbando o bom andamento das investigações”.

Morais associou os gritos e o choro de Estela a ato de teatro, de uma péssima atriz. Aí concluiu que ela estava se tornando uma primeira suspeita, afinal para que tanto fingimento? Começou a perguntar aos serviçais, como era o relacionamento das duas irmãs?

Pelas histórias que lhe contaram, realmente era uma relação cheia de conflitos que até chegaram várias vezes as vias de fato, com muitos casos de agressões que marcaram profundamente a vida daquelas duas mulheres.

 


O conflito da toga - Alberto Landi

 


O conflito da toga

Alberto Landi

 

Era uma manhã ensolarada em Roma e a cidade pulsava com a agitação de mercadores, políticos e cidadãos.


As ruas estavam repletas de mulheres e homens vestidos de togas brancas, símbolo de sua cidadania e status.

Mas havia um lugar onde essa paz estava prestes a ser desafiada: o Fórum.

Marcus, um jovem cidadão romano, caminhava orgulhosamente em sua toga.

Ele havia acabado de ser eleito para um cargo público na administração local e se sentia no topo do mundo. Em meio à multidão avistou um grupo de não cidadãos conhecidos como peregrinos que se aglomeravam perto da entrada do Fórum.


Entre eles estava um homem chamado Lúcios, de temperamento forte e determinado que havia chegado a Roma, em busca de uma vida melhor. Ele sonhava com o dia que poderia vestir uma toga e ser reconhecido como cidadão. Mas hoje, ele estava prestes a enfrentar uma injustiça, ele tinha facilidade em se conectar com a multidão, tornando-se um líder.

Diante do Fórum, Lúcios avistou Marcus e seus amigos e gritou:

“Por que nós não podemos usar togas”? Também somos parte de Roma, trabalhamos duro, horas a fio, para o seu bem-estar e de seus amigos também.

Marcus olhou para Lúcios de uma forma sardônica e com desprezo:

“Togas são para cidadãos romanos! Vocês não têm direito a isso. Se quisessem respeito, teriam que conquistar sua cidadania”. A tensão cresceu entre os dois grupos.


Os peregrinos começaram a se agitar, enquanto os cidadãos romanos se uniam para defender suas tradições.


Marcus sentiu uma onda de indignação percorrer seu corpo. “ Se não gostam das regras, voltem para de onde vieram”, gritou. Mas Lúcios não se deixou abater. “A história de Roma é feita por aqueles que vieram de longe”. Não somos menos dignos por não podermos usar togas. Lutamos por nossos direitos!


Nesse momento apareceu o sábio senador Quintus. Observando tumulto, resolveu intervir.

“Parem”! Ordenou com firmeza.

Como ele era um bom político e sábio, aprimorou da discussão. “A verdadeira grandeza de Roma reside em sua capacidade de acolher a todos, independentemente da origem”., enfatizou


Quintus olhou fixamente nos olhos de Marcus e Lucius. “Se continuarmos a dividir Roma entre cidadãos e não cidadãos, perderemos o que nos torna romanos: a União”.

Após algumas trocas acalorada, Marcus começou a refletir sobre as palavras do senador. Ele percebeu que a toga era um simples tecido. E, o verdadeiro valor estava na dignidade e na contribuição de cada pessoa para Roma.

“Eu.........eu não pensei assim”, disse Marcus.

“Talvez devêssemos encontrar uma maneira de incluir todos nós”.

Lucius sorriu timidamente: “todos nós queremos ser parte disso”.

E assim, sob os ensinamentos de Quintus, os romanos começaram a discutir formas de integrar os peregrinos à sociedade romana, criando novos caminhos para que todos pudessem contribuir e ser reconhecidos.

O conflito havia aberto às portas para um novo entendimento.

Roma se destacava por sua diversidade e cada parte contribuía para a magnífica harmonia da cidade eterna.


quarta-feira, 18 de setembro de 2024

PASSADO SOMBRIO - Vanessa Proteu

 



PASSADO SOMBRIO

Vanessa Proteu

 

Era um dia agitado na agência de publicidade “Impulsione”, onde trabalhava o divertido jovem Fernando Maldonado. Apesar de estar muito ocupado, não deixou passar despercebida a presença do professor doutor em economia, Henrique Paiva. Um senhor de 90 anos, bem-sucedido, refinado, porém pesaroso, solitário e com um olhar vazio como se sua essência tivesse sido roubada; um pouco sem vida, um pouco sem brilho, um pouco sem alma.

Enquanto o observava, Fernando se lembrava de como a morte da importante senhora Laura Soares Paiva havia sido de causa estranha, pouco esclarecida. O fato havia ocorrido há 30 anos e Fernando nem havia nascido, mas por se tratar de uma família muito conhecida na cidade era algo muito comentado e isso aguçava a curiosidade desse agente de publicidade que tinha por hobby investigações secretas.

Passou a investigar a vida daquele senhor desde a juventude e descobriu que ele nem sempre foi amargo, que gostava de música clássica e que o matrimônio com a poderosa mulher do mercado financeiro, Laura Soares, era o segundo casamento e também a segunda viuvez. Sua primeira esposa havia cometido suicídio, pelo menos era isso que constava do registro médico.

Foram meses de buscas, e Fernando não encontrou nada que ligasse o velho professor à morte de dona Laura, porém ao pesquisar uma biografia antiga acerca da vida dela, percebeu que ela tinha sido mãe na juventude, dera à luz a um menino e o chamou de Abílio Soares.

Fernando acabou descobrindo por meios digitais que esse Abílio Soares se tornou Deputado Estadual em São Paulo e que desde cedo seguia a carreira política. Casado e pai de duas filhas, atualmente com 65 anos. A apuração de Fernando não teve o sucesso esperado, mas era isso que o motivava.

Só não motivam mais do que ver a sua paixão, Milena.  Jovem charmosa, de riso fácil, cativante e tão misteriosa quanto ele. Milena não era muito de falar sobre sua família nem de si mesma. Era de São Paulo e estava cursando Direito no Rio. Aliás, foi fazendo um trabalho de pesquisa que ela conheceu o Fernando. Eles se encontraram na empresa de publicidade. Moça de corpo bonito, de voz suave. Quando seus olhos verdes encontram os dela, a certeza o domina; ele quer essa menina. Seu coração estremece e é assim que tudo acontece entre os dois.  Mas enquanto ele esconde dela e de todos o seu desejo por investigação, a jovem esconde o mistério sobre o passado de sua família.

Isso a aterroriza há algum tempo.  Às vezes, ela só queria dividir o fardo com alguém, mas Fernando, tão honesto, cheio de atitude, suportaria saber de algo tão terrível? Ela preferia esquecer o passado tenebroso e desfrutar a terrível paz no Rio de Janeiro ao lado do seu amor, cuja risada alta espantava qualquer pesadelo.

Um dia, entre um trabalho e outro, Fernando resolveu pesquisar mais a carreira de Abílio Soares e percebeu que alguns escândalos marcaram sua candidatura, bem como, denúncias de lavagem de dinheiro e outros tipos de corrupção. Imprimiu os papéis e levou para casa a fim de esmiuçar tudo aquilo.

Acabou descobrindo que Milena era uma de suas filhas: Milena Soares, filha de Abílio Soares. Isso fez com que Fernando fosse mais fundo, apesar de estar dividido entre suas duas paixões; o seu amor por Milena e o seu prazer por investigação.

PARTE 2

O rapaz sabia que seu relacionamento com a filha do deputado poderia facilitar sua busca a fim de desvendar os segredos assombrosos daquela família.

Embora não quisesse magoar sua amada, ele precisava ficar mais próximo dela para descobrir detalhes acerca dos Soares. Assim, mudou-se temporariamente para o apartamento de Milena.

Por estar muito distraída, Milena deixou seu computador ligado e com a tela desbloqueada enquanto foi tomar banho. Fernando aproveitou esse descuido para analisar os e-mails dela. Ele, movido pelo seu espírito investigador, sabia que ali encontraria alguma pista.

O jovem publicitário possui habilidades notáveis de informática e consegue vasculhar com agilidade as pastas e arquivos de Milena. Nada pode passar despercebido, nenhum detalhe pode ser perdido. Sua sobrancelha arqueou à medida que sua testa franzia e um semblante de frustração tomava conta do seu rosto.  Foi até a pasta de fotos da família dela e começou a traçar um perfil psicológico através das imagens que via.  Percebeu que, apesar de corrupto, o Sr. Abílio parecia se relacionar bem com a família e em todas as fotos com a filha ele parecia carinhoso; carinhoso de um modo excessivo do ponto de vista de Fernando. A menina, apesar de tanto carinho recebido, parecia desconfortável e com um semblante abatido em quase todas as fotos ao lado do pai.

Ele se distrai em sua análise e não percebe que Milena sai do banho e nota que ele está usando o seu computador. Nervosa, ela pergunta o que ele está fazendo mexendo em suas coisas sem a devida permissão. Fernando se vira para ela meio que perplexo e pergunta sobre a relação dela com o pai. Revela que sabe que ela é filha de Abílio e ficou curioso sobre o assunto. Demonstra preocupação com o que analisou nas fotos, mas gostaria de ouvir dela se suas suposições estavam corretas.

Milena abaixa a cabeça ao passo que seu rosto enrubesce. Ela passou muito tempo guardando algo tão terrível. Suas mãos suavam, suas pernas se estremeceram e seus olhos ficaram marejados. Sentou -se na beirada da cama e permitiu que suas lágrimas caíssem. Chorava de tão modo que sua voz sumia. Na verdade, essa voz já havia sido calada durante todos aqueles anos.

Fernando, então, a tomou em seus braços como se fosse um refúgio diante da tempestade que se aproximava dela. Milena, por sua vez, recusou o contato. Porém, de forma sutil e constrangedora. Ele resolveu se afastar e respeitar o espaço que ela determinou. A jovem funga o nariz, limpou os olhos e confirmou as suspeitas de seu namorado. Ela sofrerá abusos constantes em sua infância. Guardava o trauma e a dor que tivera por todos aqueles anos. Pelo visto, o poderoso Abílio Soares era bem pior do que se pensava.

Era só a ponta do iceberg que envolvia aquela família. Milena, apesar de assustada e abatida, começou a vomitar os podres que sabia. Ela confiava em Fernando ou via nele a abertura de um calabouço no qual estivera presa por anos. Não pensou em consequências, ela só queria rasgar o peito e deixar que sua alma sangrasse.

Deste modo, ela confessou a real história; o passado que tanto a assombrava. Fernando, estava ansioso para ouvir, contudo, foi até a cozinha a fim de buscar um copo d’água para acalmar sua amada que agora estava consternada e se sentindo a pior pessoa do mundo. No caminho, pegou o celular e colocou no gravador de voz. Precisava de provas sobre aquilo e o relato de Milena seria um ótimo começo para esmiuçar a história e desvendar os mistérios daquela família e punir os culpados por seus crimes.

Milena, começou a contar tudo o que soube ouvindo conversas da sua mãe com uma amiga. Segundo ela, a sogra, dona Laura, não era uma pessoa fácil de se lidar. Ela tinha maldade no coração e era capaz de tudo para conseguir o que queria. Na época, ela estava sozinha com o filho, Abílio, ainda pequeno. Viu a chance de se aproximar do rico Henrique Paiva. Mas ele era casado e muito feliz no casamento. Então, dona Laura se aproximou deles e se fez amiga do casal. E assim ganhou a confiança deles, tramou e armou a morte da primeira esposa do senhor Henrique. Deu-lhe um sedativo e a pendurou numa corda, simulando um suicídio.

Com o caminho livre, dona Laura casou-se com o viúvo e passou a consolá-lo. Ficaram juntos por um bom tempo, mas como a vida é justa e tem seu jeito peculiar de cobrar dívidas, a genitora de Abílio, avó de Milena, morreu após se engasgar com um pedaço de carne bovina. Não havia ninguém para socorrê-la e sua vida se findou ali. Ao chegar em casa e encontrar pela segunda vez a esposa morta, o senhor Henrique nunca mais foi o mesmo. Tornou-se frio, amargo e solitário. Mal sabe ele que aquilo foi um livramento ou quiçá o carma fazendo valer a lei do retorno.

Fernando ouvia com atenção a história contada pela garota. Agora tudo fazia sentido em sua cabeça. Milena terminou com as duras palavras: sou neta de uma assassina e filha de um abusador.

Tais palavras doem no coração de Fernando que não sabe o que dizer para consolá-la. Assim, ele incentiva a jovem a ir até a delegacia e contar tudo o que sabe.

Milena hesita, pois teme o que possa acontecer. É uma decisão difícil. Declarar guerra contra um homem poderoso como o senhor Abílio não é fácil. Ela se desespera e implora a Fernando para manter sua história em segredo. Mas ele insiste que o pai dela deve pagar pelos crimes que cometeu.

Apesar de ser algo tão cruel e asqueroso, Milena não tem como provar e isso a corrói. Ninguém acreditaria nela sem provas. E ela correria um alto risco se colocando contra um político inescrupuloso.

Ela se acalma e encontra repouso nos braços de Fernando. Ele faz cafuné em sua cabeça, deixando seus dedos perpassar os fios longos de seus cabelos. Enquanto isso, ele pensa numa forma de ajudá-la. Mas infelizmente não vem nada à sua cabeça. Ele quer vingança, ele quer justiça, enquanto Milena só quer esquecer tudo o que passou. É muito caro para ela remexer nesse assunto.

Sem concordar, porém, respeitando o desejo da mulher que amava, Fernando não tocou mais no assunto. Ele apenas queria tornar a vida dela mais feliz dali em diante. Vê-la sorrindo, mesmo tendo sofrido durante anos, era um refrigério para ele.

Fernando, era meio cético, mas ainda assim pediu ao universo que a justiça fosse feita de alguma forma. Aquele homem, assim como sua mãe, deveria pagar pelos seus crimes.

Passaram-se meses até que os escândalos de corrupção tomassem uma proporção grandiosa e a polícia federal acabou prendendo Abílio. Bem, essa foi a oportunidade de aumentar sua pena, denunciando- o por abuso infantil.

Milena vestiu-se de coragem e o denunciou. O processo que ela abriu fez com que a polícia investigasse mais profundamente e outros casos de abuso foram descobertos.  Assim, a jovem ficou em paz ao saber que sua atitude ajudou outras garotas.

Fernando jamais pensou que seu talento para a investigação fosse, de fato, colocar um homem como Abílio atrás das grades. Ele decidiu largar a publicidade e investir em sua carreira de detetive. Mas antes, resolveu pedir Milena em casamento.

 

terça-feira, 10 de setembro de 2024

Mestres da escultura e pintura - Alberto Landi

 

Êxtase de Santa Tereza - Gian Lorenzo Bernini.


                         São Gerônimo que Escreve - Caravaggio






Mestres da escultura e pintura

Alberto Landi


Antes do início do século XVII Roma já era reconhecida como centro vital de cultura e arte, com a Igreja católica exercendo uma influência sobre a vida política e social da cidade, sob+ a liderança de papas como Urbano Vlll que governou de 1623 a 1644.

A cidade se tornou um verdadeiro palco para expressão artística onde escultores e pintores buscavam não apenas reconhecimento, mas também os favores da Igreja.

Nesse tempo vivia um escultor renomado chamado Gian Lorenzo Bernini.

Ele era conhecido por sua habilidade inigualável de transformar mármore em formas que pareciam quase vivas.

Suas obras como o “Êxtase de Santa Tereza” eram admiradas por todos, mas havia um rival que sempre o desafiava. O pintor Caravaggio.

Caravaggio com seu estilo dramático e ousado tinha uma abordagem diferente da arte. Enquanto Bernini dava vida ao mármore. Caravaggio capturava essência do momento em suas telas com intensidade única. A rivalidade entre eles era palpável mas ambos respeitavam o talento um do outro.

Certa manhã Bernini recebeu uma encomenda para criar uma escultura monumental que adornaria uma nova piazza de Roma.

Ele sonhava esculpir uma figura que representasse a beleza e a graça divina.

No entanto, ao ouvir que Caravaggio também estava trabalhando em uma pintura para a mesma piazza sua determinação se intensificou.

‘Não posso dizer que ele ofusque minha obra’ - pensou Bernini. Ele passou dias e noites em seu ateliê esculpindo com paixão e fervor. No entanto, à medida que avançava, sentia a pressão aumentar. O medo de não se reconhecido como o maior artista de Roma o consumia.

Enquanto isso, Caravaggio também lutava contra seus próprios demônios.

Ele queria mostrar que a pintura poderia rivalizar com a escultura de Bernini. Com cada pincelada ele buscava capturar não apenas imagens, mas emoções profundas e sombrias que falavam diretamente à alma das pessoas.

Quando as duas obras foram finalmente reveladas na piazza uma multidão se reuniu para admirar o resultado do talento dos dois artistas.

A escultura de Bernini era deslumbrante: uma figura angelical com detalhes que parecia prestes a ganhar vida. O público ficou maravilhado com a habilidade técnica do escultor.

Doutro lado da piazza a pintura de Caravaggio exibia uma cena dramática e emocionante. As sombras dançavam nas paredes da galeria sob a luz suave do sol poente. A intensidade emocional da obra tocou os corações dos espectadores de uma forma que poucos podiam ignorar.

No entanto, em vez de admiração mútua o conflito entre os dois artistas se intensificaram.

Comentários maldosos começaram a circular entre os admiradores da arte.

“A escultura é apenas uma imitação da vida”ou “a pintura é apenas caos sem forma”.! As provocações aumentaram e alimentaram ainda mais a rivalidade.

Certa noite após um dia cansativo de exibições e críticas mistas, Bernini decidiu visitar o pintor em seu estúdio. Ele estava determinado a confrontá-lo sobre as insinuações e rivalidades que estavam se espalhando pela cidade.

Caravaggo, disse Bernini com firmeza:

“Nós dois somos artistas excepcionais. Por que devemos competir? Não deveríamos nos apoiar reciprocamente”?

O pintor olhou para ele com um sorriso sardônico.

“A competição é o que nos impulsiona a ser melhores! Se não houver conflito, como saberemos quem realmente é o melhor?”

O escultor sentiu uma onda de frustrações crescer dentro dele.

“Mas essa não é sobre ser o melhor! É sobre expressar nossa arte! Devemos trabalhar juntos para destacar cada vez mais a arte em mossa cidade!”

Nesse momento de tensão, ambos perceberam que estavam perdendo de vista o verdadeiro propósito da arte: inspirar e tocar as pessoas. O conflito havia obscurecido a visão criativa.

Após essa conversa franca os dois artistas decidiram fazer algo inusitado: criar uma obra colaborativa

Juntos seremos mais fortes dizia Bernini.

E assim uniram suas habilidades.

O escultor criaria um suporte magnífico para a tela do pintor enquanto este inspirado na escultura, pintaria com luz e sombra dando um aspecto dramático e com emoções.

O resultado foi surpreendente: uma fusão perfeita, entre escultura e pintura, que capturou a essência da beleza divina e humana.

A piazza tornou-se um símbolo da união entre as duas formas distintas de arte.

Com o tempo tanto um como outro aprenderam que o verdadeiro valor da arte não está na competição ou na rivalidade, mas na capacidade de tocar vidas e criar experiências significativas juntos!

Taça, e mais vinho - Pedro Henrique

 


Taça, e mais vinho

Pedro Henrique

    

O vento levantava os cabelos ruivos de Beatriz fazendo-os beijar o nada. Estava frio do lado de fora do restaurante, entretanto o que de fato a incomodava era o que residia dentro.

     Havia ceifado com êxito de sua memória o que vivera com Fred (seu parceiro de trabalho), contudo não se pode fugir da fúria da paixão, ela vai te consumir de qualquer jeito.

     Ela está lá, em cada toque hesitante, em cada olhar apreensivo, em cada pensamento intrusivo.

     Fred a encara percebendo que está muito quieta. Ele tenta puxar conversa, porém Beatriz não abre mão de manter intacta a muralha que a cerca, a coisa que a segrega do mundo, do sofrimento.

     — Até quando você vai ficar me evitando? Questiona o rapaz.

     — Eu não estou te evitando.

     — Beatriz, desde que chegamos você não prestou atenção em nada do que eu disse.

     — Isso é mentira.

     — Ah, é? Então, o que eu estava falando neste exato momento?

     Beatriz o observa percebendo que ele jamais compreenderá. Irritada, levanta e sai do estabelecimento.

     Quando chega em casa nada passa por sua mente a não ser o desejo avassalador que ruge dentro dela por uma taça de vinho.

     Na primeira taça, pensa em Fred; no seu cabelo, no seu rosto, na forma engraçada com que fala, no seu jeito de andar, na sua boca.

     Na segunda taça, lembra de seu pai, da noite em que o matara, no gosto suculento que escorria do prato da vingança que sentiu ao passar a lâmina de um estilete em sua garganta.

     Na terceira taça pensava em Patrick e no lixo de ser humano que, infelizmente, descobriu que ele era.

     Taça e mais vinho, taça e mais vinho, taça e mais vinho! Mais, mais e mais! É preciso adormecer o que vive e que merece a morte. É preciso cortar a nódoa explícita que uma madrugada deixou. É preciso manter a barreira e a segregação.

     Taça e mais vinho. Sim, mais, pois a vida brada e quando ela brada há de se ter coragem para bater de frente, no entanto, Beatriz não tem coragem, falta-lhe e muito, é perigoso demais voltar lá e ela sabe disso, pena que Fred não.

     Caberá somente ao destino decidir qual será o próximo passo desta história.

 

PROJETO MEU ROMANCE 2024 - DINAH RIBEIRO DE AMORIM

 


VALÉRIA


 


UMA SIMPLES ADVOGADA CRIMINALISTA!

Dinah Ribeiro de Amorim

 

Uma jovem desce sorridente os degraus do Tribunal de Justiça de São Paulo. Alta, cabelos louros, porte elegante em seu terninho azul-marinho, sapatos de salto alto e fino. Valéria Sobral, renomada advogada, investigadora criminalista, auxiliar da polícia em muitas investigações.

Como desce sorridente, demonstra sucesso no último caso que investigou, e, quando isso acontece, aparece sempre leve cacoete, coça ligeiramente o nariz.

Valéria cresceu em meio policial, órfão de mãe, muito cedo, criada pelo pai, investigador e chefe de polícia, na pequena cidade de Tambuí, onde os fatos principais não eram de grande monta. Mas, mesmo assim, aprendeu com a experiência paterna a usar a sabedoria, a prática, a inteligência e a astúcia, no campo material, formando-se com brilhantismo em advocacia, no campo intelectual.

Com a morte do pai, continua na profissão e torna-se famosa pela habilidade com que a exerce.

Muda-se para São Paulo, após pequena herança paterna, um escritório, onde inicia atendimento aos casos difíceis que aparecem.

Tem como auxiliar o detetive Jorge, útil companheiro, que a ajuda nas grandes soluções.

Estão satisfeitos com a decisão dos jurados: culpado, o réu que matou a esposa, por motivo de traição. Um homem violento, machista, ignorante de leis e dominador do seu meio social, fazendo, ele próprio, as leis e exigindo obediência. Impossível de convivência doméstica. Educado à moda antiga, ou deseducado, melhor falando, achava que o assassinato em defesa da honra é um direito de qualquer marido ou homem traído.

Valéria, com provas de seus maus-tratos à esposa, e, principalmente, o direito à vida, para qualquer um, conseguiu a simpatia dos jurados, rebatendo as alternativas da defesa e conseguindo a vitória da acusação.

Satisfeitos, ela e Jorge comemoram num barzinho próximo ao escritório, com a bebida predileta, o Negroni, uma mistura de Gin, Campari e Martini Rojo. Fora do trabalho, eles relaxam, bebendo e jogando conversa fora.

Valéria já comenta e imagina as férias que planeja ter, alguns dias à beira-mar, sem preocupação em desvendar mistérios e procurar culpados.

Jorge, ficará no escritório, enquanto ela viaja, deixando sua folga para curtir com os filhos, nas férias escolares. É casado, com três filhos, ainda crianças.

Na manhã seguinte, quando Valéria chega ao escritório, encontra Jorge aflito, ao entregar-lhe uma intimação.

Que será isso, agora, pensa ela, louca para preparar a sua viagem.

Abre rapidamente o envelope, lê o escrito e o entrega a Jorge, espantada.

Um escritório do interior, perto da cidade de Dourados em que nasceu. Solicita sua presença para informá-la sobre assunto relacionado à herança, que recebeu do pai, uns dois anos antes.

Tentam o telefone deles, mas não dão informações, somente atendimento presencial e com documentos necessários.

Aborrecida com esse acontecimento inesperado, Valéria pede para Jorge assumir o escritório e vai para a rodoviária, com destino a Dourados, curiosa e, ao mesmo tempo, contrariada.

Dourados é uma cidade pequena, não muito movimentada, como todo interior. Ao contrário de algumas outras, tem a aparência de uma cidade próspera e rica, bonita em suas edificações. Valéria pede informações sobre o local do escritório Maya, Advocacia, o qual é onde está sendo intimada.

Ao entrar, é recebida por uma senhora de meia-idade, amável, que a atende gentilmente e avisa que o doutor Rogério Maya não está no momento, mas marca um horário à tarde, para ele atendê-la. Será avisado que ela chegou de São Paulo. Enquanto isso, poderá ficar à vontade no Hotel Central, próximo ao escritório.

Valéria almoça pequena salada e, quando pensa em tirar um cochilo, é avisada por telefone que Rogério Maya a espera. Dirige-se ao escritório e, ao conhecê-lo, espanta-se com sua simpatia e jovialidade. Esperava um senhor idoso e sóbrio, carrancudo e enérgico.

Após ser convidada a sentar e bebericar um gole d'água, é informada que existe alguém, uma mulher já idosa, que reivindica metade da herança deixada por seu pai.

Confirma ter direitos como ela teve, com provas de ter tido relacionamento e convivência com ele, após sua viuvez.

Valéria afirma nunca ter havido isso, que ela soubesse e que seu pai sempre foi um homem honesto, incorruptível, se fosse verdade, ela, como filha, saberia.

A mulher, diz Dr. Rogério, afirma ter provas de seu relacionamento com ele, mediante pessoas conhecidas, alguns textos escritos por ele, fotos onde aparecem juntos, em várias ocasiões, enfim, alguns recibos bancários feitos por ele, a ela.

Valéria, achando meio estranho, pergunta a causa de tudo isso vir à tona, justamente agora, dois anos depois.

Rogério também fez a mesma pergunta à senhora em questão, Dona Margarida, que se justificou, estava em tratamento, numa casa de repouso, acometida por um AVC que lhe tirou parte da compreensão. No momento, com a melhoria do seu estado, voltou a lembrar-se de tudo, principalmente de Joel, o chefe de polícia que a visitou e auxiliou por tantos anos.

Valéria decide conversar pessoalmente com Dona Margarida, o que Rogério concordou e se propôs a ser o intermediário.

Melhor eu ir sozinha, responde Valéria, quem sabe encontro alguma intimidade de meu pai, reconheço alguma coisa, sua letra, principalmente. Converso também melhor com Da. Margarida, suas intenções, meu pai nunca escondeu nada de mim, acho tudo isso muito estranho.

Pega o endereço de Margarida, chama um táxi e dirige-se à sua casa.

Atende-a uma mulher ainda jovem, com jeito de experiente e prática, olhar vivo, como se já a esperasse. Manda-a sentar e chama Da. Margarida em voz alta: “A doutora chegou!”

Desce as escadas do pequeno sobrado, uma senhora gordinha e baixa, olhar simplório, um pouco tímida, mas resoluta, ao falar com Valéria. Determinada, ajeita levemente os cabelos brancos que cismam em sair do pequeno coque e senta-se também para uma longa conversa.

Valéria, ao conhecê-la, sente uma leve lembrança, a fisionomia não é totalmente estranha. Só não sabe quando a viu, nem onde.

Margarida reclama primeiramente de seus problemas de saúde e dos males que sofreu, tendo que ser cuidada numa Clínica de Repouso. Agora, vive temporariamente com um casal conhecido, dispostos a ajudá-la: Rosa, a moça que a atendeu e Lauro, seu marido, vizinhos antigos.

Valéria estima que esteja melhor e, meio compadecida, meio desconfiada, pergunta o que seu pai tem a ver com sua história.

Margarida, um pouco agressiva, comunica que seu pai a visitava constantemente, desde que a mãe faleceu. Não queria que ninguém soubesse, devido a sua posição na cidade. Quando faleceu, ela já estava na Casa de Repouso e não pode comparecer ao funeral, nem divulgar a sua existência.

Só agora, restabelecida, influenciada pelo casal amigo, soube que tem direito a parte da herança que deixou.

Valéria, lembrando-se do pai, sua personalidade, seu caráter, coloca em dúvida o que Margarida fala, mas, mesmo assim, pergunta quais as provas que possui?

A senhora, meio trêmula, nervosa, levanta-se e pega uma pasta, cheia de documentos e algumas fotos.

Alguns extratos bancários, feitos pelo pai, em nome dela, que não pareciam mesadas, mas pagamentos de consultas médicas feitas, com alguns recibos. Numerosos, mas não obrigatórios, poderiam justificar alguns auxílios prestados por ele a alguém necessitado. Nenhum pagamento de habitação ou pensão alimentar. 

Pelas fotos encontradas, Valéria reconhece algumas em sua casa de infância, principalmente com ela, pequena, no colo de Margarida, com o pai, mais moço, e algumas, sem ele. Lembra-se vagamente que deve ter sido sua babá, daí o olhar, levemente familiar.

Pergunta sobre as testemunhas das visitas frequentes à sua casa, se houve pernoites, pode provar isso?

Margarida responde que sempre morou em lugar retirado, a pedido do pai, mas o casal amigo, que a recolheu, poderá servir como testemunha disso. Conheciam-no como visitante constante de sua casa.

Valéria logo tem a intuição e quase certeza de que é mentira, a senhora está sendo induzida e influenciada por eles. Seria fácil provar isso, mas olhando Margarida, seu estado frágil, sua idade avançada, resolve conversar com Dr. Rogério como resolver melhor a situação. Não aparenta condições de aguentar um julgamento ou muitas sessões judiciais. Seu pai devia auxiliá-la por piedade, dó em situação carente, era um senhor piedoso e, agora, resolveram aproveitar-se disso.

Pede um tempo para estudar o assunto e sai, não sem antes perguntar e anotar os nomes dos colaboradores de Margarida, que, inseguros, dão suas credenciais e cópias dos documentos.

Valéria Sobral, sempre orgulhosa de seu nome, confusa agora, com tanta informação sobre o pai, dirige-se atordoada ao escritório de Rodrigo Maya, quem sabe, juntos, encontrarão alguma solução: verdade ou mentira.

Pelo caminho, percorre ruas estranhas da importante cidade de Dourados, com riquezas minerais em ferro, quando encontra, acidentalmente, um grande e querido amigo de infância, morador, como ela, da cidade de Tambuí. Foi vizinho e companheiro de grandes brincadeiras e alegrias em crianças.

Cresceram dos seis anos até a adolescência, quando começaram a frequentar bailinhos e ouvirem as músicas da época.

Sem perceber, a mocinha Valéria se apaixona pelo amigo Afonso, que se tornou o primeiro amor, o primeiro namorado.

Conviveram diariamente, durante anos, quando Joel, seu pai, por necessidades de trabalho, resolve interná-la num colégio de freiras, famoso na educação de moças, de uma cidade vizinha.

Há um afastamento triste entre os dois enamorados, e, com o passar do tempo, esquecem-se um do outro.

Quando Valéria conclui seu curso e volta à cidade natal, encontra Afonso noivo de sua melhor amiga, Clarice, que também deixou de lado, após anos.

Segue cada um o seu destino, Afonso formado em arquitetura, casado e com filhos e, Valéria, a advocacia, investigativa e criminalista, como o pai.

No reencontro, após tantos anos, Afonso caminha só, mais gordo e envelhecido, o grande amor do passado de Valéria.

Espantados e emocionados, abraçam-se e resolvem tomar um café no bar próximo, relembrar os velhos tempos.

Afonso, agora divorciado, com filhos grandes, tenta recomeçar a vida em Dourados, num trabalho de construção. Ele olha para Valéria com carinho e admiração, com a saudade antiga dos seus sentimentos e, ela, espanta-se, após tantos anos de distância e vivências diferentes, ainda sentir por ele uma certa atração, o despertar de uma paixão adormecida há tempos.

Quando percebem, entardece e Valéria se lembra que tem um assunto urgente para conversar com o Dr. Rogério. Não pode esquecer o caminho que o caso está tomando e, docilmente, despede-se de Afonso. Combinam de encontrar-se em outra hora.

Mais alegre e distraída, menos esperta e intuitiva, dirige-se ao escritório Maya Advocacia, antes que feche.

Rogério Maya a espera e, juntos, examinam as reivindicações de Margarida. Segundo a documentação do casal que a sustenta e auxilia, a amizade entre eles é recente, não são testemunhas antigas, como pretendem.

Lauro é um ex-presidiário, já sofreu penalidades por roubo e porte de drogas, e Rosa, sua mulher, era uma faxineira da Casa de Repouso, onde ficou Margarida. Nem conheceram Joel, o pai de Valéria, quando vivo.

Diante dessa mentira, e algumas idas à Casa de Repouso que tratara de Margarida, pessoa só, desamparada, ficou fácil para Valéria provar que não houve nenhum relacionamento com seu pai. A não ser ajuda e pagamento financeiro, muitos anos antes, quando Valéria ainda era pequena e necessitava de cuidados, e Margarida, foi temporariamente, sua babá. Mas, logo pediu demissão, alegando problemas de saúde. Viveu, maritalmente, alguns anos após, com um homem chamado José, que a deixou por outra mulher e sumiu do mapa. Nunca mais foi visto com ela, segundo uma vizinha que a conheceu em Tambuí, durante anos.

Cidade pequena, interior, pensa Valéria, sabe-se tudo a respeito de todos, embora nem sempre a verdade, mas, com Margarida, foi fácil sondar sua vida, sem grandes mistérios.

Discute o caso com Rogério, qual a melhor atitude a tomar, sem pensar em acusá-la por difamação e perjúrio, mas livramento do nome do pai dessa acusação.

Quanto aos seus dois comparsas, uma reprimenda severa e ameaça de cadeia, caso continuem com esse falso testemunho.

Valéria, ao olhar Margarida, intimada a comparecer ao advogado e retirar a queixa, compadece-se da velha senhora. Uma idosa, facilmente iludida, e, em lembrança ao falecimento de sua mãe e atendimento inicial de uma babá, resolve arrumar-lhe um lugar para ficar, novamente a Casa de Repouso, deixando uma certa quantia em seu nome, para as necessidades.

Dr. Rogério arquiva o caso, não sem antes advertir Valéria de que não deve deixar o coração dominar diante da veracidade da lei, ao que ela responde: A lei existe sim para o nosso benefício, mas nesse caso, há necessidade de um certo abrandamento. Não houve dano e Margarida chora, arrependida.

Dando o caso por terminado, Valéria respira aliviada e volta a sonhar em ir à praia, num pequeno bangalô que construiu aos poucos, com parte da herança que recebeu e o ordenado de uma advogada vitoriosa.

Lembra-se antes de Afonso, gostou realmente de encontrá-lo e, mesmo sem vontade de algum relacionamento mais íntimo, gostaria de vê-lo mais vezes.

Procura-o e combinam de se encontrar em São Paulo, assim que ele tiver alguns dias livres na construção.

Ela avisa-o que irá até a praia, possui pequeno chalé em São Sebastião, quando puder, que apareça.

Afonso, mais alegre que de costume, fica de avisá-la, quando irá.

Os dois, já não tão jovens, parecem reiniciar uma amizade que, talvez, transforme-se em algo mais sério. Tudo indica. Coisas do destino, mesmo.

Em São Paulo, Jorge pede a Valéria para ir até o escritório. Precisa assinar uns documentos que darão baixa no caso de Margarida, para ser arquivado com eles também.



 Episódio II


ASSASSINATO NA BIBLIOTECA



Dando o caso por terminado, Valéria respira aliviada e volta a sonhar em ir à praia, num pequeno bangalô que construiu lentamente, com parte da herança que recebeu e ordenado de uma advogada ganhadora de causas.

Lembra-se antes de Afonso, gostou realmente de encontrá-lo e, mesmo sem vontade de algum relacionamento mais íntimo, gostaria de vê-lo mais vezes.

Procura-o e combinam de se encontrar em São Paulo, assim que ele tenha alguns dias livres na construção.

Ela avisa-o que irá até a praia, possui pequeno chalé em São Sebastião, quando puder, que apareça.

Afonso, mais alegre que de costume, fica de avisá-la, quando irá.

Os dois, já não tão jovens, parecem reiniciar uma amizade que, talvez, transforme-se em algo mais sério. Tudo indica. Coisas do destino, mesmo.

Em São Paulo, Jorge pede a Valéria para ir até o escritório. Precisa assinar uns documentos que darão baixa no caso de Margarida, para ser arquivado com eles também.

Valéria resolve consultar, primeiro, uma pequena dúvida que teve sobre o arquivamento e acha mais prático ir até a Biblioteca, lugar que frequenta, às vezes.

Quando entra, percebe uma correria em meio ao silêncio, muitos gritos, uma senhora corre apressada à sua frente, ouve um barulho forte de tiro que a atinge e ela cai desmaiada ao chão, sem que Valéria possa segurá-la. Pronto, novo caso desperta e aguça o espírito investigativo dessa advogada criminalista que se mete na confusão estabelecida para auxiliar a polícia, logo chamada. Telefona para uma ambulância do SAMU que corre ao local e também faz perguntas aos funcionários se sabem ou viram algo relacionado ao crime.

Liga para Jorge e cancela sua ida à praia. Novo caso apareceu, novo caso a resolver, a mulher atingida na Biblioteca.

Valéria se espanta com a mulher caída aos seus pés! Esse crime não lhe sai da cabeça!

Qual seria a causa? Algum assalto? Vingança? Perseguição? Em uma Biblioteca! Lugar de silêncio e estudo?

Interessa-se pelo caso. Seu espírito investigador ressurge e esquece-se das suas férias na tão sonhada praia. Construiu o bangalô com tanto capricho e quase nem aparece. Sempre a profissão em primeiro plano. Os crimes e as tragédias não cessam, não lhe dão folga, principalmente em São Paulo.

Começa a investigar quem é a mulher vítima, qual o nome, onde mora?

Se é frequentadora comum da Biblioteca. Poucas respostas, obtém.

Descobre que ela já se refugiou lá algumas vezes, para fugir de ataques de terceiros. Uma senhora que é sua vizinha, está comentando o caso, em voz alta.

Chama-se Doroteia e é muito temida na região central de São Paulo. Mora nas imediações da Avenida São luís, numa casa antiga, muito velha, pobre e assustadora.

Doroteia é conhecida como a louca da região. Faz barulhos, gritarias, assusta e xinga quem passa. Ninguém a suporta e a polícia foi chamada muitas vezes, por sua causa.

Detestava crianças e mulheres, talvez algum problema antigo que teve em relação a isso.

Encaminhada à psiquiatria pública e institutos correcionais, sempre voltou, fingindo ou disfarçando melhoras. O comportamento briguento e escandaloso reaparecia, em pouco tempo.

Saber, para Valéria, a causa da morte, quem seria o assassino, torna-se confuso. Muitos queriam sua morte, muitos tinham motivos para isso: a mãe que teve seu filho com a cabeça raspada, o senhor de idade que ela roubou a bengala, a família do seu vizinho, com muitos filhos, a quem tirava a comida, diariamente, enfim, era uma pessoa detestada por muita gente.

Defendê-la, descobrir um culpado, ou vários culpados, seria uma agulha em meio ao palheiro. Queriam distância dessa mulher, todos ao seu redor.

Abandonar o caso, passou por sua cabeça, mas, o direito à vida, a culpa de assassinato, mesmo que seja feito por defesa, planejado, uma vingança, merece estudo. Uma vítima, já condenada por antecedência. A lei decidiria a culpa. 

Valéria começa a pesquisar o ambiente que Doroteia vivia.

Um sobrado que se destaca na Av. São Luís pela feiura, pobreza e sujeira. Muito estragado. Bastante antigo, deve ter sido valioso, no passado. Se morou sempre ali, pertenceu à sua família, não conseguiram expulsá-la.

Examinando roupas jogadas, móveis empoeirados, Valéria descobre gavetas com objetos estranhos.

Doroteia, a louca, teve vivências, lembranças do passado.

No armário sem porta, acha várias fotos. Parecem seus familiares, parecidos com ela. Teve, então, vida familiar, ao nascer. Por que, sozinha, ao morrer? Qual o motivo que a fez louca? Observa tudo. Quem sabe acha alguma pista?

Tem experiência, nesses casos. Não haverá muita investigação policial, mas um possível arquivamento. Será considerada indigente.

De repente, encontra uma foto mais recente, Doroteia aparece abraçada a um moreno bigodudo, ainda jovem. Estão no sofá da sala.

Valéria pensa: Então, mesmo louca, ela gostou de alguém. Quem seria? Demonstra muita paixão.

Observa melhor e percebe a figura de uma criança, semelhante ao homem que a abraça. Será que teve filho?

Enquanto estuda essa vida, aumenta a curiosidade de Valéria.

Cansada, anda pela Avenida e encontra a vizinha fofoqueira que comenta sobre Doroteia.

Nem sempre apresentou loucura. Foi unida a um homem e teve um filho. Com o passar dos anos, ele a abandonou e levou o filho. Nunca mais soube deles. Fugiu, levando as poucas economias que tinha como herança de família.

Ficou emudecida e trancada em casa por vários meses até reaparecer odiando tudo e todos.

Essa é a Doroteia que eles conheciam e que morreu assassinada, talvez por roubar alguém ou sabido alguma trama do bairro. Costumava andar à noite.

Não usava tóxico, mas alguns drogados frequentavam a sua casa. Deixava-os entrar, protegia-os da polícia, principalmente os mais jovens, como Oscar, que lembrava o olhar de seu filho. Quando os familiares ou vizinhos iam buscá-los, chamavam a polícia, que nada encontrava, mas era ameaçada de prisão, muitas vezes. Recebia reprimendas, era levada à Delegacia, prestava depoimentos e voltava para casa, o grande desgosto e tristeza dos vizinhos.

Valéria pensa em várias hipóteses. O assassino pode ser qualquer um. Todos tinham motivos para matá-la. Difícil, esse caso.

Dá uma chegada no escritório e comenta o caso com Jorge. Pede auxílio na investigação.

Jorge, admirado, pergunta-lhe: 

Por que tanto interesse? Nem família pediu sua defesa! Parece que ninguém se incomoda muito! Deixa nas mãos da polícia.

Valéria não responde. Sente uma coisa estranha. Uma intuição, talvez.

Nunca soube explicar bem suas atitudes, simplesmente age.

Vai até o Departamento de Polícia, procura saber o tipo de armamento usado. Foi um tiro mortal, de revólver comum, manejo simples, qualquer um saberia usá-lo.

Em seguida, dirige-se ao Necrotério para examinar a biópsia. Está sendo estudada. Verifica que foi um tiro só, à distância, atingindo os pulmões, enquanto ela corria. Não parece premeditado por pessoa com prática. Alguma vingança, talvez.

Quem teria feito isso? Eliminá-la, simplesmente, como se fosse um animal nocivo, no meio do caminho!

Sente curiosidade em saber mais. Dirige-se ao guarda que chefia a entrada da Biblioteca e pergunta se possuem algum controle ou câmera.  Se notou alguém estranho, armado, quando a mulher foi morta.

Ele responde que não percebeu nada, só escutou os gritos dela, como todos, nem viu quem atirou, mas poderá verificar alguma coisa na câmera de investigação, daquele dia. Existe um departamento que vigia o entra e sai diário da Biblioteca. Leva-a até lá.

Valéria estranha como ninguém se preocupou com isso, nem a polícia. Doroteia seria mesmo mais uma indigente morta, uma infeliz a menos, na cidade. Encontrar o culpado? De pouca importância.

Observa bem a entrada das pessoas, naquele dia. Verifica alguns corredores que aparecem no vídeo e interroga algumas funcionárias que lá trabalham, como auxiliares. Não chega a nenhuma conclusão. Aparenta um dia normal.

Observa novamente a entrada de pessoas, com livros ou cadernos, debaixo dos braços. Entrada de estudantes, com certeza, ou algum fanático pesquisador.

De repente, percebe a entrada de Doroteia, descabelada, nervosa, fazendo sinais incontroláveis com as mãos, disfarçando ligeiramente uma bolsa vermelha, cheia de papéis, não se distingue o que são.

Caminha apressadamente, verifica os lugares mais escondidos da entrada e se refugia atrás de grandes livros.

Após um tempo, em meio a outras pessoas, calmamente, entra uma mulher de meia-idade, mais moça que ela, também com uma bolsa larga a tiracolo, que se dirige a uma funcionária à procura de um livro. Enquanto a atendente procura, ela se distancia do local e parece procurar alguém ou algo, em outras dependências.

Valéria pede para o guarda aumentar a imagem e reconhece já ter visto esse rosto, no dia da confusão.

A imagem some e eles não conseguem mais mostrar nada, somente se ouve gritos e correria de pessoas no ambiente. Não conseguiram gravar o crime, somente Doroteia caída aos pés de Valéria.

Que estranho, ela pensa, como a polícia não investigou isso? Vai atrás da moradia da fofoqueira. Lembra-se do seu nome, Catarina. Quem sabe reconhece a mulher.

Como se trata de crime, acha melhor não ir sozinha e liga para Jorge acompanhá-la.

Junto a Jorge, indaga os vizinhos de Doroteia, os mais antigos e conhecedores de sua vida. Todos se atemorizam. Ninguém quer dar informação. Muito ao contrário, afirmam ter dó dela.

Valéria, contrariada, continua batendo às portas e perguntando nas imediações até que encontra um grupo de meninos, jogando bola. Um deles, mais inocente, conta para Valéria que todos a conheciam e falavam mal. Deram até Graças por ela morrer.

Quem brigava mais com ela, aqui? Pergunta Valéria ao garoto.

Ele responde que todos a ameaçavam, mas a última briga foi com a mãe de Oscar, um menino que ia fumar, à noite, em sua casa. A mãe dele foi buscá-lo e fez um escândalo. Jurou que ainda ia acabar com sua vida.

Valéria pede, então, para mostrar onde ela mora e o menino aponta a rua próxima, uma casa amarela. A mãe de Oscar era Madalena, brava também, mulher de briga.

Acompanhada de Jorge, dirigem-se à casa de Madalena, e, antes de baterem, escutam o vozerio da mulher com o filho. Está aos berros, ameaçando-o de internação se não parar com a maldita droga. Já não bastou a morte da Doroteia, que o protegia? Quem ela precisaria acabar com a vida agora? Seus amigos?

Madalena para de gritar, imediatamente, quando ouve batidas à porta. Assume um ar calmo e educado, quando percebe que é a investigadora, acompanhada do detetive.

Valéria, que ouviu tudo, mas não gravou, afirma que ela será intimada a depor no caso do assassinato de Doroteia. Reconheceu o rosto. Precisará explicar o que fazia na Biblioteca, naquela hora e, suas brigas e ameaças a ela, por causa do filho Oscar.

Madalena, muito pálida, não responde nada, e confirma com a cabeça, o entendimento. Parece surpresa com a descoberta de Valéria, mas segura e convicta do que fez.

Valéria e Jorge dão andamento ao inquérito, que segue o processo normal. Madalena, intimada, acaba confessando sua ida à Biblioteca. Não pretendia matar Doroteia, mas só assustá-la, usando o revólver do marido. Como ela percebeu e correu, a arma disparou ou ela se desesperou e atirou. Queria mesmo acabar com aquele tormento.

Justificou seu crime em defesa do filho. Achava que Doroteia é que fornecia a droga.

No julgamento, Valéria esquivou-se da acusação, passando o caso para uma colega. Queria defender a morta, mas sentiu também o drama de Madalena ao defender o filho. Achou melhor abandonar o caso.

Enfim, processos e julgamentos, na sua profissão, eram sujeitos à habilidade profissional da defesa e da acusação, tendo como final a decisão dos jurados. A justiça seria feita, independente dela.

Soube, mais tarde, que Madalena foi condenada a oito anos de prisão, por fazer justiça com as próprias mãos, sujeita a diminuição da pena, por bom comportamento.

Valéria, cansada de São Paulo, acabou tirando umas férias e indo à praia, por longo tempo. Afonso apareceu para visitá-la.


 

 

 


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