A GRANDE JORNADA - CONTO COLETIVO 2023

FIGURAS DE LINGUAGEM

DISPOSITIVOS LITERÁRIOS

FERRAMENTAS LITERÁRIAS

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

A PERFÍDIA - Dinah Ribeiro de Amorim

 



A PERFÍDIA

Dinah Ribeiro de Amorim

 

Prim...Pirim...Pim...Pim...

Olívia debate-se na cama e acorda assustada. Desliga o relógio e percebe que Carlos não veio dormir. Sabia que chegaria tarde, mas não dormir em casa... nunca aconteceu.

Suas dúvidas e ciúmes aumentam. Logo pensa: “Está mesmo apaixonado por outra mulher. Acho que é a nova secretária. Que tristeza! ”

Levanta-se rápido e prepara os filhos pequenos para a escola. Era Carlos quem os levava.

— Estamos atrasados, levantem rápido. Papai não chegou do trabalho.

Deixa os filhos no colégio, às pressas, e pensa em ir até a mãe, aconselhar-se.

No caminho, lembra que esqueceu o celular. Faz meia volta e retorna.

Ao entrar, escuta o som estridente do aparelho e percebe também estranhas mensagens.

Atende e é a secretária do marido, apreensiva, avisando que há uma reunião importante na firma e ele está atrasado.

Olívia, estranha sua voz e pergunta:

— Mas não sabe onde ele está? Não voltou para casa ontem.

Margot, responde, espantada, que Carlos não veio trabalhar no dia anterior, pensou até que estivesse doente.

— Nossa, responde Olívia. Vou ver algumas mensagens que estão aqui. Logo retorno.

Começa a verificar algumas frases de desconhecidos e gravações deixadas. As mãos trêmulas e o remorso pela desconfiança do marido começam a aparecer.

Uma voz baixa e rouca, deixada na tarde do dia anterior, avisa-lhe que o marido está em poder de um grupo, bem guardado e escondido. Querem resgatá-lo por uma quantia em dólar; receberia instruções logo após. Ah! Que não avisasse a polícia e eles poupariam sua vida. Desligam.

Mais umas três chamadas, mais tarde, ameaçam a vida de Carlos, se não responder às ligações.

Olívia estremece apavorada e arrepende-se de ter saído, no dia anterior. Foi ao cinema com Dina, sua prima, e, na verdade, odeia andar com celular. Não o levou. Detesta modernidades.

Senta-se no sofá e espera nova ligação dos sequestradores. Coitado de Carlos, pensa, como aconteceu uma coisa dessa com ele! O que fazer?

Tocam novamente e ela, quase sem voz, atende.

O mesmo som baixo e rouco, avisa-lhe que querem devolver o marido são e salvo, mas precisaria levar cem mil dólares, até um local que determinariam. Sem avisar a polícia.

Olívia pergunta como está o marido? A coragem e a revolta pela situação voltam aos poucos.

Colocam o marido para falar com ela.

— Olívia, estou vivo, sem ferimentos, mas são perigosos. Pelo amor de Deus, livra-me deles. Dá um jeito de fazer o que eles querem.

E acaba a ligação.

A esposa aflita, não acostumada com conflitos, fica de cabeça baixa, pensando...

Estavam em boa situação financeira, com Carlos, advogado de uma firma de Seguros, mas com pouco dinheiro em conta. Não possuíam essa quantia.

Sua mãe, uma senhora viúva, aposentada, vivia modestamente, com despesas pagas e alguns extras para alimentação e remédios.

Os sogros, pessoas simples, de vida modesta, comentavam com orgulho terem conseguido formar o filho advogado. Não, não poderia contar com eles.

Vai ao quarto das crianças e, entristecida, examina os detalhes, os brinquedos, e pousa o olhar num quadro, pintado pela mãe, com a figura de Jesus abraçando uma criança.

Emociona-se, ajoelha-se e ora a Deus, antes de qualquer atitude. Como resolver a situação?

Lágrimas quentes escorrem pelo rosto e seu peito estremece em soluços fortes.

Acalma-se aos poucos e vem à mente a figura do Joel, o presidente da Seguradora e chefe do marido.

Dirige-se a ele, ao entrar na firma, e expõe, trêmula, a situação.

Joel recebe-a amistosamente e, ouvindo-a, endurece o semblante e medita sério no assunto.

Carlos era amigo, bom advogado, já havia resolvido vários problemas financeiros da firma, gostaria muito de ajudá-los. A quantia era grande. Não dispunham dela, no momento. Ainda mais em dólar. Difícil comprar.

— Dona Olívia, não seria melhor avisarmos a polícia? Esses casos de sequestros, geralmente, mandam comunicar à polícia, em primeiro lugar.

Olívia reage com susto e medo.

— Eles ameaçaram matá-lo!

Joel entende bem a gravidade e acha melhor esperar nova ligação dos sequestradores. Queria falar com eles.

Olívia dá um suspiro profundo.

Nova ligação é feita e Joel atende no lugar de Olívia. Afirma ser um amigo da família a combinar a troca. Impossível em dólares, mas talvez conseguisse em real.

É feita a combinação da hora e o local da entrega, fora da cidade, em terreno solitário, indo somente ele e a esposa de Carlos.

Prometiam entregar o refém logo que pegassem o dinheiro. E nada de polícia.

Nesse mesmo dia, à tarde, Olívia pede à mãe para buscar as crianças e ficar com elas. É uma emergência. Depois explicaria.

Acompanhada de Joel, aguarda em casa, o horário combinado: dez horas da noite.

Joel avisa Olívia que irá voltar ao escritório para conversar com o contador.

Como não era esperado, depara-se com Margot falando ao telefone, assunto sigiloso.

Disfarçadamente, procura escutar o que fala e ouve qualquer coisa sobre dinheiro e hora.

Esta, ao vê-lo, encerra rápido a ligação e, branca de susto, pergunta de Carlos.

Joel, desconfiado, acha melhor não dizer nada. Chama às pressas, Fernando, um amigo detetive, experiente, e pede para inquirir a vida dos seus funcionários, principalmente Margot, a nova secretária.

Fernando, sabedor do sequestro, avisa a polícia e descobre dados importantes: Margot tinha passagem pela polícia por roubo, usava um nome falso, embora tivesse diploma superior. Hélio, da Contabilidade, era jogador e, no momento, devia grande soma de dinheiro a agiotas. Márcio, dos Recursos Humanos, sabia bem sobre a situação financeira de todos. Maior ou menor seguro de vida.

Enfim, Fernando, em poucas horas, descobre várias pessoas que poderiam estar ligadas ao sequestro.

Decide pedir à polícia que os interrogue e que também acompanhe Olívia e Joel, no momento do encontro, às escondidas.

Nenhum dos suspeitos têm ordem de deixar o local ou falar ao telefone.

Dez horas da noite, dirigem-se ao encontro dos sequestradores munidos de dinheiro, e percebem que Carlos não se encontra.

A polícia aparece e cerca o local, acompanhados por Margot. Colocam algemas em todos, obrigando-os a falar.

Margot, a maior suspeita, vendo que o sequestro de Carlos não deu certo, leva-os até ele.

Um Carlos amarrotado, dopado e amarrado, encontra-se jogado num colchão sujo e fedorento.

Carregam-no para fora, prendem toda a quadrilha, encabeçada por Margot que, realmente, tentou seduzir Carlos, com má intenção.

O tempo passa. Nos dias seguintes, a casa de Olívia é momento de brindes e reconciliação, animados por Joel e Fernando que, felizes, haviam resolvido o caso.

A esposa, ainda trêmula, beija o marido que se recupera abraçado aos filhos. Agradece ao Joel e Fernando pela solução do sequestro e lembra-se da presença de Deus em suas vidas, quando orou por socorro.

“Quando a gente pensa que Ele está longe, é quando Ele está mais perto! ”

 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

DEIXE AQUI UMA MENSAGEM PARA O AUTOR DESTE TEXTO - NÃO ESQUEÇA DE ASSINAR SEU COMENTÁRIO. O AUTOR AGRADECE.

A última carta. - Adelaide Dittmers

  A última carta. Adelaide Dittmers   Suzana segurou o envelope meio amassado, como se tivesse passado por diversas mãos. Um frêmito s...