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quinta-feira, 8 de abril de 2021

O NOVO SHERLOCK HOLMES DO BRÁS - Claudionor Dias da Costa

 

                                 


O NOVO SHERLOCK HOLMES DO BRÁS  

Claudionor Dias da Costa

Aquele emigrante argentino que deixou a cinco anos “La Boca” na sua Buenos Aires e veio arriscar a vida em São Paulo, passou a morar no bairro do Brás.

Seu nome Ramon Gregório Hernandez. Com seus cinquenta e cinco anos e ainda sonhador e romântico, conservava uma ingenuidade nata e declarava com seu sotaque imperdível:

− Por favor, “mi nombre es” Gregório.

E explicava que preferia ser chamado assim, devido sua mãe ser de origem grega e este nome significava “o vigilante”, o “alerta”. Com isto, queria apresentar uma altivez que não combinava com seu jeito simples e inocente.

Após sobreviver com alguns “bicos”, conseguiu o tão ambicionado emprego de zelador naquele edifício velho com dois blocos de cinquenta apartamentos no fundo da rua de paralelepípedos do tradicional bairro paulistano.

Os dias passavam numa rotina modorrenta naquele edifício de moradores calmos e disciplinados, grande parte aposentados.

Ele aproveitava esta tranquilidade e tirava cochilos após seu almoço no pequeno cômodo ao fundo onde residia.

Num dia no meio da manhã, o Sr. João, morador do terceiro andar e síndico do prédio apareceu histérico chamando pelo Gregório. Este apareceu rápido, o que não era normal e com os olhos esbugalhados ouviu o berro dele apontando para um “cocô” no corredor:

− Quem fez essa sujeira?

− Procure imediatamente o responsável por essa imundice.

O zelador gaguejando prometeu resolver o problema e descobrir o meliante.

O fato de se encontrar fezes no prédio em lugar de uso comum, se espalhou rapidamente e começou a gerar fofocas e acusações.

No dia seguinte bem cedo, Gregório em seus aposentos, vestiu sua capa e chapéu, que usava nas noites de boemia pela fria Buenos Aires, pegou sua lupa que usava para ver melhor quando fazia palavras cruzadas e olhando no espelho, estufou o peito e sentiu-se o próprio Sherlock Holmes. Até mudou a expressão e confiante e célere saiu à caça do “criminoso”.

Parou no corredor de repente e, completamente embasbacado ficou olhando para tudo em volta, porque novamente apareceu mais um “serviço” do malfadado meliante.

Com sua lupa observou cuidadosamente e começou a pensar qual teria sido o roteiro para tal delito. Principiou a levantar que pessoas tinham “pet” e de que tipo no edifício. Por eliminação e devido ao exame feito, pelo tipo, tamanho e circunstâncias, chegou à conclusão de que seria algum cachorro e não muito pequeno.

Identificou oito moradores nessa situação.

E matutando:

− Seria da Dona Filomena, ou do Sr. Petrônio, ou ainda da bonitona do quinto andar...Hum...hum...

E lá ia o nosso detetive andando para tudo que é lado, inquieto e intrigado, analisando os donos dos “suspeitos”. Sabia que não poderia acusar ninguém previamente sob pena de até ser despedido por falta de respeito.

O síndico aumentou a tensão quando colocou nos elevadores avisos enérgicos sob os procedimentos e mencionando explicitamente o ocorrido e alertando para as multas que seriam fatais, principalmente porque aquilo ocorria várias vezes.

Como o prédio por medida de economia somente tinha câmeras nas entradas, não havia possibilidade de identificar precisamente o que ocorria.

Gregório resolveu ficar vigilante, principalmente no período da manhã quando os moradores saem com os cães para passeio. Assim, escondeu-se atrás da parede em que ficavam encostadas as lixeiras no corredor entre os blocos.

Parecia escutar aquelas músicas em filmes de suspense. Sua respiração ficou ofegante. Até suava, esperando o grande desenlace, para resolver de vez aquela situação que era cobrado a solucionar.

De repente, lá vem Dna. Eufrásia, caminhando calmamente com seu cachorro labrador, já não muito novo. O nosso Sherlock tinha uma certa reserva com ela devido à sua implicância com tudo. Ela reclamava de tudo com ele e sempre discutiu com outros moradores e era avessa a respeitar as regras do condomínio, bem diferente da grande maioria que era educada.

No seu íntimo sentiu que só poderia ser ela a responsável. Nunca levava recipientes para recolher as fezes.

E de repente, suas suspeitas se confirmaram. O cão parado repetindo no mesmo lugar o que fazia e a Dona Eufrásia parecia até ter satisfação em ver o que ocorria. Rapidamente, Gregório preparou o celular e foi tirando fotos.

Caminhou em direção a ela que já ia saindo e disse:

 No es possible  Dona Eufrásia tal procedimento. Vou informar o Sr. João.

Ela ficou muda por instantes e xingando bastante se dirigiu à rua.

As providências foram tomadas com punição com multa e os moradores aliviados passaram a olhar o zelador Gregório com mais respeito.

Ele todo orgulhoso pendurou seu disfarce num cabide bem evidente em seu quarto e ficou aguardando ansioso por novo caso a solucionar, já que agora sua fama se espalhou como o novo Sherlock Holmes do Brás.

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