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quinta-feira, 2 de junho de 2022
quarta-feira, 1 de junho de 2022
O SILÊNCIO DO CASTELO - Helio Fernando Salema
O SILÊNCIO DO CASTELO
Helio Fernando Salema
A jornalista IRENE e também fotógrafa e escritora, conseguiu comprar uma casa por um Euro numa pequena localidade. Não foi atraída pelo valor simbólico, sabia muito bem, que teria gastos com a propriedade, pois estava sem morador há alguns anos. O que mais lhe chamou a atenção foi o conjunto. Cidade medieval lindíssima, muito bem conservada, atrativa, população minúscula, mas hospitaleira e, principalmente, as lendas relacionadas a um castelo antigo.
No bagageiro do carro acomodou apenas o indispensável para uma vida simples numa pequena cidade. A maior parte foi ocupada pelos instrumentos de trabalho. Bem cedo iniciou a viagem com muitas expectativas e fantasiando. Acostumada a criar histórias, deixou que sua alma livremente lhe revelasse as mais variadas abstrações.
Ao chegar ficou fascinada por tantas e maravilhosas surpresas. Cada casa era um deslumbre. As ruas antigas, conservadíssimas. Tudo lhe parecia diferente e primoroso, a ponto de parar o carro e ficar admirando, como uma criança diante de um novo e desconhecido brinquedo.
Embora a casa estivesse, como era de se esperar, sem os
cuidados adequados, não lhe causou nem um sopro de desalento. Abriu as janelas
e admirando com mais atenção cada detalhe, sentiu que até o final do dia
estaria a seu gosto e desejo. Depois de contemplar o céu:
— Mãos à obra!!!
A noite suavemente intervinha quando ela sentiu a satisfação do dever cumprido. Era necessário uma boa refeição e um sono prolongado e repousante. Nada difícil para quem estava prevenida quanto à alimentação e num local de tranquilidade absoluta.
Ao vivenciar os primeiros clarões do amanhecer, sentiu seu corpo dolorido pelo esforço enorme empenhado no dia anterior. Satisfeita pela aparência que observava em cada canto do seu sonhado lar, não demorou muito para recobrar o ânimo, e com tamanha euforia levantou-se, e mais ágil ficou ao se recordar de que ainda tinha muito o que descobrir naquele lugar pelo qual se encantara através de fotografias.
Ao transpor a porta, sentiu-se diante de um colossal, mas agradável, desafio. Conhecer profundamente, nos mínimos detalhes, a cidade e seus moradores.
Saiu fotografando tudo que lhe era novidade, e havia
muitas. Casas de construção não habitual, bonitas e muito bem enfeitadas, ruas
estreitas com formato diferente, que impressionaram até aos olhares menos
atentos, gerando bela e generosa paisagem.
Conversando com os simpáticos e educados moradores foi colecionando farto material para várias histórias.
Meses depois recebe uma visita surpresa de uma colega de
infância, Shiela. Aquela que sempre chegava sem ser convidada, quando ninguém
esperava e nem desejava.
Nome de batismo Shirlei Elena, ganhou o apelido porque
quando se aproximava as pessoas diziam:
— Xi! Vem ela!
Detentora de uma personalidade fortíssima e curiosa. Logo que chegou, nos primeiros contatos com o material coletado com esmero por IRENE, imediatamente começou a questioná-los. Chegando em alguns momentos a irritar a amiga pesquisadora.
Em outros momentos, no entanto, ajudou com suas observações e elogios sinceros. A ponto de Irene sentir que o material, colecionado até aquele momento, era de grande valor.
Quando Shiela acompanhou a amiga pela primeira vez ao castelo, ficou assustada, tremendamente aterrorizada, ao ouvir sons estranhos. Agarrou-se à amiga e quase chorando a chamou para irem embora.
Em casa, examinando as fotos, depois de passado o susto, estranhou que numa delas, um pequeno detalhe no canto da parede. Algumas paredes eram de pedras irregulares, mas naquele canto o que chamou a atenção da curiosa foi uma minúscula e quase imperceptível fresta. Logo veio a hipótese de ser uma entrada, provavelmente secreta.
Alertou a amiga, que embora não aceitasse aquela hipótese, resolveu voltar ao castelo no dia seguinte. Irene sem a presença da amiga, se sentia mais corajosa, pois já havia captado sons estranhíssimos, algumas vezes, quando se aproximava daquela mesma parede que ficava num pequeno corredor.
Novamente fotografou e observou, mas tudo aparentava natural. Examinou o local suspeito e não havia nada que se assemelhasse a uma porta, possivelmente, era apenas uma sombra naquela foto. Nas paredes próximas não havia nem uma pequena janela. A porta mais próxima ficava distante.
Subitamente, Irene começa a ouvir um som incompreensivo e
desta vez assustador. Às vezes um suspiro ou gemido, intercalados por
estranhos barulhos. Momento seguinte nada. Por muito tempo somente o silêncio
reinava naquele magnífico castelo.
Em seguida percebeu passos de alguém que se aproximava e vinha em sua direção. Assustada e não querendo ser vista naquele local, foi lentamente se deslocando em outra direção.
Mais distante, junto às janelas abertas para a entrada de
ar e iluminação, se acalmou ouvindo piados de pássaros anunciando a primavera.
O som dos passos não foram mais ouvidos. Mesmo assim continuou bastante preocupada. Caminhou em direção à saída olhando para os todos os lados. Temerosa e com o coração desenfreado foi pisando suavemente para não fazer barulho, porém com passadas cada vez mais estendidas. Até chegar à saída, foram momentos de terrível aflição.
Shiela aguardava em casa, andando sem parar de um lado a
outro. Esfregando as mãos como se assim pudesse ajudar a amiga distante, ou
quem sabe fazer o tempo passar mais ligeiro do que o impossível. Arrependida,
em alguns momentos, por não ter ido em companhia da amiga.
Ao ver Irene entrando bastante aterrorizada, pressentiu
que poderia ter acontecido o pior.
Um copo com água ajudou bastante. Irene sorveu cada gole lentamente, deixando a amiga ainda mais angustiada. Ao dar conta de que estava novamente em casa e segura, foi aos poucos relatando o ocorrido.
Até findar o dia foram muitas conversas e planos. Dúvidas sobre o que poderiam fazer de melhor. Irene decidiu que não iria mais àquele castelo. Nem mesmo em companhia de outras pessoas do lugar. Shiela afirmou que iria embora na manhã seguinte.
Assim que amanheceu o dia, Irene foi à rua fazer compras para o café. Percebeu um movimento anormal de pessoas, movimentando-se, gesticulando e se comunicando de maneira discrepante. Enquanto escolhia as suas mercadorias, ouviu alguém falar que um homem bastante idoso havia falecido. Mas ninguém o conhecia. Também não o virão chegar na cidade e jamais no castelo.
Mais estranho ainda foi quando entrou um antigo morador dizendo que pela manhã um corpo fora encontrado dentro do castelo, a porta estava meio aberta. E o selador havia desaparecido.
Chegando em casa, ao relatar o que havia escutado, Shiela mais uma vez teve um ataque de espanto e susto exacerbado e prolongado. Afirmou, categoricamente, que jamais pisaria naquele castelo ou em outro qualquer.
IRENE num lampejo de intuição e de coragem sentiu-se impelida a constatar se alguma coisa havia mudado dentro do castelo. O que poderia esclarecer o ocorrido no dia anterior e também servir para uma história ainda mais empolgante. Sem falar com a amiga, saiu apressadamente. Cada passo lhe parecia que a distância não diminuía, mas a angústia sim, aumentava e muito.
Ao longe notou que algumas pessoas estavam em pé junto à
porta fechada. Aproximou-se e em conversa com os presentes também ficou
impressionada com o aviso que dizia. FECHADO POR TEMPO INDETERMINADO.
Desanimada e preocupada, retornou a casa.
Depois de tantas aventuras, quase todas
inesperadas, Shiela resolveu ir embora. À medida em que enchia as malas, seu
coração também se enchia de lampejos de saudades envolventes, deixando sua
mente em hesitação.
Com a chegada do táxi não lhe restava opção. Despediu-se
com um forte e alentado abraço, o que deixou ambas em lágrimas.
Durante a viagem de retorno, cada cena que deixava para trás, lhe trazia à memória, que nunca imaginara encontrar o que presenciou ali, quando pensou em simplesmente fazer uma surpresa à amiga.
Depois de algumas semanas, Irene toma conhecimento da abertura do castelo, quando estava caminhando sem qualquer preocupação. Não querendo perder tempo vai apressadamente, só quando já estava dentro do castelo, lembrou-se de que não levava nenhum material para registrar qualquer possível mudança.
O castelo estava vazio. Nem uma alma penada para lhe fazer companhia, nenhum som por todos os cantos que passava. Mesmo com as janelas abertas não se ouvia o som dos pássaros. Sentiu arrepios estranhos e uma intuição lhe ocorreu. Saiu imediatamente.
Ao entrar na casa pegou a caixa em que estavam as fotos e
examinou cada uma, atentamente.
Durante alguns minutos observou cada detalhe daquela que
lhe prendeu a atenção. Era a fotografia do castelo de perto e mostrava
nitidamente sua imponência. Pegou a caneta e com todo o cuidado escreveu na
foto o nome do seu próximo livro.
O SILÊNCIO DO CASTELO.
PROVOCANDO RISOS E FELICIDADE - Helio Fernando Salema
PROVOCANDO RISOS E FELICIDADE
Helio Fernando Salema
Senhor Helio, que não gosta de ser chamado de senhor, às vezes respondia que o Senhor é quem está lá em cima olhando por nós.
Há alguns anos comemorou a entrada na casa dos sessenta,
não nega e não tem como negar, sua aparência revela de maneira clara e sólida.
Cabelos brancos e barba grisalha, não deixam dúvidas. Mas como gosta muito de
brincar e provocar risos, costuma dizer sempre com uma postura de muita
seriedade, que tem 28. Em seguida explica:
— Isso provoca risos sutis de uns e gargalhadas, por
vezes escandalosas, de muitos outros.
E complementa:
— É muito bom e saudável estimular risos nas pessoas. Elas mudam de fisionomia incrivelmente, e na rapidez de um raio em tempestade. Muitas vezes ficam mais bonitas e demonstram estarem saudáveis mesmo quando, pouco antes, reclamavam de doenças ou ainda pior, da vida.
Algumas vezes provoca risadas quando alguém, querendo
participar da brincadeira, diz que ele parece ter vinte e cinco ou vinte e
seis, no máximo. Rapidamente responde:
— Não, não! Tenho vinte e oito e não admito que reduzam
minha corretíssima idade.
Pronto. Era mais uma enxurrada de risos.
No início do ano era a viagem à Guarapari que enchia seu
peito de esperança e perspectivas.
Tudo começava por volta de outubro ou novembro. Quando em contato com os amigos, principalmente Carlos e Luiz. Alguém lembrava que o verão já dava os primeiros sinais, e logo vinha a lembrança de estarem juntos naquela bela e tranquila Praia do Morro.
Eram dias de reuniões na praia desfrutando tudo de bom que havia. Sol, mar, paisagens aprazíveis, cerveja, boa comida…e aquelas conversas longas que sempre eram interrompidas por brincadeiras ou deboches, terminando em hilaridade.
Outro momento importante era o contato com algum mineiro e ouvir histórias das Minas Gerais. A boa prosa lhe era bastante agradável, talvez por ser meio mineiro, também aprecia os “causos” narrados nos contos do amigo Milton.
Foi num desses dias, que o senhor Helio passeando pelas
ruas do centro de Guarapari, avistou numa das vitrines uma camiseta regatas,
por coincidência azul, sua cor preferida. Parou e ficou admirando. Lembrou que
dos dez dias programados ainda restavam oito e uma camiseta a mais poderia lhe
ser útil. Ao perceber o preço não teve dúvidas. Sem tardar, entrou e foi logo
perguntando ao rapaz que estava no balcão:
— Posso ver aquela camiseta azul?
— Sim. Vou pegar para o senhor.
O rapaz colocou no balcão a camiseta junto de outras duas, uma branca e outra amarela clara. O sr. Helio pegou as três e se dirigiu ao provador.
Minutos depois voltou ao balcão e disse ao funcionário
que levaria a branca e a amarela. O funcionário assustado:
— O senhor não vai levar a azul que escolheu?
— Não. Quando a vesti me vi como um velho de cinquenta
anos.
O funcionário espantado ficou tentando disfarçar um riso,
abaixou a cabeça. Mas não adiantou nada, senhor Helio percebeu e também, sem
nenhuma intenção de disfarçar, soltou uma risada.
O rapaz colocou as duas camisetas numa sacola e recebeu o
pagamento.
Ao sair, o senhor Helio próximo da porta, virou-se rapidamente e ainda pode ver os três funcionários em comunhão de risadas, uma secava os olhos de tanto que ria. Aquele que lhe atendeu, com as duas mãos segurava a barriga, que certamente doía de tanto rir.
Na calçada o senhor Helio rindo, disse em voz alta, como
se quisesse comunicar a todos os passantes:
— Como é bom atiçar risos. As pessoas ficam mais bonitas,
os problemas desaparecem, a vida agradece e Deus abençoa.
O Despertar - Adelaide Dittmers
O Despertar
Adelaide
Dittmers
O
rapazinho de treze anos apertou os olhos feridos pela claridade súbita. Quando conseguiu abri-los maravilhou-se com o
que viu. Muitas descrições, tinha ouvido
sobre o lado de fora, mas o que estava vendo a tudo superava. Era como se acabasse de ter saído do útero
materno. Como se nascesse naquele
momento.
Árvores
floridas, um céu vestido de um azul intenso, onde nuvens brancas desenhavam
diversas formas. Abaixo, um rio
esverdeado e vigoroso correndo pelo seu leito pedregoso.
O
jovem sentiu-se aturdido e sentou-se para recuperar o fôlego e as forças. Lágrimas cristalinas rolaram de seus olhos.
Ele perdera tudo isso por tantos anos.
Vivera na obscuridade ouvindo as diversas histórias dos mais velhos.
Um
homem estendeu-lhe uns óculos escuros.
—
Coloque isso! Você precisa se acostumar com a claridade!
O
menino o pegou e o colocou, mas o retirou.
Queria
sorver toda aquela luz, queria sentir aquele mundo, que estava experimentando
pela primeira vez.
O
vento que lhe desmanchava o cabelo era uma dádiva inesperada e balançava a
cabeça para senti-lo como se fosse uma carícia.
Saíra
de uma caverna para outra realidade. E uma pergunta imperiosa surgiu em sua
mente. O que lhe reservaria esse novo
mundo... Imenso demais. Misterioso demais. Inesperado demais.
Levantou-se
e com passos incertos começou a descer a encosta da montanha. O rio o atraía como um imã. Abaixava de quando em vez para pegar uma flor
e a cheirava como um animalzinho fareja algo delicioso.
Os
outros, que com ele haviam saído do frio e triste bunker, pararam e o deixaram
seguir.
A
água fria do rio molhou os pés descalços e encharcou-lhe a roupa. Um arrepio de
prazer percorreu-lhe o corpo. O menino
pisava com cuidado no solo de pedras lisas, apreciando cada contato com aquela
natureza, que desconhecera até agora.
Uma
voz feminina ecoou à distância:
—
Venha, filho. Temos que ir.
Ele
voltou-se vagarosamente.
—
Posso ficar mais um pouco?
—
Seu avô está sendo esperado. Precisamos
partir já.
O
jovem saiu devagar da água e dirigiu-se para o grupo de pessoas, que o
esperavam mais acima.
Na sua
cabecinha fervilhavam lembranças desencontradas. Os dias em que homens traziam suprimentos
para o bunker e reuniam-se com o avô sob as lâmpadas, que espalhavam uma luz
tênue no ambiente. Momentos únicos, em que traziam notícias do mundo exterior.
A
guerra, na qual o país mergulhara na tentativa de conter a invasão por outro
povo. A fuga desesperada do avô, que
governava a nação, juntamente com a família e componentes do governo. O esconderijo naquele lugar escuro. A resistência daqueles, que queriam libertar
a terra nativa dos opressores e a fidelidade ao avô, escondida no coração de
cada combatente. Histórias que ouvira e tivera dificuldade de entender.
Mergulhado
nesses pensamentos, chegou perto do grupo.
Olhos emocionados pousaram sobre ele.
Um senhor de cabelos prateados aproximou-se e acarinhou-lhe a cabeça.
—
Pedro, você tem muito a descobrir. Vamos
até a estrada. Carros nos esperam.
Umas
trinta pessoas começaram a caminhar até a estrada. Já tinham lhe contado que os rebeldes
conseguiram expulsar os invasores após tantos anos de lutas e armadilhas ao
inimigo e que o país fora libertado. O
que aconteceria, agora?
Ao
alcançarem a estrada, vários carros os esperavam. Os olhos de Pedro
arregalaram-se. Pela primeira vez, via
um carro. Um ähhh¨ de surpresa
escapou-lhe da boca e deu uma volta pelos veículos, admirando cada detalhe. O menino estava admirado diante daquela
realidade, que conhecera apenas pelas descrições e fotografias. Tudo era muito maior, mais impactante. As
longas conversas com os adultos, as perguntas constantes, que fizera resultaram
em uma pálida idéia do mundo exterior.
Sorrisos
estamparam-se nos rostos das pessoas. O
jovem tinha sido o filho de todos durante os longos e tenebrosos anos, que
viveram naquele lugar inóspito. Ele fora
a única alegria e um dos fortes motivos de manterem a esperança de lá sair.
De
repente parou. A alegria e o espanto
diante das descobertas chocavam-se dentro dele.
Correu para perto dos pais e
abraçou-os como um bebê que pede colo para se sentir protegido.
O
avô derramou um olhar carinhoso sobre o neto, compreendendo os sentimentos
contraditórios que o deviam estar sacudindo.
—
Vamos, Pedro! Entre no carro. Precisamos
ir para a cidade. Estão nos esperando.
Todos
tomaram seus lugares e seguiram pela estrada estreita de terra.
O
menino tinha os olhos pregados na janela, observando a paisagem que desfilava
rapidamente. O sacolejar do veículo, as
curvas do caminho o nausearam e a comitiva
parou para ele pôr para fora todo o espanto e emoção, que aquele mundo
novo estava lhe causando.
Algumas
horas passaram e pequenas habitações surgiram.
—
Casas! Estamos chegando?
—
Ainda não! Veja, vamos pegar aquela
estrada!
Uma
estrada asfaltada estendia-se a perder de vista. Os carros a acessaram, aumentando a
velocidade. O mau estado da pista fazia
com que desviassem dos inúmeros buracos, mas mesmo assim tudo parecia voar ao
lado de Pedro. Ao longe, plantações de
diversas cores passavam por eles simetricamente alinhadas. Aqui ou ali, viam-se construções em ruínas.
Muitos
quilômetros depois, surgiu mais abaixo de uma colina, uma grande cidade.
—
Agora estamos chegando, não é?
—
Sim, Pedro. É a nossa cidade. A capital do país. Respondeu o avô, com os
olhos marejados de lágrimas.
Nesse momento, seus pensamentos voaram para a
companheira de muitos anos, que não resistiu ao longo tempo de confinamento e
que não compartilharia com ele a emoção de retornar ao que tinham deixado.
A
cidade os recebeu engalanada.
Bandeirinhas agitavam-se nas mãos do povo para receber o chefe da nação,
que a maioria julgara que estava morto.
Espantado,
o menino encolheu-se no banco do carro.
As surpresas estavam sendo demasiadas para um único dia de sua curta
vida. A angústia dele foi percebida pela
mãe, que o enlaçou com um dos braços e acalmou-o com palavras ternas.
Edifícios
destruídos eram avistados ao longo trajeto.
Eram os vestígios da guerra e essa triste realidade abalou o jovem mais
uma vez
Mais
adiante, chegaram a uma grande praça, onde uma bela construção se erguia. O cortejo parou. Uma multidão lotava o lugar e o nome do avô
era ouvido em altos brados. Saíram dos
carros. O avô subiu as escadas
lentamente. Soldados enfileirados
prestavam-lhe continência. Ao chegar a
um patamar, no topo das escadas, um microfone o esperava. Virou-se devagar para o povo e acenou. Alto, rosto traçado por vincos profundos e
olhar intenso. Transpirava carisma e
integridade por todos os poros. A voz
firme, mas emocionada soou pelo lugar e um grande silêncio apagou o burburinho
que reinava.
Em
um discurso breve, ele agradeceu a todos a luta pela liberdade e lealdade ao
país e a seus princípios mais profundos.
Ao terminar, uma ovação explodiu.
Ele curvou a cabeça em sinal de agradecimento e respeito à coragem
daquele povo sofrido. Acenou mais uma vez e virou-se, entrando no palácio. Os
companheiros de exílio e aqueles que o ajudaram a reconquistar o país o
seguiram.
Na
grande sala, abraçaram-se emocionados. Uma
mesa posta, com várias iguarias os esperava.
O avô, porém, recusou a refeição.
—
Estou exausto. Preciso descansar. Vejo vocês amanhã para traçarmos os próximos
passos para reerguer o país. Há muito
trabalho a fazer.
E
levantando uma das mãos, cumprimentou a todos com um sorriso e saiu da
sala. Os presentes o acompanharam com
olhares de respeito. Admiravam a bravura
daquele homem, que mantivera a nação unida, oculto e preso em um bunker no
âmago de uma distante montanha, orientando seus homens a resistir e lutar pela
expulsão dos invasores.
Quando
toda a população soube que o seu líder estava vivo e mesmo escondido ajudou a
alcançar a vitória, o orgulho despedaçado pelos anos de submissão acendeu-se em
cada homem, em cada mulher, em cada velho, em cada criança.
A
refeição transcorreu em um clima festivo, que disfarçava uma certa tensão em
cada participante, afinal o desafio de ora em diante seria enorme e já pesava
nos ombros dos que ajudariam a levantar o país.
Pedro
não escondia a agitação que lhe sacudia o íntimo. Para os seus verdes anos, tudo era muito
desafiador. Olhava de um lado para o outro, sentindo a emoção contraditória de
cada um, ao mesmo tempo que se surpreendia com o brilho dos talheres de prata,
com a louça de filetes dourados e com a alvura da toalha.
Quando
o jantar terminou, já os últimos raios de sol incendiavam a sala de tons
avermelhados. O jovem correu para a
janela.
— O
que está acontecendo no céu?
Os
pais aproximaram-se:
— É
o pôr-do-sol! Não é maravilhoso? Perguntou o pai e completou: Está anunciando o
cair da noite.
Pedro
estremeceu;
—
Não quero ver a noite! É muito escura!
Na
sua memória, surgiu a imagem negra de uma tempestade que atingiu a montanha e
do vendaval que abriu e quase derrubou a porta oculta do bunker. Pessoas correndo para fechá-la. O susto e o medo que se apoderou de todos. A
confusão que lhe permitiu ir até a entrada e presenciar a escuridão, o forte
aguaceiro e os raios que riscavam o céu. O pânico que o paralisou e o contato
com uma mão que o levou para dentro, onde a avó o acolheu em seus braços.
O
pai tirou-o dos seus pensamentos.
—
Sei do que você está recordando. Aquela
escuridão foi consequência do temporal.
Hoje o dia foi claro e ensolarado. Você vai ficar surpreso ao apreciar a
noite.
— Vamos subir, exclamou a mãe. Você precisa
tomar um banho e descansar. Foram muitas as emoções. Mas antes de ir para a
cama, vamos admirar a noite do terraço para afastar a má impressão, que ficou
daquela tempestade.
E
pegando o filho pela mão, subiram a escada. Mas, Pedro virou-se:
—
Pai, você sobe depois para vermos a noite juntos.
O
medo ainda pairava sobre ele.
As
luzes piscantes das estrelas e uma enorme e alaranjada lua cheia enfeitavam o céu
quando saíram para o terraço.
—
Meu Deus! Quantas estrelas! A lua é
linda! Estou vendo o universo, não é?
—
Sim, uma pequena parte dele. Respondeu o
pai.
Um
profundo suspiro exalou das mais profundas entranhas do menino. Um torvelinho de pensamentos tentava
processar tudo o que estava vivendo e descobrindo em um único dia. Sacudiu a cabeça, tentando ordenar o que lhe
passava pela mente.
—
Estou cansado!
—
Vamos entrar! Você precisa de um bom sono!
Já
deitado, recebeu os beijos dos pais. A
cama macia o abraçou e o aconchegou.
—
Deixem a porta do terraço aberta!
O
luar prateado, salpicado de estrelas iluminou e embalou os sonhos de Pedro.
O fantástico resgate do amor de uma mãe - Alberto Landi
O fantástico resgate do amor de uma mãe
Alberto Landi
Charlotte, nascida em 1920 em Castle Combe, interior da Inglaterra, pertencia a uma família de protestantes.
Ela tinha sonhos frequentes que a deixavam triste, deprimida, sonhava com seu próprio falecimento.
Estava desesperada, pois com quatro filhos não tinha o suporte e orientação necessária do marido, ex-combatente da primeira Guerra mundial, que após retornar da guerra se entregou à bebida, um pai infeliz e marido ausente.
O sonho, ao lado de certas lembranças que surgiam no estado de vigília, fazia parte de seu cotidiano, influenciando desta maneira o seu desenvolvimento psicológico, emocional e social.
Aconteceu que, prematuramente, o sonho tornou-se realidade, deixando os filhos pequenos.
Muitos anos se passaram...
Marta, americana natural e moradora de San Diego, tem dois filhos.
Sua profissão é de jornalista, fotógrafa e escritora.
Num determinado dia, viu um anúncio no jornal local: Vende-se casa no interior da Inglaterra, por um euro, no pequeno vilarejo de Castle Combe.
Como requisito seria necessária uma pequena reforma e fixar residência pelo menos por seis anos.
Como ela sempre quis conhecer esse país, entusiasmou-se pela publicação e começou a pesquisar.
Por ser uma escritora, achou que seria o local adequado para exercer a profissão.
Nesse lugar havia um pequeno castelo, que os moradores diziam ser rico em histórias e lendas imaginárias.
Castle Combe se assemelhava a um cenário visto em filme de suspense, Psicose, ficava no alto de uma colina, com características bem sinistras. Um vilarejo que nasceu com os celtas e que até hoje nenhuma construção foi alterada e ou complementada.
Aproveitou o programa de incentivo do governo e adquiriu a casa.
Ela, desde criança, tinha visões com Charlotte e vivia dividida entre uma vida atual e passada. Era como um quebra-cabeça com certas peças apagadas, outras fora de lugar e outras nítidas, mas fáceis de se encaixarem.
Geralmente, nas pessoas as lembranças de infância assomam de forma desordenada sem nenhuma cronologia.
Dentre suas lembranças, destacava-se um chalé onde morava com filhos e marido.
Lembrava com muita clareza o lugar em que vivia bem como suas ocupações diárias.
Esses sonhos passaram a dominar sua vida, pois eram imagens claras de uma família, num pequeno lugar da Inglaterra.
Ela procurou um terapeuta. O analista, após submetê-la à sessões de regressão, concluiu:
— Não são sonhos, são lembranças de vidas passadas!
Com o apoio da família, Marta viaja para averiguar a casa, em busca de pistas sobre seu passado.
Ela pressentia que os filhos de Charlotte que apareciam nos sonhos poderiam estar vivos e ela teria um papel relevante junto àquelas crianças de ontem. O sonho mostrava o local, justamente o mesmo do anúncio do jornal.
O objeto central de suas preocupações eram os filhos deixados. Ela tinha lembranças de pessoas, lugares...
A dor da separação dos filhos devia ter sido tão intensa, aflitiva por deixá-los no mundo tão grande, o sentimento de culpa por não conseguir superar a morte e deixá-los desprotegidos.
Penso que o passado espiritual interfere diretamente sobre nossa existência atual.
Ela se recordava de que Charlotte gostava de ler e escrever pequenos contos infantis.
A jovem escritora, por sua vez sem muita aprendizagem, escrevia desde pequena e demonstrava com livros, habilidade que constituía herança da existência anterior.
Tinha necessidade de encontrar sua família da vida passada.
Aquelas crianças tinham sido privadas ainda na infância daquilo que seus filhos atuais estavam desfrutando agora, por isso, sentia que tinha que fazer algo a respeito.
A intensificação das lembranças ocorreu na mesma faixa etária, 32 anos quando Charlotte faleceu.
Com o material recolhido das regressões e das lembranças espontâneas, deu início a uma grande busca, os filhos de sua vida anterior.
O quebra-cabeça começava a mostrar contornos mais nítidos.
Escreveu várias cartas para os moradores locais, indagando sobre uma mulher chamada Charlotte, que teria vivido num chalé na década de 30, num determinado lugar do vilarejo.
Com o passar do tempo, apenas uma carta foi respondida e decisiva.
A mulher foi identificada como Charlotte e os filhos tinham sido enviados para orfanatos diferentes.
A sua busca mostrava algum resultado.
Conseguiu o nome e data de nascimento dos quatro filhos: George, Oliver, Elizabeth e Bridget.
Certo dia recebeu um telefonema inesperado, de um de seus filhos da sua existência anterior, George.
O encontro com ele foi de muita emoção. Ela com apenas 32 anos seria uma revelação um tanto quanto alucinatória para qualquer pessoa.
Apesar de certa confusão no início, este forneceu o endereço e número do fone de Oliver, mas o paradeiro das meninas naquela ocasião era desconhecido, pois foram para outro orfanato diferente dos irmãos.
George então com 71 anos, demonstrou grande reserva e ceticismo diante desses fatos.
Ela revelou coisas que somente ele, seus irmãos e a mãe sabiam, como que levava as crianças para passear num pequeno lago, contava histórias infantis, e que George, uma ocasião trouxera para casa uma pequena cabra, e ainda que uma das meninas havia se ferido na perna subindo a colina.
Ele ficou atônito com tudo que ela contava em detalhes. Não teve dúvidas. "É minha mãe que voltou!"
As irmãs foram localizadas e já com idade acima de 60 anos.
O contato presencial com George foi na pequena igreja local. As pessoas mais chegadas e até o pároco, ficaram conhecendo a história e compareceram a esse encontro. Num longo abraço caíram num choro emocionado. Após algumas horas chegaram Oliver e as irmãs, e as emoções continuaram.
Conseguiu reunir em torno de si, os filhos de outra vida, reatando laços que nem o tempo nem a morte, foram capazes de extinguir.
É uma história de busca e amor de uma mãe pelos seus filhos!
ELA FAZ PARTE DE UMA SOCIEDADE SECRETA - Henrique Schnaider
ELA
FAZ PARTE DE UMA SOCIEDADE SECRETA
Henrique Schnaider
Melissa faz parte de uma sociedade secreta, mas
simplesmente ninguém sabe nada a respeito. Ela leva uma vida aparentemente
normal. Trabalha como Gerente Administrativa numa Empresa de Importação e
Exportação.
Ela é casada com Gilberto e tem três filhos. Eles
formam uma família feliz. O marido trabalha como Gerente de um grande Banco na
Central Administrativa de toda esta rede bancária internacional.
Os três filhos todos em idade escolar Luiz com sete
anos, Roberto com 10 anos e Pedro com 14 anos. Melissa e Gilberto são pais
excelentes. São católicos praticantes. Vão todos os domingos à missa e procuram
praticar o bem de acordo com os mandamentos da sua fé.
Todo dia cinco de cada mês, Melissa chega do
trabalho e depois de jantar com o marido e os filhos, vai ao seu quarto e veste
com uma roupa muito fina, se pinta e chega a surpreender o marido com aparência
bonita que fica. Ela alega que todo este dia do mês tem um encontro com as ex-colegas
de Ginásio. Gilberto nunca perguntou detalhes destes encontros.
Melissa sai sempre as nove horas da noite com seu
carro e se dirige para um local desconhecido. Retornando sempre as onze e meia
para casa ainda encontrando Gilberto acordado assistindo futebol. Melissa sobe
para o luxuoso quarto do casal. Em seguida o marido sobe também e o casal fica
por um bom tempo conversando. Parece ser uma conversa que diz respeito apenas a
vida familiar do casal.
O tempo foi passando e alguns anos depois, Gilberto
muda de atitude e começa a ficar cismado com as saídas da esposa todo dia cinco.
Começa a ficar incomodado com tanto segredo. Ele nunca perguntou nada a ela
sobre estas saídas, mas esperava que Melissa com o passar do tempo comentasse
mais a respeito dos encontros com as ex-colegas de Ginásio.
As desconfianças de Gilberto começam a prejudicar a
vida do casal já que ela não comentava nada a respeito. Ele começou a
questioná-la a respeito e queria maiores explicações a respeito. Onde era o
local do encontro e quem eram as colegas que estavam presentes aos tais
encontros. A situação foi se tornando num clima pesado e Melissa estava firme
no silêncio sobre os encontros, deixando Gilberto cada vez mais irado e
desconfiado.
Melissa resistia bravamente às pressões do marido,
afinal era por uma boa causa. Gilberto acreditava que estava sendo traído há
muitos anos, e não se conformava, afinal sempre foi um bom marido, fiel,
amoroso, uma pessoa que gostava da vida familiar vivendo para a mulher e os
filhos.
Um dia cinco de um determinado mês, o marido não
aguentou mais aquela situação e assim que Melissa saiu com o carro, Gilberto
pegou a Mercedes e passou a seguir Melissa que dirigiu o carro para um bairro
distante e o marido seguindo atrás sem deixar que ela percebesse que estava
sendo seguida.
Ela para numa casa enorme toda iluminada onde havia
várias pessoas. Gilberto parou o carro a uma certa distância e caminhou,
chegando próximo da casa sem deixar que percebessem sua presença.
Estava acontecendo uma espécie de ritual do qual
Melissa passou a fazer parte também. Passava a sensação de que as pessoas
entravam numa espécie de transe e aparentemente estavam comunicando-se com
espíritos ou seres que não eram deste planeta.
Gilberto voltou para casa sem deixar que Melissa
soubesse que ele presenciou tudo o que aconteceu. A esposa chegou e em seguida
e antes que ela subisse para o quarto, Gilberto a chamou e confessou que a
seguiu e testemunhou todo aquele ritual que ela participou.
Melissa constrangida acabou por contar todo aquele
segredo guardado de tantos anos. Este ritual já vinha desde a época do seu
falecido pai. Gilberto pensou:
“Ela faz
parte de uma sociedade secreta...”. Melissa explicou que eles se comunicavam
com seres de outros planetas que aqui vinham e se comunicavam com os membros da
Sociedade Secreta com o intuito de tentar ajudar resolver os graves problemas
que seres humanos enfrentavam aqui na terra.
Melissa explicou que ela tinha que manter segredo,
pois só participavam desta sociedade, pessoas escolhidas e ela não podia
revelar o segredo para ninguém.
Gilberto deu um longo suspiro de alívio. Os dois
trocaram um longo olhar amoroso e finalmente se beijaram apaixonadamente,
encerrando todo aquele clima ruim que existia entre os dois.
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