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quarta-feira, 24 de abril de 2024

PAIS ADOTIVOS LEGAIS! - Dinah Ribeiro de Amorim

 



PAIS ADOTIVOS LEGAIS!

Dinah Ribeiro de Amorim

 

Bento e Rogério, amigos inseparáveis, levam a filha adotada à escola. Aos seis anos, já vai frequentar o primeiro ano, menina precoce e muito inteligente, quase alfabetizada.

Orgulhosos e preocupados, percebe-se o carinho que sentem pela menina Luiza, que caminha entre os dois, ansiosa para conhecer a nova professora. Não os chama de pais, mas de tios, embora more com eles.

Os amigos a adotaram uns cinco anos antes, após salvá-la de terrível acidente em estrada, um capotamento de carro, que se incendiou rápido.

Conseguiram tirá-la, ainda bebê, presa na cadeirinha do banco de trás, aos berros. Os pais, inconscientes, morreram na explosão.  Mal deu tempo de eles correrem e se salvarem.

Essa tragédia deixou-os em choque por muitos meses, não sabendo direito o que fazer com a criança pequena e com dó de entregá-la a estranhos. Segundo a polícia, só havia uma avó materna ainda viva que, com o sofrimento dessa perda, ficou sem condições de educar a neta, interna em casa de repouso.

Inexperientes, os dois amigos resolvem recorrer ao Juizado de Menores, explicar a situação e a vontade de adotá-la.

Assim a pequena Luiza cresceu, amada e criada, com dois papais ou titios.

Logo no primeiro dia de aula, as crianças notam que vem à escola com os dois amigos e, sem a mãe, como todas elas. Estranham e começam a observá-la, curiosos.

Luiza já começa a se destacar dos outros alunos. Desperta a curiosidade dos coleguinhas que perguntam, várias vezes, se não tem mãe ou qual deles é seu pai?

A menina, desembaraçada, responde que foi criada por eles, mas, realmente, não conheceu os pais, chama-os de tios. Descobre nela atenção sobre eles, como veio ao mundo e acabou sendo criada por Bento e Rogério. Demonstra não saber nada sobre o acidente.

Os dias passam alegres na escola, com Luiza, que é a mais inteligente e capaz. Torna-se líder da criançada nas atividades escolares e brincadeiras.

Às vezes, volta para casa, meio quieta, o que não é normal, quando avista os coleguinhas abraçados por suas mães.

Os dois amigos, preocupados, sentem que está na hora de contar-lhe a verdade, como veio viver com eles. Mas compreendem que terá um grande choque. Não está preparada para isso. Sentem a sua necessidade de saber sobre os pais, principalmente da mãe, quando toda criança depende da criação e do amor materno.

A menina Luiza, somente com eles, não demonstrou essa falta de carinho, mas, no meio das outras crianças, seus primeiros contatos sociais, começa a manifestar essa ausência carinhosa comum aos coleguinhas.

O que fazer? Foram criados longe dos pais, enfrentaram seus problemas sozinhos, venceram razoavelmente na vida, a ponto de se compadecerem dos problemas alheios, como aconteceu no caso de Luiza. Mas, falar sobre a ausência dos pais dela, da falta que faz uma mãe, não sabem como revelar isso a uma menina de seis anos.

Por mais que tentem agradá-la, considerá-la como filha, não conseguem substituir o amor do pai e da mãe verdadeira.

Após conversarem e meditarem sobre o assunto, resolvem pedir o auxílio da irmã de Bento, casada, com três filhos, para orientá-los como agir como verdadeiros pais e explicar à menina o porquê está com eles.

Carolina, a irmã de Bento, compreende logo a situação e já previa que teriam problemas nesse sentido. Percebia, achando graça, como agiam com Luiza, tratavam-na como se fosse um homenzinho, fazendo-a participar da vida deles. Vestiam-na com roupas esportivas, levavam-na a jogos ou a brincadeiras de meninos, não era tratada como uma menina delicada e sim como eles gostariam de ser tratados na infância. Isso chamou a atenção dos dois amigos, que creram nas verdades que a irmã de Bento falava. Precisavam mudar de atitude em relação à Luiza, se quisessem que fosse feliz como menina e, mais tarde, como mulher.

Queriam o bem dela e pretendiam mudar o comportamento. Contavam com Carolina, para isso.

Incentivam Luiza a passar uns dias de convivência com a tia Carolina.

— Por que isso? Pergunta a menina.

— Gosto de viver com vocês. Acho que vou acabar brigando com os primos. E é mais longe da escola.

Bento, entristecido, responde que é só por uns tempos, para a tia ensiná-la melhor como se vestir, brincar com sua filha, ter mais amiguinhas.

Luiza, conformada, quando fala em brincadeiras e ter mais amigos, concorda. Gosta de se socializar.

Realmente, na casa da tia, a menina começa a se divertir e gostar. Brigam um pouco também, comum na criançada, mas sente-se bem e é tratada como uma prima querida ou filha pela tia, que lhe oferece carinhos iguais aos filhos. Sentia falta de uma mãe!

O tempo passa e Luiza sente, às vezes, saudades de Bento e Rogério, o mesmo acontece também com eles. Parece que perderam uma filha, de verdade.

Carolina começa a levá-la a escola e faz amizade com outras mulheres, mãe dos coleguinhas.

Logo Luiza começa a receber muitos convites para festinhas e brincadeiras. Vem a preocupação da tia em ensiná-la a se vestir, comprar vestidos e sapatos de moda, criar na menina um pouco da vaidade e dos costumes sociais, o que não sabia com os tios.

O carinho de Carolina começa a transparecer na alegria de Luiza.

Começa a amar a tia como mãe de verdade.

Numa noite, acorda assustada, tem um sonho estranho e chama a tia, que, preocupada, corre a atendê-la. Encontra-a chorando.

— O que aconteceu, Luiza? Está sentindo alguma dor?

— Não, responde à menina, sonhei com uma mulher bonita, meio estranha, longe, parecia me chamar, mas não consegui ouvir. Senti grande tristeza ao vê-la.

— São sonhos Luiza, vai ver comeu alguma coisa que fez mal, ontem, responde Carolina.

— Não sei, tia, parece que ela me conhece! Só não sei de onde! Responde Luiza.

Carolina, pensativa, acha melhor conversar com Bento. Será que é a primeira vez que acontece isso? Pensa.

Na noite seguinte, Luiza sonha novamente com a mesma mulher bonita, chamando-a e, assustada, vai dormir com a tia.

Vem à cabeça da menina, curiosidades a respeito de sua mãe! Começa a interrogar a tia quem foi sua mãe, de verdade.

Diante disso, Bento e Rogério são chamados e contam a verdade para a menina. Os pais morreram num acidente de carro e, só ela conseguiram salvar. Passavam por uma estrada e viram quando o carro capotou. Como não tinha mais ninguém que a cuidasse, resolveram adotá-la como filha, encantados por ela e amando-a muito.

Luiza permanece em silêncio, um pouco chocada; fica quieta por vários dias, sem grandes manifestações. Até a escola, que sempre gostou, não mudou a tristeza e quietude. Parecia outra menina.

Os sonhos pararam e, com o tempo, Luiza manifestou grande saudade dos tios. Pediu para voltar à casa deles. Já sabia muitas coisas sobre meninas e, principalmente, a quem deveria amar e agradecer.

Despede-se da tia Carolina, uma tia – mãe mesmo e, volta, aos dois papais ou titios que a vida lhe deu.

Amadurece, consciente dos problemas que teve. Nunca mais aconteceram sonhos estranhos.

 


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