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quinta-feira, 28 de março de 2024

UM POUCO DE HISTÓRIA! - Dinah Ribeiro de Amorim

 



UM POUCO DE HISTÓRIA!

Dinah Ribeiro de Amorim

 

Senhor Hiroto Kurasawa, imigrante japonês radicado há anos no Brasil, medita e lembra os fatos da vida que conheceu. Recebeu de sua neta, Paula Yumi, um convite para acompanhá-la à cidade de Kyoto, no Japão. Ela estuda cinema e é louca para conhecer a famosa indústria cinematográfica e televisiva japonesa, sediada em Kyoto, com muitos jidaigeki, filmes de ação samurai.

Hiroto sente vontade de voltar ao Japão, todo modificado, restaurado depois da segunda guerra, principalmente Kyoto, que conserva até hoje habitações antigas, não atingidas pelas guerras sofridas, com alguns detalhes ainda medievais. Na cultura, certas danças e músicas como Takigi-noh e Gagaku ainda são tocadas e muitos parques e templos budistas, lembram a sua infância.

Sentado na sua poltrona predileta, não consegue deixar de pensar no passado, quando foi uma das crianças foragidas de Hiroshima com o ataque da bomba nuclear lançada pelos Estados Unidos, em 6 de agosto de 1945, matando cerca de 250.000 pessoas, sendo as crianças vivas levadas para recuperação em Kyoto, que era ainda a capital do Japão.

O alvo seria Kyoto, que foi salva da bomba atômica pela intervenção do Secretário de Guerra americano Henry L. Stimson, que queria poupá-la por ser grande centro cultural, conhecido por ele, anteriormente, durante viagens diplomáticas e lua de mel.

Escolheram então Hiroshyma por ser sede do governo militar japonês. Esse incidente trágico colocou um ponto final na guerra do Pacífico, e transformou a cidade de Hiroshyma hoje, como a escolhida para ser o centro da paz mundial. Com o Tratado de São Francisco, em 1951, o controle da cidade foi devolvido ao Japão.

Em menino, Hiroto foi criado por uma família jovem, que resolveu, juntamente com outras crianças, emigrar ao Brasil, em busca de melhores condições de vida. Isso em 1958, quando já entrava na adolescência.

De espírito rebelde e revoltado, passa por terríveis situações, desde a dificuldade da língua na escola, ridicularizado pelos colegas, até os costumes alimentares, econômicos, etc.

Inicialmente, o padrasto se estabelece num bairro popular e pobre, em São Paulo, na tentativa de montar uma tinturaria. Sabia mexer bem com algodão e outros tipos de pano.

A família aumenta, nascem novas crianças que dificultam muito o sustento e a educação.

O pai falece cedo, por excesso de fumo e bebidas, e o menino, aprende a viver sozinho, deixando a mãe criar e educar os outros irmãos. Foge de casa, vai ao interior, à busca de qualquer trabalho que o sustente. Na plantação, descobre, que para juntar dinheiro, a maioria dos imigrantes o escondia em buracos, na terra.

Aprende a lidar com tudo, desde a fazer barbas e bigodes até a viver algum tempo na praia, vendendo peixes e colares de conchas. Percorre lugares estranhos, queimado pelo sol, cabelos compridos, era aceito entre pescadores, tribos indígenas, grupos de hippies, enfim, como jovem, passa por várias experiências.

Percebe que os japoneses que queriam viver bem, no Brasil, adotavam a religião cristã, e colocavam à frente dos nomes japoneses, um português, para ser melhor aceito como cidadãos brasileiros. Isso causava-lhe revolta.

Mais velho e amadurecido, faz amizades com um grupo de japoneses que moravam no interior de São Paulo, Araras, sentindo-se mais comunicativo e adaptado com os da mesma origem e raça. Uma comunidade evangélica.

Com o tempo, converte-se ao Cristianismo e ameniza suas revoltas íntimas.

Como característica de todo japonês, torna-se sistemático, trabalhador e produtivo, estabelecendo-se como plantador de laranjas, em fazendas. Mais tarde, conhecido no ramo, aumenta o trabalho e a produção, e compra novas terras.

Hiroto se transforma em fazendeiro de renome, resolve formar família e ajudar os irmãos que havia deixado. Contribui também à riqueza do estado, sendo, atualmente, São Paulo, um dos maiores exportadores de laranjas do país.

Casa-se com Alice Sayoko, tem quatro filhos, dois homens, Milton Mikio e Pedro Takashi e duas mulheres, Ana Yoko e Olívia Tieko, todos direcionados à agricultura e aos estudos, com diplomas universitários.

Alguns costumes conservam até hoje, na bela e confortável casa de fazenda, em alimentação e cultura.  Gosta dos pratos e sopas com tofu, cozinha peixes temperados com shoyo, muitos vegetais e frutas. Não se acostuma com os talheres brasileiros, usando até hoje os famosos palitos japoneses. Um pouco de saquê, ocasionalmente, bebida semelhante à nossa pinga, ajuda a aumentar o apetite. Muito saboroso é o seu yakissoba, de carne, vegetal e frango.

As músicas e os filmes japoneses, assiste na moderna televisão, dando preferência e descartando os ocidentais. A saudade do Japão que ficou, a modernização e a paz atual, o atraem. A vontade de voltar, às vezes, o ataca, não para morar, adotou o Brasil como sua pátria, mas para reconhecer as boas mudanças.

Gosta de lembrar da batchan, a pseudo avó que ficou no Japão quando vieram, fortemente budista, visitou o Brasil somente para assistir ao casamento dele, já convertido ao cristianismo. Teve que fazer dois casamentos: um em casa, com a estátua de Buda e vestimentas budistas, e, assim que ela se foi, o casamento na igreja cristã, a qual seguiam. Foi muita correria e atrapalhação, mas deram risadas depois.

Com muitos trabalhadores a seu serviço, sendo, atualmente, só o administrador dos negócios, dedica-se aos netos, com paixão, seus herdeiros na descendência. Não consegue negar a eles nenhum pedido ou vontade.

— E aí, vovô, vamos ao Japão? Não quero perder essa oportunidade, pergunta a neta Yumi.

— Acho que sim, Paula, vou gostar muito de rever a minha Terra e a minha gente.

E teve Hiroto a mais bela de suas aventuras, no final da vida!

 

 

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