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quinta-feira, 22 de abril de 2021

A Bruxa - Adelaide Dittmers

 



A  Bruxa

Adelaide Dittmers

 

O sol derramava raios pelos campos e por um pequeno bosque, que o circundava.  Mais adiante, um vilarejo com estreitas ruelas de terra e casas de pedra equilibradas na encosta de uma montanha coberta por pinheirais, cujo pico coberto de neve, brilhava em contraste com um céu profundamente azul e bordado por pequenas nuvens, que formavam várias figuras para quem as quisessem imaginar.

À beira do bosque, uma jovem dobrava-se para colher ervas e plantas silvestres.  Usava vestes simples e a saia comprida atrapalhava seus movimentos, enroscando-se nos pequenos caules da vegetação.  Seus longos cabelos negros eram parcialmente escondidos por uma pequena touca.  Pele clara com muito traços delicados, assim como os olhos de um verde esmeralda completavam sua beleza. 

Terminada a colheita, colocou tudo em uma cesta, que estava ao seu lado, ergueu-se e com passos lentos caminhou em direção da aldeia.

Com imensa satisfação, aspirava o ar fresco da manhã.  Adorava aqueles vastos campos.  Enquanto caminhava, começou a recordar, com melancolia, as inúmeras vezes, que pequena, de mãos dadas com a mãe, percorreu aquele caminho para colher ervas para fazer remédios, unguentos que curavam doenças e mitigavam as dores de muitos.  Tinha aprendido com ela a manipular plantas, sementes e raízes, que eram transformados em poções medicinais.

Com a morte dos pais em um acidente na montanha, ficou sozinha e, além de trabalhar no campo, ganhava o pão de cada dia, como curandeira da aldeia.

Era malvista por muitos daqueles ignorantes aldeões, que não admitiam uma mulher viver só, sem marido e filhos.  Muitas vezes era molestada pelos jovens e até por homens mais velhos, mas sempre conseguia escapar de suas investidas.   Aprendeu a se defender e procurava levar uma vida discreta e apagada.

Depois de uma longa caminhada, chegou ao vilarejo e subiu a ladeira, que a levou a uma pequena casa, onde uma primavera de flores vermelhas coloria o cinza escuro das pedras das paredes. Entrou, colocou a cesta em cima de uma tosca mesa de madeira e foi acender o fogo em um pedaço de rocha plana, onde havia uma estrutura de ferro, em que estava pendurada uma panela também de ferro, que não só servia para cozinhar os alimentos como aquecia o ambiente.  A parede, em que se encostava esse fogão primitivo, era escurecida pela ação do fogo.  A moça encheu a panela com a água retirada de uma tina e começou a preparar suas poções.

Ultimamente estava preocupada com as reações de algumas pessoas do lugar.  Era olhada de esguelha e muitos a chamavam de bruxa por ser uma curandeira.  Principalmente o pároco do vilarejo a olhava com muita desconfiança e se afastava quando passava por ela.

O século XVI começou com grandes perseguições da igreja católica a todos, que professavam outras religiões ou realizavam cultos considerados pagãos.  Judeus eram perseguidos e qualquer manifestação contrária aos severos ditames do papa e seu séquito era perfidamente julgada.  Fogueiras eram acesas por toda Europa, queimando supostos infratores das leis cristãs, vigentes na época.  Os ensinamentos sábios e amorosos do verdadeiro Cristo foram esquecidos e substituídos pela ambição e desejo de poder da igreja.

Por tudo isso, o medo e a preocupação da pobre moça não eram infundados, mas ela confiava em sua missão, transmitida pela mãe, de ajudar a quem lhe pedisse socorro. E corajosamente enfrentava a desconfiança de muitos da aldeia, mesmo quando alguns a aconselhavam a agir de maneira mais oculta. Ela, no entanto, não conseguia entender porque tinha que esconder o que fazia.

Naquela manhã, enquanto preparava suas poções, bateram à sua porta.  Era Jonas, seu vizinho e amigo, que com uma voz exasperada gritou:

- Ana, você precisa fugir daqui agora. Há gente se encaminhando para cá com o pároco e outros da igreja.  Ouvi que querem levá-la para a masmorra.

A moça estremeceu.

- Não faço mal a ninguém.  Por que não entendem que minhas ervas são para curar? Sou cristã, só não tenho frequentado as missas, porque sei que o padre não gosta de mim.

- A igreja está perseguindo muitas pessoas, que nada fizeram.  Por favor, venha comigo.  Vou escondê-la na cabana de caça, que tenho na montanha.

Ana sabia que vizinhos não gostavam dela por ser só e independente. Invejavam-na por conseguir sobreviver com seu trabalho no campo e as exíguas moedas, que cobrava pelos seus remédios.

Ficou indecisa por um momento, mas o terror de ser presa a impulsionou.  Deu a mão a Jonas e saíram da casa correndo. Rapidamente percorreram os caminhos que os levariam à montanha.

Poucos minutos depois, a turba chegou à casa de Ana, invadindo-a com turbulência.  Derrubou o caldeirão de ferro e destruiu tudo o que encontrou pela frente. Os homens estavam cegos pelo ódio de não a terem encontrado ali.  Iriam procurá-la por todo o canto.  Ela não ia escapar. Era uma bruxa perigosa e em nome de Deus, precisavam castigá-la.

Enquanto isso, Jonas e Ana, subiam a montanha o mais depressa possível, enroscando-se em galhos de vegetação, que afastavam com as mãos. Finalmente chegaram a uma pequena cabana, feita de madeira.  Jonas empurrou a porta, que se abriu com um guincho e abriu também a única e pequena janela, que iluminava um pouco aquele ambiente quase vazio.  Havia um pequeno e rústico colchão de feno ao fundo, uma espécie de lareira para cozinhar e o chão era de terra batida.

Ana estremeceu, teria que ficar ali sozinha, cercada pela floresta de pinheiros, onde habitavam lobos.

Jonas disse-lhe que tinha que ir para não levantar suspeitas e que mais tarde voltaria para lhe trazer algo para comer.  Desceu, quase correndo, as escarpas da montanha e chegou à sua rua, onde viu com angústia, o que tinham feito com a casa da amiga.  A bela primavera jazia espicaçada no chão.

Sua mulher o esperava à porta de sua morada.  Ele foi ao seu encontro.  Eram muito gratos àquela jovem, que muitas vezes os tinha socorrido com suas poções.  Entraram em casa e a mulher relatou o que tinha visto e ouviu.  Iriam vasculhar toda a região em busca da pobre Ana. 

Ao anoitecer, Jonas subiu a montanha, levando uma trouxa com algum alimento para a amiga.  Pendurada no ombro, carregava uma arma de caça para disfarçar seu objetivo e também se defender de algum lobo, que cruzasse seu caminho.

Ao chegar, encontrou Ana sentada no chão, fora do abrigo, com o olhar perdido pela floresta.  As primeiras estrelas brilhavam no céu.  A jovem levantou-se rapidamente ao sentir que alguém se aproximava.

- Sou eu, Ana.  Vim lhe trazer comida, como prometi.

Chegando perto dela, estendeu-lhe a trouxa e contou-lhe o que acontecera.  A pobre moça ficou desolada.  O que seria de sua vida?

Ela agradeceu e se despediram com um aperto de mão.  Jonas voltou para casa sobressaltado por pensamentos sombrios.

No dia seguinte, as buscas para encontrar a bruxa do imaginário daqueles homens rudes de ignorantes continuaram.  Vasculharam palmo a palmo os campos e o bosque ao redor do vilarejo e a cada fracasso, o ódio daqueles fanáticos crescia como erva daninha, entorpecendo suas mentes fantasiosas.

O dia sucumbiu a uma noite estrelada e o luar banhou de prata aquele belo cenário.  Todos voltaram para casa, não sem antes combinar que no próximo dia iriam varrer a montanha de alto a baixo.

Mal o dia tinha acordado e se espreguiçado pela paisagem do lugar, já a turba subia a montanha em sua procura desvairada.

Jonas e a mulher estavam apavorados.  Iam encontrar a jovem e estavam de mãos atadas, nada podendo fazer.

Ana levantou-se ao amanhecer e abriu a portinhola de seu frágil abrigo.  A floresta estava tingida de tons laranja da aurora, que se debruçava sobre o pinheiral, iluminando cada canto, tornando aquele lugar um pequeno paraíso.  Um pássaro cantou no alto de um pinheiro, anunciando o dia que nascia.

A moça olhou para a paisagem.  Amava e respeitava a natureza.  Encheu seus olhos e sua alma com a beleza do lugar.  Estava muito cansada. Quase não tinha dormido.  Além do medo do que iria lhe acontecer, o uivo dos lobos a deixaram em permanente estado de alerta.

De repente, ouviu um tropel de passos e um alarido de vozes subindo a montanha.  Seu coração disparou e a jovem entrou na cabana, fechou a porta e se encolheu em um canto do pequeno e único cômodo do lugar que a escondia.

As vozes foram se aproximando e seu pavor foi aumentando cada vez mais.

Um homem gritou;

-Olhem, vamos procurar naquela cabana!

E chegando ao abrigo, empurraram a porta com violência e logo enxergaram um pequeno vulto encostado à parede.  Ana cobriu o rosto com as mãos, como se esse gesto pudesse a proteger. Eles a puxaram com força e a levantaram.  Ela implorou:

- Por favor, não me matem. Não sou bruxa, só procuro curar as pessoas com minhas plantas.

- É sim! Gritou o homem que a agarrara. Você tem um pacto com o diabo para fazer feitiçarias.  E a empurrou para fora.  Ela levantou os olhos para ele e na claridade do dia, reconheceu-o.  Muitas vezes aquele homem tinha se aproximado dela com as mais duvidosas intenções, obrigando-a a fugir dele, como as presas fogem de seus predadores.

O padre apareceu à frente do grupo, aproximou-se e a amarrou com uma corda e, puxada como um animal, foi  levada para a aldeia, e enquanto percorriam as vielas, algumas pessoas apedrejavam-na sem piedade.  Alguns, no entanto, choravam ao vê-la passar.  Muitas vezes ela diminuiu ou curou seus males com suas poções, que achavam ser mágicas.

Ao chegar à igreja, foi jogada em um cubículo escuro para esperar seu julgamento. Ferida e assustada, não conseguia entender tudo aquilo,

Religiosos das redondezas vieram e se reuniram para julgá-la.  A inquisição corria solta naquela época tenebrosa e a maldade humana se manifestava com todo o seu furor nas pobres criaturas, que contrariavam crenças católicas.

Ao fim de alguns dias e depois de várias reuniões do clero, foi considerada culpada e transgressora das leis de Deus. Uma herege que praticava bruxaria.

Com varas e madeiras foi erguida uma estrutura na praça à frente da igreja,  para que nela fosse aceso o fogo da expiação e parte dos habitantes do lugar se reuniu para apreciar o espetáculo.

A pobre curandeira foi trazida e amarrada àquela estrutura.  Não chorava.  Seus olhos estavam vazios, perdidos em algum lugar distante.

Jonas aproximou-se dela para lhe demonstrar sua tristeza e lhe dizer umas palavras de consolo, mas foi afastado com brutalidade por um dos algozes da indefesa vítima.

O fogo foi aceso e começou a crepitar.  As chamas foram devorando a pobre criatura, que soltava gritos de dor.

Muitos gritavam, enfurecidos, palavras contra a bruxa.  Outros procuravam esconder lágrimas, que teimavam em inundar seus rostos.

Jonas saiu dali arrasado.  Não conseguira salvá-la.  Que justiça de Deus era essa, que matava tão cruelmente pessoas inocentes, perguntava-se enquanto descia a ladeira.  E não encontrou uma resposta.

 

CONTO MEMORIALISTA SOBRE BRUXAS - Henrique Schnaider

 

 


CONTO MEMORIALISTA SOBRE BRUXAS

Henrique Schnaider


Na minha infância, era um menino peralta, juntamente com o meu amigo Carlos Azolini, pois no bairro onde nasci, as pessoas eram ou de descendência italiana como o Carlinhos, ou judeu como eu.

Nós dois aprontávamos muito. Sempre dando dor de cabeça para nossos pais, mas com a ingenuidade de crianças, acreditávamos em histórias de fantasmas, da mula sem cabeça e do saci Pererê de uma perna só fumando seu cachimbinho e que chegava num rodamoinho de vento.

Bastava a empregada da minha mãe sentar-se com a gente e lá vinham as histórias assombradas que nunca vou saber se ela mesma acreditava.

Certo dia a Maria veio cheia de teretetê e começou a contar para nós sobre a vizinha, que morava num barraco, na entrada da oficina mecânica do senhor Felício. Deixou-nos cheios de pavor, contando que a mulher que morava ali, na verdade era uma bruxa.

Disse a Maria, que ela tinha um tacho enorme de água fervente que estava sempre no fogo. Segundo ela, já havia várias crianças que sumiram da região e que os boatos que rodavam soltos no bairro, é que elas haviam sido raptadas pela bruxa, assadas e devoradas por ela.

Criança é criança, pois a gente morria de medo, mas o espírito de curiosidade e peraltice nos levava a fazer molecagens. Um atiçando o outro, lá íamos eu e o Carlinhos bater na porta do barraco e pernas para que te quero. Insatisfeitos começamos a atirar pedras na porta da bruxa.

A tal da bruxa se encheu e veio reclamar justamente com a Maria. Falou cobras e lagartos para ela e ameaçou dar queixa na delegacia. Enquanto isso eu e o meu amigo dentro de casa tremendo de medo.

Depois que a mulher foi embora, a danada da Maria veio procurar a gente e pôs fogo no caldeirão, disse para a gente que a bruxa estava ameaçando que ia nos pegar num momento de distração e levar-nos para dentro do barraco e assar a gente no tacho fervente.

É evidente que a Maria estava inventando toda aquela história, pois queria na verdade se divertir às nossas custas.

Que saudades daquele tempo de inocência e peraltices, e da Maria que enchia nossa vida de histórias assombrosas. Mas no fundo eu e o Carlinhos adorávamos a malandra da empregada. Como diz o velho ditado espanhol “Yo no creo en las brujas, pero que las hay, hay” .

Quanto a nossa bruxa vizinha, nunca se provou nada contra ela e realmente era apenas pura fama e maledicência.

A BRUXA QUE MORAVA AO LADO - Claudionor Dias da Costa

 



A BRUXA QUE MORAVA AO LADO

Claudionor Dias da Costa   

 

Minha vizinha, Dona Anastácia, senhora de mais de setenta anos tinha aspecto estranho e com suas atitudes me deixava intrigado e com medo.

Usava um lenço na cabeça, com os cabelos que saiam para fora e ficavam desgrenhados à mostra, vestido longo amarrotado e  velhas sandálias e empoeiradas pelas andanças em seu quintal de terra batida.

Por vezes, ela saia para o fundo daquele quintal entrando num emaranhado de plantas malcuidadas próximo à um muro baixo, que funcionava como uma bancada para um grande caldeirão de ferro velho e enferrujado, enfiava algumas coisas dentro. Num cantarolar agudo e inaudível, acendia, por baixo daquela bancada, o fogo com lenha e ficava com um pedaço de pau mexendo e mexendo...

Uma fumaça intensa saia dali com cheiro estranho.

Eu ficava na espreita olhando pela janela, com receio que me visse. Para os meus oito anos tudo aquilo era emocionante, mas, amedrontador.

A figura dela, o que fazia e todo aquele cenário me conduziram a uma certeza só: ela era uma bruxa.

Esta imagem era reforçada pelos livros que havia lido e que lembravam muito a “Bruxa Anastácia” que eu conhecia tão bem e vivia tão perto de mim.

Na época, alguns fatos começaram a acontecer que só aumentaram minha preocupação com as atitudes daquela bruxa aterrorizante: nosso cachorrinho Pocó morreu atropelado; num dia uma tempestade com raios e trovões derrubou o toldo de lona de nosso quintal; o carro do papai quebrou: eu escorreguei na escada e quebrei a perna.

Tudo muito esquisito e sem explicação, que na minha compreensão infantil só poderia ter acontecido por maquinações das bruxarias dela.

 Eu contava aos meus amigos e cada um acrescentava um tanto de forma que não havia criança na redondeza que não sabia de coisas terríveis dela.

Como vivia isolada e pouco contato tinha com vizinhos só aumentava o ar de mistério que cercava sua vida.

Segui até os meus onze anos fantasiando o que cercava aquela história e não poucas vezes acordei com pesadelos a respeito.

Numa tarde escura e fria de inverno, vimos uma ambulância chegar e levar à bruxa. O que teria acontecido?

No dia seguinte eu e três amigos que estavam em casa perguntamos a minha mãe sobre o ocorrido e a notícia nos inquietou:

“Dona Anastácia morreu. Teve um AVC”.

Nos entreolhamos e num misto de surpresa apesar da notícia impactante ficamos até aliviados por saber das histórias dela e o que causava em nós.

Minha mãe com olhar profundo e triste começou a contar a vida daquela senhora e de suas dificuldades de ter sido abandonada, por viver sozinha, com poucos amigos e sofrendo numa solidão sem saída.

Eu fixei o olhar nela e com voz alterada e alta questionei:

− Mãe, mas ela era uma bruxa!

− O que é isso, meu filho?

− Sim, eu a via fazendo bruxarias no quintal, dentro do caldeirão no fogo, com muita fumaça e cheiro ruim.

− Não filho. Naquele caldeirão ela só tingia roupas para sobreviver.

Pronto!

Eu e meus amigos ficamos desconcertados e depois daquele dia continuamos a comentar tudo que ocorreu. Nas nossas conclusões confusas de fantasias com o choque da realidade começamos a nos arrepender do que pensamos da Dona Anastácia.

E até hoje, passados mais de quarenta anos, quando vejo uma senhora com lenço na cabeça, passos lentos, olhar perdido, lembro da história da minha vizinha com poderes. Aprendi que envolvido pela minha imaginação infantil fui traído por julgar pelas aparências.

E me vem à mente a máxima que escutei não sei onde: O tempo se encarrega de ser um grande mestre para nós.

Esta lição me permitiu seguir pela vida, conseguindo avaliar que atitudes erradas e más são fraquezas humanas que nos prejudicam por vezes e não originarias de bruxos ou bruxas que não existem. Ou será que existem?

CLÉO, A GUERREIRA - Henrique Schnaider

 

CLÉO, A GUERREIRA

Henrique Schnaider


Cléo era uma menina na época da guerra do Vietnã. Houve uma foto que ficou famosa na imprensa mundial, onde depois de um bombardeio aéreo dos EUA com o terrível gás napalm. Uma menina, Kim Phuc aparece correndo nua com o corpo queimando.

Esta foto começou a persegui-la e depois da guerra, sempre aparecia algum repórter de algum país distante, querendo entrevistar Kim Phuc. Ela sempre repetia a mesma História:

— Eu realmente queria escapar daquela pequena menina. Mas parece que aquela imagem não me deixava ir, disse Kim Phuc.

Passaram-se vários anos e aquela menina se tornou uma mulher muito importante. Casou-se, adotou um novo nome de Cléo. Virou embaixadora da boa vontade das Nações Unidas e de ajuda às vítimas da guerra.

Cléo saiu do Vietnã, pois conseguiu cruzar a fronteira e com ajuda de Ongs humanitárias, foi morar no Canadá. Já que no fim da guerra ela enfrentou muito sofrimento e perseguições do regime comunista. Por trás desta mulher aparentemente frágil, existe uma mulher com alma de leoa.

Cléo começou a atuar de forma silenciosa e em segredo para salvar pessoas perseguidas no Vietnã.  Sempre lutando contra o cruel e sangrento regime comunista. Precisando tomar muito cuidado, já que a ditadura Vietnamita, sempre mandou agentes para tentar assassiná-la, por ser uma inimiga deles.

Cléo dá palestras contando sua história de sofrimento, desde aquela foto famosa em plena guerra. Seu marido Kim Ul além de grande companheiro, a ajuda na missão de auxílio aos refugiados do Vietnã. Cléo está sempre cercada de agentes de segurança para sua proteção.

Mas para conseguir êxito na sua missão e manter-se oculta é muito difícil, pois ela é uma celebridade e reconhecida onde quer que vá e todos se referindo a ela como a menina queimada por napalm.

Ela praticamente não possui vida familiar, já que ela e marido mal conseguem se reunir com os dois filhos.

Ela contratou como babá Jin Su, uma moça Vietnãita que ajudou a fugir dos comunistas. Mas, mal sabe ela que colocou para dentro de sua casa uma cobra naja pronta a injetar seu veneno mortal.

Jin Su foi treinada pelo serviço secreto comunista na arte do envenenamento, e enquanto isso Cléo ingênua, confiando na babá, deixava sempre ela com as crianças. Por sua vez, a agente espera a oportunidade de quando estiver reunida a família, para envenenar a todos.

Num fim de semana Cléo conseguiu um tempo, para reunir a família e Jin Su, finalmente achou que chegara a oportunidade esperada para envenenar a todos.

Jin Su preparou um suco com um veneno mortal, mas antes que alguém bebesse, Cléo recebe uma mensagem no celular de um aliado lá do Vietnã, lhe prevenindo que Jin Su era agente do regime e Cléo grita por puro instinto:

— Não bebam este suco que deve estar envenenado. Kin Su puxa um punhal partindo em direção a Cléo querendo acertar o coração.  O marido Kim Ul se interpõe entre elas e prende o braço da agente tirando-lhe o punhal, e prende os braços por trás dela, e chama os agentes que levaram Kim Su presa.

Cléo vive passando por estes sustos, mas nada e nem ninguém a impedirão de seguir na missão de salvar os perseguidos do Vietnã.

PREMISSAS - DIVERSIFICAÇÃO DE GÊNEROS LITERÁRIOS - Claudionor Dias da Costa

 



PREMISSAS -  DIVERSIFICAÇÃO DE GÊNEROS LITERÁRIOS  

Claudionor Dias da Costa

                        

  PROPOSTA 1 – “A RODA DA VIDA”

 

Tina de seis anos e seu irmão Beto de cinco anos brincam alegremente com os amiguinhos do orfanato onde vivem. Desde bebês vivem aquela realidade sem terem noção exata ainda do porquê estão ali e de quem eram seus pais. Convivem muito mais com disciplina obrigatória do que com amor.

Esquema do Enredo: Ficarão mais tempo no orfanato. Com a idade de oito e seis anos serão adotados por casal de classe média. Terão educação em escola pública, sofrerão “bullying” em várias ocasiões. Seu pai mudará o comportamento ao longo da história. Sua mãe adotiva é carinhosa. Beto fugirá de casa. Conviverá com maus elementos. Ficará viciado em drogas. Depois de muito sofrimento, retornará. Com esforço abandonará o vício. Perdas familiares. Conseguirá superar os problemas e alcançará sucesso.

Gênero: dramático romântico

 

PROPOSTA 2:” A REVOLTA DE GILDA”

 

Naquele escritório de contabilidade o chefe com seu rosto redondo e com ar sempre zangado, cabelos despenteados, bigode espesso e olhos penetrantes realçados num corpanzil avantajado sempre que circulava pelas mesas dos funcionários de forma esbaforida e sem compostura chamava a atenção em voz alta na frente de todos.

Dona Gilda era uma das vítimas favoritas dele. Não media as palavras com ela que se calava resignada.  

Esquema do Enredo: Dona Gilda que definiremos as características pessoais, profissionais e forma de vida. Próxima da aposentadoria. Cuida da mãe idosa. Auxilia os sobrinhos que moram distante. Começará a alimentar ódio pelo chefe. Com outros percalços na vida que colocaremos elabora plano de vingança. Com vários acontecimentos seus planos fracassarão.

O chefe entrará em desgraça após ser despedido. Recorrerá a antigos funcionários que não tiveram também simpatia por ele. Gilda num processo de desgaste que passou num processo de reverso do destino que se afigurava acaba amparando o chefe. Final a decidir.

Gênero: Suspense e drama

 

PROPOSTA 3 - “O BRILHO DO SOL”

 

História de Nair, viúva, morando sozinha acostumada a caminhar, não hesitou e saiu às cinco da manhã para, conforme dizia: “sentir a natureza”.

Esquema do enredo: Descreveremos algumas características dela como sonhadora, romântica, interessada pelos outros e bem solidária ajudando parentes e amigos. Apontaremos costumes e situações que passava.

Mas, alimentava no íntimo uma tristeza que procurava não revelar. Isso, provocava nela ansiedade e se sentia impotente para resolver a situação.

A ajuda chegará de forma inesperada.

Teremos mais personagens e após passar por perigo e perdas, conseguirá identificar um novo amor maduro e a história acabará bem.

 

Gênero: romântico

 

 

PROPOSTA 4 “A BELA ESPIÔ

 

Num clima conturbado da época da guerra fria com implicações na guerra do Vietnam. Contaremos breve resumo da formação e características da vida da Cléo. Como foi contatada para desvendar o mistério que envolve a primeira-dama. Seu envolvimento em descobrir uma trama internacional e o que pretendiam fazer para seu país.

Esquema do enredo: No desenrolar da história teremos um assassinato misterioso envolvendo espiões de outros países. A motivação maior era política e tentativas de dominação.

Cléo passa por perigos e mesmo encaminhando soluções do caso é obrigada a fugir de seu país. O destino é ignorado pelos inimigos e tem fim enigmático.

Gênero: suspense policial

 

 

PROPOSTA 5 -  “O OUTRO LADO”

 

Venâncio nasceu numa família simples e pobre na cidadezinha mineira de Bueno Brandão. Teve uma infância feliz, brincando com vizinhos amparado por pais trabalhadores e na adolescência além dos namoricos se aventurava pelas cachoeiras em passeios com amigos. Vivia despreocupado e tranquilo aproveitando a calma e beleza daquele lugar como se o mundo fosse muito pequeno longe dali.

Esquema do enredo: Quando terminou o grau de Ensino Médio e já germinando nele alguma ambição de fazer algo diferente de seus pais, resolveu ir para São Paulo. A partir daí desenvolveremos o rumo de sua vida com alguns percalços, profissão escolhida, trabalho e situações de conflitos pessoais etc. que culminou com decisão de largar tudo e partir numa viagem pelo mundo.

Nesse novo destino traçaremos sua aproximação com elementos estranhos que o conduzirão a ser envolvido num turbilhão do mundo das drogas. Sua aventura terá desdobramentos que o obrigarão a fugir. Novamente sua vida deverá ser retomada em outro lugar. Isto, pontuado por intrigas, delações, conhecimento de crimes, busca de sentido para a vida, arrependimento e desejos de mudanças.

O final a ser definido entre a doença, morte ou nova vida.

Gênero: Suspense policial e romântico

 

terça-feira, 20 de abril de 2021

Dr. Alex. - Dinah Choichit

 



Dr.  Alex.

Dinah Choichit

 

Nunca tinha conversado com um médico tão esclarecedor. Fiz várias perguntas e ele respondeu todas, fazendo questão que eu saísse do seu consultório me sentindo bem.

A princípio fui conhecê-lo para saber o que ele achava da minha mão direita que não fecha, os dedos não dobram.

Contei a ele que tinha levado um tombo e havia batido a cabeça, quebrado a clavícula do lado esquerdo e que eu achava que a mão nada tinha a ver com o tombo. Ele concordou e disse que isso era da idade. Mandou que eu fizesse uma série de exercícios fisioterapêuticos que melhoraria, talvez até voltasse ao normal.

Disse também que reparou que quando eu entrei estava mancando um pouco e que a perna direita estava um pouco lenta e não levantava o joelho como deveria.

Falei que tinha um pouco de dificuldade para andar, mas não tinha nenhuma dor. Só quando levantava para ficar em pé e andar que eu sentia o peso das pernas. Isso também pode ser tratado com exercícios, ele disse.

Mas, não era o momento porque eu estava sem trabalhar e as despesas continuavam.

Não se preocupe com isso porque faz parte da consulta. Eu darei uma série de exercícios e a senhora volte daqui um mês, com o retorno, e não será cobrado nada.

Estou fazendo todos os exercícios e me sentindo muito bem. Estou um pouco cansada, mas isso faz parte.

A secretária disse que ele pergunta sempre quando é o meu retorno e eu conto os dias que faltam. Se estiver apaixonado como eu, logo sairá um casamento.

quarta-feira, 14 de abril de 2021

DR. ALEX - Alberto Landi

 



DR. ALEX

Alberto Landi

 

Dr. Alex é um dos mais respeitados neurocirurgiões de seu país,  África do Sul.

Cresceu em um lar desfeito em meio à pobreza e ao preconceito, as notas na escola primária eram baixas e de temperamento difícil. Sua mãe teve um papel fundamental na sua vida e, apesar de pouco estudo, ela insistiu para que ele aproveitasse as oportunidades que a vida oferece que ela nunca teve.  Ajudou-o a ser criativo usando a  imaginação, inteligência e crença em si mesmo.

Alex nos estudos era ridicularizado pelos colegas de classe por tirar notas muito baixas. A mãe mesmo sendo uma pessoa simples, percebeu que o filho tinha problemas de visão e quando pedia a ele para ler oralmente algum livro, ele tinha necessidade de aproximar o texto próximo dos olhos.  

Corrigido o problema com o uso de óculos, suas notas começaram a melhorar.

Não foi uma criança prodígio e nem eclético como Alan Turing, o brilhante matemático britânico.

Em sua vida escolar gostava de Biologia e Ciências. Mas com o passar do tempo se interessou pela medicina e acabou se formando médico cirurgião se destacando em seu país.

Uma de suas grandes proezas foi a separação de gêmeos unidos pela parte posterior da cabeça; uma cirurgia complexa e delicada para a época, que exigiu alguns meses de estudo e preparação, sendo bem-sucedido e comentado em revistas no meio médico e científico.

Tinha muita empatia com seus clientes, comunicava-se de forma clara, procurando sempre se atualizar e usando a tecnologia a seu favor para melhor desempenho de suas atividades médicas.

Era uma pessoa boa, puxou a mãe e apresentava uma incrível capacidade para superar desafios e transformar algo ruim em um grande aprendizado, fazendo com que os obstáculos se tornassem uma força impulsionadora.

Aceitava diversos convites para dar palestras a universitários sempre apresentando atualidades cientificas e médicas em suas palestras.

Dr. Alex agora já na meia idade, cabelos grisalhos, sempre bem-humorado, serviu de exemplo a muitos formandos na escola de medicina. Não só pelas qualidades profissionais como também das suas qualidades pessoais

Até os dias de hoje, sempre que pode, ajuda em alguma ONG num lugar esquecido, pobre e triste onde ele é admirado como merece.

terça-feira, 13 de abril de 2021

A PROVA DO CRIME Um dia, num condomínio residencial. - Leon Vagliengo

 



A PROVA DO CRIME

Um dia, num condomínio residencial.

 

        Muita coisa pode acontecer num condomínio, na rotina de um dia qualquer.

Naquela segunda-feira, logo cedo,  Ariovaldo, síndico do Condomínio Edifício Oceano Pacífico, chamou o zelador Gregório ao corredor de entrada do prédio para algumas “observações”, conforme disse.

Aos trinta e dois anos de idade, Gregório, um simpático argentino, era o zelador daquele prédio já havia bem uns cinco anos. Cansado da vida rural que tivera em seu país, viera para o Brasil para viver no litoral do Oceano Atlântico, conseguindo esse emprego em Santos. Os condôminos gostavam muito dele porque era atencioso e bem-humorado, e até muito engraçado com as suas atitudes meio latinas.

Pela maneira como foi chamado pelo síndico, a quem já conhecia muito bem, sabia que viria encrenca. E tinha razão. —Ariovaldo ostentava a pose de austero, era um homem muito caprichoso, do signo de Virgem como a esposa deste narrador e – sei bem com é - deixava Gregório quase maluco por não admitir nada errado, sujo ou fora de lugar. Não deu outra: chegando ao local da ocorrência, Gregório viu que o síndico estava mesmo muito irritado.

Quem fez esta sujeira no corredor? – Perguntou a seco. Descubra o responsável para que eu lhe mande uma carta de advertência acompanhada da multa regulamentar. E procure também descobrir de onde vêm uns estranhos balidos ouvidos pelos condôminos durante toda a noite.

Antes mesmo que Gregório pudesse responder que não tinha ouvido nada e nem tinha visto o malcheiroso material até aquele momento, já estava incumbido de investigar sua origem.

Enquanto ele recebia as ordens do síndico, chegou para o seu trabalho a Jurema, a bela faxineira do primeiro andar, uma mulher batalhadora e muito séria, parecendo não perceber o frisson que provocava com o seu andar naturalmente sensual, interrompendo a conversa com a sua passagem e hipnotizando os olhares apaixonados de Gregório, e muito mais do que cobiçosos do síndico.

Vendo aquele mulherão a caminhar, eles ficaram mudos e paralisados por alguns instantes, até que caíram em si e perceberam o papelão que estavam fazendo. Voltaram logo à conversa para disfarçar, mesmo porque sabiam que Jurema não era sopa. Um dia ela havia defendido ferozmente uma criança injustamente acusada de roubo de uma ferramenta numa loja próxima. A sua ferocidade ficara conhecida por aquele episódio e lhe rendera temeroso respeito por parte das pessoas que a viam todos os dias no condomínio.

Para a sorte de Gregório e do síndico, Jurema não percebeu os seus olhares atrevidos; mas a cena não escapou à observação de Sarah, uma romântica jovenzinha de seus quinze anos, ainda com muitos sonhos cor-de-rosa, que a tudo assistia da varanda do primeiro andar.

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Estudante anteriormente muito aplicada, naquele ano Sarah havia se deixado levar pela paquerinha de um colega da escola, o Jonathan, relaxando em seus estudos. Como resultado, ao final do ano escolar acordou de seu mundo de sonhos de adolescente, chocada com o próprio insucesso nos exames, pois ficara em segunda época, uma experiência muito amarga para uma mocinha como ela, que sempre tivera sucesso na escola, orgulhando a seus pais, sua maior e natural referência.

Uma experiência dura e inesquecível. Quase em desespero ao ver a preocupação deles, Sarah estudou muito para os exames, mergulhando nos livros e cadernos, esquecendo-se de Jonathan, pelo menos por um tempo; e assim conseguiu, finalmente, a duras penas, a recuperação do ano escolar.

Agora sim, já estava em férias e podia fazer o que mais lhe agradava. Além, evidentemente, do namoro com Jonathan, Sarah tinha verdadeira paixão pela leitura. Lia de tudo: jornais, gibis, revistas e, principalmente, livros. Em apenas alguns dias após os exames, já havia tido o prazer de várias leituras, algumas bem interessantes.

Foi num gibi que leu as aventuras de Sycron, um grande robô revestido de aço, dotado de inteligência artificial auto evolutiva, inicialmente programado para o deslinde e o combate ao crime. Invulnerável aos projéteis de armas de fogo graças a seu revestimento de aço, representava um grande obstáculo para os bandidos, era um símbolo do Bem contra o Mal. Sarah riu-se ao pensar que aquele grande herói, de tão pesado, não poderia ser muito ágil e nunca conseguiria nadar. Gibis eram mesmo para crianças...

Numa revista de variedades, dias antes havia lido a história real de Thory, primeiro Super-herói brasileiro, pernambucano de vinte e sete anos, cujo nome verdadeiro e completo é Thoryvanderson Ferreira da Silva, nome esse elaborado com muito carinho por seu pai com base nos de jogadores estrangeiros, durante a Copa Mundial de Futebol de 1994, quando ele nasceu.

O artigo contava que Thory, leitor e releitor obsessivo de velhos e antigos gibis da coleção de seu avô, que encontrou quando ainda era menino, conseguiu a grande façanha de juntar um dinheirinho e migrar do sertão de Pernambuco para a Capital, onde procurava emprego como ator em algum circo, sonhando interpretar preferencialmente o Capitão Marvel, seu maior ídolo, inspirado naqueles gibis. Como não encontrou circos em Recife, estava ainda desempregado, chamando a atenção de quem o via passar pelas ruas com aqueles trajes estranhos.

Sabia que um de seus pontos fracos na interpretação do herói seria a sua incapacidade de voar, ou mesmo de provocar o raio que lhe daria esse poder ao chamar o mago “Shazan”; quando criança tentou tantas vezes, e não entendia porque com ele isso nunca funcionou, se funcionava tão bem com o Capitão Marvel. Ao ver os altos edifícios da cidade grande, até pensou em tentar um voo saltando lá de cima, mas desistiu ao lembrar-se de que não conseguiria o raio de Shazan, conforme disse sincera e candidamente a uma repórter que o entrevistou.

Sarah viu a foto de Thory na revista e logo estranhou a incoerência do rapaz na escolha do seu vestuário. Nem o Billy Batson, repórter que se transformava no Capitão Marvel, se vestiria, sem camisa, com um casacão daqueles, ainda mais no calor de Pernambuco. Esse é mesmo doido de pedra, pensou e riu, mas com pena dele.

Também nos jornais Sarah encontrava coisas assombrosas. Ainda no dia anterior lera a reportagem sobre Nickolas Sheldom, ou o “velho Nick”, como foi chamado pelo jornal. Tratava-se de um norte-americano de seus quarenta e poucos anos, que em sua juventude assistia a muitos filmes de faroeste, sempre identificando-se demais com os personagens dos mocinhos na luta contra os bandidos. Assim, desenvolvera um forte sentimento do dever de lutar pela Justiça a qualquer preço, embora não tivesse a noção necessária do respeito às leis. À medida em que o tempo passava, aquela obsessão pelo combate à injustiça foi dominando a sua mente de forma doentia. Equipou-se de armas e de outros aparatos de ataque e defesa, aproveitando-se da facilidade existente nos Estados Unidos para a compra de armas e munições. Ele sentia, cada vez mais compulsivamente, que tinha que fazer alguma coisa pelo Bem e pela Justiça,  e nada, nem ninguém, poderia impedi-lo. Num momento extremo de seu devaneio doentio, adotou até uma vestimenta de cowboy. Ao final, a sua figura despertava a atenção de quem o via, mas ninguém ousava interpelá-lo ou mesmo seria capaz de imaginar o que ele ainda faria...

A notícia do atentado praticado pelo “velho Nick”, em que algumas pessoas perderam a vida sem nenhuma razão, incomodara profundamente a jovem Sarah. A insegurança que sentiu ao pensar que qualquer maluco ou criminoso poderia dispor facilmente de armas e sair por aí metralhando as pessoas com quem cismasse, lhe pareceu algo muito insano. Isso depõe muito contra o pretenso bom-senso dos adultos, pensou decepcionada.

Essas leituras ficaram para trás.

Era segunda-feira, muito cedo, e Sarah já estava sentada numa confortável poltrona na varanda do apartamento do primeiro andar, lendo empolgada o livro com a história do mestre Ramos, um capitão que, naquele momento da aventura que lia, enfrentava uma violenta tempestade com a sua frágil traineira, preocupado em não perder a carga de peixes que alimentaria a comunidade de sua ilha por algumas semanas e, principalmente, preocupado com a sua própria sobrevivência, dada a violência da tempestade que enfrentava.  No retorno da pescaria, ele e seus companheiros foram surpreendidos por aquela tempestade, que poderia abalar a estrutura da embarcação tornando-a instável. Na tentativa de manter o barco na rota, os marinheiros caíram no mar e sumiram entre as águas. Assustado com o desaparecimento de seus companheiros, o Capitão implorava a Deus que o salvasse. Sozinho diante de um perigo como jamais enfrentara, teria que salvar a própria vida e a carga. Sua família o esperava, tinha que conseguir!

Atraída pela conversa do síndico com Gregório e desviando um pouco sua atenção da leitura, Sarah pode observar claramente, daquela posição privilegiada que lhe proporcionava a varanda do primeiro andar, a cena que se passava no momento da entrada de Jurema. E indignou-se: Síndico safado! Grudou os olhos no traseiro dela! Só não vou lhe contar porque é brava, é capaz de brigar com ele e vai dar confusão. Mas, em compensação...olha só o jeito que o Gregório olha para a Jurema! Parece que está gamadinho! Aaah! Isso eu vou contar!

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Enquanto Sarah matutava sobre o que vira, Gregório já examinava a cena do “crime”, ponderando para si mesmo que algumas pessoas não têm, mesmo, noção de higiene, respeito e civilidade. Via-se diante de uma tarefa difícil: como descobrir o responsável por aquela sujeira? Se não fosse a exigência do síndico, bastaria limpar aquilo e estaria tudo resolvido. Mas a situação, praticamente, o investira numa tarefa que seria própria para um detetive. Ao observar o montinho o seu pensamento ia correndo solto, e se divertiu ao imaginar-se vestido como Sherlock Holmes, com capa, cachimbo, chapéu e lupa, para uma importante investigação em busca do misterioso proprietário de um bichinho porcalhão, que não era, evidentemente um gato nem um periquito; certamente seria um cachorro e... um cachorro? Epa! Essas bolinhas eu conheço bem. São cocôs de cabrito! Sim! É claro! Isso explica também os balidos ouvidos durante a noite! Mas... Que absurdo! Quem teria escolhido um cabrito para pet, aqui no condomínio?

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O jovem veterinário doutor Alex vinha retornando da casa de sua noiva, que morava numa cidade próxima. Já era tarde da noite de domingo. De repente, os faróis de seu carro iluminaram um movimento agitado de um vulto branco bem mais adiante, ao lado do acostamento, chamando a sua atenção. Curioso, como a estrada estava sem tráfego pôde reduzir a velocidade enquanto se aproximava do local.

Ao chegar, parou a sua perua no acostamento, desceu do veículo, e viu que um pequeno animal estava se debatendo, preso em alguma coisa. Bondoso e fiel a seu ideal de veterinário, imediatamente se dispôs a acudi-lo; acendeu a sua lanterna e atravessou a pequena faixa de mato rasteiro até o animal, constatando, ao iluminá-lo, que se tratava de um cabrito preso numa cerca de arame farpado, já um pouco machucado e bastante assustado.

Antes de desembaraçá-lo da cerca, tomou o cuidado de prendê-lo com uma guia para que não fugisse, pois ele necessitaria de curativos. Depois, com alguma dificuldade, conduziu o cabrito até a sua perua e o alojou na gaiola que mantinha no veículo para o transporte de animais.

O doutor Alex estava bastante cansado e àquela hora não dispunha de um local adequado para deixar o cabrito. Não encontrando qualquer alternativa, teve a ideia maluca, mas única, de levar o cabrito para o seu próprio apartamento, onde o acomodaria de alguma maneira, apenas até o dia seguinte. Daria um jeito.

Ao chegar, todos no prédio já dormiam, inclusive o porteiro, como sempre acontecia.  

O doutor Alex abriu o portão com o controle remoto, estacionou a perua em sua vaga no pátio do prédio, pegou o cabrito pela guia, passou com ele através do jardim, mas não entrou pela entrada principal; foi até a entrada de serviço e subiu as escadas com o animal até o seu apartamento no terceiro andar. Ninguém os viu.

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Segunda-feira, ainda cedo, Jurema entrou no apartamento para o serviço diário e logo Sarah veio a seu encontro com aquela carinha maliciosa de quem sabe alguma coisa muito particular.

Tenho uma coisa para te contar – disse ela.

E contou mesmo, com detalhes, a cena que presenciara da varanda, descrevendo o olhar apaixonado que o argentino Gregório dedicara a Jurema durante a sua passagem na entrada do prédio. Prudentemente, nada disse sobre os olhares lascivos do síndico.

Ao ouvi-la, Jurema abandonou a sua expressão séria habitual e sorriu feliz com a notícia, sentindo-se envaidecida e agradecendo a Sarah por lhe confirmar aquilo de que já desconfiava. Agora iria pensar uma forma de facilitar as coisas para o Gregório, pois também gostaria de ser cortejada por ele.

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Quem teria um cabrito neste condomínio? Pensava ainda Gregório, exultante com a brilhante dedução que tivera no exame do cocô. Nesse momento, surge a solução, caída dos Céus. Ou melhor, vinda da entrada de serviços, por onde estava passando o Doutor Alex com o cabrito. Ao vê-los, Gregório correu afobado até eles, pisando desastradamente na prova do crime:

- Buenos dias, señor – Disse Gregório.

- Bom dia, Gregório – Disse o Doutor Alex.

- Bé é é é é é! – Disse o cabrito.

 

Enquanto Gregório explicava a situação para o Doutor Alex, aproximou-se deles o síndico Ariovaldo, que se espantara com a inusitada presença de um cabrito em seu condomínio.

Bé é é é é é! – Cumprimentou-o o cabrito.

 Isso deu ao Doutor Alex a oportunidade de lhe contar as dificuldades por que havia passado na noite anterior para acudir o animal, do qual já se afeiçoara bastante.

Ouvindo a história e compadecido com a dedicação e a bondade do veterinário, Ariovaldo abriu mão de seus princípios de virginiano e resolveu perdoar a multa, além de não fazer a carta de advertência. Deu ordens a Gregório para providenciar uma limpeza completa do ambiente e dar o caso por encerrado, declarando solenemente, ao vento:

A grandeza e a paz devem sempre prevalecer no Condomínio Oceano Pacífico.

 

Bé é é é é é é! – Agradeceu e aplaudiu o cabrito.

 

Avaliando bem as circunstâncias, o Doutor Alex achou melhor não abusar da boa vontade do senhor Ariovaldo e deixou para solicitar em outro momento a autorização para manter permanentemente o cabrito em seu apartamento, como animal de estimação.

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Na tarde daquele mesmo dia, ao sair do serviço, uma sedutora e perfumada Jurema, distraidamente, como quem não quer nada, deixou cair um pacote quando passava bem pertinho do apaixonado Gregório...

O SEGREDO DE UMA LÁGRIMA - Pedro Henrique

  O SEGREDO DE UMA LÁGRIMA Pedro Henrique        Curioso é pensar na vida e em toda sua construção e forma: medo, terror, desejo, afet...