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quinta-feira, 8 de maio de 2025

PROJETO ICAL - ESCRITORES EM DESTAQUE

 

PROJETO ICAL

ESCRITORES EM DESTAQUE


Pesquise a vida e obra de um dos autores abaixo. Anote curiosidades. Veja a bibliografia dele. O gênero que mais aplicava nos textos. Observe o estilo literário. Leia uma obra, um poema, um conto do autor, e faça uma análise do texto literário. Marque trechos da obra para os colegas conhecerem.

Será muito gratificante “descobrir” quem é nosso escritor.

 

1.           Hirtis vai escolher primeiro e sua explanação será no dia 14/04 às 20h pelo Zoom. Não faltem. 


2.          Adelaide será a segunda a escolher o autor. Sua explanação será no dia 21/05 às 20h pelo Zoom. Não faltem. 

3. Dinah Amorim - Clarice Lispector - será dia 04/06 às 20hs

Não faltem


4. Pedro Henrique - Conceição Evaristo - será dia 11/06 às 20 hs.

Não faltem.


5. Henrique Schnaider - Érico Veríssimo - será dia 25/06 às 20 hs

Não faltem.


Sugiro que visitem nossa BIBLIOTECA VIRTUAL. Nessa página repleta de boa leitura gratuita (PDF, Áudio-livros e animações). Lá está também os contos e livros citados nas aulas do PROJETO ESCRITORES EM DESTAQUE.

E você vai escolher qual autor para falar de sua vida e obra?



1. MACHADO DE ASSIS
Pesquisa e trabalho executado por Adelaide Dittmers:

Joaquim Maria Machado de Assis nasceu em 21 de junho de 1839, no Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. E faleceu em 29 de setembro de 1908, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

A obra completa de Machado de Assis é extensa e inclui 10 romances, 10 peças teatrais, 200 contos, 5 coletâneas de poemas e sonetos, e mais de 600 crônicas.

 

Machado e a esposa Carolina Augusta

Joaquim Maria Machado de Assis (Rio de Janeiro21 de junho de 1839 – Rio de Janeiro, 29 de setembro de 1908) foi um escritor brasileiro, amplamente reconhecido por críticos, estudiosos, escritores e leitores como o maior expoente da literatura brasileira.  Sua produção literária abrangeu praticamente todos os gêneros, incluindo poesia, romance, crônica, dramaturgia, conto, folhetim, jornalismo e crítica literária. Machado de Assis testemunhou a Abolição da Escravatura e a transição política do Brasil, com o golpe da proclamação da República em substituição ao Império, além de diversos eventos significativos no final do século XIX e início do século XX, sendo um notável comentador e relator dos acontecimentos político-sociais de sua época.[

Nascido no Morro do LivramentoRio de Janeiro, de uma família pobre, mal estudou em escolas públicas e nunca frequentou universidade. Para o considerado crítico literário norte-americano Harold Bloom, Machado de Assis é o maior escritor negro de todos os tempos, embora outros estudiosos prefiram especificar que Machado era mestiço filho de um descendente de negros alforriados e de uma portuguesa da ilha de São Miguel (Açores). Seus biógrafos notam que, interessado pela boemia e pela corte, lutou para subir socialmente abastecendo-se de superioridade intelectual e da cultura da capital brasileira. Para isso, assumiu diversos cargos públicos, passando pelo Ministério da Agricultura, do Comércio e das Obras Públicas (particularmente pela Diretoria da Agricultura), e conseguindo precoce notoriedade em jornais onde publicava suas primeiras poesias e crônicas. Machado de Assis pôde assistir, durante sua vida, que abarca o final da primeira metade do século XIX até os anos iniciais do século XX, as enormes mudanças históricas na política, na economia e na sociedade brasileira e também mundial. Em sua maturidade, reunido a intelectuais e colegas próximos, fundou e foi o primeiro presidente unânime da Academia Brasileira de Letras.

A extensa obra machadiana constitui-se de dez romances, 205 contos, dez peças teatrais, cinco coletâneas de poemas e sonetos, e mais de seiscentas crônicas. Machado de Assis é considerado o introdutor do Realismo no Brasil, com a publicação de Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881). Embora não haja uma lista completa e definitiva de todas as traduções, sabe-se que o romance Memórias Póstumas de Brás Cubas foi traduzido para os seguintes idiomas: inglês, francês, espanhol, alemão, italiano, sueco, polonês, tcheco, russo, romeno, estoniano, holandês e esperanto. Memórias Póstumas de Brás Cubas é posto ao lado de todas suas produções posteriores, Quincas BorbaDom CasmurroEsaú e Jacó e Memorial de Aires, ortodoxamente conhecidas como pertencentes à sua segunda fase, em que se notam traços de crítica social, ironia e até pessimismo, embora não haja rompimento de resíduos românticos. Dessa fase, os críticos destacam que suas melhores obras são as do que se passou a chamar de "Trilogia Realista".Sua primeira fase literária é constituída de obras como RessurreiçãoA Mão e a LuvaHelena e Iaiá Garcia, onde se notam características herdadas do Romantismo, ou "convencionalismo", como prefere a crítica moderna.[22]

Sua obra foi de fundamental importância para as escolas literárias brasileiras do século XIX e do século XX e surge nos dias de hoje como de grande interesse acadêmico e público para entender o Brasil e o mundo.  Influenciou grandes nomes das letras, como Olavo BilacLima BarretoDrummond de AndradeJohn BarthDonald Barthelme e muitos outros. Ainda em vida, alcançou fama e prestígio pelo Brasil e países vizinhos. Hoje em dia, por sua inovação literária e por sua audácia em temas sociais e precoces, é frequentemente visto como o escritor brasileiro de produção sem precedentes, de modo que, recentemente, seu nome e sua obra têm alcançado diversos críticos, influenciados, estudiosos e admiradores do mundo inteiro. Machado de Assis é considerado um dos grandes gênios da história da literatura, ao lado de autores como DanteShakespeare e Camões. Machado de Assis e Eça de Queiroz são considerados os dois maiores escritores em língua portuguesa do século XIX. Foi incluído na lista oficial dos Heróis Nacionais do Brasil e é homenageado pelo principal prêmio literário brasileiro, o Prêmio Machado de Assis.


 

CONTO 

IDEIAS DE CANÁRIO

Autor: Machado de Assis


Um homem dado a estudos de ornitologia, por nome Macedo, referiu a alguns amigos um caso tão extraordinário que ninguém lhe deu crédito. Alguns chegam a supor que Macedo virou o juízo. Eis aqui o resumo da narração.

No princípio do mês passado - disse ele -, indo por uma rua, sucedeu que um tilbury à disparada, quase me atirou ao chão. Escapei saltando para dentro de uma loja de belchior. Nem o estrépito do cavalo e do veículo, nem a minha entrada fez levantar o dono do negócio, que cochilava ao fundo, sentado numa cadeira de abrir. Era um frangalho de homem, barba cor de palha suja, a cabeça enfiada em um gorro esfarrapado, que provavelmente não achara comprador. Não se adivinhava nele nenhuma história, como podiam ter alguns dos objetos que vendia, nem se lhe sentia a tristeza austera e desenganada das vidas que foram vidas.

A loja era escura, atulhada das cousas velhas, tortas, rotas, enxovalhadas, enferrujadas, que de ordinário se acham em tais casas, tudo naquela meia desordem própria do negócio. Essa mistura, posto que banal, era interessante. Panelas sem tampa, tampas sem panela, botões, sapatos, fechaduras, uma saia preta, chapéus de palha e de pelo, caixilhos, binóculos, meias casacas, um florete, um cão empalhado, um par de chinelas, luvas, vasos sem nome, dragonas, uma bolsa de veludo, dous cabides, um bodoque, um termômetro, cadeiras, um retrato litografado pelo finado Sisson, um gamão, duas máscaras de arame para o carnaval que há de vir, tudo isso e o mais que não vi ou não me ficou de memória, enchia a loja nas imediações da porta, encostado, pendurado ou exposto em caixas de vidro, igualmente velhas. Lá para dentro, havia outras

cousas mais e muitas, e do mesmo aspecto, dominando os objetos grandes, cômodas, cadeiras, camas, uns por cima dos outros, perdidos na escuridão.

Ia a sair, quando vi uma gaiola pendurada da porta. Tão velha como o resto, para ter o mesmo aspecto da desolação geral, faltava-lhe estar vazia. Não estava vazia. Dentro pulava um canário. A cor, a animação e a graça do passarinho davam àquele amontoado de destroços uma nota de vida e de mocidade. Era o último passageiro de algum naufrágio, que ali foi parar íntegro e alegre como dantes. Logo que olhei para ele, entrou a saltar mais, abaixo e acima, de poleiro em poleiro, como se quisesse dizer que no meio daquele cemitério brincava um raio de sol. Não atribuo essa imagem ao canário, senão porque falo a gente retórica; em verdade, ele não pensou em cemitério nem sol, segundo me disse depois. Eu, de envolta com o prazer que me trouxe aquela vista, senti-me indignado do destino do pássaro, e murmurei baixinho palavras de azedume.

— Quem seria o dono execrável deste bichinho, que teve ânimo de se desfazer dele por alguns pares de níqueis? Ou que mão indiferente, não querendo guardar esse companheiro de dono defunto, o deu de graça a algum pequeno, que o vendeu para ir jogar uma quiniela?

E o canário, quedando-se em cima do poleiro, trilou isto:

— Quem quer que sejas tu, certamente não estás em teu juízo. Não tive dono execrável, nem fui dado a nenhum menino que me vendesse. São imaginações de pessoa doente; vai-te curar, amigo...

— Como - interrompi eu, sem ter tempo de ficar espantado -. Então o teu dono não te vendeu a esta casa? Não foi a miséria ou a ociosidade que te trouxe a este cemitério, como um raio de sol?

— Não sei que seja sol nem cemitério. Se os canários que tens visto usam do primeiro desses nomes, tanto melhor, porque é bonito, mas estou que confundes.

— Perdão, mas tu não vieste para aqui à toa, sem ninguém, salvo se o teu dono foi sempre aquele homem que ali está sentado.

— Que dono? Esse homem que aí está é meu criado, dá-me água e comida todos os dias, com tal regularidade que eu, se devesse pagar-lhe os serviços, não seria com pouco; mas os canários não pagam criados. Em verdade, se o mundo é propriedade dos canários, seria extravagante que eles pagassem o que está no mundo.

Pasmado das respostas, não sabia que mais admirar, se a linguagem, se as ideias. A linguagem, posto me entrasse pelo ouvido como de gente, saía do bicho em trilos engraçados. Olhei em volta de mim, para verificar se estava acordado; a rua era a mesma, a loja era a mesma loja escura, triste e úmida. O canário, movendo a um lado e outro, esperava que eu lhe falasse. Perguntei-lhe então se tinha saudades do espaço azul e infinito...

— Mas, caro homem - trilou o canário -, que quer dizer espaço azul e infinito?

— Mas, perdão, que pensas deste mundo? Que cousa é o mundo?

— O mundo - redarguiu o canário com certo ar de professor -, o mundo é uma loja de belchior, com uma pequena gaiola de taquara, quadrilonga, pendente de um prego; o canário é senhor da gaiola que habita e da loja que o cerca. Fora daí, tudo é ilusão e mentira.

Nisto acordou o velho, e veio a mim arrastando os pés. Perguntou-me se queria comprar o canário. Indaguei se o adquirira, como o resto dos objetos que vendia, e soube que sim, que o comprara a um barbeiro, acompanhado de uma coleção de navalhas.

— As navalhas estão em muito bom uso - concluiu ele.

— Quero só o canário.

Paguei-lhe o preço, mandei comprar uma gaiola vasta, circular, de madeira e arame, pintada de branco, e ordenei que a pusessem na varanda da minha casa, donde o passarinho podia ver o jardim, o repuxo e um pouco do céu azul.

Era meu intuito fazer um longo estudo do fenômeno, sem dizer nada a ninguém, até poder assombrar o século com a minha extraordinária descoberta. Comecei por alfabetar a língua do canário, por estudar-lhe a estrutura, as relações com a música, os sentimentos estéticos do bicho, as suas ideias e reminiscências. Feita essa análise filológica e psicológica, entrei propriamente na história dos canários, na origem deles, primeiros séculos, geologia e flora das ilhas Canárias, se ele tinha conhecimento da navegação, etc. Conversávamos longas horas, eu escrevendo as notas, ele esperando, saltando, trilando.

Não tendo mais família que dous criados, ordenava-lhes que não me interrompessem, ainda por motivo de alguma carta ou telegrama urgente, ou visita de importância. Sabendo ambos das minhas ocupações científicas, acharam natural a ordem, e não suspeitaram que o canário e eu nos entendíamos.

Não é mister dizer que dormia pouco, acordava duas e três vezes por noite, passeava à toa, sentia-me com febre. Afinal tornava ao trabalho, para reler, acrescentar, emendar. Retifiquei mais de uma observação - ou por havê-la entendido mal, ou porque ele não a tivesse expresso claramente. A definição do mundo foi uma delas. Três semanas depois da entrada do canário em minha casa, pedi-lhe que me repetisse a definição do mundo.

— O mundo - respondeu ele - é um jardim assaz largo com repuxo no meio, flores e arbustos, alguma grama, ar claro e um pouco de azul por cima; o canário, dono do mundo, habita uma gaiola vasta, branca e circular, donde mira o resto. Tudo o mais é ilusão e mentira.

Também a linguagem sofreu algumas retificações, e certas conclusões, que me tinham parecido simples, vi que eram temerárias. Não podia ainda escrever a memória que havia de mandar ao Museu Nacional, ao Instituto Histórico e às universidades alemãs, não porque faltasse matéria, mas para acumular primeiro todas as observações e ratificá-las. Nos últimos dias, não saía de casa, não respondia a cartas, não quis saber de amigos nem parentes. Todo eu era canário. De manhã, um dos criados tinha a seu cargo limpar a gaiola e pôr-lhe água e comida. O passarinho não lhe dizia nada, como se soubesse que a esse homem faltava qualquer preparo científico. Também o serviço era o mais sumário do mundo; o criado não era amador de pássaros.

Um sábado amanheci enfermo, a cabeça e a espinha doíam-me. O médico ordenou absoluto repouso; era excesso de estudo, não devia ler nem pensar, não devia saber sequer o que se passava na cidade e no mundo. Assim fiquei cinco dias; no sexto levantei-me, e só então soube que o canário, estando o criado a tratar dele, fugira da gaiola. O meu primeiro gesto foi para esganar o criado; a indignação sufocou-me, caí na cadeira, sem voz, tonto. O culpado defendeu-se, jurou que tivera cuidado, o passarinho é que fugira por astuto...

— Mas não o procuraram?

— Procuramos, sim, senhor; a princípio trepou ao telhado, trepei também, ele fugiu, foi para uma árvore, depois escondeu-se não sei onde. Tenho indagado desde ontem, perguntei aos vizinhos, aos chacareiros, ninguém sabe nada.

Padeci muito; felizmente, a fadiga estava passada, e com algumas horas pude sair à varanda e ao jardim. Nem sombra de canário. Indaguei, corri, anunciei, e nada. Tinha já recolhido as notas para compor a memória, ainda que truncada e incompleta, quando me sucedeu visitar um amigo, que ocupa uma das mais belas e grandes chácaras dos arrabaldes. Passeávamos nela antes de jantar, quando ouvi trilar esta pergunta:

— Viva, Sr. Macedo, por onde tem andado que desapareceu?

Era o canário; estava no galho de uma árvore. Imaginem como fiquei, e o que lhe disse. O meu amigo cuidou que eu estivesse doudo; mas que me importavam cuidados de amigos? Falei ao canário com ternura, pedi-lhe que viesse continuar a conversação, naquele nosso mundo composto de um jardim e repuxo, varanda e gaiola branca e circular...

— Que jardim? Que repuxo?

— O mundo, meu querido.

— Que mundo? Tu não perdes os maus costumes de professor. O mundo - concluiu solenemente - é um espaço infinito e azul, com o sol por cima.

Indignado, retorqui-lhe que, se eu lhe desse crédito, o mundo era tudo; até já fora uma loja de belchior...

— De belchior? - trilou ele às bandeiras despregadas. Mas há mesmo lojas de belchior?






 2. GRACILIANO RAMOS:

Pesquisa e trabalho realizado por Hirtis Lazarin:

Graciliano Ramos de Oliveira nasceu na cidade de Quebrângulo, Alagoas, no dia 27 de outubro de 1892, faleceu no Rio de Janeiro, no dia 20 de março de 1953, vítima de câncer de pulmão. Teve praticamente 20 anos de vida literária, mas suas obras ficaram para a história.

 Foi romancista, cronista, contista, jornalista, político e memorialista brasileiro, considerado um dos maiores nomes da literatura brasileira.

É considerado o mais importante prosador da geração de 30. O estilo próprio de sua narrativa, sem floreios, seco e simples, propicia uma abordagem direta e profunda das situações e das personagens retratadas. Destaca-se pela habilidade em abordar a interioridade e reações psicológicas humanas e as relações humanas com o meio que se impõe.

 

                                  Momento Histórico

Graciliano Ramos viveu durante um período de grandes transformações e turbulências políticas e sociais no Brasil. Ele nasceu na República Velha, marcada pela política do café com leite e pelo coronelismo. Viveu a transição para a Era Vargas com o Estado Novo e a Segunda Guerra Mundial. Após a Segunda Guerra, presenciou o retorno da democracia e a criação do Partido Comunista Brasileiro (PCB), no qual se filiou e depois se afastou.

Preso em 1936, sem acusação formal, por suposta ligação com o PCB, partido comunista, passou 11 meses na Colônia Correcional de Dois Rios, experiência que relatou em "Memórias do Cárcere".

 Ruínas do Lazareto (Ilha Grande -  RJ)


A vida e o contexto histórico de Graciliano Ramos tiveram um impacto significativo em sua obra, que frequentemente aborda temas como:

O drama social do sertão nordestino, marcado pela seca, a pobreza e a exploração.

A crítica às relações de poder e a busca por liberdade.

A reflexão sobre a vida e a morte, a política e a história brasileira.


              Características literárias de Graciliano Ramos

Ele figura entre um dos principais expoentes do chamado Segundo Modernismo, ou  Modernismo de 30. Marcado pela consciência pessimista do subdesenvolvimento, os autores desse movimento tinham como horizonte a compreensão de que os problemas sociais brasileiros eram estruturais. Portanto, desenvolveram uma literatura que retomava as formas tradicionais do romance realista, cujo projeto ideológico propunha uma denúncia dos contrastes sociais do Brasil."

Suas obras, de forma geral, são marcadas por um pessimismo profundo em relação ao homem. Ele cria situações em que as personagens se veem sempre em constantes inquietações quanto às questões da existência humana. Cada personagem corresponde a um tipo social que de fato existe e sua elaboração provém da junção entre a pesquisa da interioridade psicológica humana aliada aos tipos sociais brasileiros.


                              Análise de “Vidas Secas”

Obra de Graciliano Ramos

    “Se aprendesse qualquer coisa, necessitaria aprender mais, e nunca ficaria satisfeito.”


1 - Personagens:

Fabiano

Vaqueiro rude e sem instrução, não tem a capacidade de se comunicar bem e lamenta viver como um bicho, sem ter frequentado a escola. Ora reconhece-se como um homem e sente orgulho de viver perante as adversidades do nordeste, ora se reconhece como um animal. Sempre a procura de emprego, bebe muito e perde dinheiro no jogo.

Sinhá Vitória

Mulher de Fabiano, mãe de 2 filhos, é batalhadora e inconformada com a miséria em que vivem. É esperta e sabe fazer conta, sempre prevenindo o marido sobre trapaceiros.

O menino mais novo

Admira a figura do pai vaqueiro, integrado à terra em que vivem.


O menino mais velho

Não tem interesse nessa vida sofrida do sertão e quer descobrir o sentido das palavras, recorrendo mais à mãe.

(A falta de nome dos meninos reforça a ideia de que eles são apenas coisas, sem individualidade ou importância, dentro de um contexto de extrema dificuldade).

Baleia

Cadela que é tratada como membro da família. Pensa, sonha   e age como se fosse gente.

Fazendeiro

Homem desonesto que explorava seus empregados


O soldado amarelo


Tomás da bolandeira

Personagem secundário:

Tomás da Bolandeira não é um personagem que participa ativamente na história, mas é constantemente lembrado pelos personagens principais, Fabiano e Sinhá Vitória.

Modelo de vida

Ele é visto como um modelo a ser seguido, especialmente por Fabiano, que o admira pela sua educação e pela capacidade de se expressar de forma mais elaborada.

Cama de couro

A cama de couro de Tomás da Bolandeira, um objeto de desejo de Sinhá Vitória, simboliza a riqueza e o conforto que a família Fabiano não tem.

Vocabulário e linguagem

A capacidade de Tomás da Bolandeira em utilizar um vocabulário mais amplo é outra característica admirada por Fabiano, que o vê como uma forma de exercer poder e influência.

Símbolo de poder:

Apesar de não ser um personagem que exerce autoridade direta, Tomás da Bolandeira representa um padrão de vida e cultura superior, que Fabiano e Sinhá Vitória admiram e buscam alcançar, mesmo que inconscientemente, como um modo de lutar por melhoria.

Importância na narrativa

A figura de Tomás da Bolandeira é importante porque revela as aspirações e as dificuldades da família de Fabiano em um contexto de pobreza e seca, destacando as desigualdades sociais da época, como a diferença entre os que têm educação e os que não têm.

2 - Tempo da obra

O tempo da narrativa não está especificado. Mas tudo indica        que a história se passa em algum momento durante as três primeiras décadas do século XX. Assim, o que predomina é o tempo psicológico.

3 - Espaço

O sertão nordestino é o espaço da ação.

4 - Enredo

Sinha Vitória, Fabiano, os dois filhos e a cachorra Baleia, todos famintos, se arrastam em busca de sombra. Diante deles, a “catinga estendia-se, de um vermelho indeciso salpicado de manchas brancas que eram ossadas”. Chegam a uma fazenda. Baleia captura um preá. Fabiano faz uma pequena fogueira para assar a caça. Depois da chuva, a fazenda renasce. A família fica vivendo ali, com esperanças renovadas.


5 - Narrador

O romance  conta com um narrador onisciente, o qual tem conhecimento total dos fatos e do mundo interior dos personagens. Desse modo, a história é narrada segundo a perspectiva desses personagens.

6 - Características da obra

O romance, publicado pela primeira vez em 1938, possui um aspecto fragmentado, já que traz a visão particular de cada um dos protagonistas da obra. Ele é dividido em 13 capítulos e  possui características do romance de 1930.

7 - Conclusão

Vidas Secas é um profundo retrato da sociedade brasileira, sobretudo de seus problemas sociais. Dessa forma, Graciliano traça uma crítica social retratando as dificuldades encontradas por uma família pobre de retirantes. Eles têm de conviver constantemente com a miséria e a seca que assola o sertão nordestino.

Os Retirantes” (1944) -  Portinari 


Curiosidades

Graciliano Ramos tinha 37 anos quando foi eleito prefeito de Palmeira dos Índios (interior de Alagoas) em 1927 e tomou posse em 1928. Ele renunciou ao cargo em 1930, após dois anos de mandato.

Os textos que escreveu durante seu mandato como prefeito são conhecidos por sua linguagem direta, objetividade e estilo literário, mesmo em documentos oficiais como relatórios de gestão. Ele usava a ironia e a clareza para abordar os problemas da cidade, fugindo da linguagem burocrática usual.

                                 Alguns Textos

ILUMINAÇÃO – 7:800$000

“ A Prefeitura foi intrujada quando, em 1920, aqui se firmou um contrato para o fornecimento de luz. Apesar de ser o negócio referente à claridade, julgo que assinaram aquilo às escuras. É um BLUFF. Pagamos até a luz que a lua nos dá.


Sr. Governador.

Esta exposição é talvez desnecessária. O balanço que remeto a V. Excia. Mostra bem de que modo foi gasto em 1929 o dinheiro da Prefeitura Municipal de Palmeira dos Índios. E nas contas regularmente publicadas há pormenores abundantes, minudências que excitaram o espanto benévolo da imprensa. Isto é, pois, uma reprodução de fatos que já marrei, com algarismo e prosa de guarda-livros, em numerosos balancetes e nas relações que os acompanharam.

CEMITÉRIO – 243$000

Pensei em construir um novo cemitério, pois o que temos dentro em pouco será insuficiente, mas os trabalhos a que me aventurei, necessários aos vivos, não me permitiram a execução de uma obra, embora útil, prorrogável. Os mortos esperarão mais algum tempo. São os munícipes que não reclamam.

POBRE POVO SOFREDOR

É uma interessante classe de contribuintes, módica em número, mas bastante forte. Pertencem a ela negociantes, proprietários, industriais, agiotas que esfolam o próximo com juros de judeu. Bem comido, bem bebido, o pobre povo sofredor quer escolas, quer luz quer estradas, quer higiene. É exigente e resmungão. Como ninguém ignora que se não obtém de graça as coisas exigidas, cada um dos membros desta respeitável classe acha que os impostos devem ser pagos pelos outros.

A obra VIDAS SECAS - Graciliano Ramos - faz parte do acervo literário da nossa BIBLIOTECA VIRTUAL. Faça uma visita à página da Biblioteca, vai se surpreender com o volume do acervo, com a qualidade do menu escolhido. Lá você encontrará obras gratuitas em PDF para salvar no seu computador, as obras em áudio-livro, algumas encenações em animações. Não perca.





           3. LIGIA FAGUNDES TELLES:

Lygia Fagundes Telles nasceu em São Paulo, no dia 19 de abril de 1923, e faleceu aos 98 anos em São Paulo em 3 de abril de 2022. Romancista e contista, membro da Academia Paulista de Letras, da Academia Brasileira de Letras e da Academia de Ciências de Lisboa.

 

     4ARIANO SUASSUNA:  

Ariano Vilar Suassuna nasceu no Palácio da Redenção, na cidade de Nossa Senhora das Neves, hoje João Pessoa, capital da Paraíba, em 16 de junho de 1927, e morreu em 2014.


5. GUIMARÃES ROSA:

João Guimarães Rosa nasceu em Cordisburgo, pequena cidade do interior de Minas Gerais, no dia 27 de junho de 1908. foi uma das principais expressões da literatura brasileira. O romance "Grandes Sertões: Veredas" é sua obra prima. E morreu em 1967.

 

6. CLARICE LISPECTOR:

Pesquisado e apresentado por Dinah Amorim - 04 de junho de 2025.


Clarice Lispector nasceu na aldeia de Tchetchelnik, na Ucrânia, no dia 10 de dezembro de 1920. Nascida Haya Pinkhasovna Lispector, passou a se chamar Clarice. faleceu no Rio de Janeiro, no dia 9 de dezembro de 1977.

Clarice Lispector

Advogada, Escritora e Jornalista brasileira

Clarice Lispector (1920-1977) foi um dos maiores nomes da literatura brasileira do Século XX. Com seu romance inovador e com sua linguagem altamente poética, sua obra se destacou diante dos modelos narrativos tradicionais. Seu primeiro livro, “Perto do Coração Selvagem”, recebeu o Prêmio Graça Aranha.




Infância e Adolescência

 

Clarice Lispector nasceu na aldeia de Tchetchelnik, na Ucrânia, no dia 10 de dezembro de 1920. Era filha de casal de origem judaica que fugiu de seu país diante da perseguição aos judeus durante a Guerra Civil Russa.

Ao chegarem ao Brasil fixaram residência em Maceió, Alagoas, Clarice tinha apenas dois meses de idade, por iniciativa de seu pai, todos mudaram o nome. O nome original era Haya Pinkhasovna Lispector, mas no Brasil passou a se chamar Clarice.

Depois, a família mudou-se para a cidade do Recife, onde Clarice passou sua infância na casa localizada na Praça Maciel Pinheiro, 387, no Bairro da Boa Vista. Aprendeu a ler e escrever muito nova e logo começou a escrever pequenos contos.


Casa onde Clarice passou a infância - Recife, Pe

 

Estudou inglês e francês e cresceu ouvindo o idioma dos seus pais, o iídiche.

overlay-cleverCom 12 anos, a família foi para o Rio de Janeiro no Bairro da Tijuca. Era frequentadora assídua da biblioteca.



Clarice e o marido


Em 1941, Clarice ingressou na Faculdade Nacional de Direito e empregou-se como redatora da "Agência Nacional". Depois, trabalhou no jornal "A Noite". Em 1943 casou-se com o amigo de turma, Maury Gurgel Valente. Em 1944 formou-se em Direito. Só veio a receber o grau de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais em 1952.

Primeiro livro

Em 1944, Perto do Coração Selvagem, que retrata uma visão interiorizada do mundo da adolescência, que abriu uma nova tendência na literatura brasileira.

O romance provocou verdadeiro espanto nos melhores críticos da época, como Antônio Cândido e Álvaro Lins. Sua narrativa quebra a sequência de começo, meio e fim, assim como a ordem cronológica, e funde a prosa à poesia.

A obra Perto do Coração Selvagem teve calorosa acolhida do público e, no mesmo ano, recebeu o Prêmio Graça Aranha.

Viagens e novas publicações

Ainda em 1944, Clarice Lispector acompanhou seu marido, diplomata de carreira, em viagens fora do Brasil. Sua primeira viagem foi para Nápoles, na Itália. Com a Europa em guerra, Clarice ingressou, como voluntária, na equipe de assistentes de enfermagem do hospital da Força Expedicionária Brasileira.

Em 1946, de volta ao Brasil, publicou O Lustre. Depois de uma longa estada na Suíça, em 1949 publicou A Cidade Sitiada. Nesse mesmo ano, nasceu seu primeiro filho, Pedro. Dedicou-se a escrever contos, e em 1952 lançou Alguns Contos.


Mãe e filhos

 

Em 1954, nasceu seu segundo filho, Paulo, em Washington, Estados Unidos. E lá também nasceu seu livro Perto do Coração Selvagem, publicado em francês.




Jornalismo e Literatura Infantil

Em 1959, Clarice se separou do marido e retornou ao Rio de Janeiro, acompanhada de seus dois filhos. Logo começou a trabalhar no "Jornal Correio da Manhã", assumindo a coluna "Correio Feminino".

Em 1960 trabalhou no "Diário da Noite" com a coluna "Só Para Mulheres" e, nesse mesmo ano lançou Laços de Família, um livro de contos que recebeu o Prêmio Jabuti da Câmara Brasileira do Livro.

Em 1967 publicou O Mistério do Coelhinho Pensante, seu primeiro livro infantil, que recebeu o Prêmio Calunga, da Campanha Nacional da Criança.

Nesse mesmo ano, ao dormir com um cigarro aceso, Clarice Lispector sofreu várias queimaduras no corpo e na mão direita. Passou por cirurgias e vivia isolada, sempre escrevendo. No ano seguinte publicou crônicas no Jornal do Brasil. 

Clarice passou a integrar o Conselho Consultivo do Instituto Nacional do Livro. Era considerada uma “pessoa difícil”. Em 1976, pelo conjunto de sua obra, Clarice ganhou o primeiro prêmio do X Concurso Literário Nacional de Brasília.

Última publicação em vida

Em 1977, Clarice Lispector escreveu Hora da Estrela, sua última obra publicada em vida, na qual conta a história de Macabéa, uma moça do interior em busca de sobreviver na cidade grande.

A versão cinematográfica desse romance, dirigida por Suzana Amaral em 1985.

 

Características da obra de Clarice Lispector

A autora fez parte da “Terceira Geração Modernista” ou “Geração de 45” - época de renovação das formas de expressão literária na prosa e, principalmente nos gêneros conto e romance.

Em busca de uma linguagem especial para expressar paixões e estado da alma, a escritora utilizou recursos técnicos modernos como a análise psicológica e o monólogo interior.

É considerada uma escritora intimista e psicológica, mas sua produção acaba por se envolver também em outros universos, sua obra é também social, filosófica e existencial.

As histórias dela raramente têm um começo meio e fim. Sua ficção transcende o tempo e o espaço, e os personagens, postos em situações limite, são com frequência femininos quase sempre situadas em centros urbanos.

Clarice nunca aceitou o rótulo de escritora feminista. Apesar disso, muitos de seus romances e contos têm como protagonistas personagens femininas, entre elas: Joana, de Perto do Coração Selvagem, Virgínia, de O Lustre, Lucrécia Neves, de A Cidade Sitiada e Macabéa, de A Hora da Estrela, e Ana no conto AMOR.

As cartas de Clarice

Por causa de seu casamento com um diplomata, Clarice viveu quase duas décadas fora do Brasil e escreveu muitas cartas aos amigos, e com olhar cosmopolita ela fala sobre os absurdos do cotidiano, as agruras da condição humana e as banalidades da vida. Suas cartas foram reunidas na obra Todas as Cartas, publicada em 2020.

O livro reúne cartas enviadas para João Cabral de Melo Neto, a quem ela faz elogios (“sendo eu ateia e o senhor um religioso profundo, o seu Deus é o meu”), Rubem Braga, Érico Veríssimo e sua esposa Mafalda, com quem conviveu em Washington. Além de Lúcio Cardoso, com quem trava longas conversas sobre livros.

A amizade que manteve com o escritor Fernando Sabino também foi registrada no livro “Cartas Perto do Coração” (2001), que revela uma profunda ligação entre os dois. As cartas dela foram enviadas de Berna e de Washington, onde morou. Nelas, Clarice revela uma série de frustrações por estar longe de casa.

A Morte

Clarice Lispector faleceu no Rio de Janeiro, no dia 9 de dezembro de 1977, vítima de um câncer de ovário, um dia antes de seu aniversário. Seu corpo foi sepultado no cemitério Israelita do Caju.

 


                                            Um dos poucos sorrisos de Clarice.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

7. CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE:

Carlos Drummond de Andrade nasceu em Itabira de Mato Dentro, interior de Minas Gerais, no dia 31 de outubro de 1902. Morreu no Rio de Janeiro RJ, no dia 17 de agosto de 1987, poucos dias após a morte de sua filha única, a cronista Maria Julieta Drummond de Andrade.

 

   8. EUCLIDES DA CUNHA:

Euclides Rodrigues Pimenta da Cunha nasceu em Cantagalo, Rio de Janeiro, no dia 20 de janeiro de 1866. Suspeitando que estivesse sendo traído por sua esposa, Euclides dirigiu-se para a casa do amante (que era oficial do Exército e atirador) e sem êxito tentou alvejá-lo, mas foi assassinado com três tiros que atingiram o coração e o pulmão. (Anos mais tarde, seu filho tentou uma vingança, mas teve o mesmo fim do pai).

Euclides faleceu no Rio de Janeiro, no dia 15 de agosto de 1909.

 

9.MONTEIRO LOBATO: 

José Renato Monteiro Lobato nasceu em Taubaté, São Paulo, no dia 18 de abril de 1882. Ao nascer. Era filho de José Bento Marcondes Lobato e Olímpia Monteiro Lobato. Após a morte do pai fez alteração no nome para ficar igual ao pai, então passou a se chamar José Bento Monteiro Lobato.


10. ERICO VERÍSSIMO:

Será pesquisado e trabalhado por Henrique Schnaider, no dia 25 de junho 2025.

Romancista que figura entre os maiores da literatura brasileira, Erico Verissimo, que se definia como um “contador de histórias”, nasceu em Cruz Alta (RS), em 17 de dezembro de 1905.


11. CONCEIÇÃO EVARISTO:
Será pesquisada por Pedro Henrique, e apresentado no dia 11/06/2025


Conceição Evaristo é uma importante escritora brasileira. Nasceu em MG. Formada em Letras pela UFRJ. Em 1996 se torna mestra em Literatura pela PUC/RJ.

Recebeu o título de Personalidade Literária do Ano pelo Prêmio Jabuti, em 2019.




quarta-feira, 7 de maio de 2025

ICAL - RECORDAÇÕES - FOTOS

ICAL

FUNDADO EM JUNHO DE 2009

EM PLENAS ATIVIDADES 

LITERÁRIAS, CULTURAIS E SOCIAIS.

São tantas histórias, 

tantos festejos, 

tantas publicações, 

tanta alegria, 

que as fotos podem ajudar a contar:








































































Ele nunca soube. - Hirtis Lazarin

 


Ele nunca soube.

Hirtis Lazarin

 

Ele só tinha dez anos quando o cavalo selvagem chegou no sítio do seu pai. Não dormiu direito nos cinco dias que antecederam à chegada do animal. Levantava, à noite, na ponta dos pés, não sei quantas vezes, só pra olhar as horas. O único relógio da casa ficava na sala, bem longe do quarto. O menino perdeu a fome e teve até dor de barriga, tanta era a sua ansiedade.

Nunca havia visto um animal selvagem, mas essa palavra “selvagem” ele já conhecia bem e ouvia sempre. Foi seu tio Pedro quem disse, pela primeira vez, a famosa frase — “Esse seu filho, Antonio, é um selvagem” — O tio tinha toda razão. Essa palavra era a definição exata do pequeno Mingo. 

O cavalo chegou na carroceria de um caminhão vindo de Minas Gerais. Com todo cuidado, foram tiradas suas amarras e solto no pasto que a gente perdia de vista.  Sacudiu o corpo, relinchou bravo e, num instante, desapareceu galopando. A mensagem estava dada: “Sou filho livre do chão, sou um cavalo selvagem e meu mundo é a imensidão”.

— Filho, fique longe desse CAVALO! — Aconselhou o pai com rispidez. Conhecia muito bem o filho que tinha.

Se você olhasse, naquele momento, para o menino Mingo, sentiria dó, tamanha era sua decepção. Nem pode alisar os pelos macios e encarar o bicho “olho no olho” como costumava fazer com outros animais. Segurou o choro porque era menino-homem e saiu correndo.  Mas, com certeza, isso não ficaria assim. Sua cabecinha estava pronta pra arquitetar planos.  

Todos os dias, ele levantava cedinho junto dos outros irmãos em idade escolar. A escolinha rural acolhia todas as crianças que moravam na região.  Descalço, ele e os pés eram livres, corria na frente, era o primeiro a chegar, sempre com um sorriso aberto e uma flor para a professora. Toda sexta-feira o vaso já estava colorido com cinco flores diferentes. Sentia-se um herói.

Ficar muito tempo sentado na carteira ouvindo o “a-e-i-o-u” da alfabetização causava-lhe sonolência e ele dormia. Dormia profundamente. Ou então, saía despercebido, escondia-se no mato até a aula terminar. Ninguém percebia que ele perdia o interesse porque os ensinamentos da professora causavam-lhe confusão mental. Na hora de juntar sílabas e formar palavrinhas, inventava o que lhe vinha à mente. Ninguém ria porque Mingo era forte e ninguém queria levar um soco na cara.

Saiu da escola semianalfabeto. Sabia escrever seu nome completo e outras sílabas que a vida foi lhe apresentando.

Mas na matemática, ele dava um nó. Dono de uma mente aguçada e lógica, enxergava o mundo através de números e padrões. Eu abri várias vezes uma caderneta sua, onde, já adulto e pai de família, anotava a contabilidade dos seus negócios prósperos. Tornou-se um grande empreendedor. Já os escritos que acompanhavam os números, pra mim, eram indecifráveis. Só ele entendia o rabisco das suas letras.

E o cavalo? Mingo esqueceu-se dele? Jamais. Sempre que tinha uma folga e se via livre do controle dos adultos, percorria o pasto à procura do animal. Era um segredo que não contava nem pra Maurílio, seu irmão mais velho e melhor amigo. Maurílio era ajuizado e, com certeza, temendo pela segurança do menino, não esconderia do pai essas maluquices.

Já fazia quase dois meses que Mingo se encontrava com o cavalo. Começou o enfeitiçamento oferecendo-lhe “milho” à distância, até que chegou o dia em que o animal se aproximou e comeu em suas próprias mãos. Alisou os pelos, oferecendo-lhe carinho. A confiança foi se fortalecendo até a amizade se concretizar. Veio, então, a escolha do nome — “Ele é imprevisível e rápido, parece uma ventania.  Isso mesmo! Ventania, Ventania é o seu nome”.

Naquele tempo, internet, celular, televisão não existiam e as crianças ganhavam pouquíssimos brinquedos. Então, a criatividade entrava em ação e os pequenos criavam seus próprios brinquedos. 

Era domingo, logo depois do almoço, os adultos foram tirar uma soneca. As crianças e adolescentes brincavam afastados das casas pra que a gritaria não os incomodasse. Era a lei.

Eis que lá do alto do morro vêm galopando um menino montado a pelo no cavalo. A mão direita segura com força a crina e a mão esquerda se apoia no flanco do animal. Postura ereta e equilibrada. 

Mingo e Ventania saltam a cerca do terreno, deixando pra trás muita poeira, olhos ardidos e gritos estridentes de medo e pavor.  

Mingo nunca soube porque eu nunca lhe falei e hoje, com muito orgulho e amor, a frase sai e “desentala” minha garganta. “Pai, você é meu herói”.




Um menino ótimo em matemática pode ser descrito como alguém com uma mente aguçada e lógica, que enxerga o mundo através de números e padrões. Ele pode ter uma expressão concentrada quando enfrenta problemas complexos, resolvendo-os com uma calma que contrasta com a complexidade da equação.

 

 

Cardápio do dia. - Hirtis Lazarin

 


Cardápio do dia.

Hirtis Lazarin

 

Ela vestia um terninho de linho na cor cinza-chumbo. Corte impecável!  Um colar e um anel de pérolas miudinhas eram o ornamento naquele visual tão discreto.

Lídia levantou-se bem cedo no horário de sempre e seu primeiro compromisso do dia era o banho. Um ritual que durava mais de uma hora. Nunca aceitou ser interrompida porque, naquele momento, nada era mais importante. Se o telefone tocasse, fingia não ouvir. 

Antes de deixar o banheiro, aproximou o rosto do espelho e arrancou alguns fios brancos que se destacavam nos cabelos castanho-escuros. Um sorrisinho amargo denunciou sua insatisfação.

Desceu vagarosamente os degraus da escada com os sapatos de salto alto nas mãos. Era um cuidado necessário, pois temia um desequilíbrio e uma queda.

A mesa do café estava arrumada e farta, do jeito que ela gostava. Naquele dia, em pé, tomou apenas uma xícara de café. Janice ficou esperando o “Bom Dia” habitual, mas não aconteceu.

A sala da casa respirava uma elegância discreta, um murmúrio da história. Cortinas pesadas filtravam a luz do sol dourado. Era verão. O ambiente acolhedor e intimista era herança de Dona Leontina, a dama filantrópica de São Lourenço, cidade ao sul de Minas.

Lídia sentou-se numa das poltronas de veludo e afastou as almofadas, arrumando espaço para sua bolsa. Na parede à sua frente, destaca-se uma pintura original de Anita Malfatti. O item mais colorido daquele ambiente sóbrio.

O gato siamês aproxima-se de seus pés e aguarda o cafuné de todos os dias, mas, infelizmente, o bichano não cabia naquele olhar vazio e distante.  Afasta-se em silêncio, ao entender que não era bem-vindo.

Quarenta minutos já se passaram e a moça continua no mesmo lugar. O único som que se ouvia era o estalar do plástico-bolha que suas mãos irrequietas manuseiam. 

A campainha toca. A jovem consulta o relógio. Eram dez horas e doze minutos. “São pontuais”.

Janice, de avental e touca branca, corre e abre a porta. Lá estavam dois homens altos e fortes, vestindo roupas iguais.  Ignoram a moça e entram. Na sua simplicidade, ela acredita que a farda dá a eles esse direito. 

— Bom dia, Dona Lídia.

— Bom dia, respondeu ela sem abaixar a cabeça.

— Preparada?

Lídia levantou-se fingindo estar calma, ajeitou a roupa e, sem perder a linha, acompanha-os.  Os três entram num carro grande e preto. 

Janice acompanha-os com os olhos até o carro dobrar a primeira esquina. 

Desconfiada, franze a testa e resmunga baixinho: “Não entendi nada e nem quero. Sabe, moça, sua obrigação é cuidar bem da casa e é melhor não ficar “caraminholando”.

Apanha o jornal do chão e entra. Fecha a porta e coloca o jornal sobre a mesa. Lê a manchete e se interessa pela notícia que fala sobre o INSS. Sabe que o INSS é aposentadoria.   Lê uma, duas vezes e não entende. A linguagem é muito complicada e desiste da leitura.  Lembra-se, então, das panelas abertas e vazias que a esperam sobre o fogão. Pega o plástico-bolha esquecido sobre o sofá e corre pra cozinha.

Cantarolando, abre a geladeira e retira um pernil congelado. “Salada, carne assada e uma farofa, simples, tudo gostoso e fácil de fazer”. 

 

quarta-feira, 16 de abril de 2025

CRIANÇAS VIVEM UMA NOVA AVENTURA! - Dinah Ribeiro de Amorim

 

 



CRIANÇAS VIVEM UMA NOVA AVENTURA!

Dinah Ribeiro de Amorim

 

A Rua Vitorino era conhecida pelo grande número de crianças que lá viviam. Várias casas residenciais, famílias numerosas, a animavam e movimentavam os dias.

As brincadeiras atraíam as crianças, que passavam o dia nas calçadas, quase sem entrar em casa

Muito levadas, metiam-se em várias aventuras, causando algumas preocupações aos pais, mas, geralmente, eram sossegados, quando as viam sempre juntos. A única advertência e proibição era para não fugirem ao parque deserto, na rua detrás, perigoso e desconhecido.

Muito cheio de mato, árvores copadas, vazio ainda de construções, poderia ter algum bicho estranho ou andante desocupado e desconhecido, perigoso, principalmente para crianças. Às vezes, alguns barulhos aconteciam nas noites, sem saberem ao certo se eram de gente ou bicho.

Melhor não chegarem nem perto.

Fora isso, as crianças brincavam e se divertiam com muita graça e aventuras.

Marcinha, a mais nova, de nove anos, apenas, era a mais novidadeira. Vivia sorrindo, fazendo imitações e gracejos, balançando o corpo e movendo o rosto salpicado de sardas até no nariz. Quando corria, suas tranças ruivas, feitas pela mãe, com esmero, toda manhã, se desfaziam, desmanchadas pelo vento, ao final do dia.

Numa tarde, a criançada inventou de brincar de esconder e Marcinha, muito curiosa, achando-se a mais esperta, cismou de se esconder no parque. Sabia que não seria achada, todos tinham medo de ir até lá. Sentia-se a mais corajosa.

Vai se embrenhando naquele mato proibido e procura uma árvore de tronco grosso para se esconder.

De repente, para assustada, percebe o corpo de um homem deitado no chão, escondido atrás da árvore. Não sabe se dorme ou caiu e, como não se mexe, procura chegar mais perto.

Avista um sangue escuro que lhe escorre do pescoço e, paralisada, dá um grito forte de socorro.

As outras crianças, ao ouvirem, também correm para lá e avistam esse homem que aparenta estar morto.

Paulinho, o mais velho, corre a chamar o pai e avisa-os para não chegarem muito perto do homem. Não sabem o que aconteceu.

A polícia é chamada, peritos isolam a área e levam o homem, já velho, ao hospital. Tentam estancar o sangue do pescoço, que jorra de uma veia.

Ele é colocado numa maca e recebe os tratamentos de praxe, enquanto as crianças são interrogadas, Marcinha, principalmente, sobre o ocorrido.

Mal sabem falar direito o que viram e o susto paralisa até os seus movimentos. Todos quietos, sentados na calçada, assustados e pensativos, imaginam as piores coisas. Em suas mentes entram agora as histórias tristes que leram nos livros ou assistiram nos filmes de aventuras, com monstros, bandidos e fantasmas.

Os pais, preocupados, querem repreendê-los, mas, se não tivessem visto o que viram, como o velho teria sido achado? Ficaram em posição difícil e com dó das crianças pela brincadeira ter acabado mal.

À noite, todas as crianças dormiram no quarto dos pais. Estavam sonolentas, mas amedrontadas, nunca haviam visto, na realidade, uma pessoa morta ou caída, com algum ferimento.

Na manhã seguinte, vários policiais percorrem o parque, estudando seus esconderijos e possíveis cavernas. Nada encontraram, a não ser alguns filhotes de lobos, escondidos atrás do bosque. Com certeza, os pais saíram à caça.

Levaram-nos ao zoológico e avisaram os pais que o homem apresentou, no hospital, sinais de mordidas de lobo, principalmente no pescoço, mas não chegou a morrer. Estavam tentando recuperá-lo.

As crianças, quando souberam disso, ficaram menos temerosas, aliviadas por não haver um crime, mas cientes de que os pais têm sempre razão. O parque tinha lobos e o atacado poderia ter sido um deles. Marcinha não sabe se fez um bem ou um mal, mas na dúvida, ninguém mais brincou na rua Vitorino, por um bom tempo.

O parque logo desapareceu, com construções novas e jardins, e o homem, que quase morreu, aparece, ocasionalmente, para agradecer.

Todos o tratam bem, só Marcinha, que ainda foge quando o avista.

 

 

 

O SEGREDO DE UMA LÁGRIMA - Pedro Henrique

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