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segunda-feira, 5 de agosto de 2024

A herança não pode tardar - Pedro Henrique

                          


 

A herança não pode tardar

Pedro Henrique

 

Dinheiro, sim, dinheiro, essa palavra que me delicia a boca. Que com cada uma de suas 8 letras e 7 fonemas tem o poder de reger a vida. Não há quem não o queira, não há quem não o deseje, não há quem não o ambicione. Se acham que vim aqui lhes contar algo simplório, convido-os a se retirar. Esta história é perigosa.

Uns dizem que tudo começou devido à vaidade, outros, ou por uma desgraça. Eu, porém, me coloco entre as afirmações e permito a visão macro dos fatos. Trata-se de uma mulher abastada, que teve acesso a todos os privilégios. Seu nome? Magnólia Monteiro dos Santos, filha de Lúcia Monteiro dos Santos e Rafael Vitório dos Santos, um dos empresários mais respeitados da indústria alimentícia, que infelizmente faleceu.

Toda sua fortuna recaiu nos braços de Lúcia, e não se importou com inventário nem com a distribuição da parte da Magnólia, afinal a filha ainda era uma criança. Ela, então, desfrutava de uma vida que, aos olhos dos outros, a inveja se fazia inevitável. Falo de jantares, viagens internacionais, roupas do mais fino tecido, uma casa que caberia um bairro inteiro, joias que valiam prédios e todas as coisas boas inerentes à vida daqueles que são agraciados com ouro e prata.

Criou sozinha a filha Magnólia. Claro, teve ajuda da babá e dos outros funcionários da casa, estes não sabiam como lidar com os mandos e desmandos da pequena Magnólia. A menina era autoritária; aí daquele que questionasse uma ordem sua. Se pedisse para você pegar o brinquedo que queria, deveria ir correndo, pois, se assim não o fizesse, se jogaria no chão em prantos e persuadiria, com a mais sofisticada das atuações, Lúcia Monteiro dos Santos, a entregar sua carta de demissão.

Além de tudo, era vaidosa. Não aceitava qualquer sapatilha, queria da Chanel; não gostava de qualquer maquiagem, queria a mais cara. Não lhe importava o preço, importava que era a melhor. Lúcia se deixava levar pelos caprichos da filha, e assim a menina cresceu se sentindo a verdadeira Cleópatra, a verdadeira rainha da terra. Muitos afirmavam que nela residia o próprio diabo. Era má e gostava de ser.

Magnólia cresceu e, como toda menina bonita, foi alvo dos olhares de um homem sedutor: Alberto de Campos Nunes, um grande empresário do ramo imobiliário da cidade de São Paulo.

Não havia uma que não se entregasse ao seu charme. Alberto, para Magnólia, não era senão uma questão de honra. Queria provar para si mesma e para todos que era capaz de seduzir quem quisesse.

Não demorou muito para ambos se casarem e terem sua primeira filha, Emanuela Campos dos Santos. Os anos se passaram e, com eles, a juventude de Lúcia também. Quando chegou aos 70 anos, uma doença bateu à porta. Todavia, não só a doença foi a grande questão entre a família. Havia algo acontecendo; a maldição começou a surgir das sombras e ganhar vida na multidão. A empresa de Alberto estava indo à falência, o assunto foi o mais enfatizado durante semanas na casa da família, não havia solução. Sendo assim, o casal arquitetou um plano para resolver o problema: acelerar a morte de Lúcia.

Pois, desta forma, Magnólia herdaria tudo e poderia ajudar o marido.

Quando Alberto contou o plano para Magnólia, ela nem ao menos se assustou. Pelo contrário, degustou a ideia como quem degusta o prato mais saboroso que já comeu até então. E juntos, estabeleceram uma estratégia para executar Lúcia. Era o seguinte: numa noite de sábado, quando Magnólia voltasse com Lúcia do hospital, deveria ser forjado um assalto em frente à garagem do casarão. O ladrão, no entanto, só teria um alvo, e não era o dinheiro.

E assim se sucedeu. Era uma noite fria quando Lúcia retornou para casa ao lado da filha, depois de sua passagem pelo hospital, como já era de costume devido à sua doença. Magnólia estacionou o carro em um ponto diferente dessa vez. Lúcia achou estranho e questionou a filha.

— Por que estacionou aqui fora?

— Ah, estacionei aqui porque só vou entrar com a senhora e depois vou sair com o carro. Vou encontrar umas amigas no shopping.

— Ah, sim.

Então, quando Lúcia colocou os pés para fora do veículo e foi em direção ao portão, a filha, ciente dos fatos futuros, se precaveu e ficou alguns metros afastada da mãe. Desta forma, como planejado, veio um homem das sombras, do nada, encapuzado como quem queria permanecer no anonimato, sacou uma arma e, em voz de mando, ordenou:

— Passa tudo, passa tudo.

Lúcia olhou assustada para o rapaz e depois levou seu olhar para a filha, percebendo que nela não havia nenhum pouco de desespero. Estranhada, olhou novamente para o rapaz que disparou três tiros. A bolsa permaneceu nas mãos de Lúcia, dinheiro nenhum foi levado, roubo nenhum foi cometido. Estava feito.

Lúcia tombou no chão. Sufocando, olhou para a filha e, com o pouco de voz que tinha, rogou-a:

— Me ajuda.

Magnólia se aproximou da mãe, abaixou-se ao seu lado direito e pegou sua mão.

— Ah, mamãe, eu queria tanto lhe ajudar, mas não posso. A senhora vai ficar bem, eu juro.

— Só me ajuda, por favor.

Magnólia levou a mão aos cabelos grisalhos da mãe, e Lúcia, como quem já foi graduada nas malandragens da vida, soube o que acabara de ocorrer. Olhava com espanto e medo, com terror, para a própria filha. Não reconhecia o ser humano que estava à sua frente, não reconhecia a menininha que tinha criado, dando-lhe de tudo. Se perguntava: "Onde foi que eu errei?" Pensava, como há muito tempo, que a vida era um local onde as crueldades fazem parte do ecossistema.

Era assim e sempre foi. O culpado? Bom, lhes digo: o dinheiro.

Lúcia, entretanto, em todos aqueles devaneios rápidos que passavam como um carro em alta velocidade por sua mente, só teve a capacidade de verbalizar uma única sentença, da qual precisava mais do que tudo dá resposta.

— Por quê?

— Ah, mamãe, a herança não pode tardar.

 



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