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quarta-feira, 4 de outubro de 2023

Uma Incrível Aventura - Adelaide Dittmers

 



Uma Incrível Aventura

Adelaide Dittmers

 

Catania é uma bonita e antiga cidade da Sicília, estendida aos pés do Monte Etna, que expele suas chamas de maneira constante, o que a faz receber turistas do mundo inteiro atraídos pelo fascínio de ver de perto um vulcão em atividade.

No aeroporto movimentado, dois jovens brasileiros, com mochilas nas costas, caminham pelos extensos corredores, conversando animados.  Vão realizar um sonho há muito acalentado: chegar quase às bordas da grande cratera do Etna, para assistir ao belo espetáculo do fogo, que salta das entranhas da montanha.

Saem, brincando e provocando-se mutuamente, de quem seria o mais corajoso ao escalar a montanha.  Tinham contratado uma excursão para fazerem esse passeio com segurança. Lá fora, chamam um táxi para levá-los até ao centro da cidade, mas antes admiram a imponente montanha que parece dominar tudo a sua volta.

No percurso, os olhos curiosos passeiam pelo lugar, através das janelas do carro.  A beleza da antiga arquitetura dos prédios e casas provocam comentários entusiasmados dos rapazes.

Ao alcançar a Piazza del Duomo, descem do táxi para continuar a pé até o hostel, onde se hospedarão. Param para fotografar a diferente Fontana dell’Elefante, que exibe a estátua do animal, esculpida com as cinzas do vulcão.

A longa viagem aérea não reflete nenhum cansaço no rosto dos dois.  Ao contrário, Matheus e Thiago vibram a cada descoberta pelo caminho, mas a emoção maior é a visão do majestoso Etna, reinando sobre a cidade, como um grande senhor sobre os seus súditos.  

Chegam ao lugar da hospedagem, tomam um banho e saem para conhecer melhor a cidade. Percorrem vários pontos turísticos.  Deliciam-se com a boa comida italiana.  Paqueram as bonitas jovens que passam por eles e ao fim do dia voltam para descansar e enfrentar no dia seguinte a subida até a cratera daquele senhor irritado, que despeja sua raiva pelos ares.

Aquele 28 de fevereiro amanhece frio.  Os dois jovens despertam ansiosos, empolgados pela viagem que os levará ao topo da intempestiva montanha. Rindo e brincando, engolem rapidamente o café e comem o pão pelo caminho. 

Às oito horas em ponto, pegam o ônibus, que os levará na primeira metade da viagem, até ao teleférico. O guia avisa a todos, que está sendo esperada uma forte erupção para aquele dia e que não poderão chegar perto da grande cratera.  As trilhas de acesso estão proibidas.  Por segurança o passeio será mais curto.

Matheus e Thiago se entreolham.  Uma comunicação silenciosa é feita entre eles.  Afinal, o objetivo de terem vindo era apreciar uma erupção de perto.

Uma hora depois, já no teleférico, se maravilham com a bela vista da cidade, mas o fogo, que sobe para o céu do pico da montanha, atrai os seus olhares como um poderoso imã.

Chegam à altura permitida e são novamente avisados para não se distanciarem do guia.  Os dois seguem o grupo pelos arredores. Em certo ponto do caminho, Thiago aponta com discrição uma trilha, em que há uma tabuleta, que indica o acesso à grande cratera. Os dois diminuem os passos e, sem serem vistos, entram na trilha. 

A escalada é feita em silêncio para não serem percebidos. Apenas o som da respiração forçada pela forte subida é ouvido.  Um leve tremor os desequilibra e eles riem divertidos. A excitação apaga o perigo iminente a que estão expostos. Os olhares não se desviam do belo e tenebroso espetáculo das barulhentas explosões, que levam as chamas para as alturas.

Subitamente, uma explosão violenta sacode a montanha, um grande e intenso fogaréu é expelido e pedras voam pelos ares. Os rapazes são atirados ao chão.   Atordoados, levantam-se devagar e assustados. Matheus quase não consegue firmar o pé.  Uma dor lancinante o faz gemer.  Agora, ao invés de risadas, uma máscara de terror cobre os rostos deles. Não conseguem descer rápido, o tombo não só machucou Matheus, como feriu a região das costelas de Thiago, que procura não se queixar para não assustar mais o amigo. A trilha íngreme é salpicada de pequenas e grandes pedras, em que tropeçam e quase caem, aumentando a dor dos ferimentos. 

A cada explosão, a montanha estremece e os desequilibra, e num desses momentos uma pequena estaca ao lado do caminho se enrosca nas roupas deles, rasgando-as.

Uma nuvem espessa de fumaça negra os atinge.  Os dois começam a tossir e cobrem o nariz e a boca com os panos rasgados das camisetas na tentativa de não sufocarem.  Os olhos começam a lacrimejar, atrapalhando a visão de ambos.  Sentindo que a vida está por um fio, esforçam-se em quase correr, apesar da dor que estão sentindo.

Matheus cai de novo e quer desistir.  Thiago o puxa com a força que lhe resta e o ampara, animando-o a continuar.

Enfim, conseguem chegar ao final da trilha, exaustos se arrastam até o teleférico, que está parado.  Não há mais ninguém lá. Consternados eles colocam as mãos na cabeça e abrem os braços em um movimento de impotência.  Thiago, então, lembra do celular e o procura no bolso, mas não o encontra. Perdeu-o no caminho. Matheus abre a pochete, que milagrosamente, estava ainda presa na sua cintura e retira o dele. As mãos trêmulas mal conseguem digitar o número para pedir socorro. A atenção está presa no gigante, que cospe o seu poderoso fogo interno. Enfraquecidos, seguram-se mutuamente.

Depois de alguns minutos, que lhes pareceu uma eternidade, o teleférico começou a se mover. Os jovens se jogam nas cadeiras, que os levarão para longe daquele inferno. Quando chegam embaixo, um grupo de homens os esperam e os amparando, levam-nos até um carro de bombeiros, que acabou de chegar.  Com a sirene ligada, o carro desce veloz o resto da montanha. No trajeto até o hospital, colocam neles máscaras de oxigênio para limpar os pulmões dos perigosos gases inalados. Matheus perde os sentidos, mas é prontamente atendido.

No hospital, são examinados.  Matheus tem um rompimento em um tendão do joelho e Thiago, duas costelas quebradas e, pelo corpo, ambos sofreram várias escoriações. Mas os médicos os felicitam por estarem vivos. 

Dias depois os ousados rapazes se despedem da bela cidade. Matheus equilibra-se nas duas muletas pelo aeroporto.  Thiago empurra um carrinho com as duas mochilas.  Às vezes uma careta mostra a dor que sente pela fratura das costelas.  Parecem soldados, que voltam de uma guerra.  Afinal, quiseram desafiar o gigante.

Ao sobrevoarem a cidade, olham pela janela do avião o majestoso Etna, que agora, mais calmo, ilumina o céu noturno.  Entreolham-se sorrindo e fazem uma continência respeitosa ao velho vulcão. 

A incrível e perigosa aventura está ficando para trás, mas jamais a esquecerão.

 

 

 

 

 

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