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quinta-feira, 29 de abril de 2021

O CAPITÃO RAMOS - Claudionor Dias da Costa

 

 


O CAPITÃO RAMOS

Claudionor Dias da Costa

 

Esta história começa com Josué, homem forte, com mais de um metro e oitenta, pele morena enrijecida pelo sol em suas pescarias na luta pela sobrevivência dele e de sua família com esposa e quatro filhos.

Morava naquela ilha pequena, perdida a mais de uma hora de navegação do litoral com não mais do que duzentos habitantes que viviam basicamente da pesca e pequena agricultura.

Com quase sessenta anos, tornou-se um líder motivado por sua dura experiência de vida e sabedoria adquirida em conversas sozinho ou com poucos companheiros nas longas jornadas no mar. Era o Seu Josué Ramos, mestre navegador e amigo conselheiro para a gente do lugar. Conhecido por todos como o Capitão Ramos.

Naquele belo dia de outono, com seus dois fiéis companheiros Felício e Zé Pitéu, amigos de longa data, partiram para mais uma grande viagem em busca de pesca ambiciosa que ajudaria a suportar a vida por um bom tempo e alimentar a família e vizinhos.

Após uma semana, a pesca foi boa e propiciou uma carga bem grande que quase arriava aquela rústica embarcação como são todas a desses heróis anônimos pescadores valentes e esperançosos.

Radiantes viajavam cantando, porque  Zé Pitéu tinha grande repertório aprendido nas rodas de bar com os companheiros de cachaça e grandes filosofias.

E assim soltava a voz que encantava até as gaivotas:

− Vem comigo é só alegria nessa pescaria vamos viajar... Vida boa é pescar... Bem longe da cidade contemplando a mãe natureza com suas belas paisagens.

Aquela cantoria e os “causos” desses dois companheiros ajudavam a passar o tempo e traziam uma agradável sensação de conquista e realização.

O capitão Ramos, mesmo entretido naquele encontro gostoso com os amigos após o trabalho exaustivo da pesca, começou a se intrigar observando o horizonte ao sul. Aquelas nuvens mais escuras ao longe, não indicavam boa coisa. Experiente e tarimbado com sentido aguçado nos sinais do céu, sol, ondas e voo dos pássaros passaram a inquietá-lo.

Os companheiros entre alguns goles de cachaça para amenizar a viagem, não haviam percebido ainda.

 

Depois de algum tempo, virou-se para Felício e Zé Pitéu:

— Vejam ao longe... aquelas nuvens preocupam. E o vento passou a ser mais forte.

Concordaram com ele e passaram a ficar mais quietos e providenciar organização nos equipamentos, proteger apetrechos menores na pequena cabine do barco, amarrar as caixas dos pescados e outros objetos.

Sabiam que não viria boa coisa, pois já haviam passado por intempéries desagradáveis e não gostavam nem de lembrar.

E muito mais rápido do que imaginavam o tempo mudou e o vento forte assobiava trazendo uma tempestade violenta que começou a abalar a estrutura da embarcação, tornando-a instável e jogando-a em grandes saltos nas ondas gigantescas que se formaram.

Embora com medo, o sentido de sobrevivência falou mais rápido e procuravam um em cada ponta compensar os movimentos violentos que deixavam o barco parecendo feito de papel.

Os gritos e as chamadas de atenção do capitão pouco adiantaram e ficou ofegante quando em forte balanço viu Zé Pitéu cair no mar. O desespero de Felício o fez ir para o lado em que ele havia caído, mas, em novo solavanco, também foi jogado para fora.

Josué ficou apavorado e viu seus amigos desaparecerem ao longe com o barco à deriva em ondas gigantescas.

Nesse momento, só conseguiu se agarrar firmemente no mastro e com uma corda conseguiu se afirmar melhor.

Como num filme começou a vir em seus pensamentos a imagem da mulher e dos filhos, seguido de passagens de sua vida.

Antevendo que seria difícil se safar, olhou para o céu e rogou a Deus que o ajudasse.

Em constantes súplicas, resistiu firme na posição que estava e após algum tempo o vento e tempestade acalmaram.

Chegou após hora e meia à ilha, onde encontrou a família e vizinhos preocupados.

Exausto, mas aliviado, muito entristecido entre lágrimas contou o desfecho de Felício e Zé Pitéu o que deixou o pessoal arrasado.

No dia seguinte final de tarde, após homenagens aos amigos perdidos, sentou-se na praia a olhar o mar e com o coração apertado ainda, percebeu que dali a alguns dias deveria voltar a navegar e exclamou para si mesmo:

− É a vida ...a minha vida



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