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quarta-feira, 12 de setembro de 2018

INACREDITÁVEL - Hirtis Lazarin



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INACREDITÁVEL
Hirtis Lazarin

Dinho que já foi Nandinho e que nasceu Fernando foi abandonado num orfanato nos primeiros dias de vida.

A freira Tereza encontrou-o num carrinho confortável e preparado com todo cuidado.  Ao lado, uma mala com roupinhas finas e todo treco que um bebê necessita.

Aquela coisinha fofa causou um rebuliço no orfanato  Os indícios eram que pertencia a uma família abastada.  Nunca conseguiram localizar sua origem e Dinho cresceu ao lado de outras crianças sem família.

Ainda pequenino, já se sobressaia nas missas rezadas na capela.  Decorava num estalo as músicas cantadas e não desgrudava do moço do violão.

Na sala de aula, enquanto o professor ensinava, ele perdia-se em pensamentos que percorriam distâncias e os dedinhos tamborilavam na carteira.  E as lições... sempre incompletas.  Foi até diagnosticado como portador de "déficit de atenção".  Mas a freirinha Bety, sensível e observadora, corrigiu o falso diagnóstico, presenteando-o com um violão.  O menino sarou.

Dinho, o violão e a música nunca mais se separaram.

Corria solto por todos os cantos colhendo sons que a natureza lhe oferecia: pingos de chuva batendo no telhado, o farfalhar das folhas tocadas pelo vento, o canto afinado das aves (era apaixonado pelo bem-te-vi), o vento forte que arrastava coisas.  Sua inteligência musical permitia-lhe identificar sons, sequências musicais, ritmos e timbres.

Tudo se transformava em notas musicais que viravam melodias.  E as melodias eram reproduzidas no violão.  Dinho fazia o violão chorar ou cantar de alegria. Música e letra brotavam e germinavam sem o mínimo esforço. E os dedinhos, embora ágeis, ainda não conseguiam alcançar todas as cordas do violão.

Começou a ser convidado pra tocar em missas solenes.  Foi avaliado por "experts" em música.
 
Um menino prodígio.  Era muito mais que talento.  Era um dom. Talento a gente conquista com esforço e persistência.  Dom é nato, é dádiva, é presente.

Mas de onde veio esse garotinho tão valioso?  Quem seriam seus pais?  Que tristeza uma mãe não ter essa preciosidade em seus braços!  Foram várias tentativas pra encontrar essa família...

Bem longe dali, um homem morria num leito de hospital.  Sua filha Verônica, sua única companheira.

A doença consumia-lhe a carne e o remorso consumia-lhe a alma. Não morreria em paz.

Antes da hora derradeira, puxou a filha pra junto de si e balbuciou algumas palavras.  Ela aproximou-se mais até entender aquele emaranhado de sons.

Verônica deu um salto transtornada.  Passou da lucidez  à loucura, da razão à ignorância, do silêncio ao gemido de muita dor, do gemido ao choro compulsivo.

  Não podia acreditar que seu pai foi capaz de tamanha crueldade com ela, sua única filha.

Agarrou-o pelo pescoço como se fosse enforca-lo, mas o corpo já estava morto.

A moça partiu na mesma noite.  Engravidou jovenzinha.  O pai, rico empresário e conhecidíssimo na alta sociedade, não suportou a ideia de vê-la casada com um simples guitarrista de banda.  Levou-a pra bem longe e no hospital, após o parto, Verônica foi avisada pelo próprio pai que o bebê nasceu morto e com problemas na formação.  Não seria aconselhável, segundo os médicos, que ela visse o feto.

Ele desapareceu com a criança, abandonando-a num orfanato.

Incansáveis noites perdidas chorando pela perda do menino.  Quanto sofrimento por nunca tê-lo colocado no colo, nunca tê-lo abraçado.  Agora, finalmente, iria encontrar o seu menino, o Dinho, agora com oito anos.  A maior preocupação seria recuperar todo tempo perdido.

Verônica dedicava-se à música desde os cinco anos de idade e hoje é a primeira violoncelista da principal orquestra sinfônica do país.

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