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quinta-feira, 19 de abril de 2018

Que nem vela - Ana Catarina Sant’Anna Maués



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Que nem vela
Ana Catarina Sant’Anna Maués

   Ela era jovem ainda, mas de uma espiritualidade notável. Certo dia conversava com as amigas sobre futuro e o assunto foi indo e indo até a idade de noventa anos.
   Uma disse:
— Quando chegar nessa idade farei um testamento. Nele pedirei para ser enterrada com todas as minhas pérolas, pois terei inúmeros colares, brincos e braceletes. Amo pérolas!
   A outra tomando a palavra falou:
— Já eu distribuirei tudo o que acumularei. Rica, vou deixar meus sete filhos muito bem de vida.
   Nessa hora olharam Laurita e indagaram:
— E você?
   Ela, com olhar reflexivo, respondeu:
— Não é que eu tenha certezas e o que observo aconteça cem por cento, mas noto que a maioria das pessoas que passam a vida cultivando nobres sentimentos, dedicadas a viverem colocando-se em último plano, fazendo do exercício do perdão uma prática recorrente sempre desejando a conciliação, quando envelhecem não colhem para si, os frutos que pensavam ter plantado entre familiares, parentes e amigos. Nestes casos, a impressão que tenho, é que cada um, que conviveu com essa pessoa, viveu seguindo uma verdade individual, pouco valendo o exemplo e o esforço daquela que cedeu sempre em prol da paz.
   As duas amigas que escutavam o monólogo entreolharam-se e dialogaram entre si:
— O que?
   Do que ela está falando?
   Laurita continua:
— Meninas! Queria muito quando chegasse a noventa anos ter compreendido o sentido da vida. Mais do que a minha própria, entender o que ocorre com os relacionamentos humanos. Parece que se é um por dentro, cheio de boas intenções, mas não se consegue externar isso de forma clara, que transpareça o eu real, daí gera má interpretação com aqueles que se lida no dia a dia.
—Aff! Laurita, você é complicada.
— Não sou não! Explico novamente. As reais intenções de alguém não são captadas pelas pessoas do convívio, na forma que foram concebidas no interior, gerando erro de interpretação, por isso sofrimento na convivência fazendo o vínculo entre elas se destruir. Observo que as relações estão redondinhas, tudo corre perfeito, aí de repente algo acontece e tudo desanda tomando rumo imprevisível. Somos senhores de decisão e cada decisão alcança o outro e os demais numa reação em cadeia, empurrando ambos, anos luz do que estavam vivendo até aquele momento. Nesse sentido a vida é uma aventura onde o planejamento nem sempre dá certo. Gostaria com noventa anos ter encontrado o fio da meada desse assunto e poder ensinar todos que se aproximarem de mim. Alcançando este, esse, aquele que por sua vez entrará em contato com outro e outro e mais outro, para que evitem erros de relacionamento. Ser como vela, consumindo-me em luz.

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