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quarta-feira, 23 de maio de 2018

SEGREDOS TÊM PERNA CURTA - Hirtis Lazarin


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SEGREDOS TÊM PERNA CURTA
Hirtis Lazarin

Renata era a irmã mais nova de mamãe.  Dez anos de diferença.  Foi sem querer, sem planejamento dos meus avós.

Apressadinha, nasceu antes do tempo.  Uma luta até deixar o hospital.  Vingou forte e saudável.

Cresceu mimada e cheia de caprichos, como se a vida fosse extraída de romances hollywoodianos.

Desesperou-se quando soube que o príncipe desencantou e que no mundo há meia dúzia de castelos para turistas.  E que os homens não são heróis e nem usam capa e espada.

Sou uma adolescente observadora, curiosa e persistente.  Uma detetive improvisada.

Alguma coisa no comportamento da Renata me incomodava.

Um quê estranho no olhar, um desconforto quando papai e mamãe se acarinhavam.  Sua risada não era autêntica.   Não era um riso aberto, escancarado.  Era amargo e amarelo.  Escondia uma insatisfação constante. Suas palavras, muitas vezes, soavam falsas. 

Não queria saber de namorado e todos os rapazes eram cheios de defeitos.
  Muito estranho. Uma jovem de dezoito anos, com todos os hormônios em ebulição, não sentir atração pelo sexo oposto.  Faltava-lhe autenticidade.

Muitas vezes, trancava-se no quarto horas a fio.  Meu ouvido coladinho à porta ouvia soluços, palavrões, pensamentos entrecortados pensados em voz alta e até murros em móveis.

Que segredos seriam esses?

Minha curiosidade só crescia... Eu precisava explorar aquele universo enigmático.

Finalmente meu dia chegou.  Era um feriado prolongado.  Renata viajou com amigos e eu invadi o quarto secreto.  Pé ante pé...

Fucei todos os cantos, levantei lençóis, colchas e cobertores, abri armários e revistei roupa por roupa, remexi gavetas com cuidado pra não alterar a ordem dos objetos, virei malas e bolsas ao avesso, até caixinhas de bijuterias não escaparam.  E eu não encontrava nada. 

Desconsolada,  já desistindo, não sei por quê, pensei no casaco pesado próprio pra neve. Eu já havia examinado todos seus bolsos.  Seria uma intuição?

Retirei-o bruscamente do armário e não é que o bolso grande guardava uma caixinha... Uma caixinha decorada com coraçõezinhos pink, envolta e presa por fita de cetim.

Acomodei-me na cama, respirei fundo pra controlar a ansiedade e acalmar meu coração disparado pra quebrar.

Ou ali estavam guardados os segredos de tia Renata ou, então, seria o fim de uma busca malsucedida.

Abri com cuidado.  Dentro, uma simples caderneta. Folheando rápido, sem atentar ao conteúdo, havia muitas anotações e algumas fotos em tamanho reduzido.

Comecei a ler. Já na primeira página, quase enfartei. Continuei com a leitura. A cada página, uma decepção maior que a anterior.  

Sentia raiva, muita raiva.  Renata era louca ou estava ficando?

Chorei, gritei, esperneei, soltei todos os palavrões que mantive aprisionados.

Ao término, meu primeiro impulso era pra rasgar a caderneta em mil pedacinhos e queimar.

"Não posso.  São minhas provas".

As dúvidas eram tantas!  Mostrar à mamãe?  Guardar segredo?  Falar com a Renata? Eu não estava em condições de decidir...

Sabem as fotos?  As fotos eram do Vitor. E até um acróstico ela fez para o Vitor!

"Vivo perdida em você
Isso me enlouquece, me tortura
Tanta dor, sofrimento, por quê?
O seu corpo, a sua boca, uma pintura
Rendo-me, entrego-me
   Sou toda sua."

Eu estava arrasada, indignada.

Vitor é o meu pai.

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