SANGUE FRIO E
PENSAMENTO RÁPIDO
Do
Carmo
Depois de um dia estafante de trabalho, chuvoso,
super abafado e tendo que enfrentar um congestionamento insuportável, cheguei
em casa. Foi com alívio que tranquei a porta decidida a tomar um reconfortante
banho e desmaiar na cama.
Deixei como de costume o chaveiro com as chaves do
carro, do escritório e da porta de entrada, na própria porta, pendurada na
fechadura. A bolsa e minha pasta deixei-as em uma cadeira ao lado de um
console, logo perto da entrada. Sem notar nada de diferente que pudesse chamar atenção, fui para a cozinha, preparei um
capuccino na minha canequinha preferida, e fui para o quarto. Só então notei a
luz acesa.
A Eliana esqueceu de apagá-la. Mais um passo e vejo
a porta do armário aberta, e para meu espanto, refletido no espelho da porta,
um homem deitado de costas embaixo de minha cama.
Não sei como não gritei tal o pavor que senti. Sem
fazer nenhum movimento que demonstrasse minha descoberta, fingi pensar em voz
alta:
-
Vou pedir uma
pizza, estou com preguiça de cozinhar, e nada mais agradável que pizza e uma
taça de bom vinho.
Então, fingindo tranquilidade, peguei o telefone,
liguei para a polícia. Com voz firme e determinada, disse:
-
Senhor, eu estou
na Rua Tulipa nº 508 apto 13 eu preciso que entregue uma pizza com a máxima
urgência.
Asperamente o policial disse que brincadeiras dessa
espécie eram abomináveis, mas eu rapidamente, sem que ele tivesse chance de
falar ou desligar, eu continuei:
- Eu
preciso que o senhor entregue logo, estou ficando com muita fome, não gosto de
esperar. Ele meio desconfiado responde:
-
A senhora está em
apuros?
-
Exatamente,
senhor, que bom que o senhor falou esse sabor, venha rápido, por favor, vou
esperá-lo na porta.
-
Desliguei o telefone e continuei tomando o capuccino,
que quase não descia pelo rochedo da garganta de tão seca que estava. Mas
sorridente comecei a cantarolar, embora meu coração batucasse e quase saltasse
pela boca: PARA LÁ TIM BUM, BUM, BUM, PARA LÁ TIM BUM, BUM, BUMBUUUUM para
demonstrar descontração. Certamente esse bandido era o fugitivo assassino
procurado.
Decorridos alguns minutos, que demoraram séculos a passar,
ouvi Pirrimmmmm, o mais alegre que jamais ouvira e rapidamente fui até a sala e
com mãos tremulas destranquei e abri a porta, dando passagem a quatro policiais
fortemente armados, que silenciosamente dirigiram-se ao quarto iluminado e eles
aprisionaram o fugitivo, sem que ele tivesse tido tempo de tentar escapar.
Aos empurrões, saiu gritando que voltaria e aí sim,
eu veria o que é ser enganado por uma moça azeda.
Seu olhar de fio de navalha escurecia seu rosto
jovem e bonito, que mostrava não ter
mais de vinte anos. Ainda com olhar cortante pelo ódio, voltou-se para mim e
explodiu em blasfêmias. Entrou na viatura gritando que voltaria.
Desabei na cama e chorei de agradecimento a Minha
Mãe Santíssima.
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