A
escolha
Adelaide
Dittmers
Silas
olhava pela janela perdido em pensamentos. A chuva tamborilava na vidraça. Sempre adorava sentir o barulho das águas,
que desciam como bênçãos do céu, acalmando-o e deixando-o entorpecido. Hoje, porém, não conseguia amenizar sua
ansiedade e preocupações. Acabara de se
aposentar e sua renda não cobria as despesas rotineiras. Dívidas estavam se acumulando. Além disso, o casamento de mais de trinta
anos desmoronava-se a cada dia. Sua
esposa adorava fazer compras e viagens, acusando-o de ser um fracassado. A separação pioraria ainda mais sua situação.
O
toque do celular assustou-o e despertou-o da absorção. Número desconhecido, e
se fosse uma cobrança, mas ponderou que seria melhor saber do que se tratava.
Do outro
lado da linha, uma voz masculina, de maneira muito educada o convidou para uma
reunião no dia seguinte, que seria muito importante para ele.
Admirado
e impulsionado por uma grande curiosidade, porque o homem sabia tudo sobre suas
dificuldades, ele aceitou ir ao encontro.
Às
três horas da tarde do outro dia, chegou ao lugar indicado. Uma construção de arquitetura
arrojada erguia-se à sua frente. Entrou com passos lentos e indecisos, e
deparou-se com um amplo saguão, onde se viam câmeras e telas com várias
informações. Não havia recepcionistas, mas uma voz robotizada perguntou o seu
nome e o orientou o caminho a seguir para a sala de reunião.
Espantado
e confuso seguiu a indicação daquela voz.
Percorreu um corredor e ao fundo um homem de jaleco branco já o
esperava. Cumprimentaram-se secamente e
entraram em uma sala, que parecia um laboratório, com balcões cobertos por
frascos e paredes forradas de prateleiras repletas de livros. O homem convidou-o a sentar-se à frente de
uma escrivaninha branca, coberta por um vidro e com vários aparelhos
estranhos. Curioso, observou-o atentamente,
tinha cabelos grisalhos, óculos e olhar intenso, nem a sombra de um sorriso se
projetava em sua face.
Com
uma voz pausada, começou a explicar-lhe o que queriam dele. Apresentou-se como cientista chefe da
organização, que era um laboratório de pesquisas avançadas e vanguardistas,
onde realizavam experiências tão impactantes, que não podiam ser do
conhecimento público.
Explicou-lhe
que o escolheram porque sabiam de seus problemas e que esse conhecimento fazia
parte dos recursos tecnológicos de que dispunham.
Silas
estava cada vez mais assustado e aturdido com tudo o que ouvia. O que será que queriam dele?
O
homem de jaleco branco chamou, então, por um comunicador uma pessoa e uma bela
mulher entrou na sala e o cumprimentou, sentando-se em uma cadeira próxima ao
chefe.
Nesse
momento, o cientista começou a explicar o motivo do convite a Silas àquela
reunião.
Estavam
desenvolvendo uma pesquisa ultra-secreta, em que rejuvenesceriam o físico da
pessoa em cerca de trinta anos. A
memória, no entanto, permaneceria e era uma mudança irreversível. Essa pessoa seria monitorada e era proibida
de contar a alguém ao que estava se submetendo.
Forjariam a morte dela para disfarçar seu desaparecimento
repentino. O prêmio seria cem milhões de
dólares, uma mansão equipada, um avião particular e carros a escolher, e seria servido
por empregados particulares. Se ele não
aceitasse o que lhe estavam oferecendo, teria que manter segredo pelo resto da
vida e tinha três dias para dar uma resposta.
Silas
estava atordoado, não conseguia articular uma palavra. Sua expressão era de uma completa
confusão. Seria isso um sonho ou um
pesadelo?
A
moça permaneceu em silêncio e no fim da explicação, sorriu-lhe simpaticamente.
Pareceu-lhe que ela era mais humana que o chefe.
Silas
levantou-se com dificuldade e como um autômato despediu-se dos dois com apertos
de mãos.
Naquela
noite, não conseguiu pregar o olho.
Levantou-se e foi até a sala.
Olhou cada detalhe, cada quadro, cada objeto. O que faria? Ficar trinta anos mais jovem,
milionário e livrar-se de seus problemas pessoais não era uma má idéia. Seu
coração galopava no peito, enquanto passeava pelo cômodo.
Na
manhã seguinte telefonou ao seu único filho e marcou um almoço. Quando o filho chegou ao restaurante, foi
surpreendido por um forte e afetuoso abraço do pai. Era um bonito rapaz de
trinta anos, de olhar meigo e tranqüilo.
Muito parecido com ele nessa idade.
-Aconteceu
alguma coisa, pai? Você está bem?
-
Estou. De repente fiquei com saudades de
você.
-
Nos vimos há dois dias. Você está doente?
-
Não. Fique tranquilo. Coisas de um velho de sessenta anos.
-
Mas ter sessenta anos não significa velhice.
Sentaram-se
à mesa, conversando e rindo felizes. Eram muito amigos. O moço estava contente
de ver o pai alegre. Ultimamente o via sempre muito calado e desanimado. Estava mais envelhecido, os cabelos tinham
ficado brancos, mas mesmo assim era um bonito homem.
No
fim do almoço, Silas abraçou o filho calorosamente, escondendo uma lágrima, que
teimosamente surgiu em seus olhos. O
jovem estranhou a emoção do pai. O que estaria acontecendo com ele? Aquele almoço parecia uma despedida.
Ao
chegar à casa, a esposa estava zangada porque a máquina de lavar roupa tinha
quebrado e começou a reclamar que não podiam consertar por falta de
dinheiro. Silas, pacientemente, lhe
disse que mandaria consertar e nesse momento a decisão estava tomada. Iria
aceitar ser cobaia daquela pesquisa científica.
Na
manhã seguinte, pegou as chaves de casa, a carteira de dinheiro com as
fotografias da família, o celular, tirou a aliança do dedo e colocou-a na
carteira. Entrou na cozinha, onde a
mulher fazia o café da manhã. Olhou
longamente para a companheira de tantos anos e pensou tristemente no que
sobrara daquele amor dos primeiros tempos, apenas desentendimentos, indiferença
e cansaço. Lúcia era uma boa mulher, mas nos últimos anos se tornara amarga e
distante.
-
Não vou tomar café!
-Por
que? Vai sair?
-
Tenho um compromisso com um amigo. E num impulso beijou-a na testa e passou a
mão pelas suas faces.
Ela
estranhou o comportamento do marido. Há tempos que ele não a acarinhava.
Momentos
depois estava a caminho do laboratório.
Um vendaval de pensamentos varria sua mente. Uma torrente de emoções contraditórias
chocava-se dentro dele. Tinha que ter coragem,
a vida não estava lhe oferecendo nada de bom.
Não tinha objetivos nem esperança de alcançar os sonhos da
juventude. Agora estava diante da
oportunidade de voltar a ser jovem e milionário, mas com a experiência colhida
durante anos, que o ajudaria a conquistar tudo o que jamais conseguiu.
Quando,
no entanto, chegou e estacionou seu velho carro, uma onda angustiante o
tomou. Estaria agindo de maneira
certa? Amava seu filho e lá no fundo
também amava aquela mulher rabugenta.
Ligou o carro, mas desligou novamente. Não, tinha que ser forte. E
decidido, saiu do carro.
Entrou
no saguão e surpreendeu-se ao ouvir a voz metálica do recepcionista robótico
ecoar pelo recinto.
-Favor
dirigir-se à sala do Dr. Francisco. Dra.
Martha e ele o esperam.
Como
eles sabiam que tinha chegado. Não os
avisara. Era tudo muito estranho,
surreal mesmo.
Os
dois cientistas vieram recebê-lo. Um
meio sorriso despontava em suas faces, enquanto os olhos permaneciam
sérios. Perguntaram-lhe se estava
disposto a submeter-se à experiência e depois de um breve silêncio, respondeu
que sim.
Então
explicaram que medicações iriam ser aplicadas diretamente em suas veias até a
manhã seguinte e que iria ser mantido sedado por vinte e quatro horas, quando
acordasse estaria de volta aos seus trinta anos. Nesse período estaria inserido em um grande
tubo e todo o seu processo metabólico seria controlado.
Silas
soltou um grande suspiro. Estava com
muito medo, mas tinha chegado até ali e não voltaria atrás.
Encaminharam-no
para um quarto em que havia uma cama e vários aparelhos. Mostraram-lhe um biombo, onde deveria se
despir e colocar um camisolão branco e explicaram que quando voltasse a si, lá
estariam roupas novas para ele vestir e iniciar a nova vida. Pediram para que o
celular fosse deixado com eles.
Como
iria conservar os objetos, que trouxera sem que fossem percebidos. Na parte de trás do biombo, viu um pequeno
banco de madeira. Tinha certeza que câmeras
o espiavam, então ao tirar a roupa, disfarçadamente escondeu os objetos embaixo
do banco.
Quando
saiu, Dr. Francisco lhe estendeu um contrato, com todas as exigências assumidas
ao se submeter à pesquisa e a total confidencialidade a respeito de sua
transformação. Assinado o documento, ele
deitou-se na cama. Espetaram-lhe uma
agulha e de uma garrafinha começou a gotejar uma droga relaxante e outra para
prepará-lo para a substância que o levaria de volta à mocidade.
No
dia seguinte, durante quatro horas recebeu a droga de sua transformação. Pelas vinte e quatro horas seguintes ficou
sedado. Ao acordar, enxergou dois vultos
ao seu lado, que pouco a pouco, foram se tornando nítidos. Atordoado, precisou
de algum tempo para se lembrar porque estava ali. Tentou se mexer, mas vários eletrodos
ligavam-se ao seu corpo.
Os
cientistas sorriram para ele.
-
Você está bem? Perguntou o Dr. Francisco.
-
Mais ou menos. Estou tonto. Por que
estou ligado a esses aparelhos?
- A tontura vai logo passar e os eletrodos
estão controlando o funcionamento de todos os seus órgãos. Está tudo bem. A experiência foi um sucesso e
agora você é um jovem de trinta anos.
-
Quando vou poder me levantar?
-
Vamos desligar os aparelhos e você ficará deitado por uma hora. Será avaliado e depois
...
vida nova!
Mais
tarde levantou-se e surpreendentemente estava se sentindo ótimo. Seguindo a indicação do pesquisador foi até o
biombo. Um grande espelho tinha sido
colocado ali. Refletido nele havia um
bonito jovem. Não era possível. Passando a mão pelos cabelos agora negros novamente,
começou a admirar seu próprio rosto. Tirou o camisolão, jogando-a no chão. A barriga proeminente desaparecera e um corpo
atlético refletiu-se no espelho.
-
Esse sou eu agora, pensou. Era difícil
acreditar em tudo o que estava acontecendo. Vestiu-se lentamente. As roupas eram bonitas, de marcas caras. Ao
se vestir, lembrou dos objetos escondidos.
Discretamente, olhou debaixo do banco e lá estavam eles, não tinham sido
achados. Pegou-os e guardou-os nos bolsos.
O
homem, que saiu detrás do biombo, provocou um ohhh!... de admiração dos
cientistas. A dra. Martha não se
conteve:
-
Você está lindo! E lhe deu um abraço.
Vai conquistar muitas mulheres!
Os
dois o acompanharam até o estacionamento e ele perguntou:
-
Cadê meu carro?
-
Seu carro sofreu um acidente grave, pegou fogo e para todos você morreu
carbonizado.
-
Que horror! Seu rosto franziu em uma
expressão de desespero. Minha família
deve ter levado um grande choque.
Coitados!!
-
Foi o combinado, não é?
O
rosto do rapaz nublou-se de tristeza.
- E
agora para onde vou?
- O
motorista o levará à sua nova casa e a sua nova vida.
Despediram-se,
avisando-o que teria que retornar para exames mensalmente.
Silas
entrou no carro. Tudo parecia
diferente. As casas e as ruas passavam velozmente. Apalpava seu peito, seu corpo. Estaria sonhando?
O
motorista entrou em uma rua arborizada, cujas calçadas eram rodeadas por
plantas floridas e onde grandes mansões desfilavam magníficas e imponentes. Parou em frente a uma delas e deu uma chave a
Silas.
-Esta
é sua casa. Boa sorte, rapaz!
O
jovem desceu do carro estupefato. Um
grande portão com uma guarita ao lado estava diante dele. Quando se aproximou, o portão se abriu. Um porteiro acenou-lhe de dentro da
guarita. Ele entrou. Um vasto jardim estendia-se até a casa,
forrado por um extenso gramado salpicado por canteiros de flores.
Com
passos lentos, atravessou o jardim, sorvendo toda aquela beleza. No lado esquerdo, uma piscina brilhava com os
reflexos do sol. Chegou à porta
principal da casa e uma jovem serviçal já o estava esperando.
A
moça o introduziu na grande sala, decorada com móveis modernos e tapetes persas,
e foi lhe mostrando cada cômodo. Na
cozinha, uma senhora simpática preparava o almoço e lhe deu as boas
vindas. Subiram pelas largas escadas e
ele foi levado ao seu quarto, composto de banheiro e um imenso closet, repleto
de roupas. Tudo estava mobiliado e arrumado
primorosamente. Silas estava
boquiaberto. A moça saiu, deixando-a à
vontade.
Aproximando-se da grande cama de casal, notou
no criado-mudo um envelope lacrado endereçado a ele. Curioso, abriu-o e encontrou um bilhete:
¨Aqui estão seus novos documentos. ¨ Com mãos trêmulas pegou-os e ali estavam
carteira de identidade, CPF e até uma nova carteira de habilitação. Leu o nome nos documentos. Agora ele chamava-se Sérgio Figueiredo. Como conseguiram tudo isso? ¨Ah¨, pensou.
¨Com dinheiro tudo se consegue¨.
Foi
até uma larga porta, que levava a uma sacada e aspirou o ar fresco da
manhã. O coração descompassado pulsava
desvairado, diante de tantas emoções contraditórias. Era agora um homem de trinta anos, sem
família, com um passado trancado dentro dele...e sem saber direito que rumo
tomar.
Os
dias foram passando e ele se esforçava para aceitar a nova vida. Tinha tudo o
que queria. Era servido como a um
rei. Desfrutava de um conforto, que
nunca sonhara ter. Dirigia os carros
mais desejados por todos. Entretanto,
uma solidão avassaladora invadia o seu ser.
Uma
noite, então, resolveu sair e ir a uma discoteca para se divertir e encontrar
outros jovens como ele agora era.
Entrou
timidamente no lugar. A pista de dança
estava cheia e a moçada dançava solta ao som de batidas muito altas de uma
música estranha aos seus ouvidos. O
ambiente era meio escuro, com luzes coloridas, que piscavam
incessantemente. Fechou e abriu os
olhos, incomodado com isso.
Foi
até o balcão de bebidas e pediu um drinque.
Tinha que vencer a timidez e o estranhamento daquela situação nova e
desafiadora.
Uma
bela jovem aproximou-se dele com um copo na mão.
-
Olá! Está sozinho? Perguntou,
lançando-lhe um sorriso.
-
Estou! Respondeu desconfortável.
-
Carolina! Apresentou-se. E ela tocou o copo dele em um brinde.
-
Si...Sérgio. Respondeu atrapalhado e pouco à vontade.
Entabularam
uma conversa. Carolina era extrovertida
e divertida. Silas, agora, Sérgio
tentava acompanhar a moça, mas não entendia as novas gírias e o jeito diferente
dos jovens modernos. Muitos anos o separavam dessa nova realidade.
De
repente, a moça colocou o copo no balcão e o puxou para a pista. Uma expressão de pavor apareceu no rosto do
rapaz, que tentou disfarçar sua confusão e tropeçando lá foi ele para a fervilhante
pista. Aos poucos foi se soltando e dançaram e se divertiram pelo resto da
noite.
Na
hora de se despedir, a moça premiou-o com um longo beijo e convidou-o para ir
ao seu apartamento. Ele disfarçou o
espanto. No seu tempo, esse comportamento
já começava a acontecer com os mais ousados, mas era o homem que fazia esse
tipo de convite e não a mulher.
Quando
Carolina viu a Porsche novinha do rapaz, não se conteve:
_
Cara, além de lindo, você é abonado!
- Um
pouco! Respondeu atrapalhado.
Chegou
em casa na hora do almoço. Pediu que o
servissem à beira da piscina e enquanto descansava, depois da lauta refeição,
pensava em tudo o que estava acontecendo.
Como
um clarão, os pensamentos voaram para a antiga família. Como estaria seu filho e sua mulher? Sentiu
uma dor, que lhe invadiu até o mais recôndito do seu ser. Sacudiu a cabeça, expulsando os sentimentos
de tristeza, que queriam dominá-lo.
Agora era um homem rico. Tinha
que aproveitar a nova vida e sorvê-la ater o último gole.
Nos
dias, que se seguiram, teve vários encontros com Carolina, mas começou a se
cansar dela. A experiência de vida, que ele carregava, não combinava com a
dela. Estava cansado dela. Terminaram o
namoro.
Muitas
outras mulheres atravessaram o seu caminho. Queria relacionamentos curtos e uma
vida despreocupada. Não queria, nem
conseguia se aprofundar em nada. Várias festas e viagens preenchiam os seus
dias.
Passou-se
um ano e certa manhã, sentado no belo jardim da casa, um forte sentimento de
solidão o invadiu. Tinha muito dinheiro.
Tudo o que desejasse, vinha às suas mãos. Percebeu que o esforço para conquistar um
objetivo era motivador e dava prazer à existência.
Tirou
do bolso a velha carteira com as fotografias da família e as chaves da antiga casa.
Fitou as fotos por um longo tempo e apertou as chaves em sua mão. Uma saudade
intensa o assaltou e o surpreendeu.
Levantou-se
e resolveu voltar à cidade em que vivera para, pelo menos, observar alguém da
família de longe. Duas horas depois
chegou perto da casa do filho. Era um
domingo. Um táxi parou na frente da casa
e sua mulher saltou para a calçada.
Deixara de pintar o cabelo, que estava grisalho e quando se virou para
fechar a porta do carro, notou nela um semblante fechado e entristecido.
Logo
o filho veio receber a mãe com um sorriso amoroso no rosto. Como eram
parecidos! Desde pequeno era ele em miniatura.
Remorso
e melancolia tomaram seu coração. Tivera
uma família, dificuldades e lutas, mas era a sua vida. Perdera tudo, só lhe
sobrara dinheiro e amigos e amigas, que, talvez só se interessassem por ele,
por saberem-no muito rico.
Naquele
momento, daria tudo para ver sua mulher carregada de sacolas de compras,
conseguidas com o parco dinheiro que lhe dava.
Voltou
para casa com um imenso peso na alma e um arrependimento, que sabia tardio,
invadiu-o, como um tsunami invade e arrasa tudo à sua volta.
Vagou
pelo quarto, sem conseguir dormir, a noite inteira. Levantou-se muito cedo. Tinha tomado uma
decisão. Sentou-se à escrivaninha de seu quarto e redigiu um testamento, em que
deixava metade de sua fortuna para a antiga família e a outra metade para seus
empregados e instituições de caridade.
Quando terminou estava sereno.
Saiu
e foi a um tabelião registrar o legado. Voltou à casa e passou o dia passeando
pelo jardim. Um pássaro passou voando e
ele olhou-o tristemente, invejando a sua liberdade.
No
jantar, convidou os empregados a sentarem-se com ele, o que causou um grande
espanto em todos. Ele era um bom patrão,
gentil, educado e os tratava muito bem e com respeito, mas não esperavam esse
convite. O jantar pedido por ele à cozinheira era um prato, que ele adorava,
quando criança.
Depois
do jantar, subiu para o quarto, seu rosto parecia iluminado por uma
tranqüilidade nunca sentida.
Na
manhã seguinte, como já era quase meio-dia e Sergio não tinha aparecido para
tomar o café, a camareira bateu à porta do quarto e não houve resposta. Preocupada abriu a porta e lá estava Sergio
ou Silas, sem vida, ao lado de um vidro de comprimidos.
A
escolha fora feita.