A ÚLTIMA CARTA
Helio Fernando Salema
A ÚLTIMA CARTA
Helio Fernando Salema
Ainda sentada em frente ao gerente do Banco, Adélia viu,
no seu celular, a mensagem de D. Mercedes, a governanta, de que o agente dos
correios havia deixado um envelope. Despediu-se do gerente e saiu apressada
para pegar o táxi.
Durante a viagem, ideias não muito boas brotavam na sua
mente. Não só pela conversa com o gerente, mas também com relação ao envelope. Ao
chegar, desceu do táxi e foi logo abrindo a bolsa para pegar as chaves. Não
conseguindo segurá-las com firmeza, deixou-as cair sobre a grama. Ao abaixar,
sentiu-se tonta. Sentou-se no chão. Com as mãos nervosas, pegou o chaveiro. Em
seguida, respirou aliviada, levantou-se, lentamente. Ao sentir a firmeza das pernas,
caminhou com muito cuidado, mantendo as chaves prontas para abrir a porta.
Ao entrar, passou pela mesa, percebeu o envelope, olhou e
dirigiu-se para a cozinha. Tomou o remédio que ficava no armário. Após ingerir
o comprimido, continuou absorvendo pequenos goles de água. Sabia que D.
Mercedes tinha ido ao médico e que, certamente, demoraria.
Ao pegar a carta viu que a remetente era sua nora e o
endereço uma pequena cidade no interior do Canadá. Achou estranho que não fora
escrita pelo seu único filho.
Minha
querida sogra. Inicio esta carta com uma boa notícia. Seu neto nasceu há duas
semanas. Está ótimo. Recebeu o mesmo nome do pai. Devido a uma forte nevasca,
ficamos sem comunicação, por isso não pude me comunicar com a senhora antes.
A
notícia ruim é que eu estava em casa sozinha quando começaram as dores do
parto. Liguei para a empresa e o meu marido pegou a moto e veio para me
socorrer. Infelizmente, a moto foi atingida por um carro. Os vizinhos me
socorrem e fui levada ao hospital. Fui submetida a uma cesariana. Fiquei por
uns dias em estado de choque. Os médicos não deixaram que eu fosse ao velório.
Disseram-me que a urna estava lacrada. Somente na semana seguinte, eu recebi
alta do hospital junto com meu filho.
Hoje
mais calma, decidi informá-la da tragédia e dizer que vou continuar morando
aqui e vou fazer tudo que meu marido sonhava para o nosso filho. Seu neto irá
estudar no colégio que o pai escolheu. Se a senhora não puder vir, farei o
possível para um dia levar seu neto para a senhora conhecê-lo. Na próxima carta
lhe enviarei fotos dele.
Antes de concluir a leitura, o celular toca. Adélia
coloca a carta sobre a mesa e atende à ligação:
— Dona Adélia, aqui é o gerente de sua conta. Assim que a
senhora saiu, conclui o documento do seguro de vida da senhora para o seu filho,
só falta a senhora assinar.
Ela, com a voz trêmula:
— Não é mais necessário…