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PERSONAGEM OCULTO
O que é um personagem literário?
É o ser fictício responsável pelo desenrolar dos acontecimentos da narrativa. Ou seja, é quem produz efetivamente as ações no interior das obras literárias e, por consequência, sofre os efeitos gerados pelos eventos da trama.
Personagem
pode ser um animal, uma pessoa, ou até mesmo um objeto, desde que apresente
características humanas. Além de serem encontrados na literatura, os tipos de
personagens também estão presentes no cinema, teatro, televisão, desenhos etc.
Tipos de
personagens
· PROTAGONISTA - também conhecido
como personagem principal;
(o herói, por exemplo)
·
ANTAGONISTA - personagem contrário ao
protagonista; (o vilão)
· PERSONAGENS SECUNDÁRIOS - conhecidos como coadjuvantes, aqueles que não fazem parte da trama principal.
Hoje
vamos tratar um personagem que não faz parte fisicamente da história, mas que é
capaz de MOVIMENTAR as ações dos personagens: PERSONAGEM OCULTO. Quando empregado, ele é muito importante para o
desenrolar da trama. Não, necessariamente, é revelado fisicamente, isto é, ele
pode não aparecer nas cenas, mas ele é o responsável pelas tomadas de atitudes
dos personagens. Sua presença é marcada através da fala dos outros personagens,
ou sombras que surgem aleatoriamente. Há situações em que os outros personagens
até criam pequenas características para ele. É alguém de quem se fala. Exemplo
o Sr. Brown em O inimigo Secreto:
O INIMIGO
SECRETO (Agatha Christie): Cansados da rotina, dois jovens decidem fundar uma
empresa nada convencional, especializada em investigações, a Jovens
Aventureiros Ltda. O primeiro caso era um desafio que intrigava a Scotland
Yard: uma jovem americana desaparecera, levando com ela documentos secretos que
poderiam comprometer o governo inglês. Mas Thomas Beresford e Prudence Cowley —
ou simplesmente Tommy e Tuppence — não são os únicos interessados em descobrir
o paradeiro desses papéis. A mesma busca é empreendida por um homem misterioso
e perigoso, conhecido como Sr. Brown, um mestre na arte do disfarce, que pode
aparecer do nada e desaparecer em seguida sem deixar qualquer rastro.
Criação número 1: CRIAR UM CONTO ONDE UM PERSONAGEM OCULTO É
RESPONSÁVEL PELAS TOMADAS DE DECISÕES DOS PERSONAGENS DA HISTÓRIA.
Criação número 2: DESENVOLVER UM CONTO CUJO PERSONAGEM OCULTO SEJA UM PATRÃO SEVERO QUE NUNCA APARECE, MAS QUE DTERMINA MUDANÇAS FÍSICAS NO DEPARTAMENTO, E COMPORTAMENTAL NAS PESSOAS.
Para este conto devem-se inserir ferramentas literárias: Fluxo de pensamento, Metáforas e Antíteses.
Cruz Preta
Adelaide
Dittmers
Padre
Francisco gostava de se postar à janela da torre da igreja ao cair da
tarde. As pequenas casas, que debruavam
as estreitas ruelas ficavam douradas pelo sol poente, o que escondia o desgaste
das paredes mal pintadas daquelas construções, cujos moradores tinham que se
conformar com a simplicidade de viver com o parco dinheiro, que lhes vinha de
um trabalho duro e extenuante.
Gostava
do observar as pessoas arcadas pelo cansaço, que voltavam para seus lares e
suas carências.
O
seu olhar alcançava e se detinha na velha Rua da Cruz Preta, assim chamada por
causa de uma grande e famosa cruz de ferro, que estava presa à fachada de uma
casa assobradada, que era a maior e mais bem conservada do lugar, moradia de um
endinheirado comerciante.
A
monotonia da ruela era quebrada pela algazarra dos estudantes, que por ali
passavam, espalhando suas juventudes e irreverências pelo lugar. Detinham-se à frente da casa da cruz preta
para admirar e atirar galanteios a uma jovem, que todos os dias debruçava sua
beleza em uma das janelas, derramando
sobre eles um olhar triste, mas ao mesmo tempo cobiçoso, prisioneira que se
sentia das normas rígidas daqueles tempos. Muitas vezes ela se escondia atrás
da grossa cortina da janela e o padre de seu posto de observação matutava se
era por timidez ou um jogo de sedução.
Padre
Francisco conhecia a família de longa data e observava esse movimento à frente
daquela janela com muito interesse.
Afinal era o pastor daquelas almas.
No
meio do grupo barulhento, um rapaz se destacava pela constância da presença e
por ficar ali parado, olhando para a janela, mesmo depois do grupo seguir seu
caminho. Abria os braços e depois colocava as mãos sobre o coração para
demonstrar à jovem seu interesse por ela. Algumas vezes entoava uma canção e se
despedia se curvando em um gesto de respeito e admiração.
Certo dia, o padre viu uma flor ser jogada e
alcançar a janela. A moça a pegou e a
prendeu nos longos cabelos negros. Com o
passar do tempo notou que a mucama, que criara a jovem desde pequena, saia à
porta com pedaços de papel, que eram trocados por outros, que o rapaz entregava. Cada vez mais Padre Francisco ficou
interessado em controlar o que acontecia naquela casa.
Em
um frio e chuvoso crepúsculo, em que a garoa toldava sua visão, o sacerdote
alcoviteiro arregalou os olhos ao ver o estudante escalar a enorme cruz
escorregadia pela água fina que caia.
Como
um tufão desceu as estreitas escadas da torre.
Aquilo não podia acontecer.
Era contra as leis da igreja. Ele tinha que defender a moral de seu
rebanho. Nunca permitiu o desvio para o
pecado de seus membros. Sempre lutou
pelo bom comportamento de seu povo.
Saiu
da igreja indiferente à garoa, tropeçando nos desníveis das ruas de terra
molhadas e lamacentas. A grande barriga
sacudia-se com a corrida e a boca abria-se a cada respiração para recuperar o
fôlego.
Chegou
à casa e bateu palmas com as forças que lhe restavam. A mucama o atendeu e
espantou-se com a presença molhada, esbaforida e inesperada do padre.
Ele
entrou e sem cerimônia jogou-se em uma cadeira exausto. Os donos da casa assustaram-se ao vê-lo, que
com palavras atabalhoadas relatou o que vira.
O pai galopou pelas escadas acima.
O rosto vermelho de raiva. Gritos foram ouvidos. Momentos depois, a moça chorosa foi arrastada
escada abaixo pelo pai furioso. Atrás, o
rapaz seguia-os com a mão no rosto em que se viam marcas de dedos causadas por
um bofetão que levara.
O
casal confessou que se amava e a jovem aos gritos jogou sua revolta por ser
sempre vigiada e sempre ser tratada com
uma rigidez férrea pelos pais, que não queria enxergar que ela não era mais uma
criança. Depois de uma acalorada
discussão, foi determinado que teriam que se casar o mais depressa possível.
Essa decisão foi recebida com uma alegria disfarçada pelos dois amantes.
Terminada
sua missão, padre Francisco despediu-se da família, depois de dar um sermão aos
jovens.
No
caminho de volta, a garoa ainda caia e espalhava-se pela ação do vento
frio. O padre caminhava meio encurvado
para evitar as gotas, que teimavam em molhar seu rosto e obscurecer sua visão. Era
atropelado pelos pensamentos, que surgiam fortes e que ele queria expulsar, mas
não conseguia. Queria que a chuva
lavasse sua alma do que estava sentindo.
Sempre
fora austero ao julgar as fraquezas humanas e por que agora ao ver o casal tão
feliz ao conquistar a aceitação de seu
amor, sentia uma grande e incompreensível inveja, que lhe corroia o
coração. O que lhe estava acontecendo. Pensou nas tardes, em que da janela,
observava a vida que passava lá embaixo, modorrenta, mas viva. Descobriu em um
lampejo que sempre almejara aquela liberdade.
Chegou
à casa paroquial angustiado. Subiu para o quarto e depois de se trocar e se
secar, ajoelhou-se em frente a uma cruz pendurada na parede fria e pediu a Deus
que o perdoasse pelos pensamentos pecadores. Permaneceu em oração por um longo
tempo.
Cansado,
deitou-se na cama e adormeceu.
E
sonhou que estava escalando a enorme cruz preta...
ERA UM SEGREDO
Hirtis
Lazarin
Estou no meu quarto trancado, revirando meu
pensamento sobre o que papai me confidenciou ontem. Um segredo que ele guardou
a sete chaves, durante quarenta e nove anos. Incumbiu-me de uma missão que
deverei cumprir assim que ele se for. Espero que isso demore a acontecer. Não
estou preparado pra viver sem a sua presença.
Hoje
ele tem sessenta e cinco, mas aparenta idade bem mais avançada. A pele clara
está mais enrugada do que deveria. Os olhos perderam o brilho e, por trás das
lentes grossas dos óculos, esconde a falta de vontade de viver.
Li
um poema, não guardei o nome do autor. Ele esclarece, com muita sabedoria, a
diferença entre ser idoso e ser velho. Papai está velho, não tem sonhos, dorme muito
e não tem vontade de aprender mais nada. Entregou-se.
Mas,
só agora, depois de ouvir a sua história, entendo a amargura que sempre tentou
esconder. Sei que tudo poderia ser
diferente, se tivesse confiado em alguém, aberto seu coração e contado sua verdade.
Mamãe é bem mais nova que ele, uma ótima
esposa e mãe. Mesmo com a casa sempre impregnada da poeira que vem da rua
esburacada e sem calçamento, e com o avental sujo de ovo, trabalha cantando e com o rádio ligado. Canta todas as músicas de
cor. Traz jovialidade à nossa casa.
Ela
casou-se por amor e não abandonou o barco, mesmo quando parecia estar se
afundando. As mulheres NÃO podem
abandonar o marido. Não conheço nenhum caso de mulher separada. O casamento é pra sempre.
Todos
os dias, durante o seu trabalho doméstico que nunca acaba, prende,
religiosamente, os cabelos longos (papai não deixa cortar) com fita de cetim no
alto da cabeça. O pescoço alongado deixa à mostra um crucifixo, preso a uma
gargantilha de ouro. Desde que a conheço, nunca deixou de usá-la. Disse que foi
uma promessa a Nossa Senhora, por graça alcançada. Minha família é mais
religiosa do que o necessário.
Sinto
que ela é feliz. Acho que não é como queria que fosse, mas tem uma casa
confortável e a aposentadoria do papai dá pra fazer uma viagem a Santos todos
os anos.
Acho
que vocês estão curiosos para que eu conte que segredo é esse e qual é minha
missão.
Bem,
vamos lá. Pra situá-los, estamos, hoje, no ano de 1864.
Tudo
começou por volta do ano 1819, quando papai tinha apenas 16 anos de idade.
Meus
avós mais quatro filhos moravam na Rua da Cruz Preta. Todos ali se conheciam.
As crianças e os adolescentes brincavam e se reuniam à frente de casa até o dia
escurecer. Não havia iluminação elétrica e mesmo se fosse lua cheia era chegada
a hora do banho e do jantar. E todos obedeciam.
Em
frente ao sobrado da esquina, havia uma cruz pintada de preto e ninguém sabia
ao certo como ela foi parar ali.
Numa
manhã, como outra qualquer, os moradores acordaram com ela plantada ali. Nenhum
barulho, nenhum movimento estranho durante a noite. Um mistério assustador para
aquele povo humilde e cheio de crendices.
Muitos
comentários, muita fofoca, surgiram e muito medo também. Como nenhuma teoria foi
confirmada, os moradores consultaram um padre e decidiram que o melhor era considerá-la
sagrada e fazer ali um ponto de oração.
O
padre Piero, que dirigia a igrejinha do final da rua, benzeu a cruz com muita
água benta para espantar qualquer influência negativa e mal olhado.
E
todos ficaram em paz...
Pra não
me alongar, vou resumir um pouco.
Meu
pai e a menina do sobrado da esquina, Maria Luíza, começaram a se ver às escondidas.
Na rua vizinha, havia um galpão abandonado que já fora o armazém do Seu
Zé. E era lá que os dois se encontravam.
Tudo tão bem planejado e controlado que ninguém nunca suspeitou.
Mas
o romance foi por água abaixo quando estudantes da Academia descobriram a tal
da Cruz Preta e começaram a frequentar o lugar.
Um
deles, talvez o mais ousado e encantador, na calada da noite, escalava o
madeiro só pra ver a mocinha toda faceira que o esperava debruçada na janela do
quarto. Ele conquistou e roubou o grande amor do meu pai.
Isso
durou até a mãe da menina acordar na madrugada pra tomar água. Quando voltava, e ainda no corredor da casa,
ouviu sussurros e gemidos vindos do quarto da filha. Achou que ela estava
sonhando e entrou pra agasalhá-la. A madrugada estava bem fria.
Pegou-os
em flagrante.
Não
demorou dois meses e já estavam casados. E o mais alarmante foi que o bebê
chegou antes da gestação completar oito meses.
E a
vida do meu pai mudou pra sempre quando ele conheceu a menina e pegou-a no
colo.
Discretamente,
abriu um dos botões do casaquinho e confirmou: a criança tinha, perto do
umbigo, uma mancha de nascença. Uma estrela igualzinha à que ele tinha também.
A filha era sua.
Este
é o segredo que guardou até ontem.
E a
minha missão é encontrar minha meia-irmã.
Agora,
contarei a vocês o meu segredo: já vou começar a procurar a filha do meu pai.
Eles precisam se conhecer.
Já
fiz as contas: ela tem hoje quarenta e cinco anos de idade.
RUA QUINTINO BOCAIÚVA
Henrique Schnaider
Houve um tempo em que as ruas de São Paulo eram
conhecidas pelo nome dos seus moradores e a Rua Quintino Bocaiúva que
inicialmente era conhecida pelo nome de rua do Padre Tomé, pois o Cônego Tomé Pinto
Guedes residiu nela por volta de 1765, e que só se tornou com o nome de
Quintino Bocaiúva em 1916.
Com o tempo também ficou conhecida como rua da Cruz
Preta, pois na esquina com a antiga Rua da Freira, agora conhecida como Senador
Feijó, ergueu-se uma grande cruz de madeira pintada de preto.
As famílias tinham o costume de fazerem verdadeiros
terços em frente a Cruz Preta e dezenas de famílias faziam suas orações e
veneravam e acreditavam que ela tinha poderes e até realizava milagres.
— Eu sou uma casa que foi construída aqui nesta Rua
há muito tempo. O meu pai construtor foi Dom Agnelo. Ele me construiu com muito
capricho, confortável, grande, tanto que eu acomodava uma família de umas vinte
pessoas. E com o passar do tempo, presenciei muitas histórias nesta Rua
Quintino Bocaiuva.
Lá pelos anos de 1.900 a rua era de terra batida e
só eu sei que quando aconteciam aqueles temporais ou chuvas prolongadas, o
lamaçal que virava a minha querida Rua, era de chorar de ver. Os cavalos vinham
puxando suas carroças com um esforço enorme, arrastando e atolando uma pata
depois da outra, mas apesar da irritação, não deixavam de me cumprimentar com
um bom dia ou boa tarde.
Certa ocasião, um grupo de estudantes que gostavam
de fazer traquinagens, pegaram a Cruz Preta de madrugada levaram e a jogaram no
Rio Anhangabaú, e só por milagre a mesma não foi arrastada pela correnteza, mas
ficou ali fincada enfrentando aqueles moleques travessos. Don Agnelo montou uma
equipe de busca e acabou achando a Cruz Preta no rio e a levaram de volta ao
seu devido lugar.
— Na minha rua havia de tudo. A casa pensão onde as
pessoas iam comer era gorda uma verdadeira bola.
A casa do comércio onde havia de tudo e se achava a
tal de tão metida que era, a dona da rua. A casa onde vendiam as roupas de
mulheres chiques. Esta casa era fina e tinha até nome francês e eu diria que
ela era até meio esnobe.
Tinha a casa boteco onde os moradores depois da
lida do dia paravam antes de se recolher ao lar e tomavam sua cachaça de boa
precedência. Esta era uma casa que vivia devido à quantidade de bebida, meio de
cabeça cheia.
— Tinha a casa das mulheres de vida fácil, cheia de
dondocas, esperando seus clientes, os quais vinham as dezenas. Esta casa de
nome Renata, tinha uma reputação muito baixa e eu como uma casa decente não
trocava uma palavra com ela.
A Cruz Preta voltou ao seu devido lugar, aumentou a
fama devido ao fato acontecido e vivia cheia de devotos fazendo suas orações.
O meu pai construtor me cuidou muito bem e até o
seu falecimento, e a cada 10 anos me reformava por completo. Seus netos
continuaram com esta missão, de sempre me deixar em perfeita ordem, muito
bonita.
— Bom eu já contei muita coisa envolvendo a Rua
Quintino Bocaiúva e agora vou aproveitar antes que escureça e o silêncio
aconteça, vou puxar uma prosa com as minhas vizinhas que me aguardam ansiosas.
— Até logo e até qualquer outro dia, sempre estarei
aqui à disposição.
O CASAMENTO REAL Alberto Landi Em uma manhã ensolarada de 22 de maio de 1886, as ruas de Lisboa se encheram de flores e música para cel...