A investigação
Adelaide Dittmers
O churrasco corre animado no dia quente de
verão. Vários brindes são feitos entre piadas e gargalhadas. As duas
famílias reunidas são vizinhas há um ano, quando Thomas, o anfitrião, mudou-se
para ali e a amizade entre eles brotou espontaneamente. Thomas sempre
muito simpático aproximou-se dos vizinhos. Reuniam-se em alegres almoços,
faziam programas juntos e até fizeram uma viagem a uma praia paradisíaca da
Flórida.
De repente, as conversas foram interrompidas pelo
som estridente do telefone dentro da casa. Thomas entra para atender a
ligação. Um copo cai, espalhando vários cacos pelo chão. Peter
oferece-se para limpar o estrago e entra na casa para pegar uma vassoura e pá.
O amigo está ao telefone. Uma expressão séria
contrai seu rosto e, ao passar por ele, Peter surpreende-se com o que
ouve. Não é um diálogo normal: códigos são usados na conversa. Na
área de serviço, pega os objetos para a limpeza, mas para um momento para
tentar ouvir o que estava sendo falado, mas a conversa continuava em códigos
incompreensíveis. Ele sai para o jardim completamente confuso.
Momentos depois, o vizinho volta para junto deles,
com um ar contrariado, reclamando que tem que ir imediatamente para Washington,
pois surgiu um grave problema na empresa de construções em que trabalha.
Peter disfarça a desconfiança de que foi
tomado. O que significaria aquela estranha ligação? Que trabalho era
aquele em que ligações telefônicas eram feitas em código. Thomas era
engenheiro e o trabalho dele não exigia nenhum sigilo.
Na cabeça de Peter havia uma explosão de perguntas
sem respostas. Com certa hesitação, exclamou:
— Hoje é domingo! Não podem esperar até amanhã?
— Nos negócios de construções é preciso agir com
rapidez quando surge um problema, que pode invalidar o projeto e causar um
imenso prejuízo monetário. Responde sem explicar que grande problema era
esse.
Peter balança a cabeça e responde pensativo:
— Ainda bem que ser professor tem algumas
vantagens.
— Mas, por favor, continuem o almoço. Não
estraguem essa gostosa reunião porque vou me ausentar. Vou fazer
uma pequena mala e tentar pegar o primeiro voo. E entrou com muita pressa
em casa.
A esposa de Thomas reclamou:
— Não consigo me acostumar com essas viagens
repentinas. Acho isso um absurdo, que atrapalha nossa vida, mas o que
fazer, já sabia disso ao casar com ele.
As duas mulheres recomeçaram a conversar e Peter
tentava esconder o que lhe ia no íntimo, com pequenas intervenções nos
assuntos.
A tarde foi esmaecendo, dando lugar a um crepúsculo
de belas cores e o casal visitante resolveu ir para casa, mas não sem antes
ajudar a dona da casa a por tudo em ordem.
Naquela noite, Peter não conseguiu dormir.
Nos dias seguintes começou a observar a casa vizinha e seguir os movimentos do
amigo, mas não achou nada de anormal: as corridas rotineiras da manhã, a
saída para o trabalho. Tudo transcorria como sempre.
No fim de uma tarde, em que o vizinho chegava do
trabalho, Peter, que estava no jardim, perguntou-lhe sobre o ocorrido na obra,
que o obrigara a viajar tão repentinamente. A resposta foi lacônica e
rápida. Um grave erro em um contrato, que poderia gerar um enorme
prejuízo.
Cada vez mais a dúvida do que o amigo fazia o
intrigava e o fez até pensar se ele próprio não estava criando fantasias em sua
cabeça.
Nos dias que se seguiram, notou que o vizinho
começou a demorar mais para voltar de suas corridas. Certa manhã, em que
varria as folhas das árvores esparramadas pelo chão, Thomas passou e ele quis
detê-lo para conversar. No entanto, o vizinho, sempre amável, respondeu
que estava atrasado e que não podia parar. Desculpou-se com um sorriso
forçado e seguiu seu caminho.
Peter ficou ainda mais desconfiado. O que
Thomas estava escondendo? Andava esquisito. Não era a primeira vez que
ultimamente esquivava de conversar com ele. Inúmeras suposições
surgiram em sua cabeça. Resolveu que na manhã seguinte o seguiria.
O dia amanhece chuvoso. Nuvens cinzas
espalhavam-se pelo céu, mas como sempre o vizinho passou em sua corrida
diária. Peter esperou uns minutos e saiu atrás dele com o coração
disparado. O que iria encontrar, ou talvez não encontraria nada.
Quando chegou perto de um grande parque, que ficava
a cerca de um quilômetro de onde moravam, estacou de repente. Na entrada
arborizada do lugar, Thomas estava conversando com três homens vestidos de
terno e gravata. As expressões dos quatro eram extremamente sérias e
suspeitas. Um deles entregou um envelope para o vizinho, que se voltou para
ir para casa. Peter escondeu-se atrás de um arbusto para não ser visto.
Foi para casa e logo que chegou, ligou para um
conhecido de longa data. Marcou um encontro com ele em um café próximo às
três da tarde daquele mesmo dia, porque sentia que tinha que contar tudo o que
estava acontecendo. Não aguentava mais lidar com as sérias desconfianças
que o assaltavam.
Chegou pontualmente e o homem já o esperava sentado
em uma das mesinhas. Cumprimentaram-se e pediram um café. O clima
entre os dois era tenso. Falavam em voz baixa. O outro absorvia as
palavras com um olhar nervoso e assustado.
Nesse momento, quatro homens se aproximaram
deles. Entre eles estava Thomas.
Os dois ficaram petrificados quando os viram.
O que aconteceria agora?
Thomas chegou bem perto da mesa e falou com uma voz
dura:
— FBI! Vocês estão presos por espionagem e colocar
em perigo a segurança dos Estados Unidos da América.
Eles se levantaram aturdidos e os homens os
cercaram.
— Então Peter ou Igor! Pensou que ia nos
enganar com seu jeitinho pacífico e discreto. Há muito tempo estamos no
seu encalço e no de seu comparsa John ou Anton.
No rosto pálido de Igor, os grandes olhos azuis
faiscaram de ódio. Toda aquela amizade fora uma farsa. O medo e a
desconfiança que tomaram conta dele desde aquele churrasco tinham razão de
ser. Deveria ter agido rapidamente, pensou com muita raiva de si mesmo.
Thomas escondeu um sentimento de piedade, que ele
não podia sentir diante de um espião russo, mas naquele ano em que conviveram,
conheceu o outro lado do homem. Qual seria o verdadeiro Peter ou Igor? O
homem afável e amigo ou o espião frio que servia seu país?
Estendeu as algemas e o prendeu.