A
VIDA TEM SURPRESAS
Henrique Schnaider
João era uma pessoa do tipo durão, não conseguia
sequer ter convivência agradável com a
mulher e os dois filhos, que nunca recebiam um pingo de amor. Apesar de terem
sido criados com muita rigidez, tiveram boa educação, se tornando responsáveis
profissionais, médico e dentista.
Quando ainda os filhos eram crianças, João não tinha
quase nenhuma atividade social, dos amigos mantinha distância, não dava nem
sequer para considerá-los como tal, eram pessoas que estudaram com ele. Apesar
de sempre receber convites dos colegas para encontros animados, o homem tinha
um coração duro, não amolecia nunca.
Quanto a esposa, a pobre era uma santa, aguentava
calada todas as grosserias do marido, mas o coração estava com uma ferida crônica,
ela mal se recuperava de uma estupidez de João e lá vinha outra, os meninos
tinham pavor do pai, quando chegava em casa, eles eram ratos fugindo do gato,
senão sobrava para eles.
Quanto aos parentes, João tinha dois irmãos, mas mal
via, mantinha-os longe da sua casa, já tinham brigado, pois o danado quis
passar a perna neles, numa questão de herança mostrando daí seu mau caráter, os
dois cunhados, irmãos da esposa, nem podiam ouvir falar o nome dele.
Os anos passaram, João envelheceu, a esposa acabou
morrendo, seu coração não aguentou tantos maus tratos, a morte para ela foi uma
benção. Os filhos casaram e trataram de sumir, largando João na mão. Em todos
aqueles anos, ele não plantou o amor, e as plantinhas do amor dos filhos não
foram regadas, feneceram.
O homem com mais de oitenta anos ficou sozinho, não
recebia nunca uma visita, vivia cabisbaixo, andando de um lado para o outro, um
sonâmbulo, ninguém aparecia nem os filhos nem os parentes, nem os amigos.
Os amigos de escola souberam da triste situação de
João, acharam que não deveriam levar em conta o passado, e combinaram de visitá-lo
e dar assim a ele o calor saboroso da amizade que ele sempre rejeitou.
A primeira visita do grupo, foi uma agradável
surpresa para João, ele sabia que não merecia a gentileza. Os amigos encheram-no
de agrados, e ele chorou de emoção. Aquele coração de pedra se desmanchou,
pedia perdão por não ter dado o devido valor aos velhos amigos, finalmente descobriu
o que é a felicidade, ficaram várias horas com ele, preenchendo o vazio do seu
tempo.
Quando saíram prometeram que voltariam outras vezes,
deixando João feliz da vida, descobrindo o valor da amizade, começou até em
pensar de pedir perdão aos filhos e quem sabe no final de sua vida, ainda
aproveitar do valor do amor.