DE REPENTE O FIM.
Do
Carmo
Depois
de muitos anos de convivência, difícil é não perceber a modificação do
comportamento do parceiro. Assim
aconteceu com o casal Maria e Eduardo, sempre citados como modelo de amor
infinito e fidelidade concreta.
Sem
aparente motivo, Maria começou a notar diferentes atitudes nos hábitos do
marido, longos momentos de alheamento e desfocados olhares para o nada,
passeios solitários e explicações absurdas, por não combinarem com seu
temperamento.
Imaginava
mil motivos, mas nenhum a satisfazia, pois o amor que os unia há tantos anos,
não se enquadrava no contexto em que viviam.
Sem
consultar ninguém, decidiu contratar um detetive particular de grande
credibilidade que conheceu pela TV, e secretamente marcou entrevista.
Continuava
observando o marido e cada vez mais ficava cismada com as desculpas que ele dava
quando ela o questionava sobre as saídas sorrateiras, pois nunca foi
frequentador de praças e jardins, dizendo que só desocupados vagavam por esses
lugares. Dizia também que estava indo à igrejas, pois começava a sentir falta
de religião. Se falasse que frequentava bibliotecas, ela aceitaria uma vez que
era amante da leitura.
Finalmente
chegou o tão esperado e ansioso dia do novo encontro com o detetive, quando ele
lhe entregaria o relatório de conclusão da investigação.
Maria
não sabia o que fazer. Abrir imediatamente o envelope recebido, ou lê-lo no
táxi de volta, ou ainda esperar chegar a casa, acalmar-se, se possível, ou
ainda deixar para o outro dia, quando estivesse só.
Dilema
do inferno, o que decidir, sentia o calor das lágrimas ardentes prestes a rolar.
Sem muito refletir, foi para o quarto, fechou a porta e desabou em
lágrimas.
Não
mensurou o tempo passado nesse transe, mas quando resolveu sair, já tinha
decidido que esperaria pelo amanhã.
O
restante do dia foi o mesmo marasmo.
Na
manhã seguinte, a rotina fantasma continuou.
Depois
de ler o jornal, Eduardo falou como ultimamente:
-
Querida, volto para o almoço. Saiu.
Imediatamente,
Maria vai para o quarto e trêmula de ansiedade e pavor, pega o envelope
revelador e sentando-se na poltrona do penteador, rasga-o e retira uma só folha
datilografada.
Senhora
Maria, tendo cuidadosamente seguido e investigado os passos e comportamentos de
seu marido, senhor Eduardo, tenho a informar que todas as explicações dadas
pelo seu marido sobre suas idas a igrejas, praças e jardins, são verídicas,
como a senhora constata nas fotos. Sempre cabisbaixo e triste, olhar distante,
ficando horas sentado nos bancos, algumas vezes balançando a cabeça, passando
as mãos no rosto, nos cabelos, como se quisesse espantar pensamentos daninhos.
Totalmente
abismada com o resultado tão esperado da investigação, resolve conversar com o
marido, francamente, logo depois do almoço.
Como
sempre ele chega triste e acabrunhado, prepara-se para almoçar e assim que
termina a refeição, levanta-se e sem palavras retira-se para a sala com o jornal
na mão.
Muito
aflita Maria o segue e senta-se em uma poltrona em frente a ele e com voz
embargada pela emoção e pavor pelo que vai ouvir, o questiona:
-
Eduardo, o que está acontecendo com você? Em todos esses anos de nosso
casamento, nunca o vi tão distante e triste. O que está acontecendo, você não
me ama mais?
Tal
qual impulsionado por uma mola, Eduardo empertiga-se e aos brados de leão
grita:
-Você
é a culpada, não me ama mais, age estranhamente como uma folha ao vento, mal
fala comigo, não me olha nos olhos com aquela chama azulada do amor, o que você
quer que eu sinta? Analisei-me profundamente para descobrir o que fiz para você
deixar de me amar, o porquê desse comportamento surdo-mudo, sempre com
semblante triste, demonstrando infelicidade, me perguntava, errei onde, Senhor
Deus, me esclareça, mostre-me um caminho para voltarmos à vida romântica e
feliz que sempre tivemos.
Sem
acreditar no que ouvia Maria também se levanta e estendendo os braços e com o
rosto de cintilante rubi, banhado em alegres lágrimas de amor, encaminha-se
para Eduardo gritando:
-É o
fim, felizmente, é o fim!
Paralisado
pela explosão de felicidade de Maria, ele desaba na poltrona e com voz rouca de
emoção e susto, julgando que ela esteja dizendo que não o ama mais, desarvorado repete:
–
Por que o fim? Então você, realmente, não me ama mais?
Maria,
sem entender direito o que Eduardo havia falado, entre soluços felizes e
abraços descompassados tentava acalmar-se para poder explicar o que ela
imaginava sobre o comportamento dele.
Eduardo
disse em tom imperativo:
-Maria,
sente-se e fale comigo com clareza, o que realmente você está sentindo ao meu
respeito.
Secando
as lágrimas, respirando com menos ansiedade, explica que julgava que ele não mais
a amasse, e que essas saídas extravagantes, esses lugares que ele dizia ir, antes
abominados por ele, visitar igrejas, tudo fora de suas preferências. O silêncio
indiferente que usava, para mim era demonstração de desinteresse, falta de
amor, fim de um casamento. Querido eu o amo como sempre, e sei que jamais
deixarei esse amor morrer, sentia-me muito triste, porque julgava que você não
mais me queria.
Não
acredito que houve tanto sofrimento por suposições errôneas. Ah! Que alívio, eu
amo você, Maria, sempre irei amá-la. Eu ardia de ciúme, pensando que havia
outro homem em seu coração. Como fui idiota. Pensar em um absurdo como esse,
conhecendo você como eu conheço não tinha propósito.
E
depois de muitos abraços e beijos apaixonados, foram para o quarto e Maria,
muito feliz, disse - De repente o fim.
Acordaram
abraçados, como há muito não acontecia.
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