MADAME POMPADOUR
Hirtis Lazarin
“Até que enfim a sexta-feira se foi”. Elisa desligou
o computador, sem antes pôr ordem na papelada esparramada sobre sua mesa;
alguns documentos foram arquivados e outros, apenas rascunhos, descartados. A
lixeira tanto quanto Elisa estavam “cheias”. Ela nem se reconheceu no espelho.
Nem percebeu que o cabelo revoltado já se soltara da presilha e a maquiagem
desbotada escorria pelo rosto. “Um banho demorado, perfumado mais uma cama
confortável darão um jeito nisso, não é Elisa”?
O sábado também seria agitado, mas de um jeito
prazeroso. Era o casamento da melhor amiga de Elisa. Amiguinhas desde os cinco
anos. Da mesma rua, da mesma escola, das mesmas alegrias e tristezas.
Irmãs por escolha.
E, ela, a madrinha mais querida, tinha o compromisso
de corresponder ao lugar de destaque que ocuparia na cerimônia. Assim como as
noivas têm um tratamento especial nesse dia, Elisa reservou também um horário
comprido num salão especializado, capaz de transformá-la numa princesa vestida
de azul, da cor dos seus olhos.
Elisa desmaiou na cama, sem tempo pra pensar em mais
nada. Acordou e no escuro tateou o celular. Tinha plena certeza de que ainda
sobrava bastante tempo pra dormir. Levou um susto quando olhou as horas e viu que estava
atrasada em uma hora e meia. Deu um pulo desajeitado da cama, escorregou no
tapete redondo e só não caiu porque uma almofada exagerada a amparou.
Soltou um palavrão e mais um. Toda atrapalhada e já seminua, ligou à
profissional que a atenderia. Recebeu uma pequena bronca. Elisa não gostou, mas
trancou a língua antes que tivesse o horário cancelado. O cancelamento era
inimaginável. “Prefiro morrer”.
Jogou-se debaixo do chuveiro e tomou um banho de
“gato”. Já dentro do carro, não encontrou a chave que deveria estar dentro da
bolsa, mas, inexplicavelmente, não estava. Na correria derrubou-a no chão da
sala. Mais minutos de atraso e mais palavrões. O dia, que deveria ser só de
alegria, começou bem mal. Suas mãos e joelhos tremiam. A vista anuviou e
todo esse desconforto atrapalhou-a na direção do carro. Distraída, quase
atropelou alguém na faixa de pedestres e ao entrar à esquerda, esqueceu-se da
seta e levou um buzinaço. Estacionou na primeira oportunidade, desligou o carro
e chorou. Um choro inconsolável e raivoso. Não se conformava com aquilo,
pois tudo foi bem-planejado e com antecedência.
Debruçou-se sobre a direção, respirou profundamente
várias vezes e bebeu, pausadamente, vários goles de água. Ligou o rádio numa
música suave enquanto secava o suor que escorria do rosto. Pensou mais de uma
vez até tomar coragem e ligar novamente ao salão de beleza. Antes que a
profissional que estava do outro lado da linha esbravejasse e talvez, até
cancelasse o atendimento, Elisa ensaiou as palavras e propôs cancelamento
de alguns procedimentos que nem fariam tanta falta assim na composição do belo.
O pacote encomendado seria pago em sua totalidade pra que não houvesse prejuízo
algum. Ela ouviu uma resposta positiva e emitiu um suspiro aliviado e comprido.
Eram exatamente dezessete horas, quando uma princesa
azul da cor do céu deixou o salão “Madame Pompadour”.
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