Antonio Moura
Adelaide
Dittmers
Antonio
Moura desde jovem mostrava habilidade em negociar e vender. Na faculdade, revendia artigos esportivos
para os colegas, amealhando consideráveis quantias de dinheiro, parte das quais
entregava aos pais, que tinham parcos rendimentos e parte usava, frequentando
bons restaurantes, em encontros com belas mulheres, roupas caras: conseguiu até
comprar um carro usado. Muito ambicioso,
seu grande objetivo era vencer na vida e deixar para trás tudo aquilo que lhe
faltara na infância e adolescência.
Após
se formar em administração de empresas, empregou-se em uma grande empresa
varejista, com lojas espalhadas por todo o país. Esperto, eficiente e
trabalhador, foi galgando vários degraus na carreira e depois de alguns anos
chegou à posição de diretor comercial.
Uma
verdadeira raposa nos negócios, conseguia fechar vendas e compras, que deixavam
os que o rodeavam boquiabertos. Muito
respeitado pelos donos da empresa, gozava de livre acesso a todos os
departamentos.
A
alta remuneração que recebia proporcionava-lhe um alto padrão de vida. Usufruía com sofreguidão o sucesso, que
conquistara. Casara-se cinco anos depois
de formado e tinha dois filhos. Dizia a todos que fora amor à primeira vista,
mas os amigos mais próximos, que o conheciam bem, duvidavam dessa afirmação,
porque a esposa era de família muito rica e de projeção na sociedade. Vaidoso, exibia
sua linda mulher, como um troféu nos inúmeros eventos e festas, que frequentavam.
Na
vida profissional, era muito exigente com os subordinados, que precisavam cumprir
suas metas e até superá-las. Não
tolerava erros ou displicência no trabalho.
Entretanto, quando percebia que algo não estava correndo bem com algum
deles, mostrava-se compassivo e interessado em ajudar com palavras de incentivo
e de estímulo. Por isso, era muito
admirado e mesmo querido por eles.
Amoroso
com os pais, dava-lhes uma polpuda mesada para que tivessem uma vida farta e
sem preocupações. Nunca negava esmolas e
se apiedava dos menos favorecidos. Em
casa, os empregados domésticos eram respeitados e alguns deles tinham a escola
dos filhos paga por ele. As pessoas à
sua volta, consideravam-no um homem correto e generoso.
Numa
manhã, Antonio estava em reunião com fornecedores. Lá fora, o vento e a chuva
fustigavam as enormes janelas de vidro, abafando uma discussão acalorada, que
exaltava os ânimos dos participantes. Com uma voz fria e olhos faiscantes e
resolutos Antonio despejava argumentos firmes em cima dos homens, cujos rostos
crispavam-se de irritação.
-
Meus caros, não compro nenhuma peça de seus produtos, que estão acima dos
preços de mercado, se não me entregarem dez por cento da compra.
— É
muito dinheiro. Vamos ter prejuízo.
—
Volto a dizer, o preço que vocês estão cobrando é o mais alto e com certeza não
conseguirão vender a mercadoria a ninguém.
—
Você está exagerando, Antonio, está abocanhando nosso lucro.
—
Não chore, Alberto, você sabe muito bem que sua margem de lucro é alta.
—
Podemos dedurar você à diretoria.
—
Sairiam perdendo, respondeu Antonio, com um sorriso irônico. Com os preços que
vocês têm, nunca mais venderiam nada para esta empresa, o que seria um mau
negócio.
O
outro balançou a cabeça desanimado. A
raiva o consumia, mas manteve o controle.
Aquela venda era muito importante para eles. Engolindo com dificuldade o
desfavorável desdobramento da negociação, exclamou contrariado:
—
Fechado! Damos a você os dez por cento.
Ao dizer isso, desapertou a gravata, como se esta o estivesse sufocando.
Os
outros dois homens, que acompanhavam Alberto, entreolharam-se aturdidos.
Antonio
disfarçou um sorriso de vitória. Mais
uma vez conseguira.
Nesse
momento, seu celular tocou. A voz que
atendeu era completamente diferente, doce e suave.
— Te
ligo depois. Estou em reunião.
Após
os acertos da transação, os fornecedores despediram-se. A tensão ainda flutuava pela sala. Antonio, com um sorriso simpático,
despediu-se deles com um forte aperto de mãos e uma batidinha nas costas.
—
Não se zanguem. Estão fazendo um ótimo
negócio e vocês sabem disso.
Quando
ficou só, olhou para a chuva, que continuava a tamborilar na janela. Pegou o
celular e ligou de volta para a pessoa que lhe chamara.
—
Olá querida! Tudo bem? Sua voz era meiga e os olhos pareciam
derramar mel por toda a sala. Era outro
homem. Rendido e apaixonado.
—
Vamos ter que cancelar nosso encontro hoje. Lúcia marcou um jantar e não posso
desagradá-la. Anda muito estranha. Parece desconfiada.
A
voz do outro lado alterou-se, ao que ele respondeu:
—
Nunca te prometi que iria me separar de minha mulher. Nunca te enganei, mas você é a mulher mais
importante da minha vida.
Depois
de um longo diálogo, em que procurou ser o mais amoroso possível, desligou o
celular. Sua expressão era séria. Como
sempre tinha sido convincente, mas nunca poderia explicar à sua amante que o
dinheiro e a posição social eram mais importantes que o amor.
Pegou
o paletó e saiu para o almoço. No
caminho, enviou uma mensagem para a esposa:
— Oi
amor! Pode confirmar o jantar hoje à noite.
Amo muito você.
Mais
adiante, encontrou o presidente da empresa. Abraçados foram almoçar,
conversando e rindo animadamente.
Gostei da forma como você descreveu o perfil do Antonio, que é interessante justamente por ser conflitante. Uma pessoa boa, gentil, carinhosa, caridosa, mas ao mesmo tempo ambiciosa e, em razão desse aspecto, nada leal. Para mim pareceu bem realista, pois creio que há muitas pessoas assim: mudam de atitude conforme as circunstâncias, deixando prevalecer suas virtudes ou defeitos, até inconscientemente, conforme a situação que se oferece. Parabéns.
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