AS
INTRIGAS DO PADRE ALBERTO
Dinah Ribeiro de Amorim
Padre Alberto foi
encaminhado ao seminário por promessa da mãe. Acostumou-se com aquela vida
equilibrada, farta, sem resistir, embora não possuísse fé.
Como sempre frequentasse boas paróquias,
pessoas educadas e simpáticas, não reclamava, adaptando-se facilmente.
Houve mudança repentina na direção na Igreja
e, seus superiores, resolveram mandá-lo para um lugarejo muito pobre, com muitos
problemas, grande teste à sua fé!
O padre não gostou nada da mudança. Igreja
pequena e feia, necessitando de reparos, pessoas carentes que o solicitavam
muito, não o deixando sossegar e levar a vida tranquila de outrora.
No início sua paróquia encheu-se, todos
querendo conhecê-lo para pedir orações. Aos poucos, diante de sua falta de
simpatia, sumiram e voltaram a procurar uma antiga socorrista do lugar, Ofélia,
célebre por seus unguentos, comidas, aconselhamentos e curas.
Isso despertou inveja no padre e curiosidade
em saber o que fazia, chamando-a de bruxa e excomungando quem a procurasse. O
povo, acostumado à orientação da velha, não o obedeceu.
Padre Alberto começou a espionar a casa da
mulher, observar o que fazia, quem entrava e saia.
Ficou tão obcecado nessa ideia que, rodeando
seu casebre, avistava-a na cozinha, à noite, com um livro de receitas nas mãos,
iluminada apenas por um pequeno lampião, óculos na ponta do nariz, mexendo
suavemente pequeno caldeirão de sopa,
exalando um perfume forte e
gostoso, através da janela aberta. “Deve ser uma bruxa velha mesmo”, dizia o
padre para si mesmo, enquanto segurava sua batina que balançava ao ritmo do
vento forte da escuridão. Quando ameaçou ir embora, temendo um belo resfriado,
apareceu alguém à porta de Ofélia, pedindo
a sopa para um doente necessitado de cuidados.
Através da porta, entreaberta, verificou que
possuía um crucifixo pendurado em pequeno canto, um genuflexório, local onde
fazia suas orações, uma caixinha com
papéis escritos e, ao lado, sob uma mesa coberta com uma toalha rendada,
envelhecida Bíblia, amarelada de uso.
Eram apenas esses os instrumentos que a pobre
Ofélia usava. Suas armas principais eram amor ao próximo, e grande fé em Deus.
O padre, decepcionado com o que viu e
desconfiando de sua fé, resolveu levantar suspeitas sobre seu trabalho e
ignorar suas boas intenções de ajuda e cura. Não era certo o que fazia sozinha,
sem cumprir ordens, a serviço de quem? Só poderia ser de algo maligno.
Começou a dirigir seus sermões aos poucos
frequentadores, em ataques ao trabalho de Ofélia, explicando-lhes que não era
de Deus, talvez orientada por algum espírito mal, querendo enganá-los e
fazê-los perder o céu.
Tanto falou, tanto fez, que o povo humilde e
medroso, afastou-se da idosa, embora sentisse falta dos seus segredinhos de
saúde e orações.
Ofélia sentiu-se magoada a princípio. Fizera
muito por eles. Trouxera crianças ao mundo, ajudara a curar muitas dores e
febres, levantara pessoas quase moribundas com seus chás e comidas, enquanto
era a única, na região. Com a chegada do padre Alberto, achava que teria um
aliado e não um inimigo seu a serviço de todos.
O tempo foi passando, ela cuidando dos bichos
e da plantação, recorrendo ao trabalho na roça como esquecimento da tristeza sofrida.
Mal nascia o sol e já estava em pé, preparando
café com ovos, pão quentinho e cheiroso, mingau de aveia e mel, colhido
ali mesmo, na sua colmeia.
Padre Alberto, satisfeito e orgulhoso, com
certa popularidade, dedica-se às suas tarefas com mais afinco, tentando
fazê-los esquecer Ofélia.
Certa manhã, quando levanta-se para abrir a
Igreja e rezar a primeira missa, sente uma leve tontura e cai ao chão, quase
não conseguindo se mexer. Assustado, mal consegue chamar um moleque que o
ajuda, às vezes, Carlinhos, pedindo para levá-lo até a cama.
O menino, muito assustado, corre a ampará-lo
e pergunta se quer que chame alguém. O padre pensa um pouco e diz: “Chamar
quem? O médico mais próximo fica há quatro horas daqui.” O tempo passa e o
padre sente dores. Com medo, pede a Carlinhos que chame Ofélia. Resolve deixar
seu orgulho de lado.
_Chamar quem, padre? Ofélia? O senhor vive
falando mal dela.
_Ande Carlinhos, quem sabe
consegue fazer algo por mim também.
O menino, correndo, chega à casa de Ofélia,
surpreendo-a com o pedido. Colocando a necessidade do padre em primeiro lugar e
sabendo que uma epidemia de cólera estava ameaçando a região, vai atendê-lo,
lembrando antes de levar seu livro de consultas.
Pelo estado do pároco, percebe que ele
contraiu a doença. Sua febre, dores no corpo, demonstram que tomou água
contaminada ou comeu alimentos crus lavados nessa água. Sua experiência e
intuição fazem-na perceber. Manda Carlinhos ferver bastante água e servir ao
padre.
Amassa 2 dentes de alho, deixa de molho
durante algumas horas e manda que tome 3 xícaras por dia, junto às refeições. O
mesmo fez com cebola e suco de limão, que deveriam ser tomados em jejum.
Aconselhou comer goiaba, laranja, maçã e pitanga. Chás de pó de mico e tejuco,
até aguardarem o médico que viria vê-lo. Carlinhos, assustado, obedece.
Seguindo as orientações de Ofélia, o padre
foi melhorando. Quando o médico chega, encontra-o bem. Pessoas estavam morrendo
por causa dessa infecção.
Padre Alberto, quase curado, volta à casinha
de Ofélia, arrependido e agradecido, convidando-a para ser sua auxiliar no
tratamento daquele povo. Transformou a imagem má que fizera dela em sua
salvadora, dando-lhe, novamente, justo
valor.
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