O INVERNO NA FAZENDA!
Dinah Ribeiro de Amorim
Todo mês de julho, passávamos
férias na fazenda dos meus avós. Julinho, meu irmão mais novo, Sofia,
maiorzinha, já trocando os dentes da frente e, eu, o mais velho, encarregado de
ajudar vovó Bela no cuidado com as crianças. Apesar da tristeza do inverno, divertimo-nos muito, pois Orestes, o capataz, fechava portas e janelas quando
ventava forte, protegendo-nos da chuvarada e trovões que esbravejavam lá fora,
afastando o medo do temporal com histórias de sua vida pelo sertão, enquanto
aguardávamos o bolo de fubá com canela e o chazinho de capim cidreira, feito por
vovó.
Hoje, já crescidos,
lembramos com saudade desse tempo. Julinho, semi-adormecido ao pé da lareira,
não prestava muita atenção no que se dizia. Sofia, arteira e esperta, curiosa
demais, perguntava sobre tudo. Se existia mesmo Mulas sem cabeça, Negrinho do
pastoreio, Saci- Pererê e outras curiosidades que os meninos do mato contavam.
Até sobre a Cobra grande, que aparecia no lago, queria saber.
Orestes, caboclo falador
e contador de casos, adorava uma platéia
e, não perdia oportunidade. Punha-se a
falar coisas estranhas e, quando não sabia, inventava. Era repreendido por vovó
que dizia: ”Não amedronte as crianças com
essas bobagens! Depois nem dormem à noite!”
Eu ficava meio
desconfiado, não acreditava muito, mas Sofia, aguçava os ouvidos e arregalava
os olhos.
Dava um trabalho
danado, pois só dormia quando se enrolava na minha cama, implorando um
cantinho, morrendo de medo.
De dia, muito
corajosa, querendo saber tudo. À noite, gritando por qualquer barulho. Fazenda
é muito boa ao sol claro, mas à noite,
para quem não está acostumado, bem estranha. Estala tudo: madeira da porta,
armário, janela, ventos uivam, aves, e
por aí vai. Isso quando vovô não surgia de repente, em pijamas, tentando matar
algum pernilongo.
Sofia quis conhecer uma história diferente, das terras de
Orestes. Ele, entusiasmado, explicou que havia coisas muito interessantes de
onde viera, perto do Velho Chico, o rio São Francisco. Desta vez, sim prestei
também mais atenção.
“As embarcações têm o calado, seu fundo, muito pequeno. O
barqueiro empurra o barco com uma vara comprida, atingindo o leito do rio. É um
trabalho duro, mas ele canta enquanto trabalha. Na parte da frente, recurvada,
a carranca protetora.”
_”Carranca protetora! O
que é isso?” Pergunta Sofia. “Nunca ouvi falar nesse nome!”
“As carrancas dos barcos são esculturas em
madeira, com desenhos de monstros, bichos desconhecidos, fantásticos,
poderosos, para assustar o Bicho d´água, virador das embarcações.” Respondeu
Orestes. “Eles acreditam que ela dá um aviso, três gemidos, quando vão afundar.
Quem ouve, escapa do naufrágio.”
_E você, Orestes, já ouviu? Perguntei aflito. Estava achando tudo
bem curioso.
_ “Eu, não, mas tive amigos canoeiros e
pescadores que ouviram e escaparam sãos e salvos. Um milagre!” respondeu.
Fomos interrompidos
por vovó que mandou todo mundo pra cama, receando que Sofia desse, outra vez,
trabalho à noite. Acho que sonhar com barcos afundando e Bichos d´água, eu
também vou.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
DEIXE AQUI UMA MENSAGEM PARA O AUTOR DESTE TEXTO - NÃO ESQUEÇA DE ASSINAR SEU COMENTÁRIO. O AUTOR AGRADECE.