É aqui que eu quero morrer
Hirtis
Lazarin
Finalmente,
eu e o taxista chegamos ao topo do penhasco, mil seiscentos e quarenta e cinco
metros acima do mar.
O
caminho irregular e cheio de curvas estreitas, uma serpente negra e lisa incrustrada
no verde da natureza viva.
A
chuva fraquinha se fora e a lua crescente, num sorriso quase cheio, apareceu
entre nuvens velozes e iluminou-nos com uma luz incerta. Um punhado de estrelas surgiu e o céu
concluiu sua rotina de escurecer. Noite
suave e serena. Apenas o cri-cri-cri dos
grilos invisíveis e a cantoria de uma nota só das cigarras.
Era
só o que eu queria quando deixei o trabalho, a cidade grande e mil problemas
não resolvidos.
A
pousada que escolhi era de madeira. Além do aconchego, a madeira proporciona
conforto térmico, deixando o ambiente fresco no verão e aquecido no inverno.
Rodeada de salgueiros e hortênsias mais parecia um ateliê de artista.
Adormeci
com os pássaros e assim que o clarão da manhã primaveril entrou no quarto por
vacilo das cortinas mal-ajeitadas, saltei disposto a desfrutar cada pedacinho
daquele vilarejo medieval.
À
primeira vista, “COLFOSCO” cabia num só olhar.
Mais parecia um quadro ou um cenário fotográfico. Uma paisagem com charme pitoresco que guarda
um patrimônio: a história, a arquitetura, as belas paisagens e a cultura do
país, uma vez que nos remetem à Idade Média.
Passar
por essas estradinhas é voltar séculos no tempo. São ruínas de pedras, o
castelo construído no século XIII, o monastério dos monges beneditinos, fileira
de casas de pedra com telhas vermelhas próximas umas das outras e ruas sinuosas
de paralelepípedos. Elas sobem até o relógio da torre, no coração daquele
paraíso.
Era
domingo e a missa do padre Piero durou mais de uma hora. No lado leste da
igrejinha, a sombra adocicada de uma castanheira em floração tolera crianças
irrequietas de bochechas vermelhas que correm e gritam alto à revelia dos pais.
Do
alto do penhasco, pode-se ver o mar preguiçoso em seu momento de calmaria. Não
pretende espantar o bando de gaivotas famintas que caminha indiferente ciscando
entre as pedras.
E, pra
encerrar a noite, há uma festa gastronômica regada a vinho produzido no local.
Já
se passou uma semana e eu não sinto vontade de voltar. Angustia-me esse
pensamento. Voltar ao mundo complicado
do progresso que nos trouxe maravilhas, é verdade, mas engoliu a simplicidade,
o equilíbrio e a capacidade de viver com menos coisas e mais tempo.
É
impossível fugir dessa ciranda traiçoeira.
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