O HERÓI É HUMANO
Henrique Schnaider
Ariovaldo é um homem destemido. Ele
gosta de ajudar pessoas que se veem em situação difícil. Ele é bombeiro. Já
salvou nestes 30 anos de profissão, muitas pessoas entre adultos e crianças,
das mais diversas maneiras. Pessoas presas dentro de carros no meio da
enchente. Crianças que caíram em poços ou perdidas na mata.
Ele ama a profissão que
escolheu. Pois sente que nasceu para isso. Porém, ele quando está em
missão de salvamento, no afã de salvar pessoas e levar a cabo o atendimento, acaba
passando dos limites. Esteve nos dois incêndios que fizeram história nos
acontecimentos trágicos de São Paulo. O incêndio do Edifício Andraus e do
Edifício Joelma.
No Edifício Andraus, Ariovaldo
corajoso determinado a ultrapassar todos os limites para salvar o maior número
de pessoas, o bombeiro esqueceu a principal lei que rege a vida de um soldado
do fogo. “Em primeiro lugar cuida de ti, para depois salvar os outros. “
Ariovaldo entrou no meio daquelas
enormes labaredas não pensando em mais nada, ao ouvir os gritos de socorro
desesperados das pessoas. Não recuou, ainda que o fogo chegasse tão perto,
quase lambendo a sua face.
Ele conseguiu salvar várias pessoas
devido a sua coragem indômita. Pagou um preço caro por isso. Acabou tendo
queimaduras de segundo e terceiro graus. Precisou ficar internado num hospital
de queimados por dois meses, inclusive tendo que fazer transplante de pele.
Quando recebeu alta do hospital,
ainda teve que ficar mais um mês em casa, terminando de se recuperar. Acabou
com o rosto um tanto desfigurado. Apesar de todo tratamento moderno que
recebeu. Nunca mais seria aquele homem de perfil grego perfeito, antes da
tragédia.
Quando ficou na recuperação em casa,
percebeu que, por ser um bombeiro extremamente dedicado à profissão, acabou
relaxando na vida em família. Não dava a devida atenção à esposa e nem ao
filho. Ambos se queixavam da pouca participação de Ariovaldo nos problemas
familiares.
A esposa cuidou com todo carinho do
marido e do filho da mesma forma e aquele bombeiro corajoso por sua vez,
tentando se redimir da pouca atenção que dera a família.
Finalmente, Ariovaldo teve alta e
voltou às atividades perigosas da profissão. Ele não perdeu aquele instinto de
ir além dos limites toleráveis. Sempre nas missões mais perigosas lá estava o
nosso herói pondo novamente a vida em risco.
Apesar do perigo, por diversas vezes
entrou em atoleiros de enchentes de morros que deslizaram, soterrando dezenas
de casas. Tentava desesperadamente localizar pessoas que ficaram embaixo
daquele mar de lama, levando a missão ao êxito e em outras fracassando. Mas,
sempre indo um passo além do que devia. Acabava se machucando, precisando de
atendimento médico.
No lar as coisas iam de mal a pior. A
relação com a esposa esfriou de vez e até pensavam em divórcio. Ariovaldo
chegava em casa depois
de um dia extenuante de tragédias, cansado, sem fome. Não conseguia sequer
assistir T.V., cochilava sob o olhar desanimado da esposa.
Com o filho a relação tornou-se
tensa. Já que com a ausência do pai e sem a devida e necessária atenção ao
rapaz, a situação ia ladeira abaixo. Por várias vezes os pais foram chamados à
escola, devido ao mau comportamento do rapaz.
A esposa de Ariovaldo ainda lhe chamou
a atenção. Ultimamente ela notou que o filho estava andando com más companhias.
Ela encontrou drogas nas roupas do rapaz, maconha e cocaína. Ariovaldo o herói
corajoso, um fracasso como pai, marinheiro de primeira viagem. Não conseguia
lidar com tantos conflitos. Covarde, fugiu da sua obrigação paterna. Entrava de
cabeça nas missões mais perigosas.
O incêndio do Edifício Joelma foi
terrível, morreram dezenas de pessoas. E lá estava o nosso herói pela metade.
Não pensou duas vezes e foi prédio adentro. Tentando salvar as pessoas presas
naquele mar de chamas. Ariovaldo conseguiu salvar várias pessoas. Na última
entrada para mais uma tentativa de tirar alguém, a tragédia aconteceu e desta
vez ele não voltou. Seu corpo foi encontrado carbonizado.
Ariovaldo teve um enterro com todas
as homenagens devidas. Medalha de honra ao mérito post mortem do herói
Bombeiro. Toque do silêncio e discursos elogiosos. Presentes a esposa e o
filho. Orgulhosos pelo Bombeiro tão admirado que foi, mas tristes, porque apesar
de ele ter sido um pai fracassado e ausente, iria fazer muita falta.
Retiraram-se arrasados e desconsolados para uma nova vida sem a presença dele
em casa.
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