Um presente de Deus
Ana Catarina SantAnna Maues
No dia do casamento de Joaquim, Helena sua
segunda mãe, relembra emocionada o inicio de tudo. Escutava seu choro todas as tardes. Isto
incomodava-me profundamente mas não sabia como aproximar-me. Sabia que haviam
chegado a pouco no andar, éramos vizinhos de porta. Até que um dia não resisti
e apertei a campainha deles. Demorou algum tempo para que aqueles grandes olhos
verdes viessem espreitar na porta que abriu bem pouquinho. Era um menino de uns
quatro anos de idade com grande cabeleira despenteada. Sorri e perguntei por
sua mãe, ele respondeu que não estava. Conversando mais, descobri que chorava
porque ficava sozinho quando a mãe saia para trabalhar só retornando tarde da
noite. Fiquei parada sem pedir pra entrar até que ele resolveu mostrar seus
brinquedos, depois a mochila, os livros escolares e por último a tv ligada no canal de desenhos.
Não consegui voltar ao meu apartamento e deixá-lo, certamente iria recomeçar a
chorar, tínhamos nos dado bem.
Por volta de onze da noite sua mãe chegou,
tomou um susto comigo ali em sua sala e com a criança já adormecida. Fui logo
avisando que era a vizinha do trinta e um e que o menino estava bem. Ela
demonstrava tensão, mas com o ritmo da conversa acalmou-se e desmoronou, chorou
de soluçar. Contou que era mãe solteira, que trabalhava numa loja no shopping
próximo e que não tinha ninguém por ela. Comoveu-me profundamente tudo o que ouvi.
Eu também não tinha ninguém por mim, e sem pensar duas vezes ofereci-me pra
ficar as tardes com Joaquim. Essa proposta pegou-a de surpresa, porém cheia de
alegria segurou-a como tábua de salvação. Foi assim que Joaquim entrou em minha
vida. Hoje ele é médico, cobre-me de mimos e cuidados. Sua mãe não viu a
formatura, faleceu jovem ainda.
Um dia eu fui para ele um presente dos céus
em sua vida, mas hoje ele é a benção de Deus na minha.