A FORMIGUINHA
MICHELE!
Dinah Ribeiro de Amorim
Moro em apartamento com
pequeno quintal. Último andar do prédio. Só eu e o céu também.
Costumo cultivar algumas
plantas, já possuo até pequenas árvores. Todas em vasos, pois a terra que havia
foi coberta com cimento.
Às vezes, alguns
bichinhos aparecem, para minha tortura, detesto que entrem em casa, mesmo
pequenos. Sou alérgica a qualquer tipo de picada ou mordida.
Logo cedo, corro ao
quintal para brigar com passarinhos, que bicam minhas jabuticabas, em botão.
Não as deixam amadurecer.
Entre uns bichinhos e
outros, formigões, formigas, e aranhas pequenas. Varro tudo ou esmago com os
pés. Nem sempre a água do esguicho resolve. Sinto verdadeira mania em atacá-los
toda manhã.
Numa dessas, espantada,
paro em cima de uma formiga que me atrai a atenção. Seguro-me na vassoura e a
observo, curiosa. Tão pequenina, tenta levar uma folha nas costas, três vezes
maior que ela. Ou até mais.
Fico alguns minutos
observando-a e, como derruba a folha muitas vezes e volta a pegá-la,
enterneceu-me, e tentei acompanhar o seu trabalho. Não tive coragem de matá-la.
Achei que o problema dela não era eu, a minha casa, o meu corpo, mas sim algo
mais importante.
Percorri, com os olhos, a
sua caminhada e, lentamente, dirigiu-se a um buraco bem pequeno no muro, de
onde foi ajudada por outras que enfiaram a folha para dentro.
Na manhã seguinte, tornei
a vê-la e, sem coragem de empurrá-la, batizei-a de Michele. Tive o cuidado de
não a varrer como aos outros bichinhos que encontrava.
Percebi logo que Michele
era a encarregada da alimentação do formigueiro e, com dó, solidária ao seu
trabalho, só faltava lhe dar bom dia. Como se me escutasse.
Agora, quando varria ou
molhava o quintal, deixava sempre umas folhinhas espalhadas perto do
formigueiro, esperando Michele aparecer e facilitar o seu trabalho.
Moro sozinha, converso às
vezes com plantas e flores, mas com formigas, a primeira vez.
Um tipo de loucurinha
legal. Se é que existe alguma.
O tempo passou, a estação
mudou, chegou aquele verão forte com suas chuvas violentas. Enxurradas para
todos os lados. Até algumas telhas do terraço de cima, digo quintal, caíram, e
tive que trocá-las. Caia água na sala. Os relâmpagos, aqui de cima, acendiam
tudo, seguidos de trovões extremamente barulhentos. A natureza bela e certa
também tem seus dias negros e tristes.
Quando o tempo amainou,
verifiquei alguns estragos no meu quintal. Vasos caídos, flores e raízes
arrancadas, chão sujo com poças ainda cheias de água. Demoraram a secar.
Preocupada, procurei o
buraquinho das formigas, no muro. Nem aparecia. Cheio d’água. E as
formiguinhas, coitadas? Nenhuma. Afogadas, com certeza, no temporal excessivo.
Pensei em Michele, a
formiguinha trabalhadeira, será que conseguiu se salvar? Talvez alguma folha
caída da árvore a tenha levado embora. Servido de barco para navegar em novas
águas e procurar outros caminhos. Será que as formiguinhas também têm céu? Possuem
algum tipo de alma?
Saudades de Michele e de
observar o seu trabalho!
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