Claudionor Dias da Costa
Romeu era um homem taciturno. Até demais para seus
cinquenta e sete anos.
Vivia naquela casinha apertada localizada nos
confins da Zona Leste de São Paulo numa vila de dez casas que se aglomeravam exprimidas
num terreno em que caberiam no máximo metade delas. A dele era a última da
esquerda com placa torta e apagada que mal dava para ver o número dez.
A morada de paredes de blocos sem revestimento não
passava de um quarto, um sanitário minúsculo e um corredor que servia de
cozinha com pequena pia e um vitrô que mal entrava a claridade e um fogão
espremido. Vivia com sua aposentadoria por invalidez, devido a acidente em sua
perna esquerda o que fazia com que andasse mancando.
Às vezes, sentava-se em sua única cadeira na porta
e ficava observando a vida que corria na pequena comunidade à sua volta.
Eram pessoas pobres, muitas sem mais nada a
perder...
Contudo, havia uma viúva da casa 5 que começou a
chamar sua atenção disfarçada. Ela saia as seis horas da manhã para trabalhar
como faxineira, após atravessar a cidade enfrentando transporte lotado que
custava quatro horas ou mais do dia. Era morena clara, por volta de seus
cinquenta anos, cabelos na altura dos ombros e sempre com um sorriso cumprimentava
os vizinhos. Aparentava felicidade e parecia não existir problemas para ela.
Voltava para casa no final de tarde, com o mesmo sorriso que saia. Era a
Marialva, pernambucana simpática e cativante.
Romeu ficava intrigado como poderia uma pessoa ser
assim. Comparava com sua vida imersa no passado, após abandono de sua mulher
que o traíra, empregos efêmeros e um acidente em sua perna que o empurrava por
um abismo de pesadelos.
Os dias se sucediam e ele não via a hora da noite
chegar e, se atirar numa cama tosca, como se pudesse renascer diferente.
Mas, aquela morena com seu belo sorriso e andar
elegante e formoso começou a ocupar seus pensamentos.
Assim, tomou coragem e, toda a tarde procurava com
seu caminhar lento, ficar na entrada da vila só para ver Marialva chegar. E,
quando a via subir a pequena ladeira, virar no beco e ouvir “Boa tarde Romeu”, parecia
que só os dois estavam no mundo e seus pés não estavam no chão. Os dias se
sucediam nesse pequeno instante que parecia ser eterno para ele.
Numa tarde qualquer daquele quente verão, o encanto
de Marialva com seu sorriso, provocou a coragem de Romeu a puxar conversa com
ela. Palavras banais sobre o tempo e outras levaram-no a conhecer um pouco mais
dela. Sua infância, adolescência e a perda prematura dos pais a tornaram
sozinha com dezessete anos de idade. Veio de sua terra para São Paulo para
trabalhar e morar em casa de família como doméstica. Não foi bem tratada e,
sobreviveu residindo aqui e ali na imensidão da cidade grande. Seus amores, pouco
ajudaram em sua vida, porque a maltratavam com agressões. Assim, passou a
buscar a paz solitária.
Não foi uma vida fácil.
Romeu num rompante misto de indignação e
curiosidade perguntou a ela:
“Como com tudo isto, você leva uma vida sempre alegre
e cordial com todos? ”
Marialva sorriu e disse: “Por que deveria ser
diferente? Eu tenho tudo que preciso.
Um teto modesto que me atende, a possibilidade de a
cada manhã ver o sol, conviver com as pessoas e respirar a vida.... Lamentar o
passado é tudo que não quero, com belos dias que ainda tenho para viver.
Aquelas palavras calaram fundo em Romeu. A partir
daquele dia, parece que a vida começou novamente. Passou a se arrumar melhor,
fazia a barba diariamente e até aquele xampu que escurecia os cabelos passou a
usar. Tudo para ver Marialva e seu otimismo radiante, além daquele belo
sorriso.
Suas tardes passaram a se chamar esperança e, quem
sabe o despertar de um grande amor.
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