Leon Vagliengo
Um
conto que... Vou te contar.
Corria
o ano de mil oitocentos e sessenta e nove, e naquelas paragens distantes do
Oregon, próximo à recém-fundada capital Salem, não era fácil para uma moça
encontrar o parceiro com quem formar uma família e constituir a sua vida.
As
tragédias acontecem quando menos se espera, muitas vezes mudando para sempre o
destino das pessoas, para o bem ou para o mal.
Aos
dezessete anos, Geraldine Ashley sonhava acordada, preocupada com as incertezas
do seu futuro, enquanto realizava as suas incumbências diárias na fazenda,
obedecendo às ordens de seu pai, Thomas Ashley, um homem corajoso e
trabalhador, um verdadeiro pioneiro entre os desbravadores do oeste americano;
porém, um homem rústico, ciumento e dominador.
Havia
quase duas semanas que não era visitada por Benjamin, aquele belo e simpático
rapaz que aparecia com frequência na fazenda, sempre com algum pretexto mal
elaborado, a demonstrar claramente que vinha por Geraldine. Com o tempo, ao
ouvir o trotar de seu cavalo, ela corria para recebê-lo, sempre sob o olhar
severo, mas compreensivo de Mary Ann, sua mãe, que via com simpatia e até, por
que não dizer, esperança no futuro daquela amizade que se fortalecia entre os
dois jovens.
Não
era essa, porém, a atitude Thomas que nunca dava atenção a Benjamin e nem
demonstrava qualquer simpatia por ele. Mal conseguia disfarçar o puro e
grosseiro ciúme que sentia face à situação que vinha se estabelecendo. Não
suportava a ideia de que alguém pudesse separá-lo de sua filha. E esse
sentimento de hostilidade foi crescendo em sua mente, sem que ele o desabafasse
com ninguém.
Naquela tarde, ao ouvir o trotar de um
cavalo, Geraldine correu para receber Benjamin, como já de costume. Duas
semanas haviam se passado sem a sua visita, estava aflita por saudades. Porém,
não era Benjamin quem viera.
Aquele homem grandalhão, com uma forte
cicatriz no rosto e expressão agressiva, apeou do cavalo e correu de arma em
punho disparando tiros certeiros em direção a seu pai, que não teve tempo para
defender-se ou fugir, caindo morto de imediato. O forasteiro rapidamente montou
em seu cavalo e fugiu a galope, deixando Geraldine sem ação, estarrecida com a
cena que presenciara.
Seguiram-se dias muito difíceis para
Mary Ann e Geraldine.
Foi
uma cerimônia simples, com a presença do Pastor, que viera de Salem, para
oficiar as orações do sepultamento. Após enterrar o corpo de Thomas no quintal
dos fundos da casa que ele mesmo havia construído, superando tantas dificuldades,
Mary Ann teria que contratar um empregado para a manutenção da pequena fazenda,
passando a esse colaborador as orientações que havia aprendido com o seu marido.
David
Peterson, um rapaz tranquilo e bem-apessoado, tinha vinte e poucos anos e já
havia trabalhado na fazenda, ajudando Thomas em alguns serviços. Era bem
conhecido pela família Ashley, que tinha por ele bastante simpatia. Quando soube
da morte trágica de Thomas, logo imaginou que a viúva precisaria de alguém para
tocar a fazenda, o que para ele também seria uma boa oportunidade. Foi um alívio para Mary Ann contratá-lo.
Ela preocupava-se também com Geraldine, que
demorou várias semanas até sair do torpor que se instalara em sua mente e
retomar com clareza a consciência da crua realidade que desabara sobre a sua
vida. A cena horrorosa da morte de seu pai, que presenciara integralmente,
parecia não sair de sua retina. Continuava a ver aquele homem grandalhão, com
aquela enorme cicatriz na face, a atirar em seu pai até que ele caiu morto. E o
seu pensamento foi completamente dominado por apenas uma ideia: vingança.
Se ao menos pudesse contar com Benjamin
para desabafar a sua tristeza e o desespero que a dominavam... Mas, não. Ele
simplesmente não voltou mais.
Em sua mente, a ideia de vingar a morte
de seu pai, matando o assassino, foi predominando e tomando forma. Sabia montar
e atirar muito bem, graças aos ensinamentos que seu pai lhe dera; ciumento,
sim, mas porque a amava muito, e queria protegê-la com essas habilidades. Agora
poderia valer-se delas para executar o seu intento. Mas havia o outro lado da
questão: ela não queria tornar-se uma assassina. Sua formação religiosa, pouca,
mas inflexível, era basicamente de absoluto respeito a Deus. Essa vingança
seria um pecado imperdoável, condenação inevitável às chamas eternas do
inferno.
A vida seguia e o abastecimento de
víveres e outros itens exigia que, de tempos em tempos, alguém se deslocasse a
Salem, a cidade mais próxima, ainda incipiente em sua formação, com comércio
básico, posto de correio, e tantas outras atividades que se instalavam.
Quando os suprimentos foram se esgotando
na fazenda, Geraldine pediu a sua mãe que a deixasse ir à cidade para
providenciar o reabastecimento. A última compra havia sido realizada por Thomas
pouco antes de morrer, havia quase dois meses. Mary Ann concordou, vendo nisso
uma oportunidade para sua filha distrair os seus pensamentos, desde que fosse
acompanhada por David, para a sua segurança.
Providenciaram
o pedido no entreposto comercial. Enquanto David cuidava do abastecimento da
carroça, Geraldine saiu perguntando para algumas pessoas, até que encontrou
alguém que reconheceu e lhe disse onde localizar o homem grandalhão, de grande
cicatriz na face, conforme o descreveu. Era um comerciante estabelecido na
cidade.
Sua
mente ferveu!
Como
estava armada, como sempre que saía da fazenda, rumou de imediato para o
endereço indicado. A extrema emoção, a expectativa e a ansiedade de encontrar o
assassino de seu pai, faziam com que se esquecesse completamente do dilema
moral e religioso que perturbava a sua consciência. A tentação da vingança
prevalecia. Apertou o passo e logo entrou no estabelecimento indicado, surpreendendo
e apontando a arma para o grandalhão da cicatriz. Era ele mesmo, o assassino, e
naquele instante estava só e indefeso.
Apontou a arma, mas ainda não atirou. Precisava
antes desvendar o mistério que a atormentava, conhecer o motivo do que
acontecera, saber por que ele matara o seu pai. Perguntou-lhe em tom ameaçador
e ouviu a terrível resposta:
−
O seu pai, aquele maldito Thomas, não merecia viver! Ele matou o meu filho
Benjamin! Não me arrependo do que fiz, pode atirar!
Geraldine
não atirou. Estupefata com a revelação, percebeu claramente na voz e nos olhos
do comerciante a dor que ele sentia pela morte do filho, confirmando que era
verdadeiro o que dissera. No instante seguinte compreendeu o desaparecimento de
Benjamin: Era ele! O seu pai o matara! Por ciúmes! Deixou baixar o braço, a arma
apontada para o chão, sem entender o que sentia agora. Tudo estava muito
confuso em sua mente.
Saiu
para a rua atordoada, remoendo tudo o que havia se passado. Perdera o seu pai,
perdera Benjamin, perdera o amor dos dois. E por pouco não se tornara uma pecadora
assassina.
Mas
ainda lhe restavam o amor, a sabedoria, o carinho e os cuidados competentes de
sua mãe, Mary Ann.
Geraldine
sentou-se à boleia da carroça abastecida ao lado de David Peterson e voltaram
para a fazenda. Ele ali estava para
zelar por ela, a pedido de Mary Ann...
Corria
o ano de mil oitocentos e sessenta e nove, e naquelas paragens distantes do
Oregon, próximo à recém fundada capital Salem, não era fácil para uma moça
encontrar o parceiro com quem formar uma família e constituir a sua vida.
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