Evidências
Hirtis Lazarin
Ouvi sussurros a minha volta. Não identifiquei quem os
emitia.
Tentei abrir os olhos. Pesados demais.
Tentei gritar. Não consegui.
Eu sabia que estava vivo. Sentia o pulsar descompassado do meu coração.
Eu estava em estado letárgico.... Eis que meus pensamentos começaram a
fluir como filme em câmera lenta.
Eu e meus amigos, mais dois monitores, fazíamos trilha na Mata Atlântica, Serra
do Mar. Era um sábado abundante de sol. Passaríamos a noite acampados e
a volta seria no dia seguinte.
As tralhas pesavam às costas, mas nada como o vigor físico que a juventude nos
garante.
Ao entardecer já estávamos armando nossas barracas. Fui rápido.
Afastei-me do pessoal. Queria curtir, lá do alto, o dia que já ia
embora. O sol escondeu-se deixando um rastro alaranjado.
Lembrei-me de alguns versos: "Quando a noite esconde a luz, Deus
acende as estrelas". E o céu pipocou mesmo de estrelas miúdas
pra que a lua cheia imperasse majestosa.
Perdi-me na paz do silêncio. Apenas o cricrilar dos grilos em busca de
suas fêmeas, cigarras alegres e um bando de vaga-lumes ziguezagueando.
E assim, perdido no encanto, vi um feixe de luzes coloridas vindo lá de
baixo em meio às arvores gigantescas.
Os raios entrelaçados alcançaram-me rapidinho. E, ligeiros,
enlaçaram-me num laço perfeito.
Totalmente imobilizado, levaram-me ao interior de uma cratera incrustada na
mata fechada.
Senti o calafrio da morte. Vi mamãe perdida em lágrimas, meu irmãozinho
procurando-me pela casa toda, papai fingindo tranquilidade.
Vi
até a galinha que eu crio, amuada no poleiro.
Vi meu mundo desmoronar. Fim de linha.
Só abri os olhos quando senti o chão aos meus pés.
Inacreditável o que vi...Criaturas estranhíssimas que viviam debaixo da terra.
Eram tantas que pareciam brotar do chão.
Ignoravam-me.
De baixa estatura, quase anões, eram carecas, cor acinzentada, olhos imensos
num rosto pequeno. De tão leves até flutuavam. Conversavam muito,
mas não entendi uma palavra sequer.
Estava perdido. Tremia feito liquidificador em velocidade máxima.
O que queriam de mim? Um garoto tolo que não gostava de estudar nem de
ler e viciado em vídeo game.
Tentei correr. Um deles me impediu. Não foi grosseiro. Foi
firme. E num português arrastado acalmou-me.
Eram seres intraterrestres do bem. Milhões e milhões. Viviam em
cidades subterrâneas preparando-se pra salvar o planeta Terra.
As guerras, o embate entre os poderosos, a corrupção, os descasos com
a natureza cresciam de tal ordem que pouco tempo restava aos seres humanos.
A humanidade estava prestes a ser aniquilada. Eles, então, se apossariam
do nosso planeta e uma nova Era viria.
A última coisa de que me lembro foi quando dois deles me seguraram e um
chip foi introduzido atrás da minha orelha esquerda.
"Por que isso?" Ninguém me respondeu.
Naquela hora apaguei.
Só sei que agora estou aqui deitado. A cabeça não dói mais. Posso
movimentar braços e pernas. Reconheço as vozes que me cercam. Senti
até um beliscão que o Juninho gosta de me dar.
Abri os olhos e todos estavam ali. Era espanto, incredulidade,
alegria. Tudo misturado.
Recebi alta. No caminho de casa, nada de perguntas. Só festa.
Lembrei-me do chip. Arrepiei-me todo. Existia ou não? A
esperança era que não.
Cautelosamente passei o dedo atrás da orelha.
E... E... O chip estava lá.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
DEIXE AQUI UMA MENSAGEM PARA O AUTOR DESTE TEXTO - NÃO ESQUEÇA DE ASSINAR SEU COMENTÁRIO. O AUTOR AGRADECE.