A GRANDE JORNADA - CONTO COLETIVO 2023

AINDA HÁ TEMPO PARA AMAR - CONTO COLETIVO 2011

FIGURAS DE LINGUAGEM

DISPOSITIVOS LITERÁRIOS

FERRAMENTAS LITERÁRIAS

BIBLIOTECA - LIVROS EM PDF

quarta-feira, 10 de setembro de 2025

O anão de Nova Odessa - Alberto Landi

 

 


 

O anão de Nova Odessa

Alberto Landi

 

Ninguém sabia ao certo quando ele havia chegado à cidade. Apareceu de repente numa tarde bem abafada, caminhando pela Rua dos Patriotas.

Chamava atenção não somente pela baixa estatura, mas pelo jeito de encarar as pessoas, olhos firmes, como se cada olhar fosse um desafio. Tinha o corpo baixo e robusto. A face marcada pelo sol. Pequeno na sua estatura, mas impossível de ignorar. Quando falava, a voz firme impunha respeito maior que seu tamanho.

Na praça central, próximo ao Coreto, abriu uma pequena banca de consertos, relógios, rádios antigos e até brinquedos quebrados, que voltavam a funcionar em suas mãos hábeis.

Rapidamente ganhou freguesia, porém com a admiração vieram os cochichos…

— Esse anão não é daqui da cidade. Tem algo estranho nele, você reparou? As pessoas comentavam.

 

A suspeita cresceu quando começaram a desaparecer objetos de uma feira noturna que havia.

Primeiro frutas, depois ferramentas, até que um feirante jurou ter visto o anão Elói próximo de sua banca.

O boato se espalhou feito pólvora. Uma noite, reunidos em frente à banca, os comerciantes exigiram explicações.

— Olá, baixote, ou você devolve o que roubou, ou vai embora daqui. O açougueiro gritou alisando o facão num gesto ameaçador.

Ele não recuou. Ergueu o queixo, respirou fundo e abriu uma pequena caixa de madeira. Dentro, havia muitos objetos, sim, mas não roubados. Eram peças restauradas, devolvidas à sua forma original. 

Não roubo nada. Devolvo o que vocês esqueceram de valorizar, disse com a voz firme e alto.

O silêncio caiu sobre a praça. Alguns abaixaram os olhos envergonhados, mas o açougueiro avançou um passo, ainda bem desconfiado, e a multidão observava dividida, sem saber se acreditava nele ou não.

Naquele instante, o destino de Elói ficou suspenso como o ponteiro de um relógio que hesita entre dois segundos.

O silêncio pairou sobre a praça. Ele mantinha os olhos fixos no açougueiro que ainda segurava o facão.

— Palavras bonitas, as suas — rosnou o homem.

Mas quem garante que não é truque?

O anão respirou fundo, mergulhou a mão na caixa e retirou um pequeno rádio de pilha que havia restaurado, dando vida a esse objeto.

Colocou-o sobre a banca e girou o botão. De repente, a velha melodia de uma valsa ecoou no ar. Uma senhora na multidão ofegou, levando a mão no peito.

— Esse rádio era do meu marido. Estava quebrado há anos, disse ela, emocionada, aproximando-se.

Ele apenas assentiu.

— Encontrei-o jogado num canto da praça, achei que merecia uma vida nova.

Um burburinho percorreu o local. Outros objetos da caixa foram reconhecidos: uma boneca de pano restaurada, uma caneta antiga polida, um relógio de bolso que voltou a marcar as horas. Aos poucos, a desconfiança se transformou em vergonha.

O açougueiro baixou o facão, desconcertado.

— Então… Você só queria consertar o que estava perdido?

— Não somente objetos, às vezes pessoas também.

Um silêncio respeitoso tomou conta do lugar. A partir daquele dia, ninguém mais ousou acusá-lo. Ele tornou-se guardião silencioso da memória da cidade, não por causa de sua estatura, mas porque enxergava valor onde os outros só viam descartes.

E foi assim que o estranho forasteiro, com mãos pequenas e firmes, consertou não apenas rádios e brinquedos, mas também a confiança de uma comunidade inteira.

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

DEIXE AQUI UMA MENSAGEM PARA O AUTOR DESTE TEXTO - NÃO ESQUEÇA DE ASSINAR SEU COMENTÁRIO. O AUTOR AGRADECE.

Cleuza entre o topo e o fundo. - Alberto Landi

    Cleuza entre o topo e o fundo. Alberto Landi   Diziam na cidadezinha onde vivia que Cleuza nasceu para brilhar, mas a verdade é qu...