O anão de Nova Odessa
Alberto Landi
Ninguém sabia ao certo quando ele havia chegado à
cidade. Apareceu de repente numa tarde bem abafada, caminhando pela Rua dos
Patriotas.
Chamava atenção não somente pela baixa estatura, mas
pelo jeito de encarar as pessoas, olhos firmes, como se cada olhar fosse um
desafio. Tinha o corpo baixo e robusto. A face marcada pelo sol. Pequeno na sua
estatura, mas impossível de ignorar. Quando falava, a voz firme impunha
respeito maior que seu tamanho.
Na praça central, próximo ao Coreto, abriu uma
pequena banca de consertos, relógios, rádios antigos e até brinquedos
quebrados, que voltavam a funcionar em suas mãos hábeis.
Rapidamente ganhou freguesia, porém com a admiração
vieram os cochichos…
— Esse anão não é daqui da cidade. Tem algo estranho
nele, você reparou? As pessoas comentavam.
A suspeita cresceu quando começaram a desaparecer
objetos de uma feira noturna que havia.
Primeiro frutas, depois ferramentas, até que um feirante
jurou ter visto o anão Elói próximo de sua banca.
O boato se espalhou feito pólvora. Uma noite,
reunidos em frente à banca, os comerciantes exigiram explicações.
— Olá, baixote, ou você devolve o que roubou, ou vai
embora daqui. O açougueiro gritou alisando o facão num gesto ameaçador.
Ele não recuou. Ergueu o queixo, respirou fundo e
abriu uma pequena caixa de madeira. Dentro, havia muitos objetos, sim, mas não
roubados. Eram peças restauradas, devolvidas à sua forma original.
Não roubo nada. Devolvo o que vocês esqueceram de
valorizar, disse com a voz firme e alto.
O silêncio caiu sobre a praça. Alguns abaixaram os
olhos envergonhados, mas o açougueiro avançou um passo, ainda bem desconfiado,
e a multidão observava dividida, sem saber se acreditava nele ou não.
Naquele instante, o destino de Elói ficou suspenso
como o ponteiro de um relógio que hesita entre dois segundos.
O silêncio pairou sobre a praça. Ele mantinha os
olhos fixos no açougueiro que ainda segurava o facão.
— Palavras bonitas, as suas — rosnou o homem.
Mas quem garante que não é truque?
O anão respirou fundo, mergulhou a mão na caixa e
retirou um pequeno rádio de pilha que havia restaurado, dando vida a esse
objeto.
Colocou-o sobre a banca e girou o botão. De repente,
a velha melodia de uma valsa ecoou no ar. Uma senhora na multidão ofegou,
levando a mão no peito.
— Esse rádio era do meu marido. Estava quebrado há
anos, disse ela, emocionada, aproximando-se.
Ele apenas assentiu.
— Encontrei-o jogado num canto da praça, achei que
merecia uma vida nova.
Um burburinho percorreu o local. Outros objetos da
caixa foram reconhecidos: uma boneca de pano restaurada, uma caneta antiga
polida, um relógio de bolso que voltou a marcar as horas. Aos poucos, a
desconfiança se transformou em vergonha.
O açougueiro baixou o facão, desconcertado.
— Então… Você só queria consertar o que estava
perdido?
— Não somente objetos, às vezes pessoas também.
Um silêncio respeitoso tomou conta do lugar. A
partir daquele dia, ninguém mais ousou acusá-lo. Ele tornou-se guardião
silencioso da memória da cidade, não por causa de sua estatura, mas porque
enxergava valor onde os outros só viam descartes.
E foi assim que o estranho forasteiro, com mãos
pequenas e firmes, consertou não apenas rádios e brinquedos, mas também a
confiança de uma comunidade inteira.
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