Peraltices
Adelaide Dittmers
Era
época de Natal. As ruas já cintilavam, e
o riso das pessoas parecia que vinha mais facilmente. Minha mãe conversava com
uma grande amiga, que tinha uma loja na rua principal de Bebedouro, cidade do
interior de São Paulo. A conversa fluía animada e já entrava no clima da festa
tratando de compras e arrumações.
Estava
sentada à porta ouvindo-as distraídas com seus planos, enquanto eu e minha
amiga Maria Luisa apreciávamos o ¨footing” tradicional movimento de vaivém dos
jovens pela rua naquela época.
Tinha
nos brações um boneco do qual não me separava.
Devia ter três anos e meio de idade, não tenho certeza. O ócio logo desmotivou minha amiga que resolveu
ir para casa. Era comum andarmos
sozinhas pela cidade que não oferecia perigos, e grande parte dos habitantes
nos conhecia.
Havia
ainda muito que conversarmos, muitas curiosidades para se ver, então fui com
ela até a esquina. Nossos passos curtinhos regados a brincadeiras fez desse
trajeto uma alegria. E, quando passamos pelo cinema, eu quis entrar, tinha
vontade de ver o que se passava lá dentro, tinha vontade de ver as imagens que
traziam os sons até a rua. Mas, logicamente, o porteiro não permitiu. Vai pra
casa, garota!
Aquilo
não me saiu da cabeça. Involuntariamente me aguçavam pensamentos e a vontade de
conhecer o cinema, aumentava em mim. Na volta, percebi que o porteiro não
estava no seu lugar. É fácil entrar agora, pensei. Então entrei, empurrei uma
porta e adentrei no escuro da sala. A luz que permiti entrar ao abrir a porta,
fez com que alguns me olhassem. O som alto me atraía mais do que a escuridão
que amedrontava. Sentei-me o mais perto possível da entrada. Os olhos vidrados na telona na tentativa de
adivinhar o que se passava ali. Lembro-me de mais olhares na minha direção. Não
havia cor na tela, apenas imagens em movimento.
Depois
de algum tempo sem identificar o que faziam na tela, cansei, e decidi ir
embora. Lembrei de pronto do porteiro que agora devia estar de volta ao seu
posto, então, com muito cuidado, sai carregando meu boneco.
Voltei
para a loja, e encontrei minha mãe já aflita me procurando. Tinha pouco mais de
três anos, e levei uma tremenda bronca, daquelas que não se esquecem jamais.
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