INACREDITÁVEL
Hirtis Lazarin
Dinho que já
foi Nandinho e que nasceu Fernando foi abandonado num orfanato nos primeiros
dias de vida.
A freira
Tereza encontrou-o num carrinho confortável e preparado com todo cuidado. Ao lado, uma mala com roupinhas finas e todo
treco que um bebê necessita.
Aquela
coisinha fofa causou um rebuliço no orfanato
Os indícios eram que pertencia a uma família abastada. Nunca conseguiram localizar sua origem e Dinho
cresceu ao lado de outras crianças sem família.
Ainda
pequenino, já se sobressaia nas missas rezadas na capela. Decorava num estalo as músicas cantadas e não
desgrudava do moço do violão.
Na sala de
aula, enquanto o professor ensinava, ele perdia-se em pensamentos que
percorriam distâncias e os dedinhos tamborilavam na carteira. E as lições... sempre incompletas. Foi até diagnosticado como portador de
"déficit de atenção". Mas a
freirinha Bety, sensível e observadora, corrigiu o falso diagnóstico,
presenteando-o com um violão. O menino
sarou.
Dinho, o
violão e a música nunca mais se separaram.
Corria solto
por todos os cantos colhendo sons que a natureza lhe oferecia: pingos de chuva
batendo no telhado, o farfalhar das folhas tocadas pelo vento, o canto afinado
das aves (era apaixonado pelo bem-te-vi), o vento forte que arrastava
coisas. Sua inteligência musical
permitia-lhe identificar sons, sequências musicais, ritmos e timbres.
Tudo se
transformava em notas musicais que viravam melodias. E as melodias eram reproduzidas no
violão. Dinho fazia o violão chorar ou
cantar de alegria. Música e letra brotavam e germinavam sem o mínimo esforço. E
os dedinhos, embora ágeis, ainda não conseguiam alcançar todas as cordas do
violão.
Começou a ser
convidado pra tocar em missas solenes.
Foi avaliado por "experts" em música.
Um menino
prodígio. Era muito mais que
talento. Era um dom. Talento a gente
conquista com esforço e persistência.
Dom é nato, é dádiva, é presente.
Mas de onde
veio esse garotinho tão valioso? Quem
seriam seus pais? Que tristeza uma mãe
não ter essa preciosidade em seus braços!
Foram várias tentativas pra encontrar essa família...
Bem longe
dali, um homem morria num leito de hospital.
Sua filha Verônica, sua única companheira.
A doença
consumia-lhe a carne e o remorso consumia-lhe a alma. Não morreria em paz.
Antes da hora
derradeira, puxou a filha pra junto de si e balbuciou algumas palavras. Ela aproximou-se mais até entender aquele
emaranhado de sons.
Verônica deu
um salto transtornada. Passou da
lucidez à loucura, da razão à
ignorância, do silêncio ao gemido de muita dor, do gemido ao choro
compulsivo.
Não podia acreditar que seu
pai foi capaz de tamanha crueldade com ela, sua única filha.
Agarrou-o pelo
pescoço como se fosse enforca-lo, mas o corpo já estava morto.
A moça partiu
na mesma noite. Engravidou
jovenzinha. O pai, rico empresário e
conhecidíssimo na alta sociedade, não suportou a ideia de vê-la casada com um
simples guitarrista de banda. Levou-a
pra bem longe e no hospital, após o parto, Verônica foi avisada pelo próprio
pai que o bebê nasceu morto e com problemas na formação. Não seria aconselhável, segundo os médicos,
que ela visse o feto.
Ele
desapareceu com a criança, abandonando-a num orfanato.
Incansáveis
noites perdidas chorando pela perda do menino.
Quanto sofrimento por nunca tê-lo colocado no colo, nunca tê-lo
abraçado. Agora, finalmente, iria
encontrar o seu menino, o Dinho, agora com oito anos. A maior preocupação seria recuperar todo
tempo perdido.
Verônica
dedicava-se à música desde os cinco anos de idade e hoje é a primeira
violoncelista da principal orquestra sinfônica do país.
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