Eu te amo
A
LINGUAGEM DO AMOR
Isabel Lopes
“A boca fala do que o coração está cheio”,
dizia aquele versículo da Bíblia Sagrada.
Amanda terminava
a ministração daquela palestra cristã em libras, com essa citação e, entre
aplausos e felicitações, sentia-se grata pela oportunidade que havia recebido
da Associação dos Deficientes Auditivos de sua cidade.
Amava esse
versículo de uma maneira muito particular! Para ela não só a boca, mas também
as mãos, falavam daquilo que está cheio o coração.
Desde que fora
diagnosticada com Otosclerose, uma doença do ouvido médio que
causa surdez progressiva, ganhara preciosas aliadas: suas ágeis mãos, encarregadas
de facilitar sua comunicação.
Ela orgulhava-se
de seus dedos longilíneos e das unhas bem cuidadas e, por saber que suas mãos eram
sua ferramenta de contato com o mundo externo, tratava-as bem.
Em meio a
tantos desafios que a vida lhe impusera, Amanda havia descoberto o encanto que
esse mundo silencioso oferecia.
A perda
gradual da audição proporcionou-lhe uma percepção diferenciada do mundo ao seu
redor e era com suas mãos que ela o explorava.
Com elas, assim
como faziam as outras pessoas: acenava, tocava, acariciava...mas o que fazia
suas mãos serem diferentes das mãos dos das pessoas ouvintes é que suas “falavam e ouviam”!
Num bailado
frenético e ritmado, suas mãos iam projetando palavras e frases que expressavam
suas emoções, opiniões, alegrias e tristezas em uma tela imaginária.
Como era
fascinante se fazer entender! E que bom poder compreender o que os outros diziam.
Amanda tinha
descoberto que as mãos das pessoas diziam muito a respeito delas e se pusera a
observá-las, secretamente.
Mãos
pequeninas, em particular, a fascinavam! Suas donas normalmente eram crianças
ruidosas, que mergulhavam dedos apressados em baldes de pipoca.
E tinham as
mãos com veias saltadas e manchas senis no dorso: essas eram as de sua mãe e,
quando acariciava seu rosto, tinham um perfume que lembrava as manhãs de outono.
Como seria a
mão de Deus? Pensava. Só sabia que eram mãos grandes, pois sentia-se sustentada
e amparada por elas!
Lembrava-se agora
de como havia conhecido Juliano naquele ponto de encontro da comunidade surda,
no shopping...lá se iam dois bons anos!
Mãos fortes, ora
amparando a cabeça displicente que pendia para um dos lados do corpo; ora
mergulhadas no espaço, dizendo coisas enquanto sorria.
A amizade era
profunda, o carinho mútuo. Tinha vontade de se declarar, mas até ali tinha lhe
faltado coragem...
Mas não
naquele dia! – decidiu, batendo a porta atrás de si.
O shopping era
próximo, ela estava ofegante.
Chegou quase
correndo e cumprimentou o grupo, disfarçando a ansiedade.
Juliano estava
na mesa ao fundo, como se a esperasse.
Quando
percebeu, estava diante dele. Seus lábios silenciosos se moveram, seus olhos
brilhavam e suas mãos, enfim, falaram daquilo que estava cheio seu coração!
Com um doce
sorriso, fechou o punho delicadamente e levantando os dedos mínimos, indicador
e polegar ela se declarou na linguagem dos sinais.
Juliano
entendeu a mensagem em libras:“eu te amo!” e sorriu retribuindo.
Deram- se as
mãos e um beijo os uniu.
Não houve mais
dias infelizes depois daquele dia.
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