Primeiras
Lembranças
Rejane Martins
Eu e meus quatro irmãos chegamos no dia onze de
maio de dois mil e cinco. Não entendi direito, mas mamãe disse que éramos touro,
apesar de todos termos características caninas. Será que somos espiões
disfarçados? Se formos, como nos comunicaremos entre nós, latindo ou mugindo? Melhor
latir, assim protegeremos nossa identidade secreta.
Oba, é hora do lanche que hora tão feliz, sobrou
alguma mama para mim? Nossa que dificuldade, chega para lá, dá um cantinho, por
favor.
Nosso primeiro passeio de carro, parece que alguém
fez alguma coisa errada, mas o castigo foi coletivo, ninguém na janelinha. Ah
não! O passeio foi curtinho mesmo. Iraaaado, viemos a uma butique, missão
impossível, escolher uma roupinha neste paraíso, este aqui com dois tons de
rosa, olha só como estou chiquetosa.
Que esquisita aquela mamadeira, além do bico
fininho e metálico, não se bebia o leite, a alimentação se dava pela perna. Chegou
minha vez, nossa como doeu. Depois de me machucar a mulher ruim veio me
agradar, como se adiantasse.
A primeira casa foi bem legal, a transparência
permitia ver as pessoas na rua. Via de
regra as mordidas que meus irmãos davam em minhas orelhas me desconcentrava e
eu deixava de explorar o mundo lá fora.
Um dia resolvi tirar uma pestana, e ao acordar
percebi que havia perdido quase todos meus irmãos. Pensando melhor, depois do
primeiro passeio, a mamãe também sumiu. Como ficamos eu e a caçula somente, era
minha obrigação defendê-la de qualquer perigo.
Me senti impotente assim que assumi a
responsabilidade, nem percebi aquelas duas mãos enormes afastando minha
irmãzinha. Por mais que eu protestasse unhando o vidro, vi aquelas pessoas
segurando-a, pensei em chamar polícia, afinal estavam sequestrando uma menor
indefesa. Ficaram com medo das minhas ameaças e a devolveram-na sã e salva.
Mas não foi medo, foi revanche. O dono daquelas
duas mãos enormes, merecia ser denunciado também por cumplicidade, me colocou
no colo daqueles sequestradores. Rapidamente tracei um plano de ataque, cravaria
meus dentões de leite em todos que se aproximassem.
Porém o colinho gostoso me desarmou, eu me
sacrificaria para o resto da vida em troca deste aconchego. Pedirei para me
enclausurarem, como é mesmo que a mamãe nos ensinou? Ah! Sim, abaixa o focinho,
mira um olhar melancólico por cima dos óculos imaginário. Uhhhu deu certo.
Tchau maninha, fui.
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