Incorrespondência.
Vanessa Proteu.
Clara já estava acostumada a
receber cartas de William, afinal já fazia um ano que ele havia se divorciado e
eles começaram a se aproximar bastante.
Sempre que possível, o rapaz alto,
atraente, galante e muito bem-vestido se oferecia para levar Clara em sua casa.
Ele, com 40 anos e uma experiência de um casamento frustrado de quase duas
décadas. Ela, solteira aos 25 e à espera de um príncipe encantado.
— “Eu tenho nome de príncipe”,
disse ele, com tom apaixonado, em uma de suas conversas.
Ele a elogiava com palavras
tão doces que ela se sentia especial e, quando se viam, era como se o céu
tocasse o chão. Por outro lado, quando estavam distantes, ansiavam pelas cartas
um do outro.
Clara queria receber de
William uma declaração. A jovem vivia imaginando o dia em que ele a escrevesse
dizendo sentir o mesmo que ela. Ele era tímido e talvez tivesse medo de olhar
em seus olhos e dizer o que sentia.
O fato é que as conversas eram
profundas, as cartas eram frequentes e estavam cada vez mais próximas. Ela
sabia tudo sobre ele: que sua cor preferida era o azul, seu prato predileto era
camarão, o que o angustiava, a profissão que ele teria feito se não fosse
contador, sua vontade de morar na praia e o quanto ela o fazia bem...
Era sexta-feira e Clara estava
esperando notícias de seu amado. Ele tinha viajado e ficaria fora por pouco
mais de um mês. Ela estava ofegante, ansiosa, pois sempre que ele viajava,
escrevia para ela descrevendo, com riqueza de detalhes, as belezas do lugar. No
entanto, nenhuma carta foi entregue e ela estranhou. “Deve estar com muito
trabalho”, pensou, sem dar muito espaço à intuição.
Na segunda-feira, à tarde,
Clara saiu do trabalho e foi verificar se havia chegado alguma correspondência.
Pegou na caixinha um bolo de cartas e começou a olhar atentamente o remetente
de cada uma. À medida que ia verificando, suas mãos suavam, seu coração
disparava e suas pernas ficavam trêmulas, como se William estivesse em sua
frente. — "Envelope do Banco, cartão postal da tia Dulce, folheto de
propaganda de restaurante, santinho de candidato político, folheto de
testemunha de Jeová...” o suor começa a escorrer em seu belo rosto e
finalmente, no fundo da caixinha, a tão esperada carta intitulada: À minha
querida amiga.
Ao ler, o brilho dos olhos foi
se apagando, o sorriso sumindo, dando lugar às lágrimas. Clara correu para o
quarto onde ela sempre ficava desde que se deixou levar por esse amor platônico
e se pôs a escrever: “ Divergência, eu sei. Nossos olhos não se encontram.
Carência, talvez. Não consigo enxergar. Minhas mãos gélidas conversam com as
suas que não têm nada a falar. Incompetência, eu falhei! Não sei conquistar.
Minha voz a te seguir e a sua a fugir procurando quietude. Paciência, eu
clamei! Exigindo atitude. Sob os pés, não há chão, há um tapete de nuvens.
Chegará ao coração? Procuro na ausência um porquê, pena não ser a minha
vocação. Se eu soubesse tocar, tocaria em você, não um toque de pele, mas um
toque do ser; te encontraria nas ondas que agitam o mar. Se não fosse
imprudência, eu te abraçaria e te arrancaria do seu singular.”
No entanto, Clara
resolveu rasgar a carta e não se comunicou mais com seu príncipe William, pois
na correspondência, dentre outras coisas, ele dizia ter boas notícias, pois
havia conhecido alguém.
“Hum, boas notícias, pra
quem?”
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